31.12.19
Bem, estão concluídos 45
anos de serviço público. Ficam com quem os sofreu, porque o seu exercício nunca
foi fácil, embora, por vezes, fosse gratificante…
Ficam com quem os sofreu
porque, demasiadas vezes, o sujeito de aprendizagem perdeu identidade para se
transformar num objeto de ensino…
Quando a Memória destes
45 anos se esbate, ao contrário de muitos outros que se orgulham de numerosos
sucessos, resta um gosto amargo por não ter conseguido aplicar uma pedagogia
diferenciada que libertasse cada aluno da formatação imposta pelo sistema educativo…
Resta um gosto amargo
porque, ao longo destes 45 anos, os conteúdos foram perdendo significado,
criando um tal vazio que poucos são, hoje, capazes de distinguir a verdade da
mentira, como se a Ilusão nos bastasse…
30.12.19
Sobre o aparelho de ar
condicionado do 12º andar, enquanto a gata dorme, a gaivota alimenta-se, sem
perceber que está a ser observada…
Sem perceber? Esta
certeza é capaz de ser exagerada… Afinal, o que sei eu da perceção das
gaivotas…
E a Sammy continua a
dormir, ela que espera horas pela visita de uma qualquer ave…
Por mim, vou continuar a
leitura de Orlando, que já se encontra na fase fêmea, sem que eu
compreenda como é que, à época, se passava de macho a fêmea com tamanha
facilidade.
Alquimia literária! De
qualquer modo, amanhã a gaivota regressará. A mesma? Macho? Fêmea?
29.12.19
Os autocarros
aproximam-se do terminal rodoviário na faixa que lhes foi destinada, no entanto
ficam bloqueados. Ninguém parece preocupar-se.
Centenas de passageiros
que optaram pelo transporte coletivo esperam impacientemente por terminar ou
iniciar a viagem.
Não há um agente que
regule o trânsito, que ponha cobro ao egoísmo de quem só pensa na sua
comodidade…
A verdade é que dois ou
três agentes na zona da Estação do Oriente seriam suficientes para tornar o
trânsito mais fluido e para evitar o aumento da temperatura na zona - cerca de
2 graus.
E depois queixam-se das
alterações climáticas, sem esquecer o estado depressivo em que vamos caindo…
27.12.19
Não é por lhes citar os nomes que se tornam conhecidos. Os nomes não acrescentam nada. Sem obra individual, não há renome…
Há obras coletivas cujos
trabalhadores morrem no anonimato, mesmo que os Saramagos percorram o alfabeto
da nomeação. Um João, por exemplo, seja o primeiro ou o quinto, persiste por
mais tempo na Memória… ainda que a resistência seja cada vez mais breve…
Entre tantos manuéis, só
o primeiro assegurou um estilo, sem ter entrançado uma corda, que se saiba.
Já nem as lápides cumprem
o ofício!
26.12.19
Dizem-me nesta data - e
quem o diz não é profeta! - que faltam 185 dias. Não sei se acredite, até
porque Virginia Woolf (Orlando) assegura que
«Infelizmente, o
Tempo faz fauna e flora crescerem e definharem com espantosa regularidade, mas
não tem o mesmo efeito tão simples na mente humana. Mais: a mente humana acaba
por agir de forma correspondentemente estranha sobre o decorrer do tempo.»
A verdade é que os 185
dias podem ser mais ou menos, pois a duração não depende de nenhum robot, mas
sim da mente que tiver lido (ou ignorado) um simples e-mail. Se a leitura for
ativa, o tempo será significativamente encurtado. Caso contrário, os dias ficarão
esquecidos no computador do burocrata… e eu às voltas com o biógrafo de
Orlando:
«Uma hora quando
alojada nesse elemento tão bizarro que é o espírito humano pode ganhar
cinquenta ou cem vezes a sua extensão segundo o relógio; inversamente, uma hora
pode ser fielmente retratada no relógio mental como tendo durado um mero
segundo.»
No meu caso, o tempo
psicológico dá cabo de mim, porque uma vezes passa apressado; outras, de tão
lento, acelera-me o tic-tac.
24.12.19
BOAS FESTAS A TODOS OS
MEUS FAMILIARES, AMIGOS E CONHECIDOS!
Obrigado pela companhia!
22.12.19
O
parque de estacionamento "Oceanário" é caro e serve mal
O parque de
estacionamento 'Oceanário' fica ali ao lado - serve o Teatro de Camões, o
Oceanário, a marina…
Porém, serve mal!
Logo, à entrada, surge o
aviso de que a Via Verde não está disponível. A caixa de pagamento fica no piso
0, o que nos dias de maior afluência provoca inevitáveis e demoradas filas.
Apesar do elevado custo, o multibanco também não funciona...
Quanto aos acessos ao
exterior, ninguém se ocupa da sua limpeza, sobretudo, em dias de chuva e nas
horas em que os javardos vomitam escada abaixo, gerando situações que podem
provocar quedas extremamente graves…
E claro, vigilante,
assistente, funcionário, ninguém lhe(s) põe a vista em cima. Será por ser
domingo?
21.12.19
Que
Zeus nos acompanhe por estes dias!
Tem chovido, valha-nos o
deus da chuva!
A comunicação social
apresenta a chuva como inimigo do homem - tomba as árvores, destrói os jardins,
inunda as casas, corta as vias de comunicação… indo ao ponto de desalojar e de
retirar vidas. A chuva arruína o natal dos glutões e dos vendilhões. A chuva dá
cabo do negócio, à exceção do da comunicação social…
Ninguém questiona o
motivo por que a chuva dos ribeiros corre para os afluentes e destes para
grandes rios e se precipita no oceano…
Parece que a montante não
há ninguém que perceba que a oportunidade é única. Não há quem trace um plano
de desvio dos caudais de modo a criar reservas capazes de suprir a cada vez
maior escassez de água… não há quem trace um plano para acabar com o assoreamento
… não há quem trace um plano para retirar o edificado dos leitos e das margens
dos cursos de água…
Neste abençoado país, só
há catastrofistas que sonham em ir a banhos.
19.12.19
Vivendo o tic-tac, hoje,
com chuva, ventos fortes e mau humor…
A alternativa de seca,
calmaria e festa seria certamente mais atrativa, mas tão depressiva como as
depressões que vêm atravessando a Península Ibérica.
Esta chuva tão arisca
arrasta consigo a necessária limpeza e a reposição das reservas de água
fundamentais ao bem-estar das gentes, da fauna e da flora, sem esquecer os
minerais… Por isso a insatisfação deveria dar lugar ao agradecimento, apesar
das constipações e similares.
Este tic-tac dos dias
martela-me as meninges já cansadas da profissão. No entanto, sempre que chove
sinto alívio e vontade de continuar.
A chuva que conforta a
alma. Que seria de nós sem ela?
18.12.19
Colocar a hipótese de que
algum ser humano possa ser godot é uma presunção saída do inconsciente
individual, incapaz de descortinar a fronteira entre a conveniente modéstia e a
desmesurada soberba…
Pressinto que a modéstia
não deve ser avaliada pela conveniência, mas é da natureza humana graduar tudo
como se, habituada a rever-se no espelho, saltasse para lá do caixilho, à
espreita de uma dimensão que sempre lhe foi vedada…
Do lá de cá não mora
nenhum godot, mesmo que o façamos nascer entre as palhas de um estábulo ou nos
alimentemos do corpo e do sangue - rituais de apropriação de quem receia não
SER.
E será que há, por detrás
dos rituais e dos sonhos, um qualquer godot, relojoeiro do multiverso? Eu
simples relógio me confesso, vou vivendo até que o tic-tac se esgote. E basta!
17.12.19
Não sendo Godot nem
estando à espera dele, não deixa de ser estranho que, frequentemente, pense
nele…
Tempos houve em que
poderia esperar sentado à sombra de uma figueira… agora, sentado ou de pé,
distante do quase inexistente figueiral, espreito os dias como se eles me
fossem exteriores…
Espreito-os a desoras, à
espera de que se tenham esfumado só para me surpreenderem num regresso a horas
ociosas de que nunca tirei proveito…
E, apesar de o não querer
confessar, sei que, mesmo que Godot pudesse desfazer a espera, hei de continuar
à espera, o que não faz qualquer sentido…
Antes que se faça tarde,
vou apanhar o metro e regressar à escola donde, verdadeiramente, nunca saí…
Ultimamente, assalta-me a dúvida se alguma vez lá entrei.
15.12.19
O
movimento das sardinhas em Itália
Não queremos, mas votamos
na mentira dos políticos…
Não queremos, mas
ignoramos a prescrição das coimas que os partidos deveriam pagar…
Não queremos, mas fazemos
vista grossa à sofisticação do mercado ilegal das drogas…
Não queremos, mas
consumimos desalmadamente no natal e na passagem de ano…
Não queremos, mas
hipotecamos a vida a todo o momento…
… e o pior é que não
sabemos que, por vezes, a vontade é o nosso maior inimigo.
12.12.19
Cansamo-nos de tudo, exceto
de compreender. O sentido da frase é por vezes difícil de atingir.
Cansamo-nos de pensar
para chegar a uma conclusão, porque quanto mais se pensa, mais se analise, mais
se distingue, menos se chega a uma conclusão.
Caímos então naquele
estado de inércia em que o mais que queremos é compreender bem o que é exposto
— uma atitude estética, pois que queremos compreender sem nos interessar, sem
que nos importe que o compreendido seja ou não verdadeiro, sem que vejamos mais
no que compreendemos senão a forma exata como foi exposto, a posição de beleza
racional que tem para nós.
Cansamo-nos de pensar, de
ter opiniões nossas, de querer pensar para agir. Não nos cansamos, porém, de
ter, ainda que transitoriamente, as opiniões alheias, para o único fim de
sentir o seu influxo e não seguir o seu impulso.
Bernardo Soares
Gostaria de acompanhar
Fernando Pessoa quando defende que não nos cansamos de compreender, e que o
fazemos por uma «atitude estética», desinteressada da utilidade e da
verdade...
Parece que abdicamos da
nossa vida, apenas para fruir a (as) dos outros..., sem, no entanto, os
tomarmos como exemplo...
Pelo menos, se não caminhamos
por nós, também não o fazemos pelos outros...
Estetas do absurdo,
adormecemos sobre o mundo, enquanto a chuva fustiga a o pátio.
Voltando atrás, creio que
estes estetas são cada vez mais raros, mergulhados que andamos na mentira e no
interesse.
11.12.19
Árvore. Talvez, eu não
consiga atribuir-lhe qualquer relação com o sagrado, ou não queira envolver-me
nessa hierofania, que permitiria colocá-la, lá longe, na Índia, como expressão
da amizade entre irmãos de ambos os sexos.
Se me deixasse de
hesitações, diria que esta árvore foi classificada como 'ficus religiosa' ou,
noutra versão, como figueira do pagode, sem dança, apenas como celebração
própria de um templo hindu.
Custa-me aceitar o
sagrado, quando ele não é capaz de modificar sociedades, em que a defesa da
honra autoriza a lapidação e deixa a violação impune.
10.12.19
Com ou sem marquês, bom
seria que nesta quadra não persistíssemos no fervor das iluminações…
Pode parecer bonito, mas
fica caro!
Quanto custam as
iluminações de Lisboa? Será que a despesa não seria suficiente para retirar dos
hospitais e das ruas todos aqueles que pelas mais diversas razões foram e vivem
abandonados?
«José Lopes foi encontrado morto na tenda onde vivia, nos arrabaldes de
Sintra, junto a uma estação de comboios. As causas não são conhecidas, nem
sequer o dia ou a hora exatas da sua morte. Aos 61 anos, o ator vivia com as
maiores dificuldades, e a notícia de que um amigo deu com ele um par de dias
depois de se ter finado circulou nas redes sociais, com as mensagens de pesar
misturando-se com a prece a um deus-remorso.»
9.12.19
João Gama, da delegação
da DRAPC da Sertã e responsável pelo núcleo da Pampilhosa da Serra salienta que
“esta é uma cultura ainda pouco estudada, sendo uma planta difícil de
apreender porque tem um ciclo muito diferente do habitual, com a floração a
ocorrer ao mesmo tempo da frutificação, só perde algumas folhas na primavera e
o fruto leva 11 meses a amadurecer é, assim, muito diferente das outras
fruteiras, não há mais nenhuma igual”.
Se tudo fosse igual,
seria uma chatice!
Não vem a propósito, mas
surgiu-me agora um novo provérbio adequado à estupidez dos últimos
tempos:
A franga canta porque
quer galo! O PAN assobia porque quer galho!
8.12.19
Zeus destruirá também
essa raça de humanos de fala articulada,
quando acabarem nascendo
já com as têmporas grisalhas.
Nem o pai será concorde
com os filhos, nem os filhos com o pai,
nem hóspede com anfitrião, nem companheiro com companheiro;
nem um irmão será
querido, tal como era antes.
Desprezarão os pais logo
que envelheçam,
e vão repreendê-los
proferindo duras palavras,
os cruéis, ignorando a
vingança divina; e nem mesmo
dariam aos velhos pais
retorno pelo alimento que tiveram na infância.
O direito da força: um
saqueará do outro a cidade.
Nenhum apreço haverá por
quem é fiel aos juramentos, pelo justo.
ou pelo bom: antes o
malfeitor e o homem - violência
honrarão. A sentença
estará na força; reverência
não existirá. O cobarde
fará mal ao homem de maior valor
com discursos
tortuosos, e a seguir dirá “juro”.
A inveja todos os
humanos miseráveis
acompanhará, voz
dissonante, face odiosa, comprazendo-se no mal.
Será então que, da
terra de largos caminhos, partindo para o Olimpo,
a bela tez a cobrir
com véus brancos,
irão ter com a
tribo dos imortais, deixando os humanos,
Reverência e Indignação.
E ficarão para trás dores amargas
para os humanos
perecíveis: não haverá defesa contra o mal.
Hesíodo (meados do séc.
VII a C.), excerto de Os Trabalhos e os Dias, O mito das
cinco raças
Talvez por ser domingo, resolvi visitar Hesíodo porque, como diz a tradição,
ele terá vencido Homero num concurso poético, pois preferia a paz e o trabalho
à guerra e ao combate.
7.12.19
Com Nuno, guerreiro ou
santo, a cidade também vive às costas dele…
Consta que era
excessivamente puritano e inimigo das mulheres e que, apesar de tudo, não se
dava nada mal com os fidalgos castelhanos…
É difícil acreditar em
tudo o que se diz, e isso já nada importa, o que vale é ouvir-lhe a história e
deixar-se levar pelo brilho da cidade e ainda pelo espanto de ouvir um brejeiro
adolescente espanhol ensaiar para um público familiar a primeira quadra de um
soneto - aplaudida com entusiasmo…
Que pena não ter o ouvido
do Fernão Lopes!
6.12.19
Nada
falta nem a língua de pau!
Já não é o leão que ruge.
Está em extinção, o rei da selva! À falta dela, nem o circo ou o zoo o podem
salvar... Domesticá-lo também não faz sentido, a não ser em Alvalade.
Ligo a televisão e vai
por aí uma tal confusão, com uns a entrar e outros sair, que já não sei para
que servem as igrejas e os tribunais - tudo se passa no mundo virtual.
Nada falta nem a língua
de pau!
Só uns tantos estão a
mais - os idosos, os reformados, os doentes, os sem-abrigo, os desempregados,
os precários, os enfermeiros, os professores, os polícias, os agricultores, os
pescadores e até uma boa parte dos doutores… De qualquer modo, os sicários já
começaram a afiar as facas.
E ainda se queixam do
clima! Viva o Menino Jesus e o negócio do Natal!
5.12.19
«Na vida de hoje, o
mundo só pertence aos estúpidos, aos insensíveis e aos agitados. O direito a
viver e a triunfar conquista-se hoje quase pelos mesmos processos por que se
conquista o internamento num manicómio: a incapacidade de pensar, a
amoralidade, e a hiperexcitação.» Bernardo Soares, Livro do Desassossego
Já só há um manicómio, a
Terra toda - o planeta dos estúpidos, onde 'os inteligentes são igualmente
estúpidos' Fazer-se passar por inteligente deixou de ser necessário à falta de
interlocutor… Só o silêncio poderá pôr cobro à vertigem destruidora…
No entanto, até o
silêncio é estúpido porque é humano. Já pensei em medir o silêncio, mas sou
incapaz porque não consigo libertar-me desta tendência para zurzir a torto e a
direito...
4.12.19
«Quando nasceu a
geração, a que pertenço, encontrou o mundo desprovido de apoios para quem
tivesse cérebro, e ao mesmo tempo coração. O trabalho destrutivo das gerações
anteriores fizera que o mundo, para o qual nascemos, não tivesse esperança que
nos dar na ordem religiosa, esteio que nos dar na ordem normal, tranquilidade
que nos dar na ordem política. Nascemos já em plena angústia metafísica, em
plena angústia moral, em pleno desassossego político.» Bernardo
Soares, Livro do Desassossego
A geração de Fernando
Pessoa / Bernardo Soares, nascida no final dos anos 80 do século XIX e entrada
na vida adulta na segunda década do séc., é aqui retratada como se tivesse sido
empurrada para um beco sem saída… O retrato parece acertado…
No entanto, eu, que nasci
na década de 50 do século passado, ao ler este fragmento de Bernardo Soares,
vejo-me a pensar que a minha geração, do ponto de vista religioso, era
descrente; do ponto de vista doméstico, vivia à deriva. E quanto ao rumo
político, parte da minha geração vivia na completa ignorância, formatada numa
ideologia aviltante…
A verdade é que a
angústia e o desassossego cresciam no esplendor do existencialismo e,
sobretudo, nos campos rubros de papoilas povoados por orquestras anestesiantes,
idolatradas como se os deuses tivessem descido à terra.
E hoje, por onde é que
andam a religião, a moral e a ideologia? Há quem as veja nas mesquitas, nos
areópagos, nos cais. Em cascatas ou em fiapos…
3.12.19
Sinto-me gretado!
Dito deste modo, até
parece que sou mais um dos fãs da jovem Greta. Compreendo o espírito da sua
cruzada, mas nunca fui adepto de causas fraturantes…
Todos sabemos que a
maioria das populações nada pode fazer para combater as causas das alterações
climáticas nem mesmo para assegurar a sua própria sobrevivência.
As decisões fundamentais
têm de ser tomadas por meia dúzia de nações que há muito contribuem para o
atual estado de coisas e que insistem que não há qualquer problema.
Como diria Bernardo
Soares: «Uns inteligentes, outros estúpidos, são todos igualmente estúpidos.
Uns velhos, outros jovens, são da mesma idade. Uns homens, outros mulheres, são
do mesmo sexo que não existe.»
E é esta a história da
Humanidade. Raramente, os inteligentes conseguiram alterar o rumo traçado pelos
estúpidos.
2.12.19
É isso, o povo gosta de capas!
O povo capado satisfaz-se com capas…
Outrora, também gostava do suco, do tutano, da seiva.
(…)
Por mim, não sei do que gosto, mas sei do que não gosto - de capas, de
máscaras.
Bem sei que elas dão jeito para sairmos janotas, pobres idiotas.
1.12.19
Abre-se
a Serra, gruta de Alvados
Abre-se a Serra e do
interior jorram formas múltiplas capazes de nos fazer sonhar com outras vidas,
silenciosas e milenares…
Apenas sonhar, porque o
tempo nos falta para lhes acompanhar o movimento e a linguagem. Sim, porque a
Serra fala uma língua particular, diferente, por exemplo, da do mar.
À superfície, no entanto,
o vento continua a soprar e o trovão a ribombar, lembrando-nos quão pequenos
somos se não nos recolhermos a meditar.
Para quê, pode alguém
perguntar… Talvez para que a alma possa voltar a vibrar antes que o corpo nos
falte, de vez.
O resto, a própria
pátria, não passa de ilusão.
30.11.19
A
desproporção esmaga, gruta de Alvados
Por aqui o tempo é
desumano, arruma-nos a vida em menos de um centímetro…
Vista, deste modo, a
desproporção esmaga, mas, na realidade, quem nos põe em sentido é a Natureza,
essa criadora insaciável que já deve andar farta de nós.
No entanto, continuamos
absortos nas nossas vaidades, nos nossos interesses, sem perceber que quem tudo
tem a perder é a humanidade.
Na Serra d'Aire, a
Natureza é um livro aberto da sua Arte e da nossa imbecilidade. Não esqueçamos
que a Serra d'Aire é um aquífero insubstituível.
Esperemos que por aqui
não haja lítio...
29.11.19
Ainda estamos em
novembro, mas o presépio já está em construção... Mesmo sem carpinteiro!
Já lá vai o tempo em que
não bastava o Espírito Santo… Nem era aceitável que pusessem em causa o papel
do homem, mesmo que se tratasse de um José ludibriado...
Quanto ao Espírito Santo, disfarçado de pomba, tem feito a vida negra a crentes
e descrentes, e não há quem lhe quebre a asa.
Por mim, já que a
veneração pelo burrinho e pela vaquinha não diminui, creio que o melhor seria
não esquecer a pomba branca, colocando-a sobre o alpendre que necessariamente abrigará
a castíssima Maria e o menino que, a esta hora, já estará arrependido de ter
permitido que lhe chamassem Jesus…
(Porto de Mós, Igreja de
São Pedro)
28.11.19
Do
erro se faz culto... Saldanha Residence
Nasce um Deus. Outros
morrem. A verdade
Nem veio nem se foi: o
Erro mudou.
Temos agora uma outra
Eternidade,
E era sempre melhor o que
passou.
Cega, a Ciência a inútil
gleba lavra.
Louca, a Fé vive o sonho
do seu culto.
Um novo Deus é só uma
palavra.
Não procures nem creias:
tudo é oculto.
Fernando Pessoa
Se tudo é oculto, para
quê tanto barulho?
Se tudo é oculto, para
quê tanto brilho?
(Do erro se faz culto...)
27.11.19
Há quem nos siga por
curiosidade e, talvez, por simpatia. Nunca sabemos ao certo o motivo nem se tal
acontece de forma persistente.
Nos blogues, os
seguidores parecem eternizar-se mesmo que já não nos visitem há muito.
Poderíamos, talvez, bloqueá-los como nos é sugerido… mas nunca temos a certeza
de quem, efetivamente, nos segue e porquê.
Exceto, quando nos
apercebemos de que o seguidor já faleceu. Surge, no entanto, uma dúvida: - Será
que o finado não continuará, lá onde se encontra, mais atento do que os que
ainda se mantêm vivos?
26.11.19
Estes pingos irritantes
martelam-me a cabeça como se ela fosse de lata ou de zinco. Para o caso tanto
dá…
Fazem certamente falta
estes pingos, mas a mim, que gosto de cheias, que imagino um país bem governado
sempre que os rios e as barragens extravasam, estão a levar-me à insanidade de
querer fugir deste monobloco, definitivamente...
Ainda pensei que Pessoa
me pudesse acompanhar no desespero, mas ele prefere simplesmente entediar-se e
passar a emoção a outro que a não possa ter e muito menos conceber... São de
zinco os pingos de Pessoa e caem para além das cubatas de que outrora se terá
aproximado, a medo… Ou talvez não!
No Arquivo de Fernando
Pessoa não há cubatas… Por enquanto!
25.11.19
Em canteiros não calcados,
um ar da sua graça, embora a graça não seja da flora, apesar de atribuída à
Deusa…
Se não entenderem não faz
mal, a Flora não vos leva mal, pois andais entretidos em jogos florais com
artificiais desfechos intestinais.
Longe anda a Moira,
também não quer saber, nem já sabe como reformular 'o que tem de ser tem muita
força.'
Os canteiros que sigam o
seu caminho que nós, à força de ir por atalhos, continuaremos metidos em
trabalhos, mesmo que involuntários… Já de pouco servimos, assim tão
arrumadinhos. Nem para soldadinhos!
24.11.19
Por estes dias, decorre o
Juramento de Hipócrates pelos novos médicos…
Duvido que a maioria
tenha noção de quem foi Hipócrates (c.460-370 a.C.) e sobretudo que entenda que
alguns dos evocados não são de confiar, a começar por Apolo…
Tendo em conta a exemplaridade da
oração, transcrevo parte, esperando que os jovens médicos não acabem por trocar
Hipócrates por Balaão:
«Juro por Apolo médico
e Asclépio, por Higeia e Panaceia e por todos os deuses e deusas, tomando-os
por testemunhas, que cumprirei este juramento e compromisso, conforme as minhas
forças e o meu entendimento. Terei pelo meu mestre nesta arte consideração
igual à que tributo aos meus pais; compartilharei da sua vida; quando estiver
falto de meios, eu lhos porei à disposição; estimarei a sua família, como se
meus irmãos foram; e lhes ensinarei esta arte, se carecerem de aprendê-la, sem
salário nem contrato…» (Tradução de Maria Helena Rocha Pereira, Hélade,
Antologia de Cultura Grega)
23.11.19
Do que sei, não sei, a
não ser esta vertigem de associar os contrários sem qualquer efeito prático,
pelo menos inteligível…
Resigno-me na ideia de
que outrora sabia, mas como se o esqueci, eu que sempre defendi que só sabe
quem não esquece.
À minha volta, são tantos
os que não esquecem, e poderiam ser bem mais se eu os não tivesse esquecido.
Tudo parece estar bem,
não fosse essa ideia de perda que, por vezes, se transforma em fulgurações
instantâneas, pleonásticas e absurdas.
Desadormeço e fico à
espera desse retorno que, enquanto for dia, se revela impossível, a não ser em
linhas quebradas…
22.11.19
Outono. Uma nespereira em
flor. O sol, depois da chuva, disfarça o caixote de lixo… Despedido o
guarda-chuva… tudo invertido, como se a seca já tivesse sido vencida…
Sigo na direção da Praça
José Queirós, pintor e arqueólogo (13.7.1856-31.07.1920), fundador do
Grémio Artístico que estaria na origem da Sociedade Nacional de Belas Artes… e
vou pensando na descontinuidade das memórias que facilmente caem em associações espúrias -
termo apelativo, mas que pode adjetivar uma regressão, isto é uma relação
estatística entre duas variáveis, sem que, no entanto, nenhuma relação
causa-efeito exista.
Neste caso, a flor da
nespereira, a não ser na cor, nada diz deste José Queirós e muito menos de
outros universos queirosianos, mesmo se coevos. E, ao contrário do que seria de
supor, a nespereira floresce no final do outono ou no inverno…
21.11.19
Ignorar em nome da
tolerância - cínica condescendência - pode causar náuseas… Vê-los fechados em
celas de autossatisfação dá vontade de os esganar… Mas para quê? Continuar a explicar palavra a palavra - o
étimo, a família, o sentido, o uso, a posição - dá-lhes cabo da alma, que não
sabem que ainda têm, sobretudo se lhes faltar a religião anestesiante dos
rebanhos...
Tresmalhados, não
entendem que a língua que lhes convém é a antiga e não a dos empréstimos e dos
grunhidos… e que, por ser antiga, a língua é a luz à sua disposição, porque
nela vive toda. O tempo pode deprimir. Não no tempo, mas na língua é que a
viagem pode conduzir ao âmago do Ser.
18.11.19
Incapaz de definir as
necessidades de recursos humanos para um funcionamento ajustado do Estado, o
Governo continua a penalizar a função pública. Pouco importa quem governa, a
direita insiste numa diminuição cega do número de funcionários públicos; a esquerda
procede à engorda cega do mesmo Estado, sem, no entanto, satisfazer as
necessidades nas áreas essenciais…
Incapaz de determinar as
necessidades, o Governo aposta na descentralização, duplicando as funções,
criando microestados conforme o estado de alma do senhor primeiro-ministro,
aumentando a despesa pública… E como tal não há aumentos para ninguém!
Claro que não irá faltar
o argumento do aumento do salário mínimo e da reposição de vencimentos e de
pensões, porém todos sabemos que isso é mentira.
Por exemplo, qual é a
família portuguesa que, após a martelada reposição, está em condições de
comprar casa com o mesmo peso no orçamento familiar que teria no ano 2000?
17.11.19
Ora aí está uma palavra
que eu não devo utilizar, pois 'não é própria de gente educada' - mexericar.
Diz o escritor Joel Neto
que «se a literatura não vencer os grilhões do seu tempo não serve para nada»,
como se o inimigo fossem as redes sociais, espaço de mexericos...
O escritor parece querer
ignorar que uma boa parte da literatura ocidental teve origem no mexerico e
que, em muitos casos, se limitou a tricotar a vida alheia.
Parece-me que as redes
sociais são um dos 'lugares' onde o escritor pode beber as intrigas do seu
tempo - claro que se não tiver o engenho e arte, nunca ganhará a batalha!
Por mim, não me interessa
intrigar, apenas confesso que, ontem, ao anoitecer, fui, a pedido, à praia de
Carcavelos e por lá tudo estava sossegado. A brisa era suave, a temperatura
desceu aos 10 graus, a ondulação leve... Só não senti o cheiro do mar, e talvez
a culpa fosse das minhas narinas...
Em conclusão, não tenho
jeito para mexericar. (Praia de Carcavelos)
16.11.19
Bem
tento ver apenas o trigo...
"- Senhor, não
semeaste tu no teu campo boa semente? Por que tem, então, joio? E ele lhes
disse: Um inimigo é quem fez isso. E os servos lhe disseram: Queres, pois, que
vamos arrancá-lo? Porém ele lhes disse: Não; para que, ao colher o joio, não
arranqueis também o trigo com ele. Deixai crescer ambos juntos até à ceifa; e,
por ocasião da ceifa, direi aos ceifeiros: colhei primeiro o joio e atai-o em
molhos para o queimar; mas o trigo, ajuntai-o no meu celeiro. “Mateus 13
…Há
tarefas que me trazem de volta a parábola do trigo e do joio, mas que, pensando
bem, não posso aplicar sem reservas nesta minha função, em particular, por
estes dias…
Arrancar o joio numa
escola, oficialmente, inclusiva? Nem pensar! Que medre sem obstáculos, mesmo
que asfixie o trigo…
Queimar o joio no final
do ano letivo numa escola sem retenções? Impossível!
Do trigo que sobrar, o
Senhor acabará por me perguntar por que motivo a tulha anda tão vazia…
Creio que o Senhor nunca
terá imaginado - passe a blasfémia! - que o melhor seria não ter criado a erva
daninha.
Por mim, bem tento ver
apenas o trigo, mas o que oiço e leio dana-me os ouvidos e entorta-me os olhos.
15.11.19
E se uma chave esquecida
fosse capaz de provocar um pesadelo? Qualquer lapso pode ter consequências
indesejadas… No entanto, a interpretação do sonho parece apontar para a
necessidade de não falhar os pagamentos à Segurança Social, pois esta é
implacável com os faltosos, indo ao ponto de recorrer à penhora de quem se
encontre nas redondezas…
Ora uma chave esquecida
(e nunca mencionada) pode ser o meio para 'recuperar' uma autocaravana,
anteriormente vendida, dando início a uma longa viagem por vales e montanhas,
sem qualquer remorso…
O problema é que toda a
viagem tem um fim, trazendo à tona a necessidade de devolver o veículo,
esperando que o novo dono não tivesse dado conta do seu desaparecimento…
Ainda se o sonho tivesse
sido interrompido e a memória dele apagada, mas não… a infração continua
presente. Há mesma uma tentativa desesperada de convencer o proprietário, mas
quem atende o telefone é uma criança que nada questiona, apenas ouve… até que uma
voz pesada ordena: - Desliga o telefone!
Ciente de que o crime foi
descoberto, o ladrão procura um público (no caso, à beira de um coreto de
um jardim familiar) que lhe possa aliviar a consciência ou, sobretudo, ajudá-lo
a encontrar argumentos que lhe evitem os calabouços… e é, então, que, no meio
da esplanada, avista o bastonário que, de imediato, lhe assegura que nunca
tomou nota de um caso daquele tipo, mas que há solução para tudo… e no ato
pede-lhe o número de telefone… e 500 euros adiantados para dar início à
defesa.
Felizmente que tudo não
passou de sonho repetido, à exceção da cartinha registada da Segurança Social e
da chave da autocaravana já deitada fora, que não da maldita memória…
14.11.19
O que é que eles estão
ali a fazer? Será por vaidade? Estarão a sonhar ou simplesmente pensaram ver
ali o tronco de um velho plátano camoniano?
A leitura não parece
interessar-lhes… o que não surpreende quem por ali passa…
(Ainda agora o átrio
vergava ao peso da efemeridade de uma vida, sem dar conta de outras vidas que
por ali passaram…)
Os rios oceânicos de Sena
corriam longe dos salgueirais e contra a estupidez que nunca percebera o legado
do Poeta - o único que carregara a Pátria até ao fim.
13.11.19
É tudo tão fútil
que se quisesse
rimava com inútil
Despegados do ecrã
apagam-se os olhos
esgueira-se o sorriso
Já no vazio
alheios seguimos
É tudo tão inútil
que se quisesse
rimava com fútil
Já no vazio
seguimos alheios
Ou talvez não.
12.11.19
Um trambolhão ou uma
escorregadela pouco importam!
Com um pouco de sorte,
pode haver quem veja no ato um poema, com ou sem narrativa, sob forma métrica
ou dessa outra coisa indistinta a que chamam prosa…
Talvez fosse melhor
reduzir tudo a poema para o qual se olhe como se fosse uma maçã, mas sem
qualquer vontade de a cheirar ou de a comer…
Um poema sem ideias, sem
ritmo - um poema deitado. À espera de que o levantem da prosa inútil deste ou
de qualquer outro dia.
Ainda se o dia fosse
poema!
11.11.19
O melhor é não confiar na
Providência!
(Na vida avance só depois
de se assegurar que o piso está seco ou se não há nenhuma grelha em falta ou
mal colocada...)
Não foi o caso, mas
também não é recomendável caminhar com o olhar preso ao telemóvel... a verdade
é que a senhora, descida a escadaria do metro de Moscavide, tropeçou numa
grelha, ficando muito combalida... e nas mãos de outros passageiros,
felizmente, já que pessoal de segurança da estação nem vê-lo...
Poder-se-ia pensar que a
senhora teve pouca sorte, mas a 'pouca sorte' resulta quase sempre da nossa
inércia ou da nossa confiança infinita...
Para superior
entendimento do tradicional grito de pouca sorte nacional, o
melhor é consultar O Labirinto da Saudade de Eduardo Lourenço.
10.11.19
O problema é que há cada
vez mais gente a gostar de canalhas, seja qual for a orientação política ou
religiosa.
Farta de votar ou de
seguir canalhas, em vez de tudo fazer para os eliminar, a gente cai nos braços
de canalhas de sinal oposto, aparentemente.
Em síntese, com tanta
canalha à solta já ninguém se safa de ser incluído no coletivo.
9.11.19
O Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro,
pediu hoje aos brasileiros para não darem "munição ao canalha”, que disse
estar "livre, mas carregado de culpa", um dia depois da libertação do
antigo chefe de Estado, Lula da Silva.
Ao que o Brasil chegou!
A cultura democrática enlameada…
Por este andar ninguém se aproveita!
E nós vamos pelo mesmo
caminho….
8.11.19
Uma
jovem desesperada vai para a prisão
Uma jovem desesperada,
que deita o bebé no caixote do lixo, vai presa, como se pudesse repetir o ato
nos próximos dias.
O pedófilo continua por
aí à espera de julgamento.
Os autores de violência
doméstica, quando identificados, regressam a casa…. ou às redondezas.
Os criminosos de
colarinho branco andam à solta, rindo-se na cara dos que foram e continuam a
ser roubados
Não entendo o que é que o
legislador tem andado a fazer, a não ser que seja agressor e ladrão.
7.11.19
De
boas intenções está a educação farta
O programa do Governo,
conhecido no final de outubro, prevê a criação de um “plano de não retenção no
ensino básico, trabalhando de forma intensiva e diferenciada com os alunos que
revelam mais dificuldades”.
Quantas vezes o propósito
já foi proclamado? Quanto dinheiro já foi desperdiçado?
Elaborar um plano nem é assim tão difícil! O problema surge na implementação do
plano.
Quais são os recursos
humanos e materiais disponibilizados, considerando os múltiplos perfis de
insucesso?
Como é que são
selecionados e formados os agentes dessa ação «intensiva e diferenciada»? E por
quem?
Finalmente, um plano
desta natureza não pode ser elaborado a partir da ideia economicista de que, no
final, a despesa será menor do que a que resulta da retenção.
Nesta matéria, a solução
não está na poupança, mas, sim, no investimento.
6.11.19
Não vou citar a Sofia,
com ou sem /ph/, nem vou procurar a máscara que melhor convenha à poesia, vou
(in)disciplinadamente cumprir mais um dia…
Nem no muro vou abrir
qualquer fenda… Basta caminhar na rua, em qualquer rua, para a ver
desconsolada, de mãos vazias, ainda adulada por uns tantos corifeus, avessa a
que lhe recordem que já cá não está.
No areal, os cavalos sem
crinas ao vento galopam desnorteados… e eu sem rédeas, sigo ou fujo não sei se
dos mortos se dos vivos.
Tanto faz, não importa se
sigo ou fujo, o importante é que não pare, porque mesmo que o quisesse fazer, a
decisão nunca foi dela e muito menos minha.
5.11.19
O dia de hoje é de
tristeza. O colega Eduardo Pinheiro partiu sem aviso ou, talvez, tenha sido eu
que me distraí.
De qualquer modo, o
aviso, nesta despedida, também não serviria de nada.
Do Eduardo fica-me a
ideia de alguém que acreditava que o ensino pode contribuir para melhorar a
condição humana e que por isso se empenhava intensamente mesmo que nem sempre
fosse compreendido.
Por vezes, mais vale uma
pitada de incompreensão…
As palmas só confortam
quem não segue, por ora…
4.11.19
Acabar com os chumbos dá
250 milhões.
Não se pense que acabar
com os chumbos pode custar 250 milhões de euros… É muito mais fácil, decreta-se
o adiamento dos chumbos… Sem avaliar o custo!
De qualquer modo, com ou
sem chumbos, a evidência do falhanço do sistema de ensino está aí: no
parlamento, no conselho de ministros, no ministério da educação, no ministério
da saúde… no ministério das finanças…
Em vez de se apostar na
reforma do sistema de ensino, adaptando-o às necessidades do século,
corta-se...
Mas não segundo a divisa
"Inutilia truncat".
3.11.19
Quanto ao aeroporto no
Montijo, a escolha desagrada-me. Na amplidão do Alentejo, não deveria ser muito
caro construir as pistas necessárias para libertar Lisboa, deixando-nos mais
próximos da Europa, de África, das Américas… E depois as aves agradeceriam,
creio eu.
Com tanta ciência, parece
incrível que esta não tenha peso na decisão. Só o dinheiro ordena! Nem os
nefelibatas compreendem tamanha burrice.
2.11.19
Jorge
de Sena em dia de finados
Talvez porque nascera no
dia de finados - faz neste sábado 100 anos - Jorge de Sena terá sentido
necessidade de contrariar a lamúria humana…
(Rezar por rezar que
se reze pela vida para que esta seja menos estúpida e tétrica…)
De morte natural nunca
ninguém morreu.
Não foi para morrer que
nós nascemos,
não foi só para a morte
que dos tempos
chega esse murmúrio cavo,
inconsolado, uivante,
estertorado,
desde que anfíbios viemos
a uma praia
e quadrúmanos nos
erguemos. Não.
Não foi para morrermos
que falámos,
que descobrimos a ternura
e o fogo,
e a pintura, a escrita, a
doce música.
Não foi para morrer que
nós sonhámos
ser imortais, ter alma,
reviver,
ou que sonhámos deuses
que por nós
fossem mais imortais que
sonharíamos.
Não foi. (…)
Jorge de Sena, De morte
natural…, 1 de Abril de 1961, Sábado de Aleluia
1.11.19
Uma
situação educativa insólita
Ontem,
um grupo de professores da Estremadura espanhola visitou a Escola Secundária de
Camões entre as 21 e as 23 - horas tardias pouco adequadas à visita do
edifício, em obras… Apesar disso, tiveram oportunidade de admirar a
frontaria, o Ginásio, a Biblioteca Velha, a BE/CRE e uma sala de aula
matricial… quase tudo do Ventura Terra.
O grupo era constituído
por professores de Português - língua estrangeira - que se deslocaram a
Portugal motivados pela leitura da "A Viagem do Elefante" de
José Saramago e, também, com "o objetivo de potenciar relações que
permitam estabelecer intercâmbios entre instituições espanholas e
portuguesas"...
Não creio que esta visita
tenha cumprido os objetivos, porque escolhi uma abordagem cultural, fazendo uma
exposição sobre a história dos edifícios escolares, em particular do Liceu
Camões, e sobre o sistema de ensino no século XX, conduzindo posteriormente os
docentes espanhóis - cansados da viagem e sem jantar - para o
'monobloco' 06 instalado no antigo estacionamento...
E lá chegados foram
contemplados com a 'oferta formativa' do presente ano letivo e, sobretudo"
com uma seleção de textos de Fernando Pessoa que, recorrendo eu ao velho
comentário textual e cultural, os terá deixado com vontade de não voltar tão
cedo ao "Camões"... Entretanto, os poucos alunos do 12º ano, turma 3,
que se dignaram ir à aula das 22 horas ainda devem estar a pensar no insólito
da situação...
De qualquer modo, todos
os presentes tiveram oportunidade de "viajar" no
"chevrolet" do engenheiro Álvaro de Campos - de Lisboa a
Sintra… perto da meia-noite, ao luar/ cada vez menos perto
de mim...
Álvaro de Campos
Ao volante
do Chevrolet pela estrada de Sintra,
Ao luar e ao sonho, na
estrada deserta,
Sozinho guio, guio quase
devagar, e um pouco
Me parece, ou me forço um
pouco para que me pareça,
Que sigo por outra
estrada, por outro sonho, por outro mundo,
Que sigo sem haver Lisboa
deixada ou Sintra a que ir ter,
Que sigo, e que mais
haverá em seguir senão não parar mas seguir?
Vou passar a noite a
Sintra por não poder passá-la em Lisboa,
Mas, quando chegar a
Sintra, terei pena de não ter ficado em Lisboa.
Sempre esta inquietação
sem propósito, sem nexo, sem consequência,
Sempre, sempre, sempre,
Esta angústia excessiva
do espírito por coisa nenhuma,
Na estrada de Sintra, ou
na estrada do sonho, ou na estrada da vida..
Maleável aos meus
movimentos subconscientes do volante,
Galga sob mim comigo o
automóvel que me emprestaram.
Sorrio do símbolo, ao
pensar nele, e ao virar à direita.
Em quantas coisas que me
emprestaram guio como minhas!
Quanto me emprestaram, ai
de mim! eu próprio sou!
À esquerda o casebre —
sim, o casebre — à beira da estrada.
À direita o campo aberto,
com a lua ao longe.
O automóvel, que parecia
há pouco dar-me liberdade,
É agora uma coisa onde
estou fechado,
Que só posso conduzir se
nele estiver fechado,
Que só domino se me
incluir nele, se ele me incluir a mim.
À esquerda lá para trás o
casebre modesto, mais que modesto.
A vida ali deve ser
feliz, só porque não é a minha.
Se alguém me viu da
janela do casebre, sonhará: Aquele é que é feliz.
Talvez à criança
espreitando pelos vidros da janela do andar que está em cima
Fiquei (com o automóvel
emprestado) como um sonho, uma fada real.
Talvez à rapariga que
olhou, ouvindo o motor, pela janela da cozinha
No pavimento térreo,
Sou qualquer coisa do
príncipe de todo o coração de rapariga,
E ela me olhará de
esguelha, pelos vidros, até à curva em que me perdi.
Deixarei sonhos atrás de
mim, ou é o automóvel que os deixa?
Eu, guiador do automóvel
emprestado, ou o automóvel emprestado que eu guio?
Na estrada de Sintra ao
luar, na tristeza, ante os campos e a noite,
Guiando
o Chevrolet emprestado desconsoladamente,
Perco-me na estrada
futura, sumo-me na distância que alcanço,
E, num desejo terrível,
súbito, violento, inconcebível,
Acelero...
Mas o meu coração ficou
no monte de pedras, de que me desviei ao vê-lo sem vê-lo,
À porta do casebre,
O meu coração vazio,
O meu coração
insatisfeito,
O meu coração mais humano
do que eu, mais exato que a vida.
Na estrada de Sintra,
perto da meia-noite, ao luar, ao volante,
Na estrada de Sintra, que
cansaço da própria imaginação,
Na estrada de Sintra,
cada vez mais perto de Sintra,
Na estrada de Sintra,
cada vez menos perto de mim...
11-5-1928
29.10.19
O
Jardim (a escola) de Epicuro
Epicuro (341-270 a.C.)
Ateniense, apesar de nascido em Samos. De saúde frágil, suportou 'estoicamente'
a dor durante muitos anos.
Em 306, estabeleceu a sua
escola filosófica (o Jardim) em Atenas, com o objetivo de promover a philia,
a amizade e a felicidade.
Em termos de doutrina,
Epicuro nega a providência divina dos estoicos, admitindo a existência de
deuses que, no entanto, não se preocupam com o homem.
Ao contrário da lição
corrente, o seu epicurismo nega o deboche por causa do sofrimento que ele
acarreta, e a felicidade só existe se for expressão da ausência de paixão e
de perturbação, equivalendo à ataraxia interior do
filósofo, que, assim, o aproxima dos deuses.
Em termos de vida
pública, o epicurista deve viver, escondendo-se.
De destacar que sete
mulheres integraram a escola de Epicuro. Só uma era casada; as restantes eram
prostitutas que teriam renunciado ao seu ofício, ao converterem-se à filosofia.
Na época, o facto de o Jardim acolher mulheres e escravos era escandaloso.
(Bibliografia: Maria
Helena U. Prieto, Dicionário de Literatura Grega, Verbo, 2001)
27.10.19
Para frente é que é o
caminho! Não faço ideia de quem inventou tal máxima, mas compreendo a
intencionalidade. O problema é que os espinhos podem ser muitos e faltar a
disposição para os extirpar.
No discurso político dos
últimos dias, assomam as promessas eivadas de uma certa magia que não deixam de
me arrepiar.
Parece que se parte do
zero, quando, no ponto de partida, o que está por pagar são milhares de
milhões… e a dívida mais preocupante é a interna - vastos
sectores profissionais são miseravelmente remunerados, a maior parte dos
fornecedores esperam desesperadamente por umas migalhas do orçamento. Sem
esquecer que, em nome do aumento do consumo, continua a estimular o
endividamento de cada português. Por vezes, é necessário fazer marcha atrás se
se quer acertar o passo.
26.10.19
Há imagens da atualidade
que associamos de imediato a imagens antigas, só que o significante verbal
esfumou-se. Porém, o significado permaneceu ao longo dos tempos.
Falamos de um soldado ao
serviço particular de um oficial.
Entretanto, a pesquisa
deu resultado já que a memória não devolvia o significante.
Consta que na Assembleia
da República há centenas de ordenanças que, pensava eu, tinham como missão
disfarçar a ignorância dos seus senhor (peça desculpa pela
medieval ausência da forma feminina e da presença da sintaxe bantu!), mas
parece que não é bem assim: o ordenança continua a zelar pelo figurino, a
aliviá-lo do peso e a contracenar com ele…
Seja como for, espero que
não levem a mal a associação, pressupondo que tenham estado atentos ao
empastelamento destes últimos dias… e não há por aqui qualquer remoque aos
ordenanças de Belém...
Finalmente, aviso que
este post foi escrito sob a influência de um dicionário de Literatura Grega que
permanentemente me adverte para a minha ignorância e para o perigo da
consequente estupidez.
25.10.19
À verdade da história só
se aplica o critério da verosimilhança, porque a matéria da história é de
natureza verbal - a realidade pode ser o ponto de partida ou a outra face da
moeda, mas sem qualquer compromisso.
Há, todavia, quem insista
na anotação do real, como se a soma das notas correspondesse a uma paisagem
segmentada no tempo, numa sequência temporal.
O passado, porém, é
irrecuperável - um monte de cacos que nem um arqueólogo consegue reconstruir -,
uma ânfora perdida no fundo de um galeão destruído por corsários (ou seriam
piratas?) ao serviço de Sua Majestade.
A história com maiúscula
não existe!
Fiquemo-nos, assim, pelas
histórias, se o tempo sobrar. E esse parece ser o maior desafio, o do tempo
sobrante… o das histórias que o poderiam preencher, em que a verdade e a
mentira litigam entre si...
24.10.19
A rua não pode ser uma
lixeira para onde se lançam os detritos, os trastes, os filhos, os
desadaptados, os desempregados, os estropiados, os delinquentes e os idosos…
A rua das esplanadas e
das ciclovias não consegue esconder a pobreza social e cultural que prolifera
nas cidades, pretensamente modernas...
A rua dos trastes, um
destes dias, será dos corvos.
MARCHA FÚNEBRE
Com lixo, dinheiro dos
outros, e sangue inocente,
Cercada por assassinos,
traidores, ladrões (a salvo)
No seu caixão francês,
liberalissimamente,
Em carro puxado por uma
burra (a do estado) seu alvo,
(…)
Passa para além do mundo,
em uma visão desconforme,
A República Democrática
Portuguesa.
O Lenine de capote e
lenço,
Afonso anti Henriques
Costa.
Mas o Diabo espantou-se:
aqui entram bandidos
Até certo ponto e dentro
de certo limite.
Assassinos, sim, mas com
uma certa inteligência.
Ladrões, sim, mas capazes
de uma certa bondade.
Agora vocês não trazem
quem tivesse tido a decência
De ao menos ter uma vez
dito a razão ou verdade.
Fernando Pessoa
23.10.19
A sala de aula é, por
definição, um espaço social.
Desde o início, as regras
devem ser claras, sobretudo as consagradas nos estatutos do aluno e do
professor.
Para professor e aluno,
há direitos e deveres específicos, sendo necessário conhecê-los e, se
necessário, debatê-los de forma disciplinada...
Em síntese, a relação é
tanto mais problemática quanto mais os intervenientes desprezarem o processo de
construção de uma relação saudável que visa a consolidação do processo de
ensino-aprendizagem...
A sala de aula não é
igual a tantos outros espaços sociais, sejam o pátio, a rua ou até o jardim em
frente. Por exemplo, a linguagem, os gestos, o tom de voz obedecem a regras
específicas que é preciso aprender - tanto professor como aluno.
Aprender pressupõe
formação e, neste aspeto, há muito que o Ministério da Educação descurou as
chamadas "ciências da educação" - para não lhes chamar 'pedagógicas'
- e há muito que as famílias, ao questionarem o modelo de educação, se deixaram
cair no 'deixa andar' ou, em alternativa, na constante desautorização dos professores.
(Este apontamento
resulta da informação diária de que está na moda agredir alunos e professores.)
20.10.19
'Caem folhas secas no chão irregularmente,
Mas o facto é que sempre é outono no outono,
E o inverno vem depois fatalmente,
E há só um caminho para a vida, que é a vida...'
Álvaro de Campos, A Passagem das Horas
No Facebook, ainda há
almas sensíveis atentas à passagem das estações que, acima de qualquer outro
valor, colocam a Vida, até porque o Sol regressa todos os dias, mesmo se
oculto.
A mensagem de vida é
constante na poesia de Fernando Pessoa - para além da vida, Nada, só a Vida...
19.10.19
|
Barcelona out 2019 |
A metáfora atrai e chega
a entusiasmar os iberistas que acreditam que a Ibéria deveria ser um espaço de
acolhimento de todas as culturas que nela tentaram desabrochar ao longo dos
séculos…
O problema é que neste
espaço foram sendo erguidos demasiados castelos que foi necessário defender e
assaltar de armas na mão…
Na Ibéria, o cavaleiro e
o monge preferiram sempre a cruzada - a conquista.
Na Ibéria, dos fracos não
reza a história, mesmo quando estes possam ser maioria.
Na Ibéria, o espírito
democrático nunca prevaleceu. Muito menos, a ideia de uma casa federada.
18.10.19
Em descanso e
desinteressado? Talvez não.
Olhar de desilusão?
Talvez não.
Desleixado? Talvez não.
De facto, nem ela, a
estátua, conhece a razão por que se encontra naquele largo...
Nem eu sei por que razão
ela chama a minha atenção.
Sinto!
Como se fosse possível
dizer o que sinto! Como se houvesse alguma relação do sentimento com a
sensação!
Contentar-me-ia se
pudesse voltar a olhar a estátua escondida num recanto de agosto - mais do que
olhar é já perversão...
Talvez não.
17.10.19
Basta uma palavra, inesperada, para nos fazer
saltar...
Por exemplo, 'trinfar'...
Falam-te de água as
andorinhas no trinfar dos beirais
cedo te falarão de mim
ainda que não saiba quando a
próxima primavera
António Souto, O Milagre do Entardecer, circularidade, Onyva, 2019
Sim, 'trinfar' existe:
'soltar a voz' (falando-se da andorinha).…
E assim o leitor procura
as águas dos beirais, que anunciam a migração, ao entardecer, na expectativa,
que haja regresso da fala, sempre primaveril, bucólica.
… haja regresso da poesia
do António Souto.
Por agora, a chuva cai
dos beirais e fala-nos do milagre do anoitecer...
16.10.19
Maria Antonieta foi
julgada, condenada por traição, e guilhotinada em 16 de outubro de 1793. Já lá
vão 226 anos. O edifício do Liceu Camões foi inaugurado em 16 de outubro de
1910. A desejada reabilitação está em curso lento, com ou sem nevoeiro...
. Este que aqui escreve
veio ao mundo, com bastante dificuldade e alguma dor, no dia 16 de outubro de
1954, pelas 6 horas da manhã. Talvez seja esse o motivo por que gosta de se
levantar cedo...
Presentemente, sente-se
mais próximo do edifício projetado pelo Ventura Terra do que da Maria Antonieta
pois, apesar de tudo, prefere submeter-se a algumas obras de conservação a
imaginar a cabeça a separar-se do pescoço. Enfim, há quem diga que hoje tem
início uma nova vida, mas não me parece. Talvez, alguns descontos aqui e ali…
sem regresso ao ponto de partida, e já distante do tempo da caruma.
15.10.19
Há quem escreva porque
tem muito para dizer e procure dizê-lo de vários modos, uns mais tradicionais,
outros mais audaciosos. No entanto, muitas vezes, a audácia é filha da preguiça
de quem não quer fazer o caminho antigo… Dir-se-ia que o disparate compensa…
Dizer muito ou pouco nada
adianta, porque já só interessa não o que é dito, mas o que se deseja no
momento, e o desejo não respeita qualquer tradição, qualquer moral… nem pode
mesmo ser confundido com o cio, pois este costuma ser sazonal.
Forçado a fugir do
caminho antigo, eu já só escrevo porque nada há para dizer, no sentido do
interdito.
13.10.19
« Il y a quelque chose de vrai quand je dis que tout bien, et même
toutes les créatures, sont par rapport à Dieu moins qu'une fève comparée au
monde entier. C'est pourquoi, si j'étais un homme bon et avisé, je devrais à
juste titre renoncer à prier Dieu qu'il me donne la santé. » Maître
Eckart (1260-1328), La Divine Consolation
Eu que, só por distração,
peço qualquer coisa, começo a apreciar a teologia de Maître Eckart. Nunca me
passou pela cabeça que, devido à minha incapacidade de aceitar a existência de
Deus, viesse a reconhecer que um mundo sem Criador fosse absurdo… A questão
para Maître Eckart colocava-se de um modo distinto - se havia criaturas tinha
que haver criador. E esse criador tudo definira no tempo da criação… À
criatura, por maior que seja a dor, só resta agradecer os momentos em que ela
se ausenta.
No essencial, a minha incompreensão nunca teve nada a ver com o Criador, mas,
sim, com o Deus de dor (Cristo / o Filho) a que me deveria submeter. A
consolação não passa pela submissão.
A consolação é um modo de
aceitação, em que, apesar de grão (fève), disponho de um certo número de
oportunidades e, sobretudo, a oportunidade de não cortar as pernas às
criaturas, minhas vizinhas.
12.10.19
Rojava (o Curdistão sírio
ou Curdistão ocidental) está sob ataque militar de um membro da NATO - a
Turquia.
Rojava localiza-se a
oeste do rio Tibre ao longo da fronteira turca. A sua população é constituída
por curdos, árabes, assírios, turcomanos, arménios e circassianos…
A Turquia com este último
ataque, em nome da defesa da fronteira turca, visa impedir a aproximação de
Rojava do Curdistão turco (ou Curdistão do norte), isto é, impedir por todos os
meios o reforço dos laços culturais entre os curdos e, através da eliminação
física programada, dissuadi-los de qualquer projeto autonómico.
E a NATO, o que faz?
Nada.
10.10.19
A
bandeira da Guiné-Bissau incomoda
«Uma das coisas
necessárias é desfazermo-nos de todos os elementos do passado que possam pesar
sobre a nossa delineação cultural. Devem desaparecer as colónias portuguesas.
As colónias portuguesas são uma tradição inútil. Nós não temos o direito de ter
colónias. Na nossa mão, elas não nos servem, não servem aos outros, e pesam
sobre nós, alimentando uma tradição funesta, que foi bela enquanto foi glória
inútil, porque foi glória; mas tendo deixado de ser glória, ficou sendo
inutilidade apenas.
Que o imperialismo seja a nossa tradição; e não o imperialismo colonialista e
dominador!» Fernando Pessoa
Uma bandeira está a
provocar uma reação idiota que, só o não é, de facto, porque a mentalidade
imperialista colonialista, que deveria ter cessado há muito, persiste.
9.10.19
A facilidade com que se
atira a primeira pedra é assustadora. Esta constatação vem na sequência de uma
ideia inacabada que poderia resumir a tentativa de sintetizar uma atitude comum
de quem, não sendo capaz de se compreender o objeto artístico, se atira ao
criador, classificando-o como degenerado ou irremediavelmente louco.
A análise metódica e a
ponderação andam totalmente arredadas da formulação do juízo - pedra solta da
calçada, pronta a ser arremessada…
Por maior que seja a
condescendência, a idiotia cansa, sobretudo quando esta se manifesta a todo o
instante, prazenteira e desafiadora.
7.10.19
A expectativa era baixa…
O masoquismo nacional persiste, com laivos de sadismo.
Sem esquecer os 'ricos' que não foram votar, porque, há muito, fogem aos
impostos…
As cenas dos próximos
capítulos são previsíveis: muita ronha, muita chantagem e, sobretudo,
barulho…
6.10.19
Dire c'est faire! (O.
Ducrot)
Hoje, fazer é
dizer!
Nem que seja por aqueles
que lutaram e já não o podem fazer...
4.10.19
São 4599 os candidatos.
230 as cadeiras, a maioria já reservada…
Apesar desta certeza, a
ansiedade continua hoje a ser dramatizada, ao ponto de o eleitor ter sido
convidado a guardar silêncio na véspera da decisão popular, dia da República… e
dos professores, outrora essenciais à formação do cidadão republicano, e caídos
em desgraça nestes últimos anos…
Um sábado em que o último
"pai" desta democracia, o Professor Freitas do Amaral, vai a
enterrar, e em que o Professor e Poeta José Tolentino de Mendonça é elevado a
Cardeal.
Só nos resta meditar… se
o Professor Rebelo de Sousa deixar…
(Aposto que o bichano,
apesar de pouco familiarizado com os monoblocos) não vai perder a oportunidade
de se aproximar da urna.)
3.10.19
Passaram por cá,
trabalharam incansavelmente…
Incompreendidos, foram
vilipendiados, esquecidos… e agora não há lagartixa que não deite a cabecinha
de fora para um último elogio...
Agora, na hora da morte
de Freitas do Amaral (1941-2019).
Agora é tarde, porque
quem perdeu foi o país que preferiu a mediocridade e a vilania ao estudo, ao
rigor, à seriedade.
1.10.19
Sem imagem, não há
leitor. O tempo é de voyeurs… de mirones, caso o galicismo incomode. Perdoe-se
o hispanismo!
Mesmo que não haja
interioridade, há o jogo. Não é que se vá a jogo, mas há o gosto em espreitar o
jogo alheio…
Na retina, o voyeur é um
bisbilhoteiro debruçado sobre o tabuleiro, candidato a batoteiro.
Por estes dias, os
candidatos são 4599.
29.9.19
À porta do Centro
Comercial da Portela, por volta das onze horas, recebi um desdobrável com as
caras de santinhas e de santinhos que anseiam pelo meu voto…
Logo pensei na palavra
«pagela», tendo tido a ideia de a escarrapachar numa mensagem… No entanto,
desisti.
Lembrei-me, a tempo, das
decisões conciliares dos anos 60, apesar de ter ouvido o mordomo da arruada
incentivar os camaradas a deslocarem-se para a porta das igrejas - Campo Grande
e arredores - neste esplendoroso dia do Senhor.
27.9.19
"Isto" é tudo o
que queiram imaginar…
A definição é absurda,
pois centra-se na ausência do nome, na ausência das coisas. O indefinido
campeia não se sabe ao certo onde, ainda se fosse Deus, Ele andaria por perto e
nós não teríamos razões para desabafar…Sobretudo, se vivêssemos despegados e despojados
das coisas efémeras. Com Deus, seríamos eternos, verdadeiros, justos e bons…
porque partilharíamos da sua bondade, da sua verdade e da sua justiça…
Se estivéssemos com Deus,
n'Ele encontraríamos a consolação, a misericórdia, em vez da desolação e da
descrença…
"Isto" não é
maneira de iniciar uma relação e muito menos uma conversação, mesmo que o Poeta
se tenha deixado deslumbrar pelos boatos que ele próprio lançara.
26.9.19
Uma coisa é saber, outra
é ser conivente. No exercício de certos cargos políticos, quando se dispõe de
todas as ferramentas, é um crime não saber.
No topo da hierarquia,
não pode haver ocultação da informação. Se tal acontece, é porque há traição… e
como tal, é necessário agir contra os traidores…
Do que vou ouvindo e
lendo, parece que o principal problema é a falta de carácter. As demissões
nunca são impostas, resultam sempre de razões pessoais que, como se sabe, são
subterfúgios para iludir o vilão, na aceção medieval do termo.
24.9.19
Ainda não determinei a
cor da chuva e ela, por aqui, tem sido tão pouca… O outono já chegou, cinzento
ou, talvez, mais grisalho, só que, à noite, a cor do outono torna-se
indistinta…
Perguntam-me pela mudança
- da manhã para a noite - e não sei bem o que responder, embora a luz noturna
seja baça, o ruido sufocado e as almas ainda povoem as sombras…
As almas! Acabo de
perceber que, à noite, ainda há almas que parecem procurar um rumo, sem, no
entanto, terem tido qualquer notícia das calhas de outrora - da nora que jaz no
quintal.
21.9.19
Às 8 da manhã, apanho o
elevador, ainda com a ideia de que este não é seguro, mas que fazer quando se
vive no 12º andar. Chego à rua, não chove, mas nas floreiras há gotículas da
hora anterior e, de súbito, penso na cor, que não é de Sol. Será que a chuva
tem cor?
Incompetente em questões
de cor, como em tantas outras, fico a pensar nos jesuítas que já não querem
salvar as almas. Agora o que importa é salvar o planeta, começando por
sacralizar a vaca e eliminar o touro. Talvez, ainda haja lugar para o boi
manso… há sempre um tasco, à porta da cantina universitária, ávido de vender um
suculento naco de carne!
O melhor é desligar antes
que proíbam a Internet. Vou sentar-me a ler um livrinho cujo título é apelativo
- La Divine Consolation - escrito por Maître Eckhart (1260-1328).
Talvez ele me possa ajudar a compreender de que cor é a chuva.
20.9.19
O
valor dos homens na Rússia do Imperador Alexandre I
« L’Empereur a fait le Prince Kutusoff Maréchal, et lui a donné 100.000
roubles ; sa femme a reçu le portrait, c'est de part et d'autre le nec
plus ultra des honneurs. L'empereur a donné plus de 100.000 roubles au
Prince Bagration et 5 roubles à chaque soldat qui a combattu à Borodino. » Joseph
de Maistre, Lettre à A. M. Le Comte de Front, Saint-Pétersbourg,
2(14) septembre 1812
Naquele tempo, um
marechal valia 20000 soldados… a mulher do marechal tinha direito a retrato na
galeria imperial… E um soldado, o que é que fazia com 5 rublos? Bebia-os.
E hoje, qual é a
proporção, mesmo sem Napoleão?
17.9.19
Não é que tenha grande
significado, mas há um calendário a que nos habituamos e que, em certos casos,
rege as nossas vidas. O calendário escolar, por exemplo.
Por estes dias, tem
início um novo ano letivo, eu, porém, estou com a sensação de que o ano letivo
de 2018-2019 só terminou hoje por volta das 13 horas.
O recuo no tempo é fisicamente impossível. Espero, contudo, não ter de lá
voltar.
16.9.19
Por bastante tempo,
convenci-me que Joseph de Maistre e (François) Xavier de Maistre eram a mesma
pessoa… que Chambéry era um lugar da Saboia, quando, afinal, à época, a Saboia
fazia parte do reino da Sardenha, com a capital em Turim… que quem escrevera du
"Pape"… e "Voyage autour de ma Chambre" era a mesma
personalidade…
Afinal, Joseph e François
eram irmãos, ambos ligados à Rússia, mas com histórias de vida bem distintas.
Joseph nasceu em 1753 em
Chambéry e faleceu em Turim em 1821. O irmão, François, nasceu em Chambéry em
1763 e faleceu em 1852, em São Petersburgo.
Não é só a memória que nos atraiçoa. A pressa com que lemos e observamos o que
nos cerca, precipita-nos no erro sem que, na maior parte das vezes, possamos
corrigir a nossa perceção, quanto mais a daqueles, que, de algum modo,
influenciamos.
13.9.19
Cuidado com os
Simuladores! (CGA, Segurança Social, Bancos…)
Ninguém sabe quem é que
introduziu os dados nem se são verdadeiros.. Nem em que data foram
introduzidos, num quadro legislativo em permanente mudança… E depois há a velha
preguiça de quem toma a decisão final!
Estes simuladores que têm
vida própria podem dar cabo da vida - a verdadeira - de muita gente com grande
proveito. Resta saber para quem…
Atrevo-me a questionar a
inteligência e o anonimato dos Simuladores, porque vou ouvindo cálculos de
pensões muito diferentes para pessoas do «nosso tempo», com carreiras
contributivas muito semelhantes, mas com valores finais muito distintos.
10.9.19
Já nada é
insignificante.
Tudo é mais do que
parece…
Quem cumpre é facilmente
acusado, mesmo que seja sempre bem-educado…
É preciso caminhar com um
olho no peixe outro no gato…
(E procurar não subir às
cegas a árvore-ouriço.)
Ser equidistante é
tramado,
pois todos sabem para que
lado anda o rabo alçado.
Um destes dias, o sangue
descerá a Avenida e só o mar lhe atalhará o passo.
6.9.19
Lembro-me do professor
responder “Não, o sentimento é sempre o mesmo. A “tristeza” é a “tristeza.””
Acontece que dou por mim a ler livros onde, por exemplo, a palavra
“soturnidade” é usada em detrimento da palavra “tristeza” e tenho a perceção
que por isso não consigo perceber o livro da mesma maneira. Julgo que seja uma
tristeza que eu não tenha vivido, e por isso se encontre escrito com uma
palavra mais “colorida”. Só que isto parece reforçar a ideia de que esta
“tristeza” não é a tristeza e que existem vários tipos de tristeza… (de
um jovem inquieto)
O modo como exprimimos o
sentimento é que varia… Sentimos antes da representação, verbal ou outra.
E essa representação é que é determinada pelo objetivo que queremos
atingir… Ao anunciarmos que o sentimento foi de "tristeza" ou
de "soturnidade", já estamos a pensar num efeito mais genérico ou
mais sensorial…
A sinonímia ajuda-nos a
tipificar sensações, a graduá-las segundo conveniências, por vezes,
inconfessáveis.
Na verdade, nós não lemos
sensações, esforçamo-nos por interpretar representações, verbais ou outras, de
alguém que tem o poder de nos enganar.
5.9.19
Não sei se este meu amigo
gosta da cor verde, mas, depois de sair da Estufa Fria, entrei na Livraria
Francesa, e dei de caras com um livrinho de Michel Pastoureau, Vert,
Histoire d'une Couleur…
Pensei, talvez este meu
amigo goste mais do azul ou, até, do amarelo, de qualquer modo ainda vai a
tempo de ensaiar uma ou mais crónicas sobre o efeito da cor na vida do ser
humano…
Entretanto, enquanto não recebe o livrinho, este meu amigo pode começar a
alinhavar umas tantas memórias e a ordená-las de modo a criar um efeito de
surpresa no futuro leitor.
E, claro, o editor pode começar as esfregar as mãos, ele que tanto valoriza a
cor...
4.9.19
« Ce ne fut donc que dans la première moitié du XVIII è siècle que l'impitié devint
réellement une puissance. » Joseph de Maistre, in Essai sur le
principe générateur des constitutions politiques
Na minha abordagem, a
impiedade não é traço de qualquer programa. É, apenas, a expressão irónica de
rejeição da sabujice que vai alastrando…
Está na moda publicar
listas de todo o tipo de objetos e de pessoas. O objetivo, no primeiro caso, é
mercantil e, no segundo, é devassar…
Por exemplo, pela enésima
vez, é publicada a lista das pensões vitalícias, sendo os seus beneficiários
julgados na praça pública, como se delas se tivessem apropriado ao arrepio da
Lei...
Estou em crer que quem as
recebe as terá merecido ao prestar um serviço publico por nós solicitado…
Se houve apropriação
indevida, não sei... De qualquer modo, não me parece razão suficiente para que
o jurista André Ventura faça uma vigília à porta do Tribunal Constitucional,
mesmo que alguns membros do mesmo tenham beneficiado de tal prorrogativa...
Esta estratégia não passa de um modo de nos atirar poeira nos olhos em tempo de
campanha eleitoral.
1.9.19
Até tem uma certa beleza,
ígnea.
Uma beleza que tudo
envolve, indiferente à mão humana…
Se nela nos perdermos,
ela enlear-nos-á como se lhe pertencêssemos, como se fossemos o ouro inicial...
De regresso a um tempo
anterior, ígneo, onde
nunca houve poeta, nem
biblioteca, nem cardeal...
No palácio, o presidente
já sonha que o poeta seja eleito pontífice...
Até tem uma certa beleza,
ígnea, o interior - sem remorso.
Dormi mal, às voltas com
um velho sofá, preocupado com as medidas - talvez não caiba no elevador!
Em setembro, regressa o
sofá que, agora, alguém quer trocar por 'um bacalhau assado no forno' ou,
talvez, gratinado...
Mas o problema de
setembro não é o sofá, mas, sim, a dificuldade em libertar o presente do
passado - estas horas já tão esfíngicas...
E a propósito de
setembro, está na hora de voltar aos figos de outras idades - sem qualquer
espécie de nostalgia, até porque a canícula derretia as juvenis esperanças de
sono eterno.
31.8.19
« Vous croyez être un édifice, vous n'êtes que des pierres. » Joseph
de Maistre, in Contre la Grèce et les Églises séparées
Joseph de Maistre tinha
horror do individualismo. Acusava-o de soberba e de gratuidade. Nada mais
absurdo do que um protestante que, apenas, existe para destruir…
Por estes dias, só vejo
pedras, cada uma com o seu projeto de edifício, mesmo que isso signifique
destruir a CASA …
29.8.19
Problemas não faltam.
Todos os temos. Alguns têm solução, outros, não. Óbvio!
O mais frequente parece
ser o da falta de educação dos governantes e por aí abaixo...
Hoje, acordei com um
problema de pontuação. Por mais que me esforce, saio quase sempre na paragem
errada.
Estou em crer que a causa
do meu problema é o excesso de peso. Lá dizia o doutor: «ao menino para
engordar basta uma corrente de ar», sem pausa na assopradela...
28.8.19
Quando a perceção é
desequilibrada, a razão desliga; só a vontade tudo atropela.
A vontade de ter. A
vontade de ser.
No melhor dos casos, os
outros são áulicos. No pior, são vítimas.
25.8.19
« Une idée nette est une idée sans lendemain. » E.
M. Cioran
Felizmente que com a
idade, as ideias se tornam raras e, sobretudo, pouco claras...Caso contrário,
pensar seria um desperdício.
Aposto que por estes
dias, uma foto, mesmo que pouco nítida, desperta muito mais atenção… e não
necessita de ser necrótica.
23.8.19
Já deixei atrás um
apontamento sobre o capitão que só falava alemão. Em Hamburgo, é extremamente
difícil comprar uma revista ou um jornal em inglês ou em francês. Só, ontem,
consegui, já no aeroporto, comprar o LE MONDE… Nas caixas das galerias
comerciais, na restauração, mesmo que digas que não compreendes, continuam a
fazer perguntas e a dar explicações em alemão…
No regresso,
excecionalmente, encontrámos um taxista iraniano que se preocupava em saber
qual era a origem dos passageiros e que, durante o percurso, descobriu uma
aplicação em português para se identificar e, sobretudo, para vincar que a mãe
era arménia, talvez porque eu lhe dissera que o "Irão era um grande
país"... No entanto, este cidadão do mundo nem sabia que Portugal existe e
que, quando nos descobriu no mapa, logo quis saber se eramos cristãos… Desisti
de lhe explicar que há mil anos havia por cá muitos árabes...
No aeroporto, nos
controlos rigorosos, ninguém explicou as situações por que íamos passando e,
principalmente, que íamos viajar na AIR LAUDA, ao serviço da Ryanair, com uma
tripulação austríaca (?) e que os lugares, pagos antecipadamente, poderiam ser
ocupados por um casal teutónico, cujo macho se revelou irremovível… À volta,
tudo era tedesco!
21.8.19
O
capitão que só falava alemão
A navegação era de uma
hora no lago Alster, Hamburg…
A paisagem deslumbrante,
a linha de terra rica, os desportos de vela dominavam… só o capitão narrava
divertido algo que me pareceu ser sobre o custo dos imóveis que se alinhavam em
torno da toalha de água. Vislumbrei por instantes a Casa Branca com bandeira
americana, mas não percebi o que é que os americanos faziam por ali… depois de
terem destruído uma boa parte da cidade e do porto de Hamburgo em 1943 e 1944.
Alguns passageiros
sorriam dos dizeres do capitão… os restantes, orelha murcha, nada entenderam,
embora eu tenha pensado que aquele capitão tinha uma segunda profissão - agente
imobiliário.
19.8.19
Chuva no sábado e no
domingo, apesar de não ser muito intensa. Temperatura agradável para quem não
tem o 'termostato' avariado, o que se pode tornar numa carga de trabalhos...
Hoje, o sol fez a sua
aparição logo pela manhã, mas sem grande convicção.
As ruas são enormes,
lateralmente fechadas, provavelmente para evitar os corredores de vento… não
creio que corram todas para o rio, com sinais de opulência pós-guerra, e
desvairadas gentes, como diria o Fernão Lopes. No caso, as gentes tanto são
múltiplas, diferentes, como dão sinais de degradação social e, sobretudo,
pessoal…
Ainda não compreendi se
existe um grande projeto, mas a verdade é que a cidade está transformada num
enorme estaleiro.
17.8.19
A prova que faltava da
minha vontade de visitar a Susana em Hamburgo. Durante 16 dias li A
Montanha Mágica e ao 17º aterrei num lugar um pouco cinzento… e
húmido.
Amanhã, ver-se-á.
16.8.19
Chegado a Agosto, tinha a
clara intenção de ler A Montanha Mágica de Thomas Mann. A
edição da Dom Quixote pesa mil e 100 gramas, e a letra é pequeníssima - mais
uma dificuldade! (1.08-2019)
A 16.08.2019, terminei a
leitura. Não me sinto defraudado, apesar das minhas expetativas românticas não
se terem realizado.
Hans Castorp passou 7
anos no Sanatório, desprendendo-se do Tempo e da Planície e, quando parecia que
por lá continuaria, a política internacional despertou-o para uma guerra que fora
arduamente antecipada por Settembrini e Naphta, cujo antagonismo descambara em
inevitável irracionalidade… que se desenvolveu no solo europeu
de 28.7.2014 - 11.11.1918...
Por AQUI se pode aferir
que o grau zero da leitura é possível. As alternativas são imensas, nem sei
mesmo se a leitura ainda é considerada 'alternativa' em certos meios...
Não querendo contrariar a
tendência, meti-me, no entanto, a caminhar pela 'Montanha Mágica' e estou a
chegar ao fim da estadia. Ainda não sei porque é que a dita é 'mágica', apesar
da escrita ser fascinante…
15.8.19
Entretanto, Clawdia
partiu sem explicações ao leitor, pelo menos até à página 787... Quem
regressou foi o fantasma de Joachim, a solicitação do primo Hans durante uma
sessão espírita...
O Sanatório parece ter
caído nas mãos do doutor Krokowski e estar 'presentemente' dominado pela
irracionalidade que, na perspetiva de Settembrini, também alastra rapidamente
na planície....
A música passou a ser o
único porto de abrigo de Hans Castorp, o que revela um afastamento cada vez
maior da realidade... da passagem do tempo social...
14.8.19
Por este andar, vou
deixar de rabiscar.
Diga-se, de passagem, que
o verbo me parece duvidoso, mas que fazer nestes tempos de puritanismo
filisteu!
A razão é objetiva - não
consigo sair da 'Montanha' e já percorri o caminho até ao misterioso suicídio
de Pieter Peeperkorn, 'personalidade' de grande 'envergadura'.... Isto há cada
apelido!
A três dias de partir
para Hamburgo, sinto-me ansioso por saber se Hans Castorp, acompanhado de
Clawdia Chauchat, terá regressado à planície, à cidade do norte da Alemanha de
onde saíra, já não se sabe há quanto tempo - lugar onde, para todos os efeitos,
já teria sido esquecido...
No entanto, há sempre uma
outra hipótese: Wehsal assassina a Beatriz de Hans. Vamos ver se chego a tempo.
12.8.19
Ontem, nem sequer cheguei
a entrar na 'Montanha', lembro agora, o que me deixa pesaroso, como se a ficção
fosse mais interessante do que as filas para atestar o depósito de gasolina.
Eu, que raramente o faço, lá me sujeitei ao ritual deste último domingo, em vez
de entrar num qualquer templo religioso como mandaria a boa educação…
De regresso à 'Montanha'
e a casa, avancei, entretanto, até à página 610, por entre debates fervorosos
de Naphta e de Settembrini sobre a natureza das ações do homem ao longo dos
séculos - obscurantista e iluminada - sem que Hans Castorp se disponibilize a
favorecer um dos seus mentores… posto que tal lhe inviabilizaria, por exemplo,
a experiência alucinatória vivida durante um nevão.
De significativo, no VI
capítulo, o retorno e a morte plangente tenente Joachim, sem que o patético
deixe de nos convidar à gargalhada nos momentos mais solenes:
«A senhora Stohr chorou com entusiasmo perante a transformação que o corpo
de Joachim exibia:
- Um herói! Um herói!
- gritava sem parar, enquanto pedia insistentemente que tocassem a «Erótica» de
Beethovem na hora do enterro.»
10.8.19
Se
não tivesse entrado nesta Montanha
Por aqui, o vento sopra
forte. Na Montanha, há imensas páginas em que não há referência ao estado do
tempo - e já vou na página 520. Talvez a ventania tenha um efeito benéfico no
avanço da leitura!
Assisto a um debate
intensíssimo sobre a religião e a racionalidade humanista, protagonizado,
respetivamente pelo jesuíta Napta e o já apresentado italiano Settembrini,
atirando o protagonista Hans Castorp para o lugar do aprendiz dos mistérios da
vida e da morte, do espírito e do corpo… da eternidade e do tempo…
Da leitura fica-me a
convicção de que, afinal, a disciplina a que fui submetido durante a
adolescência foi ministrada por jesuítas, mesmo que não estivessem conscientes
da essência do seu ministério… Não era só o edifício que fora construído de
acordo com a regra de Santo Inácio… também as camaratas obedeciam ao princípio
da organização em "divisões" militares - lembro-me que pertencia à
camarata de São Condestável… e depois havia as refeições em silêncio cortado
pela leitura de excertos bíblicos, sem esquecer as deslocações em fila para
todos os atos diários…
No entanto, publicamente,
não me lembro de ter ouvido uma única palavra sobre esta 'diabólica' doutrina…
Se não tivesse entrado
nesta Montanha, talvez não tivesse chegado a esta conclusão.
9.8.19
Nem sei por que motivo um
Pardal interferiu na leitura da Montanha. Lá não se ouvem as aves do Céu nem da
Terra, pelo menos até à página 414... e por aqui, há uns tantos pardais,
comilões, mas inofensivos…
Por lá, as matérias
perigosas são de natureza fisiológica e cada um carrega as suas, e quando o
trenó entra em ação é mau sinal - é mais um corpo que é levado de forma
sigilosa e definitiva.
Por aqui, o tempo mudou,
desrespeitando o verão ou, talvez, a mudança seja apenas para baixar a
temperatura, coisa que lá em cima se afigura difícil, infelizmente…
8.8.19
Um olhar
despreconceituado, isso existe? Sobre a matéria, talvez, mas sobre o tempo?
A epígrafe é frágil,
porém não tem incomodado, mas essa é outra questão.
Em muitas situações, o
tempo nem sequer é nosso. Não temos o mínimo de liberdade para o gerir, quanto
mais avaliá-lo de forma isenta.
As horas são determinadas
pelo capricho - forma excessiva, porque previsível - de outrem que acha natural
dispor…
E as horas podem ser a
vida, mesmo que o outro não seja sempre o mesmo.
Por estes dias, anda um
Pardal à solta a impor a sua vontade a milhões de almas, a dar-lhes cabo da
vida...
7.8.19
«Chegavam mesmo a
considerar essa dependência dos livros uma inépcia própria de aselhas. Bastava
perfeitamente ter, quando muito, um livro no colo ou sobre a mesa de apoio para
sentirem as suas necessidades supridas.» Thomas Mann, A Montanha
Mágica, pág. 309, edição D. Quixote
Não desisto de subir a
montanha para lhe captar a magia, no entanto não posso deixar de me confrontar
com a minha inépcia, apesar de uma vida dedicada à leitura.
Hoje, por exemplo,
comprei 1/2 dúzia de ovos por 2,99 €. Há dois ou três dias, levantei 100€ numa
ATM, percebendo agora que paguei + 7 € pelo levantamento…
Entretanto, na Montanha,
encontrei uma referência ao Terramoto de 1755, no debate entre a Natureza e o
Homem. A única até ao momento - é um pouco como se a Ibéria não existisse,
quanto mais Portugal.
Finalmente, à medida que
avanço, vou-me interrogando sobre quantos leitores terão chegado ao cume desta
obra… o editor diz que esta é 8ª edição, sem referir o número de exemplares…
E ainda me falta
descobrir a natureza dos ovos...
6.8.19
A Hans Castorp
também faltava o fôlego, sobretudo quando decidia desrespeitar a disciplina do
Sanatório Internacional Berghoff - afinal, ele não passava de um visitante que,
entretanto, apanhara uma constipação, dizia ele, interessado em analisar as
múltiplas expressões do 'tempo'.
Este 'também' pressupõe
que o leitor o seja de facto, e não apenas alguém que está de passagem.
Já lá vão sete semanas
naquela montanha suíça, e eu só avancei 258 páginas. Hans Castorp acabou por
baixar à cama para conter o sopro pulmonar e, principalmente, o rubor que lhe
assaltava o rosto, já que não conseguia descer dos 37,7º, ficando à mercê do
enigmático Behrens...
A vida na montanha
decorre para uns como antecâmara da morte e, para outros, quase como estância
turística. De notável, os diálogos entre Hans Castorp e o italiano Settembrini…
(…)
Por aqui, junto ao mar, o
tempo de leitura parece ser o de quem lentamente sobe a montanha… Há horas em
que o vento incomoda, mas nunca neva...e a salada algarvia surpreende.
4.8.19
Vou titular este post com
o nome do protagonista - Hans Castorp para que percebam que não fui eu que subi
à montanha. Agora, encontra-se na sala de jantar, pela terceira vez no mesmo
dia. Muito se come naquele sanatório!
Eu encontro-me muito mais
a sul, num país do Sul, a apanhar sol forçado, pois detesto areia e calor. Nos
intervalos, sigo Hans Castorp, apesar de, hoje, na praia da Torralta, ter
sentido inveja de Thomas Mann - ele não teria perdido a oportunidade de relatar
o cavaco daqueles dois «amigos» que, de pé, e ao sol, falaram de tudo durante
mais de duas horas… A mim, falta-me o fôlego…
3.8.19
Já viajei de Hamburgo a
Davos. Agora, encontro-me no Sanatório, rodeado de criaturas debilitadas para
quem o tempo se mede por parâmetros distintos dos meus… Ainda defendo que me
encontro de perfeita saúde, apesar da anemia que me vai esverdeando… Começo, no
entanto, a duvidar se as três semanas que reservei para esta viagem serão
suficientes, mas nada mais posso acrescentar, exceto que… Fica para outro dia!
1.8.19
«Entrei em julho muito
cansado, a precisar não sei bem do quê, pois nos meses de julho e de agosto
sempre me vi em trabalhos inesperados.» 5.07.2019
E este julho não fugiu à
tradição. Mais não posso dizer. Não sei se se trata de maldição!
Chegado a Agosto, tenho
uma clara intenção: Ler A Montanha Mágica de Thomas Mann. A
edição da Dom Quixote pesa mil e 100 gramas, e a letra é pequeníssima - mais
uma dificuldade!
Quanto ao trabalho, desta
vez, é procurado e sinto que não posso perder esta oportunidade…
No fim, se lá chegar,
veremos se a "montanha" é "mágica"...
31.7.19
Só por ironia é que estes
fiéis são abençoados, pois nem nome de igreja têm. Os nomes são de casa ou de
vizinhança - e são emblemáticos como não poderia deixar de acontecer em meios
pequenos. Alferce lembra-me a minha aldeia em que cada fogo abrigava uma
linhagem de proezas, constantemente rebaixadas pelos vizinhos… É certo que lá
não havia uma bruxa do calibre da Corte da Pomba, mas havia umas bruxinhas
capazes por o Demo em sentido, quanto mais o 'abade' itinerante, pois os
indígenas andavam por terras mais férteis, de preferência na capital ou nas
redondezas…
A composição de António
Manuel Venda revela-se coesa, porque as ações de cada 'individualidade' se
enredam de tal modo que o leitor consegue progressivamente recriar aquele
espaço algarvio nos seus constituintes mais genuínos, a começar pelo decantar
da língua, ficando com vontade de o procurar numa das próximas viagens, mesmo
que pressinta que uma parte só a leitura no-la faculta…
29.7.19
No beco… sem saída.
A ideia que fica é que
não é possível voltar para trás, fazer inversão de marcha. De qualquer modo,
para esclarecer a redundância, é necessário identificar o sujeito da ação.
Desde que o sujeito seja outro, que não o próprio, tudo parece possível.
Tudo o que caminha vai e
volta ou, pelo menos, acreditamos que sim. Só o próprio é que caminha, o mais
lentamente possível, até bater na parede, na meia-noite da Sintra pessoana - a
tal inevitável metáfora do chevrolet, que ainda não entendemos que é nome de
todas as figuras.
28.7.19
Ao balcão, a senhora abre
a mala. O lojista pergunta-lhe: - Quer alguma coisa? Ela, hesitante, responde:
Sim, mas não sei o quê?
Paciente, ele diz: -
Talvez um maço de tabaco!
Ela confirma, mas parece
perdida. Não compreende que deve pagar 4.90 € pelo tabaco ou, talvez, quisesse
comprar O Sol… sem pombos!
Entretanto, afastei-me.
Percebi que para o vendedor a situação não era insólita… e pensei que entrar no
beco era isso, mas sem saber.
27.7.19
« L’important n'est pas de guérir, mais de bien vivre avec ses mau. » Palavras
do abade Galiani a Mme. de Épinay
Num tempo em que a cura é
o primeiro objetivo de novos e velhos, e é prometida e vendida por mercadores
de todo o tipo, as palavras do abade-economista fazem todo o sentido, mesmo se
as das Épinay de hoje reduzem tudo ao ginásio e à farmácia…
Conhecer as limitações,
não se deixar dominar por elas, testá-las é, afinal, o caminho… e, sobretudo,
não acreditar em milagres de qualquer natureza - pensamento proibido a um
abade!
E aproveitar o que se nos
atravessa no caminho. Neste caso, por atalhos de David Mourão-Ferreira e de
André Gide, voltei ao século XVIII, mesmo que seja mais fácil bater à porta de
Mme. de Épinay do que de Ferdinando Galiano (1728-1787), autor de Della
Monetta, 1750; Dialogues sur le commerce des bleds, 1770; Doveri
del principe neutrali, 1782.
24.7.19
Desta vez, na prova de
Português (639, 2ªfase) não há nenhum crime lesa-aluno, ao apresentar
um excerto do Canto VI de "Os Lusíadas". Tal só teria acontecido se o
excerto camoniano tivesse sido colocado na Parte C do Grupo I, mobilizando
conhecimento global da epopeia.
Se alguma crítica se pode
tecer é ao modo como o fio temático é tratado. Creio que os jovens examinandos
terão tido alguma dificuldade em situar-se nos cenários de Alegre e de Lobo
Antunes, bastante neogarrettianos…
O universo familiar atual
é bem distinto e falta-lhes o recuo necessário para cotejar "visões do
mundo"...
22.7.19
Não falta combustível,
como agora se diz, o que falta são acessos que permitam a rápida deslocação dos
carros de bombeiros.
No caso concreto, para
aceder a este terreno, necessito de fazer mais de 500 metros a pé…
Dizem os autarcas e os
populares que os bombeiros chegam tarde. Do povo, compreendo a queixa, agora
dos presidentes de junta de freguesia ou da câmara, censuro a atitude, porque
uma das suas atribuições é precisamente abrir caminhos onde sejam necessários.
Ou será que estou enganado?
21.7.19
Tudo o que escrevo é
inútil. Para quê, então, o rabisco mais ou menos quotidiano?
No fundo, é um pouco como
no tempo pós-vindima - há sempre alguém que dá a volta à vinha, não tanto
porque tenha fome, mas porque o esgalho esquecido se torna guloso…
O que me leva a pensar
que escrever é do âmbito da gulodice e não da utilidade, pelo menos, na aceção
anglo-saxónica.
O que a seguir vou
rabiscar é inútil, porém não o vou calar.
Alguns dos meus vizinhos
homens são humanos como eu, só que vestem túnicas, uns, brancas, outros,
acinzentadas. Deixam crescer as barbas, como eu, mas muito mais do que eu
(ainda não percebi porquê). Calçam sandálias, poupando nas peúgas…, e
deslocam-se em mercedes, volvos… não os vislumbro nos transportes públicos.
Cruzamo-nos uma ou duas vezes por dia e raramente nos saudamos.
Detesto-me quando penso
que eles são árabes, muçulmanos, magrebinos, estrangeiros, ricos ou pobres,
simpáticos ou antipáticos… O que eu gostaria era de conhecer o nome
próprio de cada um…
20.7.19
No geral, as borrachas,
que utilizo, sujam mais do que apagam. O primeiro ato é, assim, de limpeza para
que possa eliminar o que não convém, embora a conveniência possa ser problema
alheio.
- Vá lá, meu menino,
passa a limpo que fica melhor!
Ser cortês é isso -
aprender a limpar, aprender a apagar.
Tanto apagamos que pouco
sobra!
Ser cortês aprende-se a
limpar, a apagar, a rasgar… de tal modo que as aparas se amontoam sem nos
apercebermos do vazio que criamos…
Até que um dia, nos
exigem que refaçamos o que apagámos - «o peito oculto», como se ele não tivesse
sido eliminado antes, mesmo, de termos nascido…Nós, os que crescemos por entre
aparas...sem acesso ao peito das reticências nem das metáforas e muito distantes
das anástrofes da vida.
17.7.19
Ao contrário de quem «só
sabe», eu sei cada vez menos… as dúvidas adensam-se a toda hora-as certezas
esmorecem.
Oiço, mas fico sem saber
se as palavras que me chegam refletem o pensamento de quem as profere, máscaras
simpáticas do momento… que também podem ser odiosas… só porque não satisfazem
os caprichos…
Emudeço na dúvida.
15.7.19
Não sei se vai ser fácil
desligar…
Há anos que o procuro
fazer sob a forma de distanciamento, mas acabo sempre enredado… pois continuo
preocupado, sobretudo quando a vaga de sabotadores vai engrossando… Uma vaga
cuja retaguarda é constituída por encarregados de educação incapazes de distinguir
quem recorre à disciplina para poder instruir de quem apenas os lisonjeia…
porque vivem na ribalta política, académica, artística, ou ainda usam monóculo
ou pingalim…
No próximo ano, vou
trocar a luz pela penumbra.
Pode ser que, assim,
desligue de vez…
13.7.19
Continuo atento, mas a
energia falta. As pernas já não acompanham a vontade e mesmo que as obrigue a
cumprir a caminhada, elas encontram sempre forma de me lembrar que as não posso
utilizar a meu belo prazer…
Entretanto, tudo convida
as que lhes dê descanso ou que as substitua - o negócio da preguiça está por
toda a parte, mesmo que saibamos que, daqui a um ano ou dois, os novos
empreendedores consigam a salvífica declaração de falência.
As offshores resolvem…
Dizem-me que 30.000 milhões de euros atravessaram a fronteira!
11.7.19
O painel informativo
regista um intervalo de 15 minutos entre o 783 Prior Velho e o 783 Portela. O
passageiro prepara-se para na paragem do Aeroporto abandonar o primeiro e
esperar pelo segundo autocarro, quando, na Rotunda do Relógio, se dá conta de
uma outra alternativa - o 722 vem na roda. Afinal, com o calor das 14 horas, a
mudança inesperada alivia da canícula…
Entretanto, o 783 Prior
Velho liberta o passageiro na paragem do aeroporto… e o autocarro 722, numa
ultrapassagem vertiginosa, deixa-o a esturricar mais 15 minutos à espera do 783
Portela…
Os factos aqui ficam. Dos
comportamentos é melhor nada dizer.
O que é curioso é que o
passageiro há dias que se interroga se os comportamentos podem ser considerados
factos…
9.7.19
«Que o verbo seja um
espelho…» David Mourão-Ferreira
Se fosse neutro, o verbo
poderia ser o reflexo de uma escada que ligasse a terra ao céu…
Em baixo, o grotesco; no topo, o sublime; no intervalo, a diversidade…
Em baixo, o sublime; no topo, o grotesco; no intervalo, a diversidade…
A escadaria poderia ser bela, não fosse a soberba que nos faz discriminar a
cada passo…
Não fosse a soberba (…) a escadaria poderia ser bela.
7.7.19
«Um homem deve ler de
tudo, um pouco ou o que puder, não se lhe exija mais do que tanto, vista a
curteza das vidas e a prolixidade do mundo.» José Saramago, O
Ano da Morte de Ricardo Reis, pág. 159.
Por estes dias, 'de tudo'
é a locução adequada. Todo o tipo de folhas, a maioria caduca… Por vezes, uma
centelha, outras, uma orientação na floresta desavinda… sem esquecer o rigor do
David Mourão-Ferreira do Motim Literário, textos dos anos 50 e 60
do século passado…
(Um destes dias, volto a
falar do crítico literário…)
5.7.19
Entrei em julho muito
cansado, a precisar não sei bem do quê, pois nos meses de julho e de agosto
sempre me vi em trabalhos inesperados.
Doravante, o que preciso
é de serenidade, de traçar um rumo e alhear-me da realidade imediata - um
metódico fechar de olhos e de ouvidos… como se nada estivesse a acontecer.
A ilusão é agradável, mas
os dias não se deixam enganar… e eu já ficaria contente se nada tivesse a
relatar.
3.7.19
Em comunicado enviado à
Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), os 'encarnados' informam que
o Atlético de Madrid “pagará a pronto um valor de 30 milhões de euros e que a
Benfica SAD efetuará uma operação de desconto sem recurso dos restantes 96
milhões de euros, sendo os custos financeiros associados a esta operação de
seis milhões de euros”.
Afinal, quem é que «paga»
o João Félix?
Espero que não tenha sido
a Caixa Geral de Depósitos (ou o BCP) a financiar a negociata… Ainda vai sobrar
para os contribuintes portugueses.
2.7.19
Hoje já há acordo: a
França e a Alemanha acordaram e dividiram. As migalhas ficam para os belgas e
para os espanhóis… Os portugueses contentam-se com o Centeno e com alguma sobra
que venha a cair…
De tudo o que li até ao
momento, só me agrada a escolha da federalista Ursula von der
Leyen e preferia que a senhora Christine Lagarde se mantivesse no FMI - quanto
mais longe melhor!
Entretanto, parece-me que
o António Costa deve ter saído bastante frustrado desta cimeira europeia…
1.7.19
«Foram muitas as
reviravoltas, mas no final ficou tudo como estava: em águas de bacalhau.»
Coitados, falta-lhes o
tempero!
E dão um péssimo sinal ao
não se entenderem na partilha dos tachos… O problema é que nos vão dar cabo da
cabeça por muito mais tempo, pois parece que quanto menor for a quantidade de
sal maior é a esperança de vida...deles, que não a nossa.
30.6.19
Rapidez, facilidade… as
portas da informação. Má ou boa, pouco interessa!
Preocupante é a confusão
entre informação e conhecimento.
Preocupante porque o
conhecimento nada tem a ver com a pressa e, sobretudo, porque nunca é fácil.
Ao contrário do que
muitos acreditam e até desejam, ainda não chegou o tempo de destruir o
património e, sobretudo, de queimar as bibliotecas e, muito menos, de eliminar
as línguas…
29.6.19
Já não sei se penso.
Talvez, só repita.
E à força de repetir,
começo a duvidar se o intelecto não é apenas uma ferramenta enferrujada…
Outrora, chamavam-lhe faculdade - a mais desenvolvida entre os intelectuais.
A transformação da
faculdade em ferramenta é comummente aceite, o que me leva a pensar que o
melhor é comprar uma ferramenta que me desfaça a dúvida inicial…
(Acabo de ouvir uma ideia
de dieta que me apetece repetir: E se organizássemos a semana, reservando o
domingo para o vermelho, e os restantes dias para o verde?)
28.6.19
Não fosse a nobre tarefa
de sublinhar desvios (erros) à norma europeia da língua portuguesa e de cotejar
(cortejar?) dislates com assertivos cenários de resposta, o que seria de mim?
Entre cotejar e cortejar,
a diferença parece mínima, mas, na realidade, existe um abismo. Apesar de nunca
termos sido convidados para a corte, inebriados de cidadania, agimos submissos
como o boi ou o bugio de Vieira…
Pobre Vieira que não
chegou a imaginar que um dia a aquicultura viria ostracizar o gado de Proteu!
26.6.19
O sujeito sabe do que está
a falar. A Estela não quer acreditar no que está a ouvir… e eu só oiço: -
Estela! Estela! Tu não me conheces, Estela… Estela, "yesterday", eu
bem tentei desfazer o negócio, mas eles não quiseram saber. Estela, só tu me
podes salvar, Estela…
Dez minutos mais
tarde.
O sujeito não parou de
interpelar a Estela, eu é que fui tomar café… - Estela, meu amor! Qual amor?
Apenas - Estela, tu é que podes desenrascar-me (pausa) -Tu não me conheces,
Estela! É isso, tu não me conheces, Estela…
Já passaram quarenta
minutos, e a Estela ainda não desligou… Será que ela existe?
25.6.19
Não tenho paciência para
descascar favas e quando o faço é porque um súbito e raro apetite me invade -
no máximo, duas vezes por ano e basta… Mesmo que as favas sejam verdes, recordo
sempre a brotoeja que associo a tulhas de fava seca - uma comichão miserável
invade-me o corpo, esganando-me com as minhas próprias mãos… Quem me mandou a
mim entrar para onde não fora convidado!
(Lá está! Acabo de ser
vítima da inevitável repetição.)
E até na «ilha ao sul de
tudo», encontro o «veludo» da fava que, por estes dias, me irrita o couro
cabeludo…
24.6.19
Dá vontade de desistir,
mas do quê se não há propósito?
Lemos e voltamos a ler e
alguma coisa destoa, mas o quê?
Talvez a coisa e,
sobretudo, a palavra repetida. Há sempre uma palavra repetida, há sempre uma
mosca e outra mosca. Nem com vinagre se evita a falha…
Dá vontade de desistir,
mas do quê se não há mais-valia?
Mais valia ter ido ao
neurologista, mas já é tarde! E se lá tivesse ido, ele não me teria evitado a
cacofonia…
23.6.19
Entrado o Verão, acabei
por ir assistir, na Igreja de São Roque, à apresentação da PAIXÃO SEGUNDO SÃO
JOÃO, de Johann Sebastian Bach, na versão da Escola Artística de Música do
Conservatório Nacional.
O espetáculo foi soberbo,
muito acarinhado pelo público que encheu o templo barroco, e em perfeita
conformidade com o referido estilo.
Embora na performance deva
destacar o coletivo, não quero deixar de mencionar a novíssima soprano Ema de
Sá, que revelou segurança e confiança, o que certamente resultará da grande
capacidade de trabalho - não só do engenho, mas, sobretudo, da arte,
como diria o Poeta.
Felizmente, hoje chove!
20.6.19
Não faz calor, no
entanto, por estes dias, seco… tanta é a burrice e o despudor.
E em tempo de seca, ao contrário da cigarra, calo-me.
18.6.19
A
anáfora no exame nacional de Português
La anáfora es una figura literaria y, como tal, tiene
unas funciones concretas. Si bien este recurso literario necesita de la
creatividad del autor o del poeta para significar una u otra cosa, hay algunos
empleos en los que se observa con mayor frecuencia.
La anáfora puede emplearse para otorgar una mayor importancia o notoriedad a
un aspecto del que se está hablando que puede ser un lugar, un tiempo, un
sujeto, un sentimiento… Esta figura literaria es muy recurrente en tanto
que ofrece dinamismo y velocidad (en ocasiones) a los versos o al texto en
cuestión. Es también un recurso que ofrece ritmo y melodía en un poema
o en la prosa. Además de centrar la atención en la palabra o
palabras que se repiten ayudan al lector a familiarizarse con el texto creando
mayor atracción y facilidad para comprender.
Querer reduzir a anáfora
ao(s) sentido(s) é abusivo. Revela insensatez, sobretudo quando o poeta se
chama Fernando Pessoa.
17.6.19
«Irás ao Paço irás
pacientemente
Pois não te pedem canto
mas paciência
Este país te mata
lentamente»
Sophia Andresen
O senhor Professor,
patrono dos professores, anda incomodado com os professores. Recebeu-os no seu
palácio, mostrou compreensão e pediu-lhes tempo - anos, meses e dias - e,
sobretudo rogou que fossem pacientes…
O senhor Professor tem
obrigação de saber que entre os professores há muita desigualdade e que para a
combater não bastam umas tantas selfies e paciência, muita.
O senhor Professor
deveria saber que, para além dos professores, quem perde é o País de que se
orgulha de ser Presidente.
16.6.19
«Sem espírito
crítico e sem ler as obras, isso de história da literatura é cousa escabrosa de
se executar.» António Sérgio, Ensaios III, pág. 192.
A ideia, à época, fazia
todo o sentido.
Sérgio rejeitava o
biografismo, a psicocrítica mais ou menos freudiana, a sociocrítica, pois ao
crítico literário e ao estudioso o que deveria interessar era a obra - ler na
obra o que ela acrescenta…
Entretanto, os tempos
mudaram. O facilitismo instalou-se e o que agora está na moda é estabelecer
'ligações' entre textos, que se me afiguram de enorme risco -
intertextualidades.
E porquê? Porque,
simplesmente, raros são os que leem.
Terça-feira será dia de
detetar ligações, de inferir estados de ânimo, de exprimir opinião. A
dissertação já terá ficado para trás… e a argumentação, envergonhada, cairá sob
exemplos estafados de futuros por achar.
Nem o eclético
borboleteio impressionista se fará sentir… Até lá só ingurgitação!
14.6.19
Afinal, mesmo vazio, o
cacifo mantém o odor. A quê? Não sei.
Na paragem de autocarro,
hoje, havia outros cheiros que não me impediram de apanhar o 783 para o Prior
Velho - destino dele, que o meu passou a ter uma componente pedestre, o que até
faz bem, dizem, à saúde, mas agrava o estado das varizes…
Até aqui o assunto é
anódino e as hipóteses de o melhorar são escassas.
De manhã, ainda pensara
que a prioridade era Ler. Ler livros. Livros antigos que os atuais são fúteis,
mentirosos e estéreis… Ler Homero, Platão, Sófocles, Horácio, Virgílio, Santo
Agostinho… até chegar a Goethe… e ficar por aí até ter coragem para retomar a
leitura dos antigos. Molière, Vicente, Shakespeare… e Camões, mas bem longe das
salas de aula, isto é, bem longe do Paço, talvez nas margens do Tejo ou na
serra da Arrábida…
E depois, esqueci a
prioridade e fiquei à espera de que o Vara cumprisse o que prometera, que era
não falar, mas falou sem saber se a prioridade era o ovo ou a galinha, o que me
fez recordar que o Luandino Vieira um dia, no Tarrafal, também se esmifrou a
tentar explicar se o ovo era da dona da franga ou da vizinha grávida
proprietária do terreiro onde o traseiro largou o dito.
13.6.19
O
perfume dos santos populares
É como se os olhos e os
ouvidos se tivessem retirado. O que vejo esfuma-se e o que oiço é tão soez que
prefiro esquecê-lo…
De permanente só o odor,
por vezes, perturbador. Nas mãos, há sempre o vestígio de presenças
persistentes. Até o nariz parece querer impor um cheiro específico, indizível.
Ultimamente, a memória
persegue-me com situações que não sei como tratar.
A semana passada, avisado
de que iria ser necessário esvaziar um cacifo, entusiasmei-me porque vi na
necessidade a oportunidade de o libertar de uma fragrância desagradável que se
tinha acumulado em mais de vinte anos - o papel acumulado agredia-me as narinas
sem eu saber porquê… Agora que o depósito está quase vazio, a perturbadora
sensação desapareceu. Abro o armário, e nada…
Ontem, chegado à paragem
do 783 no Saldanha, já aborrecido com o ferrugento placard que nada instrui,
sentei-me num banco e, de súbito, lá estava o odor… um odor de quem não toma
banho ou de quem não teve oportunidade de se lavar ou, simplesmente, de quem
abomina a água… O impacto foi de tal ordem que preferi deixar seguir o
autocarro com o meu incómodo vizinho.
Entretanto, vou-me
apercebendo que os espaços coletivos estão cada vez mais impregnados dos mais
diversos cheiros e que os temo de uma forma, talvez, doentia…
De momento, não consigo
libertar-me do perfume dos santos populares.
11.6.19
Nem precisavam de
conversar! Todos sabiam ao que iam! Agora, trata-se de velhacos
desconhecidos…
E confiam na nossa falta
de memória...
10.6.19
Não sei se este 10 de
junho foi diferente do dos anos anteriores. Mudaram os oradores, mas os
protagonistas continuam os mesmos… Poucos se atrevem a subir ao palco, apesar
de um outro sapateado fervoroso, mas mentiroso…
O Presidente Marcelo
continua sem saber de quantos «portugais» Portugal é composto e, mais grave,
ainda se rege pelo mapa do império - tudo em nome da lusofonia!
9.6.19
Sofro, Lídia, do medo do
destino.
A leve pedra que um
momento ergue
As lisas rodas do meu
carro, aterra
Meu coração.
Tudo quanto me ameace de
mudar-me
Para melhor que seja,
odeio e fujo.
Deixem-me os deuses minha
vida sempre
Sem renovar.
Meus dias, mas que um
passe e outro passe
Ficando eu sempre quase o
mesmo, indo
Para a velhice como um
dia entra
No anoitecer.
Ricardo Reis
Das duas odes que
Fernando Pessoa atribuiu a Ricardo Reis, prefiro esta sobre o medo do
destino. Não se trata de medo, mas, nesta fase, não sinto qualquer
necessidade de sobressalto, de aceleração… Prefiro que o minuto dure sessenta
segundos, nem mais nem menos… E as pedras do caminho, passo bem sem elas.
Sobretudo, sofro que
queiram que eu mude de máscara de acordo com as conveniências.
8.6.19
Provavelmente, este peixe
é da estirpe daqueles que tiveram paciência para ouvir o franciscano António ou
o jesuíta Vieira…
No presente caso, o
peixinho, na tentativa de descobrir em mim um despertador de consciências,
acabou fotografado frontalmente… Creio que, mais do que curiosidade, o que ele
me pedia é que o libertasse daquele fluviário de Mora tão distante do oceanário
de Lisboa…
Se eu o tivesse trazido
comigo, talvez se passeasse a esta hora pelo Parque Eduardo Sétimo e por lá
encontrasse outros pregadores…
7.6.19
Públio Terêncio Afro terá
deixado escrito, uns 150 anos a.c. - Homo sum: humani nihil a me
alienum puto. Tradução pessoal - Sou homem: penso que nada do que é
humano me é estranho.
Talvez seja verdade! No
entanto, a não ser que feche os olhos e os ouvidos, começo a duvidar da
universalidade da máxima. E também não sei se estou preparado para me
metamorfosear de todas as estirpes com que me cruzo…
Há dias em que não me
importo de ser eu o estranho, apesar de não resistir a saudar: - Olá, bom dia,
boa tarde...
6.6.19
A entrada dos monoblocos
não é fácil. Parece que se esqueceram de tirar as medidas ao portão!
E quanto às futuras salas
de aula, pressinto que o melhor será organizar muitas visitas de estudo… ao ar
livre… O novo espaço afigura-se-me irrespirável, independentemente do ar
condicionado… sem falar das inevitáveis alergias… A inclusão acomoda-se!
3.6.19
«O mundo tornou-se
categórico quanto ao que é demonstrável; o que é iluminado desconcerta-o.» Agustina
Bessa-Luís, O retrato, 28 Agosto 1968.
Tantos foram os anos a
ler "A Sibila", no tempo em que ainda havia leitores para aquele
matriarcado intratável, que, desconcertado, eu imaginava que aquele não era o
meu país, mas deixava-me conduzir aos lugares mais sagrados e abjetos de que ainda
guardo memória - os cheiros pestilentos, as calosidades rochosos, os segredos
biliosos, as invejas de morrer. A insídia. A morte suja que não abria as portas
do paraíso, a não ser a algum custódio…
Havia um outro lado, que
se iluminava nas páginas de Agustina, e que agora se extinguiu, a não ser que
os leitores regressem, o que se afigura nada provável…
4.6.2019
O Presidente da
República, Marcelo Rebelo de Sousa, disse hoje que Agustina Bessa-Luís,
escritora que morreu na segunda-feira, "está no Panteão do coração de
todos os portugueses"
Ainda se estivesse no
coração, agora no "Panteão do coração"... Rima, mas é só verborreia.
2.6.19
Situado, mais do que
localizado, sitiado.
As circunstâncias dão
cabo do homem, transformam a notoriedade em efemeridade ou, em alternativa,
agrilhoam-no…
O texto não passa de
tentativa caduca em que, apesar de tudo, algumas linhas se precipitam das
ameias do ser.
Segui-las, talvez, possa
ser a última oportunidade de furar o cerco.
1.6.19
Talvez seja hoje o dia
certo para lembrar que milhares de professores, neste fim de semana, se
encontram em regime de reclusão a classificar os derradeiros testes e a
preparar a avaliação que antecede os exames finais… Não creio que a maioria dos
professores tenha trocado essa tarefa por um fim de semana no areal…
Talvez seja o dia certo
para lembrar que muitos professores não têm tempo disponível para acompanhar as
suas crianças porque, afinal, continuam ao serviço de centenas milhares de
jovens que se comportam diariamente como crianças…
Assim que só para os
professores / anda o mundo concertado.
31.5.19
A Comissão de Orçamento,
Finanças e Modernização Administrativa (COFMA) vai pedir um parecer jurídico
aos serviços da Assembleia da República sobre a informação que pode ser
divulgada sobre os grandes devedores da banca, disse hoje a presidente da
comissão.
Tanto pedido de parecer
jurídico já aborrece! Fui consultar o Regime do Segredo de Estado por
causa das dúvidas e não encontrei razão para tanta delonga. Só as cumplicidades
parecem explicar o estado a que chegámos…
«Consideram-se
interesses fundamentais do Estado os relativos à independência nacional, à
unidade e à integridade do Estado ou à sua segurança interna ou externa, à
preservação das instituições constitucionais, bem como os recursos afetos à
defesa e à diplomacia, à salvaguarda da população em território nacional, à
preservação e segurança dos recursos económicos e energéticos estratégicos e à
preservação do potencial científico nacional.»
Diário
da República n.º 150/2014, Série I de 2014-08-06
Antes que se faça tarde,
o melhor é começar por averiguar a dimensão do negócio dos pareceres jurídicos…
30.5.19
Também
eu me queria a milhas...
Desviei na Ribeira Grande
(Fronteira, Alentejo) no regresso para ver a Praia Fluvial, mas fiquei-me pela
estreita ponte, assustando a passarada que, entretanto, se pôs a milhas…
Também eu me queria a
milhas da canícula alentejana… e da propaganda que um dia apregoou urbi
et orbi a reforma agrária que continuo a não vislumbrar, a não ser que
ela se tenha materializado nos extensos olivais que cobrem, por exemplo, as
extensas encostas de Avis.
Parece que Abril não foi
capaz de seguir o exemplo do Mestre que, justa ou injustamente, lá foi
redistribuindo as terras para pagar os serviços de quem o colocou no trono…
29.5.19
Só oiço queixas,
exigências!
Todos querem qualquer
coisa, independentemente dos meios…
É só sonhar e a porta
escancarada abre para o mar da fantasia.
Esse mar fica longe,
vai-se de avião com hotel reservado e carro alugado. Tudo pago! Não interessa
por quem, se por ninguém…
Não ser o último a partir
é a única preocupação.
Já ninguém quer ficar!
Ninguém quer ser!
Andamos todos de partida,
mesmo arriscando a chegada...
27.5.19
«E tudo se passava
numa outra vida / E havia para as coisas sempre uma saída», Ruy Belo,
E tudo era possível (poema)
Suspeito que o que
andamos a pedir não é assim tão simples!
Se descermos ao
particular, à experiência de vida, essa outra vida pode nunca ter existido. O
poeta, abençoado, já experimentara tudo nas páginas dos livros.
Só que, para muitos, não
houve 'leitura' do mundo porque não havia livros, só pagelas de piedosas
figuras martirizadas…
A saída de casa dos pais
não significava perda mas, sim, descoberta, mesmo se os obstáculos diários
pareciam inultrapassáveis…
Neste hora pastosa,
suspeito que para muitos talvez não haja condições para compreender a nostalgia
do poeta, e que a escola atual seja um impedimento maior.
26.5.19
Le taux de participation est « le plus élevé en 20
ans », avec une estimation de 51 % pour les 27 pays de l’UE, sans le
Royaume-Uni. Le Monde avec
AFP Publié aujourd’hui à 19h43, mis à jour à 22h43
Em Portugal, a taxa de
participação parece ser a mais baixa de sempre. Falta de civismo?
Mais de 68% não foram às urnas!
É azul, mas não se vê, a
borboleta! Resta o passadiço, o verde e a luz, o que já não é pouco…
Para quê o azul da
borboleta? Por ora, a informação da sua existência é suficiente.
Não tive tempo de lhe
perguntar se foi votar na esperança, mas deve ter ido que as borboletas não
perdem a ocasião… ao contrário de muitos bípedes que desprezam a sorte que têm…
25.5.19
Este maio é mais
subjetivo. Já não o vejo na sequência do eterno retorno… vejo-o como derradeira
expressão de um observador que, durante mais de vinte de anos, se habituou a
procurar as folhas e as flores, e se foi apercebendo que nem sempre os
jacarandás cumprem as expetativas…
Apesar da goma
escorregadia, a cor enfeitiça!
23.5.19
Tal como as borboletas,
nada tenho a acrescentar. Saltito de tarefa em tarefa, desligado da campanha
que atravessa o calendário das feiras…
Não imagino o que as
borboletas possam pensar quando as caravanas se aproximam, mas observo que elas
se escondem ou, pelo menos, volteiam como se temessem pela vida…
Instintivamente,
procuramos a vírgula que nos retenha a respiração, não vá ela abandonar-nos de
vez… ela, ambígua, a respiração ou a vírgula?
Tanto faz!
21.5.19
O
Imaculado Coração de Maria e o rosário...
No dia 18 de maio, em
Itália, rodeado de comparsas da extrema-direita, Matteo Salvini empunha o
rosário e evoca os seis «santos patronos» da Europa, segundo a Igreja Católica:
Benoît de Nursie, Brigitte de Suède, Catherine de Sienne, Cyrille et Méthode, et
enfin Thérèse-Bénédicte de la Croix (née Edith Stein, morte à Auschwitz en
1942). Avant de vouer
l’Italie, et sa victoire électorale prochaine, « au Cœur immaculé de la Vierge
», le tout en agitant un rosaire avec des gestes de bateleur. A
extrema-direita europeia
Matteo Salvini,
deliberadamente, esquece Robert Schuman, Jean Monnet, Altiero Spinelli e Alcide
Gasperi, para além de renegar o paganismo do último chefe de fila da Liga do
Norte, Umberto Bossi… O que importa é conquistar o voto da Itália mais
conservadora...
20.5.19
Mais depressa do que
podia imaginar, um 'ambicioso' chegou-se à frente e gritou: - Se queres uma
Europa federal e solidária, VOTA FÚTIL!
Agora só me resta
continuar atento aos 'ambiciosos' de serviço.
19.5.19
Anda por aí um banqueiro
a apregoar que 'ao povo português falta ambição'. É possível, mas não é por
falta de gente ambiciosa.
Basta ver o que se passou
nos bancos portugueses nos últimos anos para perceber que muita gente procurou
o estrelato à custa do pagode. Foi um regabofe!
Em matéria de psicologia
coletiva, é difícil alterar atitudes antigas, no entanto, bom seria que não
tivéssemos de assistir às cenas dos últimos dias - do parlamento aos estádios,
passando pelas televisões, redes sociais e, sobretudo, pelas folclóricas arruadas.
Faltam 8 dias para as
eleições - há até quem já tenha votado! - e eu ainda não encontrei um
'ambicioso' que me explique porque devo ir votar no dia 26 de maio.
E eu que até sei que
Europa quero, não encontro quem a defenda - uma Europa federal, solidária.
18.5.19
Tremor
de terra na União Europeia?
Dans un entretien accordé au Parisien, M. Bannon dit
avoir choisi de venir en France parce que « de toutes les élections qui auront
lieu le week-end prochain en Europe (…) c’est de loin, ici, (…) la plus
importante » et ce à cause du « positionnement mondialiste » d’Emmanuel Macron.
« C’est un référendum sur lui et sa vision pour l’Europe », a ajouté M. Bannon
qui prédit un « tremblement de terre » dimanche 26 mai.
Pois é, a queda parece
inevitável, exceto, aqui, em Portugal, no país das melgas... Ou será dos
comendadores?
17.5.19
Joe Berardo é Comendador
da Ordem do Infante D. Henrique desde 1985, tendo recebido ainda a Grã-Cruz da
Ordem do Infante D. Henrique, em 2004...
O alarido em torno do
senhor José Manuel Rodrigues Berardo parece-me exagerado. Não creio que dois
presidentes da República se tenham enganado ao distingui-lo…
A narrativa da queda
cheira-me a esturro. Só o estudo rigoroso do assalto ao poder entre 12 de
março de 2005 e 21 de junho de 2011 poderá explicar o buraco negro, entretanto,
criado.
A altivez e o riso alarve
do senhor José Berardo são compreensíveis. Afinal, a comissão parlamentar não
se tinha preparado para interrogar a estátua do comendador.
Durante anos foi um investidor na bolsa portuguesa e é aqui que surge o
problema. Joe Berardo comprou um lote de ações do BCP, em 2007, quando se
preparava uma luta de poder pelo banco, com a queda de Jardim Gonçalves e a
demissão de Paulo Teixeira Pinto. A 4 de janeiro de 2008, o Público noticiava
que apoiantes de Carlos Santos Ferreira, ex-presidente da Caixa, tinham pedido
empréstimos ao banco público para comprar ações do BCP. Queriam abrir caminho à
entrada de Santos Ferreira (com Vara) para liderar o BCP. Santos Ferreira
acabou por presidir ao BCP, mas Berardo, viu o investimento desvalorizar em
catadupa. Nos últimos anos, deixou de ser um dos mais ricos do País.
16.5.19
«Quando chegam aos
exames e provas de aferição, “os alunos não falham na
memória (…) falham na análise e na crítica”, disse o secretário de
estado da Educação, lembrando os problemas que os estudantes têm revelado nas
provas quando lhes é pedido para raciocinar, argumentar ou relacionar
conceitos.» João Costa 'Ensinar e avaliar'
Os alunos não falham no
exames, falham todos os dias. Porquê? Porque o que se exige diariamente é muito
pouco - estar, se possível, sem perturbar.
Paradoxalmente, aprendem
cedo a criticar, embora não queiram analisar, pois tal significa empenho,
trabalho, raciocinar, extrapolar…
Neste caso, quem me
surpreende é o secretário de estado da Educação que, no cargo em que foi
investido, já poderia ter acabado com este falso método de estudar. Já teve
tempo para por cobro à ditadura das Editoras e do IAVE.
14.5.19
Não fez parte da minha
infância, o homem de lata. A distância era intransponível, apesar dos 50 anos
decorridos desde que ele surgira na América… No entanto, o homem de lata ocupou
muito do tempo dos meus filhos…
Ao vê-lo no ecrã, ia
pensando que, apesar da bondade, havia ali um mundo sem alma, sem Deus. E esta
ausência, à época, não me afetava por aí além. No caso, a distância também era
intransponível…
Hoje, no metro,
lembrei-me dos escritos - os escritos na vidraça que indiciavam que a casa 'se
alugava ou se vendia'.
Hoje, no cais, lembrei-me
dos escritos - os corpos que por ali passavam surgiam todos anotados, como se
houvesse algures um Escriba Supremo…
Ainda pensei numa
possível exegese, mas recuei não fosse descobrir «o triunfo puro da
mercadoria». (Eduardo Lourenço)
13.5.19
António Costa disse no
Parlamento que todo o país está "chocado" com o "desplante"
de Joe Berardo perante a comissão de inquérito à Caixa. O país deveria
estar chocado com o 'desplante' de um Estado que deixa à solta indivíduos da
estirpe de Joe Berardo…
Quantos outros estão presos por dívidas bem menores?!
12.5.19
O velho professor
encontrou quem lhe desse um bordão. No entanto, nos dias que correm, para os
professores só há bordoada.
Reparem que, no caso do
'velho professor', até lhe foi melhorada a visão, talvez para poder ver que os
tempos dos mais novos não andam de feição.
11.5.19
O federalismo
Formação_federalismo
Viriato
Soromenho-Marques, Portugal na Queda da Europa, Temas e Debates,
Círculo de Leitores, p.349:
«No domínio conceptual
encontramos a raiz da objeção contra o federalismo efetuada em nome do
privilégio da homogeneidade, sob todas as suas formas. Na verdade, ela
abriga-se, não num conceito, mas sim num preconceito, que poderemos designar
como uma metafísica naturalista da identidade política.»
Nestas eleições para o
Parlamento Europeu, como só me interessam as invisíveis propostas federalistas,
sinto-me incapaz de avaliar o que se está a passar em diversos países… até
porque não me é dada a possibilidade de votar numa proposta transnacional…
Resta-me voltar a ler
Kant e procurar compreender porque é estou a andar ao contrário.
10.5.19
Quando as vias
respiratórias superiores claudicam, as palavras tornam-se inaudíveis. Do outro
lado, alguma compreensão, embora, em certos casos, predomine a indiferença e
até um certo desafio…
Hoje, no entanto, vi-me
confrontado com alguma amargura, porque os poetas (os escritores) parece que
desconhecem a alegria: é só tristeza, dor, pequenez…
Apesar do dia não ser o
mais alegre, lá fui explicando que a poesia ou é narcisista ou lacrimejante -
celebra a glória pessoal e coletiva; celebra a perda…
Na literatura portuguesa
predomina um sentimento de perda (de impotência individual e nacional) ou,
então, de nostalgia mais ou menos infantil, mais ou menos patrioteira…
E daqui não saímos, nem
mesmo quando nos oferecem bilhete para construir uma outra europa -federalista
e solidária…
Quando as palavras se
tornam inaudíveis, há que desconfiar das reticências.
9.5.19
C’est au IIe siècle
av. J.-C. que l’on estime
la naissance de la ponctuation grâce à Aristophane de Byzance (257-
vers 180), alors conservateur à la bibliothèque d’Alexandrie, qui utilisa un
système de trois points pour couper les phrases : le « point
parfait », positionné après la dernière lettre, en hauteur, indiquait que
le sens de la phrase était complet ; le « point médian », situé
à mi-hauteur, avait la fonction de notre point-virgule actuel ; quant au
« sous-point », placé à l’extrémité inférieure d’un mot, il faisait
office de point final. On retrouve d’ailleurs dans ce système de points
l’étymologie du mot « ponctuation », du latin punctus qui
signifie « point ». A
história da pontuação
Au Moyen Âge, Gasparino Barzizza, (1370-1431), rédige le premier
traité de ponctuation, La Doctrina punctandi.
La ponctuation s’est surtout développée avec l’apparition
de l’imprimerie (vers 1440). Goeffroy Tory (1480-1533), par
exemple, invente l’apostrophe et le point crochu qu'Étienne
Dolet (1509-1546) renomme « virgule » dans son ouvrage Traité de
la ponctuation de la langue françoise plus des accents d’ycelle. La Renaissance
est également l’époque où l’on invente les signes diacritiques (comme
la cédille et les accents). Les signes de ponctuation tels que nous les
connaissons sont des apports successifs liés à l’essor de l’imprimerie. Ils
seront pleinement organisés à partir du XVIIIe siècle. Dans l’article Ponctuation
de L’Encyclopédie, Nicolas Beauzée défend avec force
l’intérêt de la ponctuation. Il la règle sur les
besoins de la respiration.
No início do século XV, o
ponto, a vírgula e os dois pontos tornaram-se frequentes. No século XVI, surgem
as maiúsculas, a apóstrofe e o ponto de exclamação.
No entanto, até ao século
XVIII, a pontuação só tem o valor de «respiração». A partir dos finais do
século XVIII, a pontuação passa a ter uma função gramatical - ela influencia o
sentido da frase.
No século XX, a
utilização da pontuação é regulamentada, apesar de todo o tipo de
transgressões.
Le XXIe siècle et l’apogée de l’Internet ont vu la
ponctuation se métamorphoser ; les smileys et le langage SMS
apportent des éléments nouveaux, propres à l’époque dans laquelle nous vivons.
8.5.19
Ouvi dizer que o Nogueira
do Sindicato está a pensar em abandonar o Partido Comunista. Surpresa!
Espanta-me que o PC acolha árvores de tal porte… Sempre me habituei a pensar
num Partido rigoroso… por vezes, até demais.
Os tempos andam revoltos.
Hoje vi tratar o Nogueira como «o professor de Coimbra» e logo pensei que se
trataria da reencarnação do de Santa Comba…
A esta hora, o Nogueira
deve estar a acender uma vela à UTAO!
Mais 398 milhões de
euros: é este o custo que teria a recuperação integral do tempo das carreiras
especiais, estima a UTAO.
Só que o Governo
discorda: Descongelamento de carreiras: “Cálculo da UTAO é totalmente
arbitrário.”
7.5.19
Faleceu José Carlos
Camolas, jogador do União de Tomar no tempo em que eu estudava na cidade
nabantina - 1971-73. Creio que na mesma época lá jogou o Eusébio...
No entanto, nunca entrei
no estádio, embora, inicialmente, vivesse muito perto dele. Hoje, ao ler que
falecera Camolas, lembrei-me que sempre associara aquele nome ao proprietário
de uma loja, onde comprei duas ou três garridas camisas aos quadrados…
Ainda recordo a rua
estreita, a montra da camisaria, a pensão em que vivi temporariamente, e
sobretudo a Biblioteca, da qual ainda hoje conservo uma pequena obra de David
Mourão-Ferreira, Motim Literário, editada pela Verbo em 1962, com o
carimbo da Fundação Calouste Gulbenkian.
Confesso que nunca foi
minha intenção ficar com o livrinho cujo título fora roubado a José Agostinho
de Macedo, mas da última vez que passei por Tomar, apercebi-me que a Biblioteca
mudara de lugar tal como eu…
Entretanto, espero que
esta memória não seja falsa!
6.5.19
Não é fácil ser… num país
que não perde a oportunidade de adular a inteligência do chefe, sobretudo,
quando se trata do primeiro-ministro.
A natureza do chefe é
virtuosa e temporã. Desperta nos humildes e nos invejosos atitudes próprias dos
hienídeos.
Não é fácil ser… quando o
chefe é venerado por hienas cabeçudas que só sabem abanar a cauda.
(Infelizmente, as
hienas não correm perigo de extinção.)
5.5.19
À boleia do equilíbrio
orçamental, velejamos mesmo que a seca se aprofunde. O paradoxo ignora a
dívida, a baixa produtividade, a fragilidade da iniciativa pública e
privada…
Na origem do
desequilíbrio estão as alterações climáticas - a inteligência diminui a cada
hora que passa, com perogrulhada ou não - como é óbvio, em tradução portuguesa.
Lá dizia Saramago
"Nunca tivemos melhor filósofo do que Pero Grullo".
4.5.19
Ainda estou a recuperar
do castigo… do tempo perdido.
Face à balbúrdia
instalada, só me resta aquietar-me, não venha o velho Tirésias revelar-me que
sou fruto de algum desmando ancestral, e que para sempre devo penitenciar-me…
cegar-me.
3.5.19
Ainda pensei na espada de
Dâmocles! Depois pensei na Excalibur… no gládio ungido do Mestre da Paz… no
entanto, vou ficar-me pelo canivete português - à sorrelfa, o truão lá vai
repartindo o quinhão.
O resto é conversa de
empanturrar! Por exemplo, diz o enfatuado: - "O professor no topo de
carreira ganha «à roda de três mil euros.» Ganha mas não recebe! Em
muitos casos, não chega a receber 1900 euros líquidos… Vá lá! Multipliquem por
14...
2.5.19
|
Francisco Goya, 3 de maio de 1808 |
Carta a meus filhos sobre os fuzilamentos de Goya
(Poema lido por Eunice Muñoz)
(…) Tudo é
possível,
ainda quando lutemos,
como devemos lutar,
por quanto nos pareça a
liberdade e a justiça,
ou mais que qualquer
delas uma fiel
dedicação à honra de
estar vivo.
(…)
Jorge de Sena
O espantoso quadro de
Goya é uma das imagens mais memoráveis da desumanidade do homem para com o
homem. Os exércitos de Napoleão ocuparam a Espanha, mas no dia 2 de maio de
1808, os cidadãos de Madrid levantaram-se contra os franceses. No dia seguinte,
o exército francês revidou com uma terrível vingança, executando centenas de
rebeldes e muitas outras pessoas que eram apenas observadores dos inocentes.
Goya só conseguiu registar esses factos alguns anos depois, quando o rei
Fernando VII foi reconduzido no trono espanhol. O quadro transcende o contexto
histórico específico e demonstra duas características principais da arte de
Goya: suas imagens marcantes e diretas, e sua moralidade que questiona mas, em
última análise, é distanciada.
Este quadro de Goya intitula-se O 3 de Maio de 1808 em Madrid: Os Fuzilamentos
na Montanha do Príncipe Pio, embora também seja conhecido por Os Fuzilamentos
da Moncloa.
É pintado de forma totalmente anti-retórica: num charco de sangue, três
cadáveres no chão, enquanto um frade e alguns camponeses esperam receber a
descarga; aproxima-se deles uma outra fila de condenados que vão morrer. É
noite; contra o céu escuro recorta-se o perfil da capital e, em primeiro plano,
rodeado de luzes e sombras projetadas de encontro ao muro por uma lanterna, tem
lugar a execução brutal e sem piedade.
A atenção concentra-se na
figura do condenado de camisa branca e com os braços em cruz que desafia os
soldados sem rosto, curvados e fixos no ponto de mira, enquanto o frade reza e
os restantes fazem gestos de desespero, numa atmosfera ainda mais gélida,
devido ao sangue que se espalha pelo chão e que chega aos pés dos algozes.
A camisa imaculada, prestes a ser trespassada pelas balas, converte-se no
estandarte de uma denúncia universal contra a guerra.
Simone Martins, 7 de outubro de
2017
30.4.19
Ao fim de 45 anos,
Armando Vara decidiu abandonar o Partido «para evitar qualquer embaraço» ... E
eu que pensava que ele já tinha sido expulso!
São estas cumplicidades
que vão dando cabo da Democracia.
Diz o ministro das
Finanças que o País não pode suportar encargos de 635 milhões de euros com os
professores. Talvez! O número é de tal dimensão que tenho dificuldade em
acreditar na palavra de Centeno.
No entanto, o mesmo
ministro está preparado para gastar mais de mil milhões de euros com o Novo
Banco…
28.4.19
Lembra-me aquele dia em
que assentei praça no Quartel das Caldas da Rainha e, logo ali, fiquei de
plantão. Nem os azulejos das casas de banho me escaparam…
Há dias assim! Cada vez
mais, sempre a servir, caso contrário o caos instala-se definitivamente. Não se
trata de uma condenação, mas de contenção da irracionalidade - o aluvião.
Fico-me por aqui!
Se não me entendem é
porque nunca estiveram de plantão. Explicar para quê?
Em Espanha, por exemplo,
andam todos cheios de razão, porque nunca enfrentaram um pelotão de
fuzilamento… Já passaram 80 anos!
27.4.19
«... proponho que
olhemos o talento como 'uma expressão concentrada de saberes e competências',
dirigidas para a realização de algo concreto.» Luís Bento, O
Prazer da Transgressão, pág. 26, On y Va, 2019
No entanto, com tanta
gente jeitosa na montra, esperar-se-ia mais obra, mas, infelizmente, esta é
pouca e de qualidade ranhosa.
Por exemplo, depois de
nos dizerem que 'a europa é aqui' ou que 'nós somos a europa', agora querem
convencer-nos que devemos 'gastar bem os dinheiros da europa'...
Nem era preciso afixar
cartazes com tais proclamações.
Houve sempre quem
revelasse um talento especial para se apropriar das especiarias da Índia, do
ouro do Brasil, do bacalhau da Terra Nova, das remessas dos emigrantes, dos
diamantes e do café de Angola, São Tomé e Timor, dos fundos estruturais
europeus, dos empréstimos do FMI e do BCE…
Não nos faltam nem manhas
nem ardis para fintar todo o mundo e ninguém. Não me venham é dizer que a
'europa é aqui' ou que 'nós somos a europa'. Por favor, não desvirtuem o
glorioso passado!
26.4.19
«O António
Barrasquinho, o Batola, não tem ninguém para conversar, não tem nada que fazer.
Está preso e apagado ao silêncio que o cerca.» Manuel da
Fonseca, Sempre é uma companhia.
Se me colocar no lugar do
Batola, apenas conversarei sobre o tempo e, talvez, sobre a desertificação da
planície sem pedir contas aos holandeses e aos franceses que alugam as
herdades…
Se vestir a pele do
António Barrasquinho, não o acompanharei no assombramento que o invade, mas
estarei com ele no que respeita à inexistência de parceiro para conversar…
Uma conversa esclarecida
sobre o que nos cerca faz falta. Por exemplo, sobre o que acontece por estes
dias em Espanha, em França, em Marrocos ou na Argélia…
A novidade do que por lá
ocorre seria uma boa ajuda para sacudir o marasmo que nos asfixia ou escrutar a
«mão de vaca» do Centeno.
25.4.19
No ano passado escrevi:
«No 25 de Abril,
continuámos a olhar para trás e, felizes, sentimo-nos superiores aos espectros
do Estado Novo... No intervalo, contentamo-nos com a devassa, sempre
invejosos dos sucessos e das malfeitorias dos nossos semelhantes…»
Hoje, verifico que uns
foram trabalhar e que outros aproveitaram para celebrar e passear.
A novidade é que o 25 de
Abril já não necessita dos espectros do Estado Novo. A cúria envelheceu de tal
modo que o espelho que a reflete se desfaz em cacos, que se pavoneiam pelos
palcos que lhes vão oferecendo à custa do erário público…
Interessante seria saber
qual é a percentagem dos que trabalham, dos que celebram e dos que passeiam e
como é que a atividade deste dia se materializa nas urnas.
Quanto à devassa, à
inveja e às malfeitorias, não encontro nenhum indicador de mudança.
24.4.19
Cansado. Física e
mentalmente. Passo e palavra desconcertados.
Revê o passado e nota que
as vozes de hoje não passam de réplicas de outras vozes, agrestes e acusativas
- rejeita o determinismo, mas a evidência insiste em contrariá-lo.
Hesita entre a primeira e
a terceira pessoa do singular. O plural desenha-se como arquipélago para onde
nunca viajou. Até o género o faz titubear - a hora é de preposição; isto é a
'loja é de cidadão' - dizem que a redução dá votos…
No desconcerto, vislumbra
que talvez possa aprender, que 'talvez' é imprescindível, e que ensinar é
adiar… porque ao servo apenas lhe é mudado o dono: a herdade continua lá; na
herdade já não há ratinho, mas há nepalês… o indígena gasta os dias no jardim
autárquico…
E depois, chega a unidade
- a grande mentira - nem no início!
23.4.19
Dizem que o tordo, na
época em que as uvas estão maduras, anda quase sempre atordoado.
Esta manhã, olhando
aqueles jovens rostos, comecei a pensar que uma boa parte estaria alienada - a
consciencialização de que há vida para além do EU tornara-se impossível! Como
explicar a 'alienação'?
De repente, pensei que
estariam simplesmente atordoados. Quis acreditar que aqueles jovens eram
vítimas de excesso de informação, de notícias falsas… Vítimas? Como os
habitantes da Alcaria de Manuel da Fonseca?
Também eu já macerado,
sentia-me atordoado. E o meu atordoamento agravou-se ainda mais quando
compreendi que não fora informado do falecimento da Isabel Rodrigues… A Isabel
que conheci com outros apelidos em tempos distintos - que conheci no ITAU em
1973... A Isabel que se esgotava no seu perfecionismo… e a quem fui dando a mão
em tempos difíceis… partiu, para mim, inesperadamente, sem um singelo aceno…
22.4.19
O medalhão de pescada,
apesar de se encontrar no centro da frigideira, não aloura como os que o
circundam. Viro-o e o resultado é o mesmo. Não faz sentido… Só depois de
observar a posição da chama, percebo que o centro não corresponde ao que eu
vejo…
Ainda pensei que a minha
labuta tinha um sentido: reduzir o caos. Recordo que, há mais de 40 anos, José
Rodrigues Miguéis apostava na «programação do caos» ... Ora, a experiência
pessoal ensina-me que, na maioria dos casos, a realidade não corresponde nem ao
que vejo nem ao que anseio…
Talvez seja por isso que
lido mal com as celebrações privadas e públicas, se a distinção ainda faz
sentido…
Sinto-me afetado pela
desproporção, tantas são as evidências… e por aqueles que, por estes dias,
agitam bandeiras de um tempo morto.
21.4.19
Um
dia que fugiu do calendário
Tudo um pouco diferente,
sem chuva nem vento, com alguma família mais ou menos azafamada.
Um dia de árdua
satisfação, apesar do peso nas pernas e da leve irritação que me assalta as
meninges - mesmo agora me vi forçado a destrinçar quem era o Mário Emílio Forte
Bigotte Chorão, tudo porque José Régio o menciona na sua correspondência…
Começo a pensar que o Régio seria hipocondríaco, versão portuguesa do amado
Marcel Proust.
Olho para o que falta, e
pressinto que a azáfama ainda não terminou. Os dias de festa são assim: há uns
que aproveitam e outros que amargam.
(…) E agora que é tempo
de Páscoa, mandou o governo devolver o IRS que cobrou indevidamente…
Ou como escreveu
Saramago: «Agora que veio o tempo da Páscoa, o governo mandou distribuir por
todo o país o bodo geral, assim reunindo a lembrança católica dos padecimentos
e triunfos de Nosso Senhor às satisfações temporárias do estômago protestativo.» O
Ano da Morte de Ricardo Reis, pág. 306, Porto editora.
20.4.19
Chegada ao aeroporto da
Portela, logo perguntou pelo mar - pela cor, pela areia, pela água…
Partimos de imediato para
a Ericeira. Chegámos rápido, com a sensação de que a chuva de abril poderá vir
a ser insuficiente - apesar do amarelo e do verde, a terra parecia seca,
arenosa.
Na Ericeira, muita gente
espraiava-se pelas ruas, pelas amuradas e pelas esplanadas… e alguma, deitada
nas exíguas línguas de areia, desfrutava o sol e o vento da tarde deste ameno
sábado. (A penumbra esbatera-se!)
Ela desceu ao areal,
mergulhou, por momentos, os pés nas águas atlânticas, e regressou em silêncio
como se São João Batista acabasse de a libertar de todas as impurezas da
Alemanha imperial…
19.4.19
A única palavra-síntese
que me dá conta da luz do dia é 'penumbra'.
Lá fora, o rio-cinza
espreguiça-se, incapaz de seguir o seu destino. Preguiçoso, contorna a única
língua de terra que avisto, embora a afirmação não seja totalmente verdadeira,
pois uma via rápida dá-me conta do fluxo do trânsito que se dirige maioritariamente
para Sul… para lá da penumbra…
Nesta sexta-feira, para
uns tantos, santa, eu até gosto desta quase sombra, prenúncio de acalmia mesmo
se efémera.
E se, afinal, a
ressurreição mais não fosse do que a passagem da luz para a sombra?
Sei que a hipótese é um
pouco herética, mas já estou cansado de tanta 'aleluia'...
18.4.19
Nada tem avançado, mas
dizem-me que estou mais perto.
Talvez por isso, hoje
decidi aspirar a casa. O Kirby foi contemplado com dois novos acessórios, o que
me levou a querer pô-lo à prova.
A publicidade diz que o
Kirby é o Ferrari dos aspiradores! Pensa-se que com ele 'tudo será mais fácil,
tudo será mais rápido, mais leve', mas, no meu caso, não tendo recebido
formação - na rua dos Soeiros, Lisboa, propuseram-me umas aulas para melhor manuseamento
do protótipo - acabei derreado…
Estou mais perto do chão…
Porém, não estou só!
Ainda ontem, ouvi que a
Ilha da Madeira não dispunha dos sacos funerários necessários, apesar dos
milhões gastos em fogo de artifício no Funchal.
Em 2018/2019, foi
estabelecido um novo recorde madeirense, com mais de 174.000 fogos de artifício
lançados com um total de 26 toneladas de explosivos.
17.4.19
Uns pagam o mínimo
possível e ninguém lhes põe a vista em cima. Outros são mal remunerados, são
manipulados… dizem o que lhes mandam: todos adoecem, têm família, e nesta
páscoa querem um futuro melhor; na próxima logo lhes dirão o que fazer…
O governo zela pelo
cumprimento da lei da greve, mesmo que esta afete sectores vitais da atividade
económica, da vida doméstica - os indicadores apontam todos na mesma direção:
não incomodar o capital, público ou privado.
16.4.19
Dentro de cinco anos, a
catedral de Notre Dame estará restaurada. Os milhões de euros necessários não
faltarão. Os ricos já estão a reservar o lugar na catedral e no céu, e os
pobres também querem ajudar para garantir a vida eterna…
Cá nesta vida, daqui a
cinco anos, as vítimas do Ciclone Idai já terão morrido ou continuarão sem
habitação, sem pão, sem educação, sem os devidos cuidados médicos...
15.4.19
«Toda a emoção
verdadeira é mentira na inteligência, pois não se dá nela. Toda a emoção
verdadeira tem portanto uma expressão falsa. Exprimir-se é dizer o que não se
sente.» Álvaro de Campos
A catedral arde em Paris.
Não resiste à voragem do fogo e, provavelmente, à imperfeição humana, para lhe
não chamar incúria ou mesmo malvadez…
A hora é de emoções para
muitos. A hora é solene para uns tantos… mas, neste caso, fingir (não) é
conhecer-se…
«Os cavalos da
cavalaria é que formam a cavalaria. Sem as montadas, os cavaleiros seriam
peões. O lugar é que faz a localidade. Estar é ser. // Fingir é conhecer-se.»
14.4.19
Nunca gostei do D. João
III! Sempre o associei a uma inflexão negativa do rumo político, em que o homem
se viu obrigado a submeter-se à Igreja mais conservadora e inquisitorial…
De qualquer modo, em
1550, elevou a vila de Portalegre a cidade… e pela observação que pude fazer ao
percorrê-la, na segunda metade do século XVI, havia suficiente riqueza para
edificar um vasto património, consolidado nos séculos seguintes, mesmo durante
a ocupação vizinha…
Não sei se a
Contra-Reforma já foi extinta nestas terras, tantas são as extensões de terra
de tão poucos proprietários.
Os Cristos de José Régio,
por outro lado, despertam em mim a ideia de que o colecionador, mais do que um
penitente, era um libertador das mentes retrógradas que por ali habitavam,
resignadas e submissas.
13.4.19
Ainda há quem viva noutro
país - o atual está cheio de sinais de proibição! - entre a igreja e o pasto.
Hoje, é mais pasto para turista consumir!
As ruas de Portalegre são
íngremes e estreitas, com memórias restauradas para forasteiro ou, então, em
ruína com promessa de requalificação para gentes que hão de vir de fora…
Também eu pareço ser da
criação do José Régio - os sinais multiplicam-se como se eu continuasse a viver
noutro tempo…
Só a pé consigo dar conta
desse tempo … O problema é que para o conseguir, necessito do silêncio
monástico que me está, de todo em todo, interdito.
Ao visitar a Casa-Museu
de José Régio, pensei que os professores, a partir de 1927, em Portalegre,
deveriam ser muito bem remunerados… No entanto, sei que a explicação terá que
ser outra… a começar pela ignorância dos campónios…
12.4.19
Assim se comprova a
efemeridade dos homens.
Se passar por Portalegre,
não se esqueça de visitar o frondoso plátano, com vista para o Hotel José
Régio, e, sobretudo, de observar a sua vitalidade. José Régio que um dia
escreveu
Toada de Portalegre
Em Portalegre, cidade
Do Alto Alentejo, cercada
De serras, ventos, penhascos, oliveiras e sobreiros
Morei numa casa velha,
À qual quis como se fora
Feita para eu Morar nela...
Cheia dos maus e bons cheiros
Das casas que têm história,
Cheia da ténue, mas viva, obsidiante memória
De antigas gentes e traças,
Cheia de sol nas vidraças
E de escuro nos recantos,
Cheia de medo e sossego,
De silêncios e de espantos,
- Quis-lhe bem como se fora
Tão feita ao gosto de outrora
Como as do meu aconchego.
11.4.19
Apesar do ar decrépito da
árvore, o lenhador terá decidido que a hora dela ainda não soou. Por ora, serve
de abrigo às aves que, ao anoitecer, nos embalam nos seus finos trinados,
apesar dos finórios que se nos atravessam no caminho…. e que se multiplicam a
cada dia que passa.
10.4.19
«Ó Portugal, se fosses
só três sílabas
de plástico, que era mais
barato.»
Alexandre O'Neill
A opção de Alexandre
O'Neill pelo plástico revela-se hoje politicamente incorreta. Azar de Poeta!
Com três sílabas, bem poderia ter optado pela 'cortiça' ou pela 'madeira',
certamente mais caras…
Teríamos, de qualquer
modo, um Portugal florestal prestes a arder em três sílabas, deixando atrás de
si nuvens de cinzas ecologicamente incorretas…
Não entendo o
empolgamento do comissário Carlos Moedas com a primeira imagem de um buraco
negro.
9.4.19
… a tentar perceber o que
é que move os políticos - os sinais são contraditórios: uns agarram-se com
unhas e dentes à família, outros procuram afundá-la; há quem não queira sair da
Europa, embora também haja quem procure entrar para a desmantelar…
… a tentar perceber o que
é feito da prometida regulamentação das promessas eleitoralistas…
… a tentar perceber
aquela brasileira que, chegada a Portugal, descobriu que 'o regime é socialista
e que se soubesse não tinha vindo'...
… a tentar perceber se a
senhora May é mesmo tola ou se o brexit é, afinal, um sinal da queda da europa…
… a tentar perceber se o
militarismo do Bolsonaro é a expressão da incapacidade da classe política…
… a tentar perceber tanta
crise existencial juvenil, tanto laxismo parental, tanta burrice
institucional…
8.4.19
«Os Europeus têm de
escolher entre continuar no atual mergulho em direção a um sistema
internacional entrópico e destrutivo, ou inverter o rumo, deixando frutificar
as sementes federais que sempre existiram nos projetos de construção europeia.
A escolha é entre a desordem de Behemoth e a esperança de paz e progresso de
Leviatã.» Viriato Soromenho-Marques, Portugal na Queda da
Europa, pág. 207-208.
Até à data, ainda não
ouvi (nem li) nenhuma proposta de clarificação do rumo europeu. Parece que o
importante é assegurar o lugar…
Os candidatos a
eurodeputados deveriam prestar provas escritas sobre o pensamento político de
Thomas Hobbes (1588-1769) e Immanuel Kant (1724-1804).
Aos candidatos
portugueses, considerando as suas limitações, recomendo a leitura da Obra
«Portugal na Queda da Europa».
7.4.19
O número de tolos é
infinito.
Ninguém é tão tolo como
um tolo intencional.
Ninguém é tão tolo que
não possa ensinar…
… a verdade é que a
maioria prefere 'viver debaixo da vassoura'. Porque será?
Quem começa pela
'verdade' acaba a mentir…
O melhor é seguir a lição
de Pieter Bruegel, O Velho.
6.4.19
Come un Gatto in
Tangenziale, filme de Riccardo Milani, 1977 (12ª
festa do Cinema Italiano)
Uma comédia divertida sobre políticas de integração.
Dito de outro modo, tudo
começa a mover-se no dia em que o intelectual Giovanni, defensor da integração
social negociada em Bruxelas e Estrasburgo, se vê obrigado a entrar num bairro
dos subúrbios de Roma, por causa dos amores da filha…
Apesar das dificuldades
encontradas, Giovanni sempre acaba por aprender alguma coisa, ajudando a salvar
(a integrar) algumas almas, muito por força da 'angélica' Mónica...
5.4.19
A
questão não está em saber quem cunhou a ministra
Vieira da Silva sobre
filha no Governo: “não tenho interferência nenhuma”
Nem S. José, o
carpinteiro, ousou blasfemar de tal modo sobre o filho que Deus lhe outorgou.
A questão não está em
saber quem cunhou a ministra, mas em perceber se não havia ninguém mais
qualificado…
Num país de gente
desqualificada, quem tem meio-olho é rei!
4.4.19
Face ao alarido que se
abateu sobre a classe política, designadamente a governamental, concluo que não
tenho família ou, pelo menos, não tenho familiares colocados na área política…
a não ser que a família tenha concluído que me faltam requisitos para motorista,
porteiro, chefe de gabinete, secretário…
Numa época, em que o
propósito parece ser o de demolir as instituições, creio que esta balbúrdia se
justifica. Sendo a 'família' um pilar do Estado Novo que entrou em convulsão na
Terceira República, o que não se compreende é este favorecimento, a coberto de
um olvido demolidor… embora, pessoalmente, não estranhe a situação, pois
raramente os meus interlocutores se lembram do que era suposto terem feito no
dia anterior ou até no próprio dia…
Na semana passada e nas
anteriores, eram os banqueiros e os governadores, todos amnésicos, e já me
esquecia do excelentíssimo da fonte termal / Boliqueime. De acordo com a lenda,
quem nela mergulha passa a sofrer de distorção da memória.
3.4.19
«Talvez porque o
escuro junta as coisas, costura os fios do disperso.» Mia Couto, O
pescador cego
Logo pela manhã
contaram-me a estória de um pescador que perdera um olho porque se esquecera do
isco para a pescaria… A razão pareceu-me não ser da ordem do esquecimento. No
entanto, o esclarecimento não chegou. O peixe não resistiu ao engodo vítreo… A
estória amputada acabou nos braços da esposa outrora rejeitada, como se Jocasta
tivesse, de novo, acolhido no seu seio filho e marido pelos peixes do olimpo
castigados…
Com a chegada do escuro,
lá fui revisitar o pescador de Mia Couto e, afinal, trata-se da estória de um
CEGO MACHO e não de qualquer Édipo freudiano, mesmo se «quase pouco» ...
2.4.19
Ótimo aproveitamento dos
componentes de computadores atirados para a sucata, que, desolado, fui
observando sob as escadarias laterais que dão acesso ao primeiro piso…
Por ali passou algum
zéfiro que decidiu brincar com o velhinho maltratado que persiste à entrada do
Liceu Camões…
Afinal, ainda há
"engenhos" capazes de interpretar o tempo em que vivemos - metálico e
digital…
Os meus parabéns aos
estatuários!
1.4.19
O povo está feliz! Já
pode inverter o percurso e ir viver para o campo ou para a praia.
Vem aí a boa vida! A
semana de trabalho de três dias e trabalho para todos, mal remunerado - que
importa?
Com a poupança no passe,
já é possível pagar o infantário e o colégio das crianças e até amortizar umas
tantas imparidades familiares.
Anuncia-se, entretanto,
que a taxa de casamentos vai aumentar e a de divórcios diminuir, sem esquecer a
multiplicação de carrinhos de bebé nas faixas criadas para os velocípedes…
O metro já começou a
acelerar, reduzindo em 5% o tempo de espera; nos cais, os cachos humanos
diluem-se.
Nas paragens de
autocarro, a vontade de conviver intensifica-se; afinal, os atrasos não passam
de uma abordagem subjetiva de quem não compreende a mudança em curso…
E depois há os novos
comboios, as novas carruagens, os novos catamarãs, os novos autocarros a gás e
a hidrogénio… tudo novinho, a baixo custo, a chegar dentro de momentos...
E se esperarem um pouco
mais, também não faltarão os novos hospitais, as novas escolas, os novos
presídios, as novas barragens, os novos albergues, os novos fontanários. Tudo
novo!
Tal qual como no Estado
Novo!
Eu por mim, já encomendei
o passe! Só não sei é se irei chegar a horas! Pouco importa!
31.3.19
A hora mudou! Será
verdade? Estou a sentir-me roubado… E parece que amanhã vou ser enganado!
Já não há respeito pelas
estações. Até há quem diga que elas estão a mudar. Não creio.
A mudança deve ter causa
humana! A ração está atrasada. O arame farpado só pode ter sido inventado por
uma mente perversa… a mesma que inventou os direitos e os deveres, sem esquecer
os calendários…
30.3.19
'Qualquer coisa' é
expressão indefinida, vaga… afirmação 'empacotada'. É menos do que 'azul', cor
do céu e do mar e da maioria das linhas que me preenchem o sábado.
Ao contrário de 'qualquer
coisa', não desgosto do azul… Sei que há quem veja nele ´qualquer coisa"
de divino e quem o contraste com o rosa, como se a humanidade ignorasse o
arco-íris…
O curioso é que por causa
de 'qualquer coisa', as linhas azuis estão a ficar avermelhadas, forma
eufemística de evitar os cravos que deveriam macerar as carnes…
Em 'qualquer coisa' não
há substância, nem forma, nem cor, mas pode tornar-se uma maçada. Para uma
massada, tenho necessidade de algo mais sólido, mais definido, mesmo se
empacotado…
29.3.19
O fio de Ariadne pode
tornar-se desesperante para quem não dá conta da mudança de protagonistas - ano
após ano, o iniciado procura desenvencilhar-se dos obstáculos, com o erro
aprendendo o caminho, pensar-se-á…
O problema é a inércia
mental daqueles que fazem fé na evolução humana, ofuscados com o progresso que
os embala.
(Só a desaceleração pode
evitar que o fio quebre.)
Deixemos as mãos colher a
terra, a água transformá-la em barro… e depois o sol, em dia de calor ou de
forno…
28.3.19
«Quem não sabe
encontrar causas, gosta de encontrar culpados.» Viriato
Soromenho-Marques, Portugal na Queda da Europa, pág. 119
Antero de Quental soube
identificar as "Causas da Decadência dos Povos Peninsulares". Punha
de parte a política ultramarina e apostava no federalismo ibérico...
Até à data, a União
europeia não soube (ou não quis) apostar no federalismo da União. Nós
embarcámos sem avaliar as consequências... mas elas são evidentes:
- Remunerações de miséria.
- Dependência absoluta da política de
crédito.
- Incremento de todo o tipo de
subsídios com o inerente clientelismo, familiar ou outro, pouco interessa.
27.3.19
perseveração - manifestação
de inércia mental que se traduz pela sustentação de uma forma de atividade
quando uma forma diferente deveria tê-la substituído. (Porto editora)
São 10 horas!
O corpo move-se
lentamente na galeria; latejante, a cabeça procura na névoa ocular uma
explicação fisiológica - bem sei que existe um diagnóstico de maculopatia ocular
da idade…
No entanto, perseverante,
procuro a causa fora do cérebro. Encontro-a no Dicionário, no verbete acima.
Confronto a definição com
o que se passou nas duas horas anteriores e com o que se irá passar nas horas
seguintes. Em cheio!
Em tempo de inclusão, só
me resta ser contemporâneo…
26.3.19
Os figos de março começam
a amarelecer.
Resta saber se estão com
pressa de amadurecer ou se simplesmente já estão a definhar.
"Tanta vida" é
expressão frequente de iniciativa, de dinamismo, de entusiasmo e, depois,
inesperada a notícia da morte serôdia, injusta…
Mas porquê, se os figos
despontam tantas vezes fora de tempo…
25.3.19
Estamos em finais de
março! E a figueira carregada de figos parece estar ali plantada para chamar a
atenção para o desnorte do Tempo que, benévolo e irónico, insiste em trocar-nos
as voltas…
Há quem pense que este
fervor da figueira é uma consequência das alterações climáticas. Por mim, este
argumento é inconsistente.
Por mais que façamos, o
Tempo (o que nos governa ou nos devora) ora é cruel ora é magnânimo para que
não esqueçamos quão efémeros somos e, sobretudo, que estamos à sua mercê…
Entretanto, esperemos que
o Tempo não nos dê cabo dos figos lampos.
24.3.19
Vus à hauteur d’homme, les termites ne sont rien d’autre
que des petits êtres nocifs : de médiocres fourmis blanches, tout juste
bonnes à dévorer nos charpentes et à nourrir d’autres insectes. Mais qui s’est
rendu un peu plus au Sud, sur le continent africain, et a admiré les
cathédrales de 6 à 8 mètres érigées par certaines colonies pour y cultiver les
champignons dont elles se nourrissent, abandonne immédiatement tout mépris. (…)
Pois é, parece que o
nosso desprezo quase instintivo não passa de soberba precipitada… Os nossos
sentidos, embora essenciais, revelam-se fonte de enganos. A nossa pressa de
vencer derrota-nos a cada momento…
(…) De manhã, dois
mestres concordavam na ideia de que conquistar países é uma caraterística
humana. Nem sequer punham a questão em termos de necessidade de alargar o
território…
A cegueira humana é
desesperante. Veja-se o caso do Reino Unido que insiste em arrastar o processo
"brexit" até à véspera das eleições parlamentares europeias… Quem é
que pode confiar na lucidez humana?
Talvez as térmitas nos
possam ensinar a resolver as nossas idiotices…
23.3.19
Aqui estou eu a descer e
a subir páginas, sem me cruzar com qualquer marquês nem respirar o carbono da
avenida, dita, da liberdade…
No centro da página, não
há vestígio de imperador - apenas súbditos - e nas margens, vão-se acumulando
hieróglifos vermelhos em perda de intencionalidade…
No paço, apenas o cavalo,
apeado, por força de uma austeridade cuja origem continua encoberta, porque, à
época, o que interessava eram os fundos de coesão.
De qualquer modo, neste
terreiro de papel, o futuro parece esconder-se numa linha invisível pronta a
sumir-se com ou sem palha…
22.3.19
Esta
notícia só pode ser falsa
Uma notícia fere-me a
vista.
Cerca de 23 mil euros
(18,943,20 euros + IVA) foi quanto custaram a mesa de reuniões e as 22 cadeiras
que o gabinete do ministro de Educação adquiriu.
Espero que o senhor Tiago
Rodrigues não tenha sido ouvido nem achado na decisão. Seria paradoxal caso ele
tivesse encomendado tal mobiliário para o seu gabinete, já que, até ao momento,
o ministério da educação tem sido governado pelo ministério das finanças.
Em matéria de gestão do
orçamento, o senhor ministro tem sido tão cumpridor e submisso que
provavelmente a notícia será falsa.
21.3.19
Parecem um nadinha
pálidos, redundantes, confusos, densos, lentos - os escritores.
Não percebem nada de
pontuação! Nunca respiram! Uns totós sedentos de atenção! Têm a mania que são
profundos, que percebem de filosofia e de religião, de história e de geografia,
e, em particular, de política… Vivem em jarras de flores murchas e nutrem-se de
paraísos perdidos… E depois todos os anos deitam cá para fora dois ou três
livrecos para nos martelar os miolos… sem perceberem que o resultado é uma
massa consistente, fétida…
Peço desculpa, no dia da Poesia, deveria ser proibido deitar o lixo pela
janela. Só que os Poetas não são escritores…
«Um génio antipatriota
é um fenómeno, não direi vulgar, mas aceitável. Um operário antipatriota é
simplesmente uma besta.» Fernando Pessoa, Em arte tudo é licito
desde que seja superior.
20.3.19
Peso as palavras. Cansaço.
Esgotamento. Impaciência…
Um grama a mais, um grama
a menos. Um problema de género, jansenista.
Insatisfação semântica…
quântica, outro modo perdido de distribuir e combinar as partículas.
Talvez saturação, quem
sabe, desorientação, realidade tão pesada que nem a fuga conseguirá fazer
recuar…Nem o sorriso escarninho que ilumina o gaveto me serena - nem o
silêncio.
Peso as palavras
ruidosas.
19.3.19
O meu pai não se chamava
José e era agricultor. S. José não era pai de verdade, e consta que era
carpinteiro. Eu também não sou carpinteiro nem sou José.
Sou pai, mas não quero
que seja o meu dia, esse já foi, e já pouco interessa, ficou noutro lugar bem
longe de Belém sem ter tido necessidade de me esconder de Herodes…
A verdade é que não quero
ser o Orfeu que perdeu a Eurídice, irremediavelmente.
Estou em crer que S. José
detesta pombas e que lho recordem.
18.3.19
(…)
Já não podias desenhar
sequer uma linha;
um nome, sequer uma flor
desabrochava no verão da mesa
(…)
João Cabral de Melo Neto
eis uma sensação
antiquíssima
cada vez mais
pesada
explosiva que de tão
contida
se deixa cair pelos dedos
abaixo
fora de qualquer estação
fora de qualquer
pontuação
apenas o ainda branco
respira
apara a queda das
pétalas
17.3.19
Para onde pensar em
fugir, se só a cela é tudo? Bernardo Soares, 23-3-1930
'Em fuga' parece ser o apelo irresistível de quem imagina a vida como um oásis
- a viagem do neófito ávido de novas sensações em paisagens
distantes… Mesmo que o intelecto antecipe que o desejo não passa de ave
passageira, a vontade caprichosa não se importa de hipotecar o corpo, como se
ele não fosse o único bem…
Escancarada a cela, nada
nos espera… nem mesmo a brisa nos arrastará para o mar.
16.3.19
Estamos
a facilitar a radicalização
«Nós estamos aqui. Nós viemos aqui para
dizer que sois culpados. Nós repetimos aqui que
sois responsáveis pelo que nos está a acontecer. Nós prometemos aqui que
vamos voltar, até porque não temos plano B...»
'Nós,
a juventude, viemos até aqui convencidos de que a melhor arma
é a frase-martelo. Reconhecidos no aplauso coletivo e institucional, estamos
prontos, ou quase...'
Um destes dias, o Ato
ignóbil bater-nos-á à porta. Então, não haverá quem explique a radicalização
dos protagonistas…
No entanto, bastava no
tempo certo ter ouvido o martelo e ter analisado as imagens para perceber o que
aí vem.
Sem aplauso!
15.3.19
Com o petróleo chegou o
plástico facilmente moldável. Em 100 anos, as aplicações do plástico
multiplicaram-se com vantagens em muitas áreas da atividade humana. Entretanto,
o plástico caiu em desgraça, pois será responsável por grande parte da
destruição da Natureza…
As cruzadas estão em
marcha… Neste domínio, como em muitos outros, convém ter à mão um bode (balde?)
expiatório e deixá-lo imolar, de preferência, pela juventude… O problema é a
grande indústria que há muito tempo aprendeu a acarinhar os movimentos contestatários…
Pena é que, no meio de
todo este empastelamento secular, se tenham esquecido de fabricar os livros em
plástico, embora, em muitos casos, a plastificação de cadernos e livros tenha
sido um bom negócio…
Aposto que se o papel dos
livros tivesse sido substituído pelo plástico, hoje, o dia seria de enorme
satisfação… - Para quem?
14.3.19
Próximo dos plátanos, só
na distância, porque raro é aquele que pergunta o nome da árvore que em certos dias
lhe magoa as narinas e os olhos, lhe intumesce a garganta… e ensombra o estio…
… só o trinado dos
pássaros em voo catabático antecipa a primavera e já nem as estações são
óbvias… por vezes, um besouro esquecido de que deveria anunciar as chegadas, em
vez de assombrar aqueles corpos tão assustadiços…
13.3.19
A citação exemplifica,
ilustra uma ideia. A citação fundamenta um argumento.
No entanto, a citação
pode, se parodiada, reverter os princípios que sustentam uma cultura ou fazê-la
cair na gratuitidade.
No geral, a blasfémia
prefere a alusão, fértil em solos arenosos percorridos por ventos desenfreados
por prestidigitadores verbais quase sempre idolatrados por uma sacerdocracia
volúvel e calaceira...
12.3.19
«Vestidos de preto que
matavam pessoas, degolavam» …
Ainda pensei que fossem
os sarracenos. Mas não, a versão é mais recente e mediática. Supostamente, a
imagem permanece na memória juvenil ou está ao alcance do olhar vagabundo,
delinquente, pronto a diluir-se numa inocência desamparada. Ou será revoltada?
Ainda procurei uma
explicação mais fina, mas não, a definição não deixa pontas soltas: «o preto
é a ausência de toda a cor ou luz e, em todo o mundo, está
associado ao mal. É a cor do mistério, da penitência, da condenação, da
angústia e representa o submundo.»
Olhei à volta, não eram
muitos os que vestiam de preto, mas lá estavam dois ou três, sem albornoz nem
cimitarra, creio…
Eu por mim, vou ler
"Os sinais da infâmia e vestuário dos mouros em Portugal nos séculos
XIV e XV". Os sinais de infâmia
11.3.19
Nada fica. Porquê? Será
apenas desinteresse? Ou será uma nova forma de estar, desmemoriada, para poder
esticar a vida? As conexões antigas diluem-se, talvez para que outras,
inocentes, possam libertar-se…
Esta rutura assusta, e há
quem a explique com a falta de empenho ou, em alternativa, com as portas
arrombadas, perdidas as chaves do presente.
A própria ideia de um
texto fechado à chave, que fosse preciso escalonar, apavora, embora de forma
distinta do terror que assalta a sala quando o besouro desorientado pela luz se
projeta sobre a vidraça…
Não sei se o besouro
poderia ficar… De qualquer modo, aproveitei o intervalo para o libertar para a
tília sem futuro. Sorte a do besouro!
10.3.19
Uma língua de terra com
contornos de água - parecem margens, mas não são. As margens poderiam ser as
faces da moeda, opondo-se como se cada uma representasse a escolha certa, mas
não.
As duas faces não são antinómicas.
Cada uma, no entanto, é assumida como representação do Bem e expressão da Luta
contra o Mal... Invertidas, traçam cruzadas mortíferas, em nome da Razão. Ou
será de uma outra Fé? Porém a Fé, embora iluminada, é a expressão da cegueira
humana.
Viro e reviro a moeda, e
apetece-me deitá-la fora.
9.3.19
Questionado
como explica ter usado a Bíblia para fundamentar uma sentença em que
desculpabilizavam dois homens que agrediram com uma moca de pregos uma mulher,
Neto de Moura afirmou que não foi "despropositado", uma vez que
considera que a "sociedade é muito influenciada pela cultura
judaico-cristã", assim, a citação da Bíblia "aparece como uma mera
referência histórica" e "faz parte da fundamentação".
O argumento parece
pertinente, só que o juiz Neto Moura está a necessitar de visitar uma sala de
aula de uma escola pública para perceber que esse caldinho de cultura já viveu
melhores dias. A não ser o ímpio Saramago, mais ninguém cita a Bíblia…
O tempo em que vivemos,
na prática, faz tábua rasa dos valores judaico-cristãos e se alguma coisa
herdámos foram as sementes de violência…
O argumento, afinal, só espelha
incompreensível desfasamento.
8.3.19
Não sei se há algum rio
que tenha apenas uma margem, talvez, mas longe, desenhado pela imperfeição
humana…
Os rios regulados acabam
por saltar a margem a que os confinamos, destruindo as sombras a que nos
poderíamos acolher…
Talvez fosse mais sensato
fluirmos juntos, visto que o mar que nos acolherá não faz distinções de
espécie, de cor, de classe, de orientação sexual, religiosa, política…
Infelizmente, os sinais
são de divergência…
7.3.19
“... porque para os
professores este Governo morreu”. Fenprof
No que me diz respeito, o
Governo de António Costa continua em funções, e avaliá-lo-ei pelo (in)
cumprimento das promessas…
Por outro lado, não
aceito que a Fenprof se arrogue o direito de falar por mim, muito menos o
senhor Mário Nogueira…
É bom não esquecer que
algumas causas da atual situação resultam de opções erradas impostas pelos
sindicatos dos professores.
A
violência é uma consequência
A violência doméstica não
terá fim, pois é apenas uma das faces da violência gerada pela desigualdade e
pela injustiça que minam a sociedade portuguesa.
Nas últimas décadas, a
governação só contribuiu para o acentuar da pobreza e para a degradação dos
valores.
Quando a pobreza cresce e
a corrupção aumenta, não há propaganda que nos salve, não há comissões
multidisciplinares que possam por cobro à violência nas famílias, nas escolas,
nas ruas, nas prisões, nos hospitais… A violência é uma consequência.
6.3.19
Não é que queira mudar o
mar de lugar ou sugar-lhe todo o lixo que o mata, tento, todavia, esvaziar
dezenas de pastas que fui acumulando, rasgando faturas e comprovativos de
despesas que, vistas à distância, dão conta do consumismo gratuito para que fui
empurrado ou confundi com a necessidade do momento…
A experiência consumada
diz-me que me tornei num mar de plástico quando me imaginava de sargaço.
Enredado, vi na novidade a solução para um problema que eu próprio ia criando,
colocando a carroça na frente dos bois…
A verdade é que a vida
parece mais não ser do que a acumulação do lixo em que nos vamos transformando.
Talvez por isso Giovanni
di Pietro di Bernardone tenha deixado Assis, longe de imaginar que um dia seria
patrono de um mar que as cidades há de afogar… se não reduzirmos
significativamente o consumo…
5.3.19
Chegar ao topo é ótimo, o
problema são as escorregadelas!
Não faltam exemplos de
júbilo provocado pelo sucesso, em regra, efémero, mas que insistimos em
imaginar como consistente…
Sem a comunicação social
e as redes sociais, a glória inconsistente seria momentânea. Talvez seja por
isso que acabo de ler que o primeiro-ministro 'vai ao programa da cristina no
dia de carnaval'...
Por este andar, a
quaresma será tempo de tormento e durará muito para além da páscoa...
Perdigão perdeu a pena
Não
há mal que lhe não venha.
Perdigão
que o pensamento
Subiu
a um alto lugar,
Perde
a pena do voar,
Ganha
a pena do tormento.
Não
tem no ar nem no vento
Asas
com que se sustenha:
Não
há mal que lhe não venha.
Quis
voar a uma alta torre,
Mas
achou-se desasado;
E,
vendo-se depenado,
De
puro penado morre.
Se
a queixumes se socorre,
Lança
no fogo mais lenha:
Não
há mal que lhe não venha.
Luís de Camões
4.3.19
Esta noite, um vizinho
resolveu colocar umas prateleiras no espaço comum das garagens, e sem dizer
água vai, entrou na minha boxe e mudou-me o arquivo para o espaço público -
ignoro a intenção. Desconfio, todavia, que nada aconteceu e que ando a delirar como
toda a gente. Até me passou pela cabeça, ao raiar da manhã, que o melhor seria
transformar o arquivo num livro temático…. Bem sei que na quadra ninguém leva a
mal, vou, no entanto, antecipar a quaresma… não vá o caldo entornar-se e cair
na alçada de algum neto.
2.3.19
Borrões, aquelas cartas…
Melhor seria que não tivessem sido escritas.
Que se saiba,
desapareceram todas. De qualquer modo, resta ainda uma memória zangada, apesar
do interlocutor também ter tido razões de sobra para se sentir ultrajado. Lá no
fundo, a indecência nascia de um acerto de contas irracional, como se o outro,
anterior ou coevo, pudesse determinar o caminho…
A página azulada, mais do
que expressão da solidão, corria vergastada de vingança não do passado mas da
separação… nesse tempo em que tudo se esvaziava no sono quase diurno do que
poderia ter sido a primavera…
Borrões de dor
desnecessária, aquelas cartas melhor seria que nunca tivessem sido escritas…
Essa primavera que nunca chegou a acontecer… ou que se chegou, foi tarde e com
outras cores...
1.3.19
Fui ver se o João Cabral
de Melo Neto ainda continuava com dor de cabeça, e encontrei-o a discorrer
sobre a tinta de Cesário Verde:
Cesário
Verde usava a tinta
de
forma singular:
não
para colorir,
apesar
da cor que nele há,
Talvez
que nem usasse tinta,
somente
água clara,
aquela
água de vidro
que
se vê percorrer a Arcádia.
Certo,
não escrevia com ela,
ou
escrevia lavando:
relavava,
enxaguava
seu
mundo em sábado de banho.
Assim
chegou aos tons opostos
das
maçãs que contou:
rubras
dentro da cesta
de
quem no rosto as tem sem cor.
(…)
Nem dor de cabeça nem
aguarela, apenas pomos de ouro num mundo sem cor... Amanhã é sábado! E hoje,
que dia foi? Entre a primavera e o outono a escorrer para o inverno, um muro ou
será uma muralha? Antiga, muda, sem queixume… só a água a pode colorir.
28.2.19
Neste
país de fantasia lucrativa
Acabam de me solicitar o
meu contributo para a elaboração de um plano de formação contínua… Neste país
avançado em que a formação não passa de uma fantasia lucrativa, de tempos a
tempos, voltam à carga.
Todas as chafaricas devem
ter um plano de formação adequado às necessidades dos aguadeiros, mesmo em
tempo de seca.
Desta vez, apesar da
chuva que vai caindo n' O Ano da morte de Ricardo Reis - chove
desde outubro de 1935 - não me sinto capacitado a não ser para contribuir para
um plano de formação de descontinuação.
Aqui, com grave dor, com triste acento,
deu o triste pastor fim a seu canto;
co rosto baixo, e alto o pensamento,
seus olhos começaram novo pranto;
mil vezes fez parar no ar o vento
e apiadou no Céu o coro santo;
as circunstantes selvas se abaixaram
de dó das tristes mágoas que escutaram.
(Excerto de uma écloga de
Camões, cujo 1º verso foi aproveitado por José Saramago)
27.2.19
Depois de tantos anos,
saído de um modelo autoritário, com uma vaga esperança de que a democracia
fosse capaz de promover a cidadania, olho embaraçado para a displicência, e
compreendo que, mais um desafio pueril, estou pronto para regressar à matriz…
No entanto, travo o
impulso, um dia mais…
26.2.19
Dá
vontade de os desemparelhar
Chegam atrasados, esperam
pelo intervalo e fazem de conta que chegaram a horas, arlequins... Sentam-se
aos pares, e casos há… que têm muito que esbracejar...
Dá vontade de os
desemparelhar… mas se não há campos por lavrar para quê colocar-lhes a canga…
ou será o jugo?
Depois há os smartphones.
Lembram-me as grilhetas do Prometeu, só que o fogo extinguiu-se. O Cáucaso para
quê se ali adiante o rio corre sem saber se a água em que se banha vem do mar
ou dos afluentes… E mais para sul, o casario, todas as janelas fechadas, só as
obreiras apressadas titilam a rua sem saber se são varinas ou criadas… e
podem-no fazer porque o deus do dilúvio se terá mudado para uma outra galáxia…
Que inveja!
25.2.19
Lembro-me de um conto de
Sophia, em que, de súbito, uma fenda se abria no muro da penitenciária - ou
seria da casa? - e o grito da vítima crescia até quebrar o silêncio imposto
pelo Estado Novo…
Por estes dias, oiço que
o muro do ministério da educação se tornou inexpugnável, mas não sei como,
porque, na minha perspetiva, este ministério, como outros, só existe para
encobrir outro… Tal, como no estado novo, quem decide é o ministro das
finanças…
Por isso, o protesto deve
procurar o verdadeiro interlocutor, e o melhor é procurá-lo em Bruxelas! É lá
que ele se ufana de oferecer migalhas ao povinho e distribuir milhares de
milhões aos corruptos…
24.2.19
Esta noite vi-me numas
acomodações enormes, cujos extensos corredores despejavam para os quartos
centenas de convidados de um casamento. Ou seria de uma eucaristia?
Não sei onde ou se dormi,
visto que nos meus olhos desfilavam ininterruptamente grupos vestidos a
preceito, eles de preto e elas de branco…
Dos noivos e do
celebrante, não obtive qualquer notícia. Talvez já tivessem partido ou até
desistido…
Ao fim da manhã, dei
conta que os convidados se precipitavam para o almoço sob uma vasta tenda presa
do azul do céu…
Sem nada entender, pus-me
a caminho, olhando os grupos que apressadamente ocupavam os seus lugares. Por
mais que fixasse o rosto de cada um dos comensais, todos me eram estranhos…
Circulei por todas as mesas, não havia um único lugar vago… ou seria vazio?
Apesar de sentir que a
minha hora ainda não tinha chegado, não pude deixar de pensar no que estaria
ali a fazer, como é que tinha ali chegado… e era tudo tão carregado.
23.2.19
Marcelo Rebelo de Sousa:
Arnaldo Matos “ficará na memória de todos como um defensor ardente da
liberdade”
O que dizer das sábias
palavras do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa e sobretudo do seu conceito de
'liberdade'?
Tenho pena de não ter
passado a escrito o que fui observando a partir de 1974. Das palavras de ordem
que lembro, até as compreendo, pois a mudança só seria verdadeira se a guerra
no ultramar acabasse… Tudo o resto, era alinhamento… No Liceu Passos Manuel
(assim como na Faculdade de Letras de Lisboa), a guerra era entre comunistas e
maoístas, apesar do pretexto ser o combate à nova direita que abarcava tudo o
que era herdeiro do estado novo, socialistas incluídos… O tempo era de
saneamento após julgamento sumário…
Tudo era feito em nome da
Liberdade, justa ou injustamente pouco importava. Era o tempo das novas
oportunidades!
22.2.19
Aqui, na Lusitânia, somos
família.
O governo, para além de
ser família, é constituído por duas ou três famílias - basta reparar nos
apelidos…
Na cultura, é difícil
ignorar o peso da família.
Na universidade, mais do
que família, é linhagem.
Na finança e nos
negócios, movem-se famílias inteiras.
Até nos tribunais e nos
escritórios, os nomes de família são herança…
E quem não é família não
tem futuro - basta reparar na violência…doméstica ou outra.
As vítimas só o são,
porque preferem não ser família ou foram atiradas para a dependência total da
estado, do patrão, do pai, do marido, da seita, da casta, do partido, do clube…
Aqui, na Lusitânia, para
o bem ou para o mal, somos família!
21.2.19
Juppé plaide pour le « droit à l’oubli » avant
d’entrer au Conseil constitutionnel
Les députés ont approuvé très largement la nomination de
l’ancien premier ministre, qui a estimé que ses succès électoraux à Bordeaux
avaient la valeur d’un pardon politique.
Ora aqui está uma notícia
que me deixa perplexo. Ainda pensei que a classe política francesa visse o
esquecimento como a tradicional «travessia do deserto» a que muitos políticos
se entregam, quando afastados do poder, para regressar como se nada tivesse
acontecido - um ritual de angelização tão do humano agrado…
Afinal, não somos só nós,
os franceses saíram me cá uns anjinhos!
20.2.19
Em nome do novo paradigma
educacional, os maluquinhos do novo sistema insistem que, no âmbito da
escolaridade obrigatória, nenhum aluno pode sofrer avaliação que o afete no seu
brio pessoal… O aluno deve ser poupado a qualquer tarefa que o afaste da procura
do prazer imediato…
Como medida de proteção
da nova juventude, recomendo o abate imediato de todos os critérios de
avaliação…
19.2.19
Não por acaso, mas porque
alguém clicou no post "Recompensa" /Caruma 2008, volto a lê-lo e
dou-me conta de que por lá continua um comentário «anónimo» maldizente…
Maldizer, outrora, era um ato responsável em que se dava a cara…
Hoje há cada vez mais
irresponsáveis que tudo denigrem, escondendo-se nas redes sociais, em palavras
de vãos de escada…Não por acaso, os rostos fecham-se, as palavras
escasseiam…
Há, no entanto, que
reconhecer que, em 2019, os sinais de humildade não se extinguiram e, de nenhum
modo são expressão de indiferença ou de desconsideração pelo outro…
18.2.19
De
inteligência artificial não percebo nada
Sejamos claros, de
inteligência artificial, não percebo nada. E também não entendo nada de
algoritmos. Esta minha ignorância parece fazer de mim uma mosca morta num mundo
em que qualquer 'curiosidade' me devassa os dias, pois de imediato sou
convidado a viajar, comprar, solidarizar-me, apostar… Tudo porque ela está
aqui, à espreita, sob a forma de algoritmos invisíveis capazes de gerir os meus
sentidos e, sobretudo, a minha inteligência…
Eu, já velho, deixo de
ser Eu… e aqueles jovens, ali à minha frente, nunca chegarão a sê-Lo,
apesar de ser dos poucos pronomes que repetem a todo o momento…
Para mim, a situação não
é nova - durante milénios só o soberano proclamava o Eu…
Hoje de manhã, por
momentos, quase me convenceram que contra a inteligência artificial, na melhor
das hipóteses, só me seria permitido empatar. Afinal, aquela virtualidade,
antropomórfica ou não, tem uma capacidade de processar dados insuperável por
qualquer ser humano…
E foi aí que reagi:
o conhecimento é bem mais que o resultado do processamento de todas as
informações (dados) sobre um objeto.
O que me leva a pensar
que, no meu caso pessoal, vou ter de travar uma última batalha contra milhares
de algoritmos que não deixarão me assediar permanentemente.
(Resposta a um jovem
que me perguntou se eu estava a gostar da palestra 'Desafiar o Futuro -
Computação e Inteligência Artificial', por Paulo Novais)
17.2.19
Antes
que eu comece a evocar o Jazas
O problema manifesto
resulta da falta de articulação frásica ou outra. Dito deste modo pode parecer
que se optou por eliminá-la, mas não é isso… O que ganha visibilidade é um
fluxo contínuo, um débito espontâneo, de noções controversas. O que pesa é que,
no papel, o débito serpenteia sem qualquer tipo de racionalidade…
O suporte é também ele
uma vítima de um problema latente que resulta do mau funcionamento das sinapses
- o problema é cada vez mais neurológico.
Ora como eu lido com
representações materiais e, por mais que faça, não consigo resolver o problema
latente, nem de nada me serve recorrer aos sociólogos e psicólogos da educação,
creio que a melhor solução é criar um gabinete de neurologia em cada organização,
começando pela Escola… antes que eu comece a evocar o Jazas…
Não sabem quem é o Jazas?
Até há dois dias, eu ficava-me por uma forma do verbo jazer...
16.2.19
Desta vez, não vou
analisar o Ranking. A verdade é que mesmo que quisesse, já não consigo
descortinar os gráficos do Público… E não é apenas por culpa da miopia e do astigmatismo…
Há anos que valorizamos a
informação em detrimento do conhecimento, que valorizamos os direitos em
detrimento dos deveres, que valorizamos a acomodação em detrimento do trabalho,
que substituímos a formação pela encenação… que a Escola foi tomada por um
conjunto de atores menores, sempre prontos a privilegiar o acessório…
E não me digam que a
responsabilidade é dos alunos. Não foram eles que geraram o pântano.
(O momento é solene, mas
não vale um chavo, apesar do muito dinheiro que se ganha à custa dele.)
Accusé d’abus sexuels, l’ex-cardinal McCarrick défroqué par le Vatican, une
première…
Por aqui, silêncio
absoluto. Pedófilos, abusadores… nem pensar!
Não sei é se basta
devolver o cardeal à vida laica sem cumprir pena pelas crimes cometidos… Pelo
que consta, o cardeal, aos 88 anos, continua a viver em paz num mosteiro…
Em Portugal, anda à solta
muito boa gente laica que, não podendo ser despojada da sua laicidade, deveria
ser colocada atrás das grades por longo tempo. Estou a referir-me à chusma de
colarinhos brancos que continua a desfrutar dos dias principescamente.
15.2.19
Se eu quiser escrever
sobre o estado congestionado em que me encontro, devo evitar a 'crónica'
porque, por estes dias, este registo procura anular a duração, e o que eu tenho
para confessar é que há horas em que não se está bem em lado nenhum.
Não fossem os ossos
doridos, os espirros e o corrimento nasal descontrolado, talvez pudesse evitar
a expressão corriqueira da fragilidade pessoal - a crónica exige que a
fragilidade seja humana!
Por mim, o género nasceu
da «ordenação de estórias» com o objetivo de legitimar uma escolha política ao
gosto do baixo clero, da nobreza calaceira, de uma burguesia ávida de futuros
pardaus e de uma arraia-miúda destrambelhada…
Nunca a crónica poderia dar conta do momento em que me informam "A
consulta foi-se. A médica fartou-se. Abandonou o consultório, sem explicação
razoável…"
A verdade é que não fiquei surpreendido, pois já me apercebera que os
endocrinologistas andam quase sempre zangados e, no caso, o que eu precisava
era de um médico de clínica geral… Talvez por isso tenha dito à rececionista:
Olhe, quando a doutora tiver acertado o doseamento, ela que diga em que dia é
que me recebe…
14.2.19
Procuro remendar, mas
desconsigo. Voltar? (O que nasce torto, tarde ou nunca se endireita…)
O retorno é tão cansativo como assustadora é a reencarnação...
Não encontro Valentim que queira apadrinhar esta língua adulterada…
Escondo-me aqui à espera que o Imperador adormeça…
Talvez pudesse soltar-me destas grilhetas e regressar às galhetas. Para quê?
Vou regressar ao desalinho da criada empoeirada e desgrenhada.
13.2.19
'Eu sei lá quem é o
António, mas deve ser um homem interessante, já que concorda comigo...
Eu sou culto, eu leio, eu
sou livre! Já nasci assim e não tenciono mudar. O António deve morar no andar
debaixo, pois nunca o vi… E parece-me um pouco antiquado - ainda fala de
ditadores e de escravos. Eu cá não me assusto com a cultura. A ultima vez que a
vi, ela caminhava sozinha e olhava fixamente para o mostrador de um smartphone
roubado numa loja do bairro… '
11.2.19
Nunca fui fã das teses
sociológicas em matéria de educação.
À escola compete instruir
e educar… com ou sem ajuda dos pais e encarregados de educação.
Se não erro, era esse o
objetivo da escola republicana. A sobrevivência da República, no seu início,
foi colocada nas mãos dos professores. Competia-lhes elevar o nível educativo,
cultural e instrutivo da nova sociedade…
Entretanto, a República
amadureceu…muita parra e pouca uva.
11.2.19
… Nesta avenida asiática,
o trânsito é constante nos dois sentidos… Na minha cabeça, há mais sentidos… só
que não fluem, paralisados pelas crianças-brinquedo, por velhos infantilizados,
por decalques inesperados…
Os ouvidos cansados do
atropelo de vozes e do matraquear dos hits perdem-se nos olhos
descarrilados, tantas são as incongruências das linhas com que me ocupo…
10.2.19
Em tempos, aprendia-se
que havia uma função mágica da linguagem própria de certos cerimoniais… Os
exemplos eram conhecidos de todos - uns angélicos outros satânicos… No caso, a
magia era o que menos importava, apesar da iniciação ser publicitada para os devidos
efeitos - religiosos, civis, profissionais…
A magia da palavra
sobrepunha-se a qualquer descrença, desacordo ou até inabilidade. Podia até
limpar o pecado original, mas não o fazia esquecer… A magia da palavra vivia
nas formas simples, da adivinha ao conto, sem esquecer o provérbio.
Estas formas simples
representavam o modo de estar e de pensar de quem as criou sob a capa do
anonimato involuntário e, em geral, eram transmitidas, para o bem e para o mal,
de geração em geração.
Entretanto, os novos
exorcistas abriram uma nova frente. Querem eliminar os provérbios e, sobretudo,
querem ser eles a liquidá-los… (Estudá-los nem pensar!)
Já estou a ver uma
quantidade de obras artísticas a serem queimadas em nome do bem comum do
momento.
9.2.19
Falta aqui um fio
condutor? Talvez!
Só que a linha é tão fina
que se enreda e se quebra…
Por vezes, parece que a
linha muda de cor, engrossa ou que já não é a mesma.
E como é que o fio
condutor pode ser mantido se outras linhas nos cercam, altaneiras?
Uma delas acaba de me
desafiar: - Ler autores do século XX ou de séculos anteriores para quê?
(Cheira a defunto!)
8.2.19
O que posso eu dizer a um
jovem que quer ser Poeta, eu que nunca o fui? Poderia recomendar-lhe que
consultasse um Poeta, mas qual? Os poucos que eu conheço já morreram ou, se
vivos, andam tão assoberbados, não sei se com a vida se com as palavras, deles
ou alheias…
Talvez o poema se faça de
silêncio ou, em alternativa, dos gritos de que se vestem as palavras. Sem elas,
pouco se pode adiantar, a não ser que as rimas só se transmitem na voz, e que
as palavras há que transfigurá-las… Arrancá-las ao Dicionário pode ser um
passo, pequeno, pois, de acomodadas, murcham se as não mimarmos demoradamente…
7.2.19
«...também eu fui
atirado à vida por insuficiente fé…» (Caruma, Caminhos…)
A frase é minha e exprime uma revisitação de um itinerário de certo modo
involuntário…
Antes, o caminho da fé fora escolhido pela miséria do Estado Novo.
Depois, o caminho começou
por ser o da teimosia inconsciente - a única certeza caridosa veio de quem
percebeu que me faltava o entusiasmo do crente…
Finalmente a minha vida,
o caminho que ninguém escrevera… nem escreverá por mais pedras que se levantem
diante de mim, e têm sido muitas!
6.2.19
Vejo que ontem admiti que
ainda me era possível ter fé. A verdade é que hoje verifico que caí em
contradição, pois inúmeras foram as vezes em que confessei ceticismo, dúvida
metódica e pirrónica… evitando, no entanto, o desespero…
Perante o protesto
instintivo da horda matinal, soergo-me entre a tristeza e o desespero, e
naquele intervalo de angústia, compreendo que se não fosse a fé há muito teria
desistido, não de Deus nem do Homem, mas de mim…
Ter fé em quê ou quem?
Nas pedras do caminho que evito maltratar, deixo-as ali a protestar…
5.2.19
Ideias houve que hoje são
ininteligíveis, e já nem sei porque insisto, talvez porque ainda tenho fé na
mensagem do provérbio 'agua mole em pedra dura tanto dá até que fura'...
No entanto, pensando bem,
se recorrer ao ditado popular, dou início a uma preleção incompreensível.
Parece que outro povo, que não este, soube, de forma lapidar, gravar na pedra a
luta contra as tiranias, (sem entrar numa sala de aula), apenas talhando os
breves dias nas palavras que a memória guardava e a voz transmitia…
Mesmo que a ideia surja
transmudada em imagem, só por ser verbal, emudece…
3.2.19
Uma língua de terra
estrangulada por dois braços de rio - castanha sem verde, ou será dos meus
olhos?
Pouco acrescentam os meus
olhos.
Talvez um pouco de oiro,
alheio, ao anoitecer.
Talvez, ao alvorecer, o
Sol me faça ver o verde que se empertiga na língua de uma terra que quer
sobreviver ao abraço do rio…
Tudo o que penso ver
difere do que os meus sentidos me poderiam dizer se os deixasse ir com o rio…
2.2.19
«Quando os homens
falam do futuro, os corvos começam a rir.» (provérbio japonês)
Com tanta gente a
vaticinar o dia de amanhã, convém estar atento às promessas e às profecias.
Cético, deixei de
acreditar nos homens, mesmo que estes ainda sejam jovens…
Nunca como hoje, o
oportunismo foi tão evidente. Poucos são aqueles que procuram ter uma ação e
uma visão ecuménicas, despojadas de particularismos…
Sorte a dos corvos!
(O queixume, no entanto,
de nada serve. Há que suportá-lo estoicamente…)
1.2.19
«A ironia é um ponto
de vista distanciado sobre o mundo…» Jorge Fazenda Lourenço, in
Colóquio Letras, nº 200, pág. 30
Não compreendo como é que
o ponto de vista pode ser 'distanciado' a não ser que o observador seja uma
espécie de atirador na carreira de tiro em que o alvo é o mundo. Nesse caso, o
observador deixaria o mundo ou, talvez masoquista, disparasse sobre si próprio…
Eu vejo o ironista
- à exceção do snob académico, aristocrático ou burguês -
mergulhado no mundo, incapaz de pôr cobro à estupidez que o circunda, a
sinalizar, um pouco como o sineiro que anuncia o passamento do
conterrâneo…
O ironista esconde-se na
casa mortuária na esperança de que a certidão de óbito tenha sido passada por
um farsante desatento dos sinais de vida do moribundo…
O problema é que a
exceção parece corresponder a um vasto grupo de figurões parasita do
mundo. E aqui morre a ironia…
31.1.19
O A25-BIS-DR2,
é um Gene! Uma sequência de aminoácidos, que só existe num
único Povo: O LUSITANO.
Depois do messianismo e
do sebastianismo com a ideia-chave de que somos o povo eleito para
dar corpo à vontade divina, parece que, afinal, o nosso destino está inscrito
no gene lusitano.
Desta vez, o argumento
cultural surge embrulhado na evidência científica.
Só nos faltava mais esta
'descoberta'!
30.1.19
António Costa considera que “só vale a
pena” negociar com os professores quando houver “alguma coisa nova a propor” -
fonte:
Até o primeiro-ministro António Costa deveria saber que o argumento é fraco.
Isto da 'coisa nova ' é coisa velha de quem não sabe que coisa quer, pois se o
soubesse já teria encontrado uma solução para aqueles que diariamente tratam da
'coisa pública', independentemente de serem professores, enfermeiros…
29.1.19
Anónima, respira melhor,
até porque ela não está à venda e até já nem arde… Não passa de lugar remoto,
onde vão caindo agulhas soltas - pedaços de dia em desalinho…Tudo incompleto,
sem início nem fim, como se uma curva dobrasse o caminho…O que lá cai, morre, e
o resto não chega a germinar…Por vezes, um fogacho arrebata-a. Vanitas!
Expressão de vazio caída na calçada endeusada…Anónima, sem início nem fim, na
curva do caminho vai soletrando mais um dia em desalinho. Perturbada, já deixou
de estar em linha. Quem a quer, assim, desgrenhada? Anónima.
28.1.19
A imposição da
escolaridade obrigatória até aos 18 anos não se coaduna com a elevação do nível
de conhecimento…
Misturar quem não se
esforça minimamente com quem se empenha diariamente é uma medida populista,
agora reforçada com a tão propagandeada escola inclusiva…
Ao docente é exigida uma
atenção permanente à indisciplina, à diversidade linguística e cultural, à
incapacidade, à menoridade e à maioridade, ao humor parental, à pedagogia
diferenciada, ao desnorte educacional… num espaço obsoletamente equipado…
Quando passo por um
docente e o vejo de olhar fixo no chão, sinto que que ali vai alguém amargurado
- uma das muitas vítimas de um sistema perverso que quer acomodar, mas não
educa nem ensina.
27.1.19
(Apenas água e café.
Nem vinho nem whisky.)
Ontem, Kino 2019, fui ver
o documentário (?) da colaboração 'improvável' entre dois artistas: o crítico e
cineasta alemão Wolf-Eckart Bühler e o ator americano Sterling Hyden…
Durante a longa sessão,
dei atenção a três tópicos: o cais de Besançon, nas margens do rio Doubs, onde
o Batelão do ator se encontrava atracado; a figura física do ator que
permanentemente me lembrava D. Quixote; o prolongado arrazoado sobre o
alcoolismo com a ideia subjacente de que sem o alcool e a droga a vida perde
sentido…
O espaço fechado, onde
voluntariamente a personagem se move, convida à escrita, enquanto o alcool e a
droga a inibem…
Por mim, nem viagem nem
alcool nem droga… só palavras incisas! E destas, tudo por dizer… e pouco de Leuchtturm
des Chaos.
25.1.19
A rotina, apesar de
certos sobressaltos, não sai de si.
As promessas, passados os
festejos do orçamento, caem em sono moribundo à espera das campanhas que se
avizinham, já com novos partidos prontos a enterrar os antigos…
Os arautos da nova ordem
securitária afinam as gargantas sobre as periferias abandonadas, agora
iluminadas por incendiários pagos à peça…
E nós, sossegados,
cruzamos as ruas, esquecidos de que a rotina é a nossa espada de Dâmocles…
24.1.19
Não tenho jeito para
tertuliano, embora admire o espírito dos comensais que se reúnem a pretexto de
temas nobres… e que, no meu entendimento, derrapam facilmente…
De qualquer modo, os
momentos de admiração e de elogio mútuo são necessários à sobrevivência da
espécie… O que seria dela se se visse obrigada a abdicar do caldo verde e do
copito…
23.1.19
Obter a chave ou as
chaves para poder interpretar os textos, tomados como redes semânticas
autónomas, como visões do mundo particulares, poderia ser motivo suficiente
para entrar na sala de aula…
Na verdade, eras houve em
que assim foi. O aluno entrava na sala de aula sequioso de aprender, disponível
para acolher as noções, os conceitos que davam corpo à cultura. Ser culto
pressupunha a capacidade de abordar os signos nos respetivos contextos, seguir-lhes
o diálogo por vezes sem saída e mesmo assim respeitá-los…
Hoje, com a morte do
contexto, com o esvaziamento da situação, de tão frágeis os signos perderam
todo o fulgor que iluminava os passos dos discentes…
Hoje a simples alusão a
Deus num contexto verbal específico, à Vontade divina numa visão do mundo
poética, é suficiente para libertar os demónios desafiadores de qualquer padrão
de cultura.
22.1.19
António
Gedeão, um poeta menor?
Agora, conheço alguns
poetas atuais, com quem falo e de quem sou amiga, que me dizem que ele é
considerado no meio como um poeta menor. Um retrato de
António Gedeão
Cristina Carvalho, filha
de António Gedeão, diz que já viu a frase ‘O sonho comanda
a vida’ nas situações mais insólitas, o que prova a popularidade do poema Pedra
Filosofal. Mas acha que essa popularidade suscitou a desconfiança do meio
literário. José Cabrita Saraiva, Sol.
Uma entrevista
esclarecedora sobre o homem Rómulo de Carvalho… e indiretamente sobre a pobreza
inteletual das comadres e dos compadres que assaltaram a academia e a
comunicação social.
20.1.19
A
ser iconoclasta ou talvez não
Inundado de imagens,
atrofio. Observo a encenação e não encontro a rede… provavelmente, o
estigmatismo turva-me a verdade.
Por alguma razão há quem
condene a iconofilia.
Já não sei o que pensar!
19.1.19
Pouco importa se não
recordo a hora, agora já difusa a lembrança de que não há nada mais abjeto do
que os poderes dos lugares pequenos, ou só das pequenas pessoas do lugar,
pressinto que devo evitar pronunciar-me sobre a celebração dos estrangeirados
que cruzam os céus pátrios sempre amargurados em versos, crónicas, ensaios e
contos de andanças…
Fico a pensar na razão do
desencanto e da diatribe demoníaca, e surge-me a ideia do arame que só incomoda
se for farpado, uma ideia farpada - adjetivo inapropriado se os dias não forem
baços.
Baços porque as pessoas
dos lugares pequenos nunca perceberam que os estrangeirados o são por causa
delas…
18.1.19
«Estas páginas são
rabiscos da minha inconsciência inteletual de mim.» Bernardo Soares
não são uvas, são
rabiscos
(se fossem uvas, seriam
dona maria…)
… vivo do rabisco da
fartura alheia
melhor seria que estas
páginas fossem riscos… de joan miró
17.1.19
A bondade era coisa
preciosa - adivinhava-se no olhar de um avô, de uma tia - refrigério de horas
tardias, gastas entre varapaus e cobras arreliadoras sob a batuta de demónios
esganiçados perseguidos por tachos e panelas, suspensos da gritaria suada da terra
estéril…
Tudo era herança de ter
nascido num lugar amaldiçoado ou, pelo contrário, tudo era apelo à superação.
E, por mais surpreendente que hoje tal possa parecer, a única porta que abria
os céus era a da escola…
A minha infância foi um
lugar estranho donde saí para outra vida.
16.1.19
Armando Vara entregou-se.
Um pouco como o Cristo, porque o Pai não afastou o cálix, pois queria que o
sangue do justo purificasse os gentios já que os seus assobiavam nos canaviais…
O pecadilho de que vai
acusado não justifica tal tormento, embora a disciplina do cárcere eborense
seja salutar como bem sabe… o amigo José não terá deixado de o informar sobre a
regra do lugar.
15.1.19
Se a soberania não é
objeto de preocupação presente, como é que a mesma temática pode entusiasmar
alguém quando a abordamos historicamente através, por exemplo, da obra
literária?
Da nascente à foz, flui
um rio no qual deixámos de nos rever…
O rio Eufrates (ou outro)
já não oferece margem onde possamos cantar Sião, em tempo de exílio ou de
convalescença… Talvez na diáspora, mas não estamos lá… só se expulsos do
torrão…
Por enquanto…
Até os mitos se arrastam
banais em horas absurdas…
Metade de nada, libertos
do espírito, esperamos que as horas retomem o seu curso.
14.1.19
Estou sem saber a partir
de que idade é que o problema da identidade se coloca…
Atualmente, a noção de
pertença a uma determinada comunidade perde terreno… esvai-se no tempo.
Há quem pense que a
identidade nos é oferecida já fechada, sem necessidade de construção ou de
aperfeiçoamento.
Numa perspetiva
diacrónica, a identidade é uma questão resolvida, aborrecida e bolorenta…
Por exemplo, explicar que
o sebastianismo é a expressão lusa do messianismo obriga a uma viagem no tempo
hebraico, desde o cativeiro à busca interminável da terra prometida na condição
de povo escolhido pelo Criador, mas para quê?
No caminho, o Messias foi
crucificado, sendo ressuscitado pelos gentios, mas para quê se a analogia
deixou de funcionar?
Quem é que ainda quer
acreditar que um dia fomos escolhidos? Quem é que quer acreditar que um dia
deitámos tudo a perder? Quem é que quer acreditar que, apesar de tudo, o
Criador não desistiu de nós - a humanidade cada vez mais desumana?
Há viagens perdidas logo
à partida.
13.1.19
De vez em quando, o
teatro…
Desta vez DO ALTO DA
PONTE (A View from the Bridge, de Arthur Miller), coprodução Artistas
Unidos, domingo, 17 horas, Sala Luís Miguel Cintra. Meia sala.
Espetáculo
conseguido.
Peça produzida em
1955/56. Temática atual - emigração clandestina; vida no fio da navalha;
macartismo ativo; valores patriarcais exacerbados; sexualidade sobrevalorizada;
Estados Unidos economicamente pujantes, Itália sem futuro…
Este tipo de teatro
deveria ser mais acarinhado, porque com Arthur Miller a tragédia desce às docas
e aos bairros operários…
Parabéns ao Jorge Silva
Mello e aos "Artistas Unidos"!
12.1.19
Os rios não reagem, fluem
ou secam…
No caso, a estiagem tende
a prolongar-se por causa da ambivalência da personagem que acredita que os
ventos da desgraça não deixarão de se enfurecer nos próximos tempos…
Só não contava era com o
assoreamento dos santanas, venturas, montenegros e quejandos… uma tribo
fratricida capaz das maiores vilezas para assegurar o lugar à mesa do
orçamento.
11.1.19
Luís Montenegro:
"Estou aqui para dizer que sou o adversário que o Dr. António Costa não
teve"
O que o Luís Montenegro
quer é ser o António Costa do PSD, pressupondo que o Rui Rio é o António José
Seguro, sem descortinar que o Passos Coelho está a fazer a travessia do
deserto…
Um candidato a líder
necessita, pelo menos, de ser mais esperto, já que a inteligência é um dom cada
vez mais raro… (Da miséria da política)
10.1.19
Olhos nos olhos,
acertavam-se ideias, tomavam-se decisões calendarizadas que eram registadas
para que o verbo não pudesse ser escamoteado…
O hábito ainda se mantém,
mas já sem olhos…
Agora, do outro lado,
incerto, ouve-se a voz que confirma, mas cujo registo só virá à tona, caso
alguém possa vir a ganhar com a sua reprodução - a decisão passou a flutuar ao
sabor da vontade dos bonecreiros…
E quando a decisão não
agrada, soltam-se as imagens, efémeras e cegas.
9.1.19
Felizmente, ainda há
muita gente respeitadora, zelosa, responsável - gente que se preocupa com o
bem-estar dos outros, que se supera no exercício diário das tarefas que lhe
estão confiadas…
O problema é que esta
gente está a ser humilhada por decisores que, para se manterem na ribalta, não
se importam de hipotecar os valores que lhes competiria preservar e replicar…
Esta gente ainda não
perdeu o rosto, mas pouco falta, pois diante de si já só encontra máscaras...
7.1.19
Eu nunca aprendi a ler
no pormenor «um todo, uma coisa, uma voz, uma frase» - como
'escreveu' um dia esse economista político que se fazia passar por ajudante de
guarda-livros no círculo literário de Fernando Pessoa…
Na lição de Bernardo
Soares, o pormenor não é apenas a parte, nem a sombra de Platão, nem os
bonifrates de Shakespeare, há a vaidade de quem segue indiferente à engrenagem
transformadora, há a banalidade de quem não compreende o poder da imaginação
transfiguradora… há esse extraordinário alheamento de quem, um dia, ficou sem
cabeça… e seguiu adiante…
Na lição de Bernardes
Soares, já havia sinais de que um dia um fogoso presidente entraria em direto
no programa televisivo de uma voz esgrouviada para a ajudar a anestesiar uma
nação…
Tal como Bernardo Soares,
começo a crer que tudo é absurdo...
6.1.19
Não chego a perceber se o
inominável existe ou se este não passa de um anseio de rejeição de tudo o que
poderia nomear.
Mas nomear cansa…
Ainda se nomeasse um
inesperado deslumbramento - talvez a ave minúscula que me confunde na vegetação
do frondoso jardim de Gonçalo Ribeiro Telles… O que é feito dele? Se calhar
continua a desenhar círculos de água…
(Distante do saco de
Eça de Queiroz - que estranho - tenho dificuldade em imaginar a mochila
queirosiana; um tablet evitaria aquela conversa pedante de quem nunca quis ler
duas páginas seguidas nem sabe que as aves mergulham nos círculos do arquiteto…)
Abro na página 944..., e
logo me encolho ao vislumbrar a insânia de um inquisidor insaciável…
e ainda há quem se revolte, como se o lucro não fosse o valor dominante...
5.1.19
Passaram sete anos e
outros sete, dois ciclos concluídos!
Do que vem não se sabe em
que ponto já vai e se respeita a predição…
O que não faz sentido é
desperdiçar o tempo a pensar nisso, até porque nada obriga a que haja
renovação…
Apenas fiapos de
resignação.
Enquanto o fiozinho não
se rompe, sigamos o caminho… depois alguém dirá o que tiver a dizer…
4.1.19
As cadeias estão lotadas.
Não há dinheiro para construir novos estabelecimentos prisionais. Nem há
dinheiro para valorizar as carreiras dos carcereiros…
(..)
Não faz sentido prender
cidadãos tão impolutos… Se porventura algum pecado cometeram, uma penitência
leve, com o acréscimo do pagamento balsâmico de uma ou outra indulgência, lava
tudo. Nada que Melchior não tenha satisfeito em devido tempo…
Agora há que ir atrás dos canalhas e pô-los atrás das grades.
3.1.19
Ainda não me sinto em
2019, isto é, não sei bem o que sinto, pois tudo me surge sob um nevoeiro
persistente. Não vejo nisto qualquer metafísica, nem já me contento com a
explicação de que esta abarca tudo o que está para além da matéria…
Ando há anos a repetir
definições cristalizadas, e isso aborrece-me cada vez mais… Aborrece-me o
relativismo moral… Aborrece-me a indulgência…
Aborrece-me a
intransigência, porque as âncoras estão desertas, enferrujadas… já não há barco
nem marinheiro que as procure...
2.1.19
Vivi vários anos em
espaços fechados e nunca tal me deprimiu.
A disciplina do lugar
deve ter contribuído para eliminar qualquer espécie de angústia.
Por outro lado, o facto
de ter nascido numa aldeia também não será alheio a esta ausência de temor - a
aldeia não era delimitada por qualquer muralha, mas havia lá uma linha
invisível, inultrapassável… O exterior despertava muito mais ansiedade, porque
era um não-lugar, sede de todos os perigos…
Hoje, repentinamente, o
elevador avariou no entre o 12º e o 11º andar. Fechado, esperei pacientemente,
sem qualquer receio, que alguém me libertasse da clausura forçada. Foram 30
minutos, lentos, mas sem um mínimo de ansiedade…
1.1.19
Da insanidade mental em política
« Et pourtant, tout régime politique vaut ce que vaut le personnel
politique qui le dirige et le fait fonctionner. » Atsutsé
Kokouvi Agboli, Jeune Afrique, nº 1624
Infelizmente, os doente
mentais estão a ser catapultados para o exercício do poder, com a aprovação da
populaça e a manipulação de inconfessados interesses transnacionais.
E como se sabe, a doença
mental não escolhe a cor política, qualquer uma lhe serve… mesmo que Bolsonaro
prometa que a bandeira brasileira jamais acolherá o vermelho, apesar de apostar
no seu derramamento…