terça-feira, 14 de outubro de 2025

Diário_2016

 

31.12.16

Neste fuso horário

Duas mulheres, já idosas, caminham, não sei se em direção ao centro comercial, se à igreja. O caniche precipita-se para o meio da estrada, mas ainda não será em 2016 que acabará atropelado.

Agora que 2016 está a terminar neste fuso horário, reconheço que, pessoalmente, este foi um ano muito duro. De qualquer modo, vivo rodeado de ilusionistas...

A criança aprumada, de mochila azul, espera. Entretanto, parqueado o carro, o avô, de cigarro empertigado no canto da boca, avança. Dão as mãos, e partem rumo a 2017.

 

30.12.16

Apesar do ceticismo

Apesar do ceticismo de que fui dando prova ao longo de 2016, pressinto que 2017 será um ano de novos desafios que só poderão ser vencidos se não nos faltar a coragem de que os pescadores são, ao longo da História, o melhor exemplo.

O resto é vaidade! O resto é narcisismo! O resto é prepotência!

 

29.12.16

O frenesim da passagem

« Je n'ai jamais de chance avec les hommes." Quem o diz é a protagonista de Eugénie Guinoisseau, de Grégoire Delacourt, in Les Quatre Saisons de ´L'été, 2015.

Ao homem, nas diversas idades, falta o jeito, a constância, falta o sentimento. O homem é um bruto! Se exceção houver é porque esse homem é cândido, prefere outro homem e, nesse caso, regressa a fidelidade, a paixão, a sensibilidade... e até a bestialidade, mas não com a mulher, esse ser incompreendido, que, em cada idade, exige uma dedicação exclusiva, como se o mundo apenas fizesse sentido centrado no "corpo" e na reação que possa despertar nas feras famintas... Saciadas, as feras abandonam a presa até que a fome regresse...
Agora que o novo ano se aproxima, o frenesim da passagem mais não é do que o voto de que tudo possa recomeçar, mesmo se por um breve instante, pois o homem é bruto...
Só não percebo, por que motivo não é permitido ao homem exclamar "Je n'ai jamais de chance avec les femmes!" Provavelmente, teria de ser poeta; só assim seria compreendido, pois a sensibilidade não lhe faltaria...

 

 

 

 

28.12.16

A viscosidade

Pouco importa o que fica para trás - nem nostalgia nem saudade! Apenas, a viscosidade desperta atenção - talvez nela possa encontrar a redenção.

Ligeira hesitação entre 'redenção' e 'salvação'. Nenhum dos termos satisfaz, pois qualquer um deles pressupõe crime (erro, falha, pecado). O que fica para trás, por muito que pese, já nada pode fazer pelo presente... 

Poder-se-ia pensar que a solução se apresentaria cristalina, mas a verdade é que a transparência anda há muito desaparecida. Longe vai o tempo da luz!

 

27.12.16

A espera

Outrora, talvez fosse a demanda...

Nos últimos anos, tem sido a espera. Nuns casos, a espera iguala-se à demanda, pois o objetivo continua por atingir - o graal, godot, a carta ...o inominável; noutros, a espera, apesar de repetida, é pontual, circunstanciada - o desespero, o cansaço e até a satisfação de ver o sucesso de uma operação...

Quem espera, desespera!

Hoje, pelo que fui ouvindo e observando enquanto esperava, sinto que há quem tenha muito mais motivos para desesperar, porque só a crueldade da morte os poderá libertar...

 

26.12.16

El coronel no tiene quien le escriba... agasta-me e empolga-me

El coronel no tiene quien le escriba, de Gabriel García Marquez

À medida que a leitura avança, o comportamento do coronel deixa-me agastado, pois prefere alimentar o galo a cuidar devidamente da esposa enferma. Na verdade, quem faz das tripas coração para que não morram à fome é ela... É ela que o incentiva a vender o relógio de parede, a vender o quadro, a vender o galo, embora nunca o incentive a procurar um trabalho - derrotado politicamente, espera pacientemente que o governo lhe atribua uma pensão pelos serviços prestados à pátria na Guerra dos Mil Dias. Durante 15 anos, todas as sextas-feiras, ele espera que o carteiro lhe entregue a carta que, finalmente, reconheça o seu direito...

A novela foi publicada em 1961, apesar de escrita em 1957-58, tempo em que o autor passava fome em Paris, pois o governo colombiano ia encerrando os jornais de que era correspondente. Ao lê-la, veio-me à memória a peça de teatro "En attendant Godot", de Samuel Beckett, publicada em 1952. Pode ser coincidência, mas o coronel surge-me como reencarnação de Estragon e Vladimir à espera de Godot...

De qualquer modo, o absurdo da situação do coronel é mais politizado, pois as referências à ação política são bem mais evidentes. Desde um Governo (do general Rojas Pinilla) que não respeita os seus inimigos políticos, a uma censura que, no caso do cinema, era controlada pela Igreja que classificava todos os filmes como atentatórios dos bons costumes - anunciando o seu veredito através de 12 badaladas diárias...

O galo acaba por se tornar no símbolo principal desta novela, porque deixado pelo filho Agustín, fuzilado, representa para o coronel e para o povo de Macondo a esperança de que a ditadura terá um fim. Não se sabe é quando!

Quanto à escrita e à composição de Gabriel García Marquez é tão enxuta e tão cheia de humor que só me resta relê-lo...

 

25.12.16

Rafael Escalona... e a fantasia em que vivemos

Aproveito o dia de Natal para ler a novela "El coronel no tiene quien le escriba", de Gabriel García Márquez e, no avanço da leitura, descubro o compositor e trovador colombiano Rafael Escalona (1927-2009).

Aqui, registo uma das suas trovas que ilustra bem a fantasia em que vivemos:

Voy hacerte una casa en el aire
solamente pa´que vivas tú.
Despues le pongo un letrero bien grande
con nubes blancas que diga "andaluz"

Cuando Andaluz sea señorita
y alguno le quiera hablar de amor
el tipo tiene que ser aviador
para que pueda hacerle la visita
el tipo tiene que ser aviador
para que pueda hacerle la visita

Y si no vuela no sube
a ver a Andaluz en las nubes
y si no vuela no, no llega allá
a ver a Andaluz en la inmensidad

Voy hacer mi casa en el aire
pa´que no me la moleste nadie

Como esa casa no tiene cimientos
tiene el sistema que he inventado yo
Me la sostiene en el firmamento
los angelitos que le pido a Dios

Si te pregunta cómo se sube
deciles que muchos se han perdido
para ir al cielo creo que no hay camino
nosotros dos iremo´ en una nube
para ir al cielo creo que no hay camino
nosotros dos iremo´en una nube

Y si no vuela no sube

Voy hacer mi casa en el aire
pa´que no la moleste nadie
es que voy hacerla en el aire
pa´que no la moleste nadie

 

A noite de Natal de 2016

A noite de Natal, que se vai extinguindo, foi um pouco melhor do que a do ano anterior, não por efeito da coligação de esquerda, mas porque, estrategicamente, os participantes não se envolveram nas habituais polémicas - a visão utópica foi condescendente com a visão bem informada, realista e cética.

E convém não esquecer os ausentes, uns irremediavelmente; outros, por puro egoísmo...

Quanto à coligação de esquerda, apesar de mais otimista, nada trouxe que ajudasse a resolver os problemas dos participantes na ceia de Natal.

Como banda sonora, regressou o Feiticeiro de Oz! (1939) Pelo que vejo a visão utópica continua a apreciar o filme de Victor Fleming....

 

23.12.16

O cinema social de Ken Loach

O filme "Raining Stones", de Ken Loach foi realizado após o termo da governação de Margareth Thatcher (1979-1990). De certo modo, pode ser lido como consequência do thatcherismo, pois mostra o estado em que vivia a classe operária na periferia de Manchester ou de Liverpool.

Os desempregados recorriam a expedientes, por vezes, à margem da lei, para impedir que a perda de "estatuto" económico e social se tornasse visível.

Curiosamente, neste novo mundo, os sindicatos desapareceram e cederam o lugar à Igreja (católica). Uma igreja que abraça a causa dos novos pobres e que não hesita em proteger o pai desesperado que, ao tudo fazer para assegurar que a filha não tenha tratamento desigual na cerimónia da primeira comunhão, acaba por contribuir para a morte do agiota que, pela força, tirava proveito da miséria social.

No essencial, o cinema social de Ken Loach ilustra bem as consequências da política levada a cabo pela coligação PSD-CDS, entre 2011-2015.

 

21.12.16

O Natal...

Nunca percebi se o Natal tem dono, todavia alguém inventou um Pai que faz muitas compras num mercado gigantesco para alegria de muitas crianças, apesar do número daquelas que são esquecidas de ser quase igual ao das prendadas...

Por conseguinte, há crianças que riem e muitas, anónimas, apesar de terem pai e mãe, sofrem... E há também quem enriqueça à conta do negócio, sem falar dos que se empanturram como se não houvesse dia 26...

Sobre o Natal, há muitas teorias, mas aquela do menino nas palhinhas, rodeado por José, que, afinal, não era pai, e de Maria, que nunca conheceu homem, sem falar dos tristes animais, a quem naquela noite roubaram uma parte do estábulo, é a que mais me impressiona desde os tempos em que era criança...

No entanto, nunca me explicaram que, face a certas sociedades em que «o aborto e infanticídio eram praticados de maneira quase normal, de tal modo que a perpetuação do grupo se efetuava por adoção, muito mais frequentemente do que por geração, sendo um dos objetivos principais das expedições guerreiras obterem crianças» *, os sacerdotes sentiram necessidade de santificar o nascituro... Só que o escolhido foi o Filho, feito por um tempo menino... Uma história que sempre me pareceu mal contada, mas que continua a servir de alibi a muitos comportamentos, uns dignos, outros indignos...

No Natal, sobe-me a tensão arterial! Boas Festas!

*Claude Lévi-Strauss, Tristes TrópicosCadiueus.

 

20.12.16

Línguas de fogo...

Não sei se as metáforas ensandeceram, mas as que encontro andam tão estafadas que me apetece calcá-las e deixá-las a fenecer. Parecem ter sido moídas por um energúmeno, que atolado numa qualquer lixeira, decidisse lançá-las aos abutres de serviço na Academia ou lá como se chama o clube de sapiências que tomou conta das universidades, politécnicos, institutos e quejandos...

Ouvi dizer que as metáforas só são pertinentes se perderem a referencialidade e ficarem a levitar no espaço cerebral dos seus criadores, deixando os leitores a decifrar puzzles irresolúveis. Basta sonegar duas ou três peças para que a metáfora se eleve acima das cabeças, para depois sobre elas poisar como língua de fogo...

O problema é que as línguas sagradas parecem ter vontade própria, pois são elas quem decide quem integra o falanstério dos eleitos, são elas quem agracia e quem deixa de fora... E os eleitos não se fazem rogados, desatam a voz, assaltam as cadeiras e ocupam-nas vitaliciamente.

Há até uns tantos, que depois de mortos, ainda continuam a assombrar-nos com a sua inexplicável opacidade.   

 

19.12.16

Transtorno coletivo

Poder-se-á pensar que a tirania é um privilégio dos estados ou daqueles que aspiram à conquista do poder, mas, pela amostragem dos últimos anos, a violência individual serve-se (ou esconde-se por detrás) de causas mais ou menos nobres para satisfazer instintos autodestrutivos. 

Temos assim uma conjugação explosiva que levará inevitavelmente a uma permanente retaliação e à morte de qualquer tipo de humanismo que ainda possa persistir.

As mortes, por exemplo, em Alepo, em Ancara e em Berlim são a prova do transtorno coletivo em que vamos mergulhando.

 

18.12.16

O que mais irrita...

 O que sobra do Império é bastante absurdo!

As portas de madeira carcomida, o metal ferrugento, os púcaros amachucados, as aves empalhadas e depois, uma natureza defenestrada e pessoas fascinadas por uma melopeia guerreira, convencidas de que a mudança liberta, mesmo se a nova exploração as torna infra-humanas.

O que mais irrita é a quantidade de ferrugem, os arquivos mortos, a ideia de que nada vale a pena.

Está quase tudo na exposição de Antonio Ole. A bromélia, não.

O mapa do tesouro

«O governo de Passos Coelho prometeu o mapa dos diamantes a Angola, uma semana após ter tomado posse e quatro dias antes de ser derrubado no Parlamento.»

Enquanto uns esfolaram e mataram, durante 100 anos, para rastrear o território angolano, um governo desmiolado entrega o mapa do tesouro. Gesto solidário, pensarão uns; gesto perdulário, pensarão outros.

Por mim, é mais um ato irresponsável, de desrespeito pelo passado, mesmo se de sangue. Quanto às contrapartidas, o tempo dirá... ou talvez o Correio da Manhã.

 

 

17.12.16

Desabafo em dia de ranking

Espaço vetusto. Equipamento obsoleto. Corpo docente envelhecido. Corpo discente heterogéneo e mal preparado...

Ranking tradicional: 146 (10,85). Ranking alternativo: 225 (0,58)

Todos os dias são esforçados, mas os resultados não premeiam o empenho da comunidade escolar.

E no próximo ano, tudo continuará...

Claro que há sempre quem olhe para o lado. Ainda por cima... para o lado errado.

 

16.12.16

O telefonema do Hospital Central de Lisboa

Se não formos direto ao assunto, ninguém nos segue. Pois, faça-se a vontade de quem ainda a tem ou pensa ter!

A cirurgia estava marcada para as 11 horas. A receção no hospital Curry Cabral marcada para as 10h45.

Às 10h05, o telefonema: - o Senhor ainda está em casa? Não vale a pena deslocar-se, o anestesista acaba de avisar que não pode estar presente...

No metro, o utente do SNS desespera. (Preparara-se para a intervenção, há meses considerada urgente, desmarcando todos os compromissos previstos para a semana anterior ao Natal, não ingerira qualquer alimento, sólido ou líquido, avisara os amigos... e a agora o telefonema! Ainda pensara que estivessem preocupados, não fosse ele atrasar-se. Nada disso! E de chofre, nova pergunta: - Será que é possível realizar a cirurgia no Natal ou no Ano Novo?)

Sob chuva intensa, o paciente desloca-se à Secretaria do Hospital. A explicação não muda uma vírgula: - O anestesista não apareceu. (Já na consulta de preparação, também marcada para uma sexta-feira, o anestesista não aparecera.) A funcionária, solícita, procura encontrar nova data na agenda - um nome de outro doente é riscado... e a cirurgia fica marcada para o dia 27, uma terça-feira, dois dias depois do Natal...

(O testemunho é do "adulto responsável", cujo dever é acompanhar o doente no pós-operatório, prestando-lhe os cuidados que o SNS passou a delegar nas famílias para evitar maiores custos.)

 

 

 

15.12.16

Um pássaro esverdeado

Acordo cedo. A gata arranha a porta. E não sei se acordo cedo porque a gata arranha a porta ou se a gata arranha a porta porque acordo cedo.

Ela sabe que não lhe quero abrir a porta, mas que pode tirar vantagem, pois reforço-lhe a ração da madrugada. Eu quero distraí-la do objetivo inicial, no entanto desconfio que o objetivo dela seja diferente do imaginado.

Até porque a gata, satisfeito o apetite, desloca-se para a sala, e imobiliza-se junto do computador à espera de que eu o ligue... e verifique quem está online ou se, no tempo de Morfeu, algo aconteceu de verdadeiramente insólito.  E esfíngica, observa todos os meus movimentos até que eu conclua as rotinas da madrugada...

Só reage à abertura da porta que dá para o patamar... aí, ela consegue esgueirar-se e não perde a oportunidade de subir o lanço de escadas que dá acesso ao sótão. Abro a porta do elevador à espera que ela queira entrar, porém ela prefere regressar a casa ou, em alternativa, descer o lanço de escadas que dá acesso ao 11º andar.
(a escrita, neste, momento torna-se mais difícil, pois ela insiste em dar-me marradas e em digitar uns sinais ++++, o que é o menos, pois de seguida a vítima é o S. José que corre o risco de ficar sem bordão.) A Sammy vive cá em casa como viveria em qualquer outra casa, apesar de aqui ela poder exercitar-se no varão, sem nunca esquecer o seu velho peluche - um pássaro esverdeado, reduzido à expressão mínima. Por vezes, oferece-mo... e eu agradeço.

Há uma hora, perguntaram-me se iria "passar o Natal à terra". Pergunta inofensiva, mas que me surpreendeu de tal modo que eu retorqui "Qual terra?" E pensei "aquela terra nem cemitério tem!" Só agora dou conta que não posso voltar à terra, pois a Sammy não gosta de descer de elevador, embora possa voar atrás do velho peluche esverdeado...
Entretanto, já lhe prometi que, um destes dias, vamos ler O Gato Preto, de Edgar Allan Poe:

«Não espero nem solicito o crédito do leitor para a tão extraordinária e no entanto tão familiar história que vou contar. Louco seria esperá-lo, num caso cuja evidência até os meus próprios sentidos se recusam a aceitar. No entanto não estou louco, e com toda a certeza que não estou a sonhar. Mas porque posso morrer amanhã, quero aliviar hoje o meu espírito. O meu fim imediato é mostrar ao mundo, simples, sucintamente e sem comentários, uma série de meros acontecimentos domésticos. Nas suas consequências, estes acontecimentos aterrorizaram-me, torturaram-me, destruíram-me. No entanto, não procurarei esclarecê-los

 

 

 

 

 

14.12.16

Eu nunca fui a Benguela!

Eu não vou à piscina!
Eu não bebo coca-cola!
Eu nunca fui a Benguela!

No entanto, o tio Vítor foi a Luanda dizer que era dono de uma piscina cheia de coca-cola em Benguela!

Eu ainda tenho um tio que conheceu Luanda, Sá da Bandeira e Benguela. (Um dia ofereceu-me um avião que esteve imenso tempo imobilizado sobre um guarda-fato!) Este tio nunca me deu conta da existência de qualquer piscina cheia de coca-cola - nem sequer na Jamba! A verdade é que este tio, que deixou Angola minutos antes do camarada Neto presidente da RPA ter tomado posse, se recusa a contar a sua desventura africana...   

Em Luanda, parecia só haver gasosa, uns camaradas cubanos, sem esquecer os camarades sovietes a construir um mausoléu com forma de foguetão...

Em Lisboa, já ninguém sabe quem foi o camarada presidente Neto, para quem os camaradas sovietes iam construindo um mausoléu leninista... e muito menos o que é um mausoléu...

Em Lisboa, as crianças nasceram todas a beber coca-cola e a ver televisão a cores, e pensam que a natureza é uma chatice... e que o passado nunca existiu.
Em Lisboa, nem na rua há putos. Estão todos online, não se sabe a fazer o quê... talvez, a experimentar o cyberbullying ou a aprender uns truques de magia para matar o tempo nas aulas de Português. 

 

13.12.16

O seu a seu dono

A administração do Santander afirma ter tomado, por 46 vezes, a iniciativa de propor a renegociação desses contratos, face aos potenciais prejuízos acumulados depois de 2008. Mas, na ausência de um acordo, os 9 contratos de swap, celebrados entre junho de 2005 e novembro de 2007 com a Metro do Porto, Metro de Lisboa, STCP e Carris, estão a ser julgados desde o passado dia 12 num tribunal em Londres, por iniciativa do banco espanhol.

Como prezo o rigor, relembro que os piores contratos de swaps são posteriores a junho de 2005, e que António Guterres, foi primeiro-ministro de Portugal entre 28 de outubro de 1995 e 6 de abril de 2002.

Almeida Garrett defendia, nos anos 40 do século XIX, a criação da lei da responsabilidade ministerial que punisse todos aqueles que pusessem em causa a "res publica". Não sei se na arca do legislador existe tal lei, verifico, no entanto, que as responsabilidades continuam por apurar... o que permite que "as guerras de alecrim e manjerona" se perpetuem...

De qualquer modo, quem é que lê António José da Silva e Almeida Garrett?

Em 2013, quatro empresas públicas de transportes de passageiros consideraram inválidos os contratos 'swap' celebrados, suspendendo os respetivos pagamentos. Em causa está uma fatura superior a 1.300 milhões de euros.

O Tribunal Superior (High Court) de Londres rejeitou esta terça-feira um recurso de quatro empresas públicas de transporte portuguesas, mantendo a decisão da primeira instância que determinou a validade dos contratos 'swap' com o Banco Santander Totta (BST).

 

12.12.16

António Manuel de Oliveira Guterres

Não é possível ficar indiferente!

António Guterres, nascido a 30 de Abril de 1949, tomou hoje (12.12.2016) posse como secretário-geral da ONU, o cargo mais distinto a que alguém pode aspirar, não pelo força que possa deter, mas porque poderá efetivamente contribuir para a construção de um mundo diferente, para melhor: mais solidário, mais pacífico e mais equitativo.

Na cena internacional, esta é a posição mais elevada que um português jamais atingiu. Um português que sempre procurou ser melhor nos estudos, na vida profissional, na vida política e, sobretudo, na defesa dos mais pobres e das vítimas das guerras e das calamidades que têm assolado os vários continentes.

Com este perfil, acredito que António Guterres tudo fará para que, doravante, o mundo seja um pouco menos triste, mesmo sabendo que a mesquinhez dos interesses lhe criará obstáculos, todos os dias.

Mas há que subir a montanha!

 

11.12.16

No reino das sombras

Um destes dias, alguém me perguntou se o "epílogo" surge no princípio ou no fim da obra... surpreso, respondi sem perceber a razão da questão. Era suposto o leitor observar o manuscrito e verificar a posição da sequência...

Entretanto, não pensei mais no epílogo até que, ao assistir ao bailado "La Bayadère", no Teatro Camões, recordei o episódio no meio do terceiro ato " No Reino das Sombras".
Não sei se por causa da duração, a verdade é que me interroguei sobre o motivo porque demoramos tanto tempo nesse reino sombrio... Afinal, dele nada sabemos!
Para nosso bem, e sobretudo dos que nos acompanham, o epílogo deveria ser breve... e quanto ao reino das sombras já era tempo de o democratizar, pois creio que por lá o poder é poeira...

 

10.12.16

O tempo anterior

Esquecer os problemas! Nem sempre o trabalho o consegue, pois muitos dos problemas advêm do próprio trabalho... Por estes dias, estou a contas com 'trabalhos' que revelam falta de rigor.

Falta de rigor não do momento, mas do tempo anterior - um tempo lúdico que, por ser tal, se aceitou que pudesse pactuar com o desleixe, com a desatenção e com a indisciplina... Tudo, a meu ver exógeno, mas que os cientistas do comportamento insistem em considerar endógeno; por pouco, dirão que as atitudes são inatas e, como tal, todas desculpáveis...

De qualquer modo, o que mais me preocupa é que, num tempo em que o trabalho é raro, este tempo anterior gere tanta inadaptação, tanta desorientação, tanta irresponsabilidade. 

 

9.12.16

Não há como o trabalho...

Não há como o trabalho para nos fazer esquecer os problemas! Sobretudo, quando, por entre tanto disparate, nos surge pela frente um jovem de 15 anos que não só leu detalhadamente a Odisseia, de Homero, como é capaz de a apresentar oralmente, captando a atenção dos colegas...

Oralmente, sim, porque a maioria cultiva a leitura, convencida de que a eficácia comunicativa é atingida com tal suporte...

Bom, não estraguemos o dia com lamúrias e consultas estafadas que insistem em ignorar o mundo que nos abraça.

Como se de finda se tratasse, remato lastimando que o Criador ande tão esquecido de que, para além de sofrer, todo o Homem deve trabalhar para ganhar o pão de cada dia...

 

8.12.16

Tolhido, em dia santo e feriado

Ontem, nada registei porque a tensão arterial me tolheu os movimentos, quase todos... As causas ficam por explicar... apesar de uma quota da responsabilidade poder ser atribuída ao Dédalo lisboeta que insiste em derrotar o automobilista que, de súbito, se vê a braços com a necessidade de se deslocar a vários lugares da cidade em plena hora de ponta...

Hoje, ainda tolhido, vejo-me obrigado a reduzir as tarefas, rejeitando a hipótese de me deslocar a um hospital, porque tenho a certeza de que a tensão iria aumentar de tal modo que o organismo não resistiria ao choque hospitalar. Sim, porque o SNS, em dia santo e feriado, derrota qualquer utente que decida entrar-lhe portas dentro...

Resta-me, assim, relembrar o dogma da Imaculada Conceição, padroeira de Portugal, desde o dia em que D. João IV, no Paço de Vila Viçosa, lhe outorgou a coroa, talvez por agradecimento, iniciado por D. Afonso Henriques e reforçado pelo santo Nuno Álvares Pereira, por "nos ter livrado dos nossos inimigos", apesar de Sua Alteza não ter assistido em vida à capitulação do inimigo "castelhano"...

Como já estou a ficar cansado, deixo para melhor oportunidade uma particular reflexão sobre a necessidade que deu origem ao dogma, no singular e no plural, pedra angular da Santa Madre Igreja e do Reino de Portugal e Algarve, sem esquecer os territórios situados para lá (ou no meio) do mar...

 

6.12.16

Pouco lhes importa...

Todos repetem que o homem é sociólogo, que nasceu em 1977, que escreve... e que recebeu o 'Prémio Sagrada Esperança', entre outros por mencionar... Fiéis ao Google, repetem que escreve crónicas, pouco lhes importando que, de verdade, escreva "estórias"... 

Por investigar, fica a origem do 'Prémio Sagrada Esperança', e no Mausoléu do esquecimento repousa o patrono... o Google poderia ter ajudado, mas não foi o caso...

(Tal como poderia ajudar a esclarecer o 'milagre" do dia 8 de dezembro, e da sua padroeira...)

Ninguém quer saber que tipo de escrita é que um sociólogo pode desenvolver quando olha para o bairro (ou para o musseque) onde cresceu - para a infância de um país que cresce junto com o seu povo. E tudo num tempo em que todos são camaradas!

E como tal, ninguém parece surpreender-se com a abundância de camaradas sovietes e cubanos - nem lá, na terra de Ondjaki, nem cá, nesta terra tão multicultural e tão alheada da sua História...

Se se lhes explica que há diferença entre 'História', 'história', 'conto' e 'estória', e que essas palavras exprimem relações de domínio e de autodeterminação, entreolham-se num desabafo mudo... Pouco lhes importa se o sociólogo transformou a sua análise dos diversos grupos que se cruzam na sua rua em "estórias" questionadoras da realidade quotidiana de um tempo que persiste em reproduzir-se...

 

5.12.16

Religiões e crenças

Há as religiões e há as crenças, embora eu descortine poucas diferenças.

Na religião, os fiéis procuram viver em rede, sob orientação divina. A rede, apesar de se esperar que seja horizontal, dispõe-se verticalmente, de acordo com um modelo hierárquico que acaba por gerar diferenças inaceitáveis.

Depois, ou antes, há a crença, onde cada indivíduo despreza a rede, para ficar a sós com o seu "demónio", mas que, farto de solidão, acaba por gerar cismas que desembocam em redes, também elas verticais...

É um pouco incompreensível que eu me entretenha a dissertar sobre tais assuntos, mas a ideia tem uma causa: a construção (ou será edificação?) do Templo da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias - A Igreja Mórmon... no Parque das Nações.

 

4.12.16

Voluntários ou prosélitos?

Chamam-lhes voluntários, mas pelo modo como fazem barreira nas entradas das pequenas e grandes superfícies, eu vejo-os como prosélitos que abarcam causas de forma irracional.

Curiosamente, os estados patrocinam esse zelo porque lhes retira a responsabilidade de promover o trabalho devidamente remunerado, de combater a doença e de fomentar uma educação assente em valores que evitem o fervilhar das seitas, da clubite, em suma, de qualquer tipo de fanatismo.

A desigualdade e a injustiça são as causas do alastrar do proselitismo e, consequentemente, de todo o tipo de radicalismos.

 

3.12.16

A vida dentro de um lenço de bolso

«Necessita-se de pouco para existir: pouco espaço, pouca comida, poucos utensílios ou ferramentas, pouca alegria; é a vida dentro de um lenço de bolso.» Claude Lévi-Strauss, Tristes TrópicosA Terra e os Homens.

O antropólogo não resistiu à síntese sob a forma de metáfora - na Ásia, na Índia, na fronteira da Birmânia, o homem, em contraste com as castas mais elevadas ou com o europeu da classe média, mais não era do que um lenço de bolso.

Nesta quadra de consumo excessivo, de esbanjamento e de desperdício, talvez conviesse recordar que cada lenço que utilizamos é o preço de uma vida... uma vida que nunca teve noção da sua humanidade.

E por este andar, uma vida que, tendo noção da sua humanidade, se arrisca a perdê-la de modo desesperante. 

 

2.12.16

Não é a leitura de Manuel Laranjeira que me deprime

Não sei se ainda há quem leia "Diário Intimo" de Manuel Laranjeira, e temo mesmo que se tal acontecer a sua leitura possa ter um efeito depressivo, embora eu creia que a depressão, ao contrário do que muitos apregoam, seja uma particularidade mais ou menos permanente do leitor, caso contrário não se atreveria a folhear de forma aleatória tal livrinho...

(Eu conheço uns tantos leitores a quem basta a capa e umas linhas da contracapa para formar um juízo definitivo sobre a obra. Como ainda hoje me referiram "aquilo não vai com o meu estilo de leitor".)

Estilo à parte, eu folheio os dias e deixo que olhos se percam no abismo das palavras:

Quarta, 3 de Junho

Invade-me a infinita tristeza da existência, o tédio infinito da vida, dos homens e das coisas.

Tudo é de uma instabilidade asquerosa!

Se eu pudesse ao menos - ser alegre e abafar o ruído deste aborrecimento sem fim!

Às vezes lamento-me de não ter nascido estúpido, muito estúpido, como a estupidez.

Diário Íntimo é do Manuel Laranjeira (1877- 1912), que eu não tenho diário... até porque dificilmente um estúpido seria capaz de dar conta da sua estupidez... De qualquer modo, não é a leitura de Manuel Laranjeira que me deprime...

 

1.12.16

Não fosse a ironia dele (A.S.)

«Refunde-se tudo, porque é na refundação que está doravante a virtude.» António Souto, 2016, Dupla Expressão CrónicasNo refundar está a virtude (Outubro de 2012), DebatEvolution - Associação.

Não fosse a ironia, poder-se-ia imaginar um cronista doutrinário. Mas não, o sujeito da escrita cultiva o olhar do pícaro que, em tempos, serviu com desvelo o poder do momento, sem, no entanto, se deixar iludir... e que com essa servidão aprendeu que, infelizmente, o futuro não é muito diferente do presente, ao contrário do prometido nos idos de abril, do seu abril, feliz - eufórico.

Agora que a tarde avança, não querendo refundar nem restaurar nada, pois essa missão é reserva do poder, vou entrelaçando o contentamento do cronista António Souto com a sensação de que tenho andado a adjetivar o tempo, de forma abusiva.

Escravo do adjetivo, crio a ilusão de uma extensão, ora material ora imaterial, que me desvincula da substância, a única que verdadeiramente pode ser incinerada...

Como tal, a leitura e a escrita são formas de incisão e de cisão em aberto...

 

 

 

Tempo medíocre

O episódio, em Cabo Ruivo, não terá qualquer significado, mas é revelador do modo como os CTT gerem o atendimento. Às 22:48, havia 68 pessoas em espera. Postos de atendimento:3. Funcionários, atenciosos, sem mãos a medir.

Utentes, pacientes, na sua maioria. Havia, no entanto, a oportunista decadente, que levava a mãezinha de 90 anos, para poder passar à frente. Havia, também, o psicótico incapaz de compreender que se o sistema informático das Finanças falha, os CTT não lhe podem validar a operação que ele poderia ter resolvido no escritório ou em casa (...)

Despacho concluído às 0:08 horas do dia 1 de dezembro, data de restauração sem objeto...

Hoje, o país entrou em modo de pausa... e assim vai continuar até à próxima 2ª feira. E depois, no dia 8, o país voltará a descansar, que bem merece...

Lá fora, a chuva, a espaços...

Em Chelas, noite, apenas. Do metro saíam vultos, apressados, bamboleantes, de olhos mortiços...

E eu sem tempo para saudar as novas crónicas de António Souto - Dupla Expressão -, ed. debatevolution, apresentadas por António Manuel Venda, na Biblioteca da Escola Secundária de Camões.

Crónicas de um tempo medíocre em que o cronista vai entrelaçando episódios irrelevantes, procurando-lhes a intemporalidade em que repousam. E esse pousio é que é a causa do desencanto de que nos falaram os Antónios.

 

29.11.16

Pouco importa...

Pouco importa se eles compreendem, pouco importa se o novo dia é frustrante, pouco importa se nos desconsideram...

... eu trabalho para que eles tenham esperança.

No entanto, asseguro, desde já, que depois de morto, eles não poderão contar mais comigo.

De nada importará o que tenha feito, dito ou escrito.

Felizmente! Não há nada mais aborrecido do que uma assombração!

 

28.11.16

Só querem que eu os não defraude

Eles querem bons resultados e quando os não obtêm a culpa é minha. E eu até estou de acordo com eles - até me encontrarem, o seu desempenho era classificado como excelente...

Tento ouvi-los, mas não consigo - não respondem ou cavaqueiam entre eles, como se eu não estivesse presente.

Tento lê-los, mas fico destroçado - não compreendem, não interpretam, não redigem com um mínimo de correção.

Alertados para a situação, não se preocupam. Deixam de ouvir. Preferem memorizar definições estrangeiradas, descontextualizadas.

Porquê? Porque compreender, interpretar, definir, textualizar... dão trabalho... e exigem atenção, disciplina, rigor.

E afinal eles só querem bons resultados! Só querem que eu os não defraude... que lhes devolva o tempo em que eram felizes.

Que enfado! Para eles e para mim!

 

27.11.16

A posse arruína e conforta

Mesmo se desnutridos, deslavados e engelhados, poucos são os que desprezam o luxo. Vejo-os nos passeios a olhar as montras como se a sua posse os compensasse do fracasso a que se sabem condenados...

A posse arruína e conforta. Ser o outro idealizado é tão deslumbrante que a montra deixa de ser obstáculo. Lá dentro a tentação fácil, a crédito, baila esfuziante, indiferente à sorte dos que se arrastam nas ruas e nas vielas...

Agora que o Natal se aproxima, os vendilhões (e os seus criados) não poupam na iluminação, mesmo se os clientes desnutridos, deslavados e engelhados já não têm dinheiro para pagar a fatura de eletricidade... e vão ter de passar frio e acabar por dormir na rua...

Na quadra natalícia, o mafarrico anda à solta.

 

26.11.16

Tempo social

O conceito de 'tempo social' anda associado ao desenvolvimento industrial, à urbanização e ao surgimento de novas tecnologias... com início no século XIX.

Para mim, o tempo social é um pouco diferente. Vejo-o constituído por um conjunto de indicadores de uma ação externa que determina a atitude do indivíduo em qualquer idade, estando presente em todas as épocas e em todos os lugares, mesmo que o avanço civilizacional seja reduzido.

Nesta perspetiva, a ação de cada um de nós é condicionada por cronótopos distintos, em função do lugar, da idade e das instituições que nos enquadram.

Deste modo, a liberdade individual não passa de uma quimera, como bem sabem todos os rebeldes que um dia sonharam e quiseram incrementar uma qualquer forma de revolução. E por mais que nos custe, a indisciplina é, também ela, a prova de resistência ao tempo social, que, por vezes, deve ser pensado na sua pluralidade... Do sonhador Fidel de Castro nada tenho a dizer, embora ainda não tenha parado de pensar no comentador de 'política cubana' que, na RTP 1, afirmou que o americano Trump irá ajudar a "amortizar a morte de Fidel"...

AMORTIZAR A MORTE!

Enfim, em todos os atos que, hoje, executei, vejo com dificuldade que tenha iniciado algum que não fosse determinado pelo cronótopo em que me inscreveram - fazer compras, classificar testes, ir à Cinemateca ver o filme de Raffaello Matarazzo, CATENE, estacionar num parque que me cobrou 5,25€ por duas horas... até as lágrimas despoletadas pelo melodrama, sem esquecer este apontamento.

 

25.11.16

Idadismo, o que é?

O que é o idadismo? A palavra existe?Sim, existe como designação de uma atitude discriminatória em relação às pessoas idosas.

No Auditório Camões, a Associação "Cabelos Brancos", criada por duas "jovens" Ana Caçapo e Luísa Pinheiro, promoveu uma "tertúlia" sobre o tema "idadismo", tendo como convidados Bernardo Barata e Carlão, distintos produtores, compositores e músicos. 

Esta atividade, incluída no PAA da Escola Secundária de Camões, visa provocar nos jovens estudantes do ensino secundário uma nova abordagem do processo de envelhecimento.

Através de perguntas dirigidas aos convidados - "Como é que cada um pensa a sua velhice?"; "Já se imaginou velho?"; "A idade limita o exercício da profissão?"; "A vida na estrada contribui para um bom ou mau envelhecimento?" -, a moderadora procurou que a plateia juvenil se questionasse sobre a sua relação com os idosos... e também com a idade, pois parece que, afinal, sempre existe um "antes" e um "depois"... ou ainda será cedo para pensar nisso?

Não querendo deixar, aqui, nenhuma apreciação crítica, registo a boa receção das turmas presentes e, em particular, a colaboração de alguns alunos, recentemente chegados a Portugal, e com entendimentos distintos do nosso modo de encarar o envelhecimento. 

 

24.11.16

Não sei se é do frio...

Não sei se é do frio, mas sempre que o Inverno se anuncia, os burocratas da avaliação regressam.  Querem dar dignidade ao sistema que não se sabe se começa nas escolas e termina nos exames ou, pelo contrário, se os exames condicionam de tal modo o trabalho do professor que este não passa de uma marionete governada por "doutores", editoras, encarregados de educação, sem esquecer o pessoal de cada partido que vai ocupando os salões das fundações, dos institutos, dos ministérios, das secretarias regionais, camarárias e outras que tais...

O professor, à mercê dos interesses do momento, já não faz parte desta narrativa... a não ser que seja tão bestial que, também ele, consiga engrossar a fila dos fregueses que se preparam para dividir entre si o bolo orçamental.

Agora, são os alunos que vão ver alterados os modos de avaliação; amanhã, serão os próprios professores...

E o pior são os patinhos que acreditam que as migalhas lhes vão chegar, quando a lei, há muito, os condenou a não sair do charco... 

 

23.11.16

O étimo

Aluno: - Qual é que é o étimo? Professor: - É sempre o defunto!

E ao defunto não se pede que se mova... Dos filhos, legítimos ou bastardos, já não se pode dizer o mesmo, a não ser que tenham, também eles, ficado pelo caminho.

Ora, digam lá, quem é que quer ser étimo?

«E por en tenh' eu que é mui melhor

de morrer homem mentr' lhi bem for

     Martim Moxa

 

22.11.16

Da variante africana da língua portuguesa

Na questão das variantes da língua portuguesa, começo a interrogar-me se fará sentido ensinar que há uma variante africana, designação tão genérica que pouca informação nos consegue dar sobre o verdadeiro resultado do contacto do português com as línguas locais.

Em territórios extensos e distantes, polvilhados de culturas diferentes, só um estado despótico poderia realizar a homogeneização da expressão dos cidadãos... Como bem sabemos, nem em todos os territórios, tradicionalmente, considerados de expressão portuguesa, há estados, democráticos ou despóticos, capazes de assegurar a escolarização das populações...   

E mesmo que cada estado conseguisse definir uma política da língua, nunca o faria em nome de uma entidade abstrata, no caso a variante africana.

Entretanto, em Portugal, os jovens de 15 / 16 anos, que supostamente dominam a variante europeia, vão confessando, por exemplo, ao ler Ondjaki, que compreendem e falam quotidianamente a língua d' "Os Da Minha Rua"...

O que me deixa a pensar que a distante e polvilhada rua africana desagua cada vez mais nas nossas escolas, europeias e portuguesas, sem ser necessário pisar solo africano. Mas fá-lo num registo muito empobrecedor!

 Quanto à variante brasileira, o melhor é começar a gravar os «papos» nos centros comerciais, nos cabeleireiros, nos bares e nas fachadas dos prédios...

 

21.11.16

Nem sei como explicá-lo

Nem sei como explicá-lo, mas é como se o tempo pudesse ser representado por uma casca espessa, cheia de nós cada vez mais difíceis de interpretar e, em simultâneo, por uma película tão fina que não suporta qualquer enraizamento...

Por mais que se insista que a árvore tem raízes milenares, que é necessário observar o seu crescimento e ramificação, a verdade, mesmo se provisória, é que a folha se move ao sabor da chuva e do vento, à mercê do frio e do calor.

Por um instante, a película parece ganhar consistência, mas rapidamente se perde na confusão dos dias.

Li, há uns minutos, um queixume sobre o ocaso dos amigos, e não pude deixar de pensar que a história de cada vida se assemelha ao curso da folha que já nem o rouxinol ousa cantar.  

 

20.11.16

Impossível, hoje!

«As viagens são consideradas geralmente como sendo uma deslocação no espaço. É pouco. Uma viagem inscreve-se simultaneamente no espaço, no tempo e na hierarquia social.» Claude Lévi Strauss, Tristes Trópicos

A sucessão de lugares, a vertigem do percurso, o tempo insuficiente para encurtar a distância, como se os intervalos nada pudessem contar, apenas dourados estéreis fastidiosos - a viagem...

O espaço só ganhava consistência se houvesse um pouco mais de tempo - raro. Impossível, hoje! E quando espaço e tempo confluíam, isso significava, por um lado, mais folga financeira e, por outro lado, descoberta de desnivelamento social - de desigualdade.

Por aqui, é a bananeira que expõe um cacho de bananas contra a chuva e contra o frio, insistindo numa viagem condenada ao malogro...

Acolá, é a Fundação Calouste Gulbenkian que mostra As Linhas do Tempo que a regem, como se a viagem pudesse ser nossa (1986-1956-2016). A entrada é livre e gratuita!
O difícil é ficar indiferente à riqueza que permite este festim do gosto que inebria e que convida à viagem...

Por mim, hoje, o meu pensamento está com a bananeira...

 

19.11.16

Na praça José Fontana

O projeto assenta em 38 turmas. Hoje, as turmas são 42. O espaço é o mesmo - consequência: as salas vão aumentar de área, podendo, assim, aumentar o número de alunos... ou, pelo contrário, as salas vão diminuir de área, de modo a criar gabinetes de trabalho...

Diz-se que o investimento é de 12 milhões de euros para escorar o edifício, modernizá-lo e, pelos vistos, deitar umas salas abaixo. Ou não será nada disto?

Há uns anos, o investimento era de 20 milhões para escorar o edifício, acrescentá-lo, em pisos e salas. O acréscimo não causava problema, o que incomodou muita gente foi a vintena de plátanos que insistem em florescer nos pátios...

Desconfio que daqui a uns anos, nada disto será problema. O tempo tudo cura!   

 

18.11.16

O Deus deste dia é brasileiro!

Ele quer ajudar você. Comece agora seu relacionamento com Deus. Para que diacho fui eu colocar-me "entre ruínas"?

Deus não perdoa! Na sua sapiência infinita, entra por este blogue e provoca-me, acusando-me de não o acolher devidamente - afinal, ele espera que eu lhe solicite ajuda...

Desconfio que o Deus deste dia é brasileiro: os pronomes não enganam (você / seu) ... sem esquecer o "relacionamento".

Pessoalmente, preferia estar numa 'relação' com um Deus que me ajudasse desinteressadamente. Afinal, não sou eu que o impeço de cumprir a sua missão.

 

17.11.16

Por entre ruínas

«A verdade é sempre provisória.» José Fernandes Fafe, A colonização portuguesa e a emergência do Brasil, Círculo de Leitores, Temas e Debates, 2010.

Se a verdade é sempre provisória, o que dizer da mentira? Provavelmente que, com o tempo, o que era certo deixa de o ser.

Talvez tenha sido por isso que inventaram as religiões - a melhor maneira de contrariar a ideia de que a "morte é certa"...

Dizem-me que os Estados Unidos da América prosperaram porque a religião calvinista admitia que o capital seria a chave da redenção do indivíduo...

Dizem-me, também, que o Brasil se atrasou na redenção capitalista, porque a religião católica sempre foi um entrave ao sucesso da pessoa, porque esta vivia vigiada pelo dogma de fonte divina... isto é, romana...

Por mim, que nada sei, espanta-me que, em 2017, Estados Unidos e Brasil possam vir a viver em convulsão permanente, como parecem anunciar os apelos à guarda pretoriana.

E nós, por aqui, na boca do túnel, por entre ruínas...

 

16.11.16

Os professores bestiais são raros!

«Basta que (...) para que, nas carteiras, os olhos adquiram outro brilho e o silêncio se torne explicitamente natural e fecundo.» Mário Dionísio

Já não basta que o professor se afaste do conteúdo a memorizar ou da resposta a dar!

Logo que as raízes procure explicitar, a interrupção é inevitável, " mas isso é história", "mas isso é português antigo ou nem isso - latim, talvez!".

Logo que procure explicar que o nome próprio contém uma história por descobrir, uma responsabilidade acrescida, um sentido de pertença a não alienar, o silêncio que nunca chegou a ser desfaz-se em grunhidos e em sorrisos gulosos...

Logo que pressinta que tem de voltar a explicar que a comparação são dois termos em que a substância do segundo serve para dar conta da bestialidade do primeiro, alvoroçam-se as mochilas e vão à sua vidinha.

Para tudo há uma explicação: - os professores bestiais são raros!

 

15.11.16

Nos 100 anos de Mário Dionísio

Para que não se construa o futuro sem memória! Nos 100 anos de Mário Dionísio, exposição cedida pela Casa da Achada.

Esta exposição pode ser visitada até ao dia 24 de Novembro nas Caves da Escola Secundária de Camões.

 

 

 

14.11.16

Os campos de jogos

Abandonados há anos, os campos de jogos tiveram um custo. Qual? Ninguém quer saber.

Desaproveitados há anos, os jovens não podem exercitar-se ao ar livre, o que também tem um custo. Qual? Pouco interessa se a Higiene e Saúde são descuradas!

Ao longo dos tempos foram identificadas as razões para tal abandono. Não sei se hoje ainda são as mesmas, a verdade é que os arbustos ocupam, imperturbados, os campos de jogos... e os responsáveis dormem, também eles, o sono dos justos.

Com o decorrer dos dias, o assunto vai caindo no esquecimento, e a natureza agradece!

 

13.11.16

Breve

Não gosto do título "Carta aberta ao Marcelo" do Diretor do DN, Paulo Baldaia! (DN, 13.11.2016)

Embora no artigo, Paulo Baldaia se dirija sempre ao Exmo. Senhor Presidente, a familiaridade do título banaliza a função do presidente da República portuguesa...

Talvez Paulo Baldaia se tenha deixado arrastar pela imagem do presidente da República a estender roupa para as televisões na Cova da Moura...

Neste caso, Paulo Baldaia transforma o DN num jornaleco. Ao Diretor do DN exige-se mais decência.

 

12.11.16

Por uma escola decente!

Não sei se o senhor ministro da educação faz ideia do nível de língua dominante nas escolas portuguesas. Nem sei se tal preocupação existe... A verdade é que surgem todos os dias testemunhos da pobreza linguística em que a comunidade escolar mergulhou...

A informalidade popular assentou arraiais escorada num único pilar - o calão - linguajar universal tão banalizado que os locutores nem consciência têm do que vão papagueando. De qualquer modo, a promoção do indivíduo (que não da pessoa!) estriba-se na força ilocutória do palavrão...

Já lá vai o tempo em que se defendia uma 'escola participativa'; agora, refere-se muito a 'escola de qualidade'.

Creio, no entanto, que a escola de hoje é o lugar da indecência, da bufonaria... uma escola que aliena, porque favorece o 'indivíduo' em detrimento da 'pessoa'...

Como eu gostaria de estar enganado!

11.11.16

Lição menor

«Envio-vos como ovelhas para o meio dos lobos; sede, pois prudente como as serpentes e simples como as pombas. Tende cuidado com os homens...» São Mateus, Livro II

Embora entenda a mensagem, tenho cada vez mais dificuldade em aplicá-la, pois já não sei como distinguir as serpentes das pombas. Por outro lado, se observarmos de perto, verificaremos que pombas e serpentes se movem pelo interesse que, para simplificarmos, designamos por instinto...

Em conclusão, a prudência também nos pode defraudar.

 

10.11.16

Dispersei-me mais uma vez!

Dispersar: Fazer ir para diferentes partes.

Dispersão biológica: conjunto dos processos que possibilitam a fixação de indivíduos de uma espécie num local diferente daquele onde viviam os progenitores.

Hoje, fui acusado de dispersão!

Lembrei-me, de imediato, do professor e comunicador Vitorino Nemésio. Não podendo ombrear com tal referência da cultura lusófona, pus-me a pensar se a acusação não teria origem numa qualquer doença do espírito... Consultei três dicionários, um de Filosofia, outro de Psicologia e, finalmente, um de Psicanálise. Nenhum deles aborda a "dispersão" como doença mental...

Insatisfeito, ainda pensei nas recentes neurociências, mas sem resultado... até que dei comigo a magicar nos processos migratórios e, em particular, nos degredos a que foram condenados milhões de homens, mulheres e crianças na Alemanha, na URSS e na China, só para me situar no séc. XX.

Neste momento, dou conta que já entrei em dispersão, embora sem vítimas, penso...

Não sei se desista, porém, apercebo-me de que a acusação é a expressão do desprezo absoluto do que de positivo e de negativo a História oferece - um desprezo gerado pelo sistema de ensino que, alguns, ainda designam por 'sistema educativo'.

Sem saberem, os acusadores acusaram-me de os 'querer fazer sair' do habitat em que se sentem confortáveis - a caverna da alegoria.de Platão. A minha luz está a apontar-me o dedo " não digas nada, esquece Platão, a caverna, e nunca pronuncies a palavra 'alegoria'... limita-te ao Pavlov, mas nunca o cites".

Peço desculpa! Dispersei-me mais uma vez. Vou regressar à caverna... E acabar com as hiperligações!

 

9.11.16

A consequência

«Quem semeia ventos, colhe tempestades.» provérbio

Acordei cedo e esbarrei na incerteza. No entanto, o resultado já não oferecia dúvida.

E pensei: - O que é que irei dizer aos meus jovens alunos sobre o futuro determinado por estas eleições americanas?

De súbito, o provérbio esclareceu-me a resposta. Donald Trump abateu-se sobre todos nós como uma tempestade. Esta, porém, mais não é do que a consequência. De nada serve querer, agora, exorcizá-la.  

Porquê?

Porque não há consequência sem causa, ou seja, o problema foi criado por todos aqueles que, nas últimas décadas, soltaram os ventos da desigualdade e da iliteracia... (as dinastias, as oligarquias, as plutocracias...)

Por enquanto, vou esperar que depois da tempestade surja a bonança... e que não seja necessário elevar uma forca em cada praça...

 

8.11.16

As eleições nos Estados Unidos

A imprudência é um comportamento que, creio, deve ser imputado à ignorância. Ora, nos países mais ricos, dominados pelas elites mais esclarecidas, servidos por tecnologias de ponta e por armamento cada vez mais sofisticado e destruidor, há cada vez mais pobres cujo acesso à escola não vai além dos rudimentos necessários à sua identificação.

Identificação que não identidade! Estes ostracizados têm em comum o desprezo absoluto pelo cosmopolitismo e pelo liberalismo, pois este encontrou meios de os marginalizar, amputando a liberdade a todos prometida...  Liberdade, em termos de sucesso individual no seio da comunidade, apenas reservada aos acumuladores de riqueza.

Aquilo a que estamos a assistir nos Estados Unidos é à destruição da democracia através da subversão total do conceito de liberdade.

Depois do acentuar das desigualdades, do colapso das doutrinas da fraternidade, laicas ou religiosas, entrámos num tempo em que, através do voto, a imprudência pode tornar-se um instrumento de terror e de caos.

A questão já não está em saber quem ganha as eleições, mas em perceber se a partir de amanhã restará de pé algum pilar do sistema democrático. Ou seja, se não iremos assistir ao enterro dos pais fundadores.

 

 

7.11.16

Da imprudência

«Na sociedade estado-unidense reina a liberdade de culto e não há religião de Estado. Porém, com os que não professam nenhuma religião essa tolerância diminui. Porque a sociedade é fundamentalmente e esmagadoramente religiosa (desta ou daquela Igreja, desta ou daquela seita). Daí que, se um negro pode ser presidente dos Estados Unidos, um ateu ou um agnóstico... pomos dúvidas.»  José Fernandes Fafe (2010), A Colonização Portuguesa e a Emergência do Brasil, pág. 63, Temas e Debates / Círculo de Leitores.

Se, amanhã, Donald Trump ganhar as eleições, as fronteiras elevar-se-ão no interior da União. O grande império americano acabará, à semelhança do que aconteceu com a URSS.

E nós, ficaremos à mercê dos ventos da discórdia...

Por hoje, resta-me a esperança de que José Fernandes Fafe tenha razão, pois não conheço o Deus de Trump, embora pressinta que os fundamentalismos o sirvam fielmente.

 

6.11.16

O pai foi em viagem de negócios

Emir Kusturica nasceu a 24 de novembro de 1954, já no final do período informbiro (1948-1955), tempo em que Tito rompeu com Estaline. A palavra informbiro designa o modo pelo qual os Jugoslavos se referiam ao Cominform, uma abreviação para "Secretariado de Informações".

É dessa época que Kusturica extrai o argumento do filme "Otac na Sluzbenom Putu" (O pai foi em viagem de negócios), realizado em 1985.

Quem nos conta a história é o pequeno Malik que, de início, acredita que a ausência do pai se deve a negócios, mas que, com o tempo, perceberá que a razão é outra. O pai, apesar de deportado pela polícia política, foi vítima de cupidez.

Malik conta-nos, assim, a odisseia da família num cenário político de traição e convenção, em que o dinheiro acabará por ser o único valor.

 

5.11.16

Afinal, eu não sou geek!

Chamada de “Davos para Geeks”, a Web Summit realiza-se entre 7 e 10 de novembro no MEO Arena e Feira Internacional de Lisboa (FIL), e traz consigo vários eventos paralelos que juntarão os mais institucionais e os mais informais, em momentos de discussão, mas também de descontração, como a Night Summit e os Pub Crawls ou a Surf Summit, que arranca hoje na Ericeira.

Os bilhetes para a Web Summit custavam 900 euros cada um. Para jovens entre 16 e 23 anos, a organização vendeu ainda milhares de bilhetes promocionais a nove euros.

Afinal, eu não sou 'geek'! Estou fora do padrão de peculiaridade ou de excentricidade que carateriza estas 'pessoas'. Tenho bem mais de 23 anos e o que ganho não me permite adquirir um bilhete por 900 euros para este evento... Provavelmente, esta minha ausência acabará por significar que eu sou qualquer coisa como 'uma não pessoa', fazendo, desde já, parte da 'peste grisalha', que não merece qualquer respeito... até porque na Web Summit pouco restará da língua portuguesa.

Há, no entanto, algo que eu posso assegurar é que, de 7 a 10 de novembro, ninguém me apanha no Parque das Nações...  

Geek (pronúncia no IPA: [ˈgiːk]) é um anglicismo e uma gíria inglesa que se refere a pessoas peculiares ou excêntricas, fãs de tecnologia, eletrônica, jogos.

 

4.11.16

Ser diretivo

Depois de tanto tempo a desconstruir, decidi que, doravante, serei muito mais diretivo...

O que é que isto significa? É simples! A construção do 'novo' círculo esgotou-se - a liberdade extravasou de tal modo que a comunicação definhou...

O anseio voltou a ser de clausura - eliminação da razão e aposta em tarefas que matem qualquer tempo de partilha construtiva...

É como se a consciência se tivesse esfumado ou a ciência tivesse perdido o sentido da sua edificação.

Ser diretivo é levar a cabo um processo de robotização.

 

3.11.16

Operação Zeus

Vivir a la ocasión. El governar, el discurrir, todo ha de ser al caso. Querer quando se puede, que la sazón y el tiempo a nadie aguardan. Baltasar GracianOráculo manual y arte de prudencia.

Tudo leva a crer que chegámos a um ponto em que a ocasião faz o ladrão. Não há dia em que não decorra uma investigação a crimes de corrupção ativa e passiva. Desta vez, está em curso 'a operação Zeus'. Pobre Zeus!

Lá vai o tempo em que a honestidade (a honra) determinava os limites à ação humana, exigindo uma resposta rápida e adequada a cada situação, e na medida do saber e do poder de cada indivíduo.

Desprezados o saber e a honestidade, cada um deita a mão ao que pode, uns de forma discreta, outros à tripa forra.

2.11.16

A circunstancia

Hay a veces entre un hombre y otro casi otra tanta distancia como entre el hombre y la bestia, si no en la substancia, en la circunstancia; si no en la vitalidad, en el ejercicio de ella. Gracián, Baltasar: El discreto

A diferença não se encontra na substância, mas, sim, na circunstância. Um ditador na Venezuela, na Guiné Equatorial, na Turquia, na Síria, na Coreia do Norte, na Rússia ou a caminho da Casa Branca, não se distingue, em substância, dos condenados à morte, ao desemprego, à pobreza - à miséria, tout court.

De facto, é a circunstância que permite que uns tantos se apropriem do poder - não interessa, aqui, a sua natureza - para esmagar as restantes criaturas... E a circunstância, como se sabe, é feita de espaço e de tempo de que o ditador se vai apropriando para melhor gerir a sua bestialidade, apesar de, neste caso, a propriedade nada dever a quem carrega o peso da falta de alma...

 

31.10.16

Os Frutos da Terra, de Knut Hamsun

Embora haja quem o considere o autor europeu mais influente em 1920, ano em que lhe foi atribuído o prémio Nobel de Literatura, a verdade é que, até esta data, eu nunca lera nada do norueguês Knut Hamsun (1859-1952).

Acabo de ler Os Frutos da Terra (1917), romance que me foi oferecido com uma menção que me deixou perplexo - esta narrativa corresponderia ao meu rosto... Li-o, assim, na perspetiva do margrave Isak, o colono que ousou desbravar terras norueguesas inóspitas próximas da Suécia...

Esclareça-se desde já que desconhecia por inteiro o termo "margrave" e, sobretudo, que significa "título dado outrora aos príncipes soberanos de certos estados fronteiriços da Alemanha." Quanto ao título, não vejo razão para que alguém me considere "margrave", apesar de, por vezes, me sentir posto à margem, e não senhor da "margem", relembrando, agora, que um dia distante, Maria de Lurdes Pintasilgo me terá dito que toda a margem tem um centro...

De qualquer modo, li as 382 páginas em muito pouco tempo, pois a narração é suficientemente diversificada para, a partir de um núcleo - Sellanraa - se dispersar por vários caminhos que põem diante do leitor: a apologia da sociedade agrícola, a fraqueza do dinheiro, a precariedade da vida urbana e principalmente dos valores em que esta assenta, sem esquecer a fogosidade da mulher, capaz de incensar o companheiro, mas também de o desprezar e de matar os próprios filhos...

O romance termina com a vitória do modelo rural sobre a modernidade, abrindo caminho a um certo de tipo de sociedade patriarcal que tantos estragos viria a provocar na primeira metade do século XX... o que, talvez, explique a simpatia de Knut Hamsun pelo regime nazi...

Enfim, apesar de publicado em 1917, não encontrei qualquer referência à Primeira Grande Guerra. Explosões só as resultantes da extração de azurite - pedra ideal para eliminar os obstáculos que se nos atravessam na vida.

 

30.10.16

Uma alfarrobeira!

Uma alfarrobeira! Esta situa-se na Portela.

Há anos que a observo, um pouco surpreendido, pois não vislumbro outra por perto...

O nome árabe começou por designar "vagem", depois o povo encarregou-se de misturar as línguas, por um processo bem simples... Se a árvore se distinguia pela suas vagens, nada impedia que com um prefixo árabe e um sufixo comum "eira", o compósito designasse o todo.  Nada que eu não descubra em mim próprio: nascido com algum "cabelo", logo houve quem lhe acrescentasse o sufixo "eira". Esqueceram-se, no entanto, do prefixo "al", provavelmente porque a Inquisição andava mais ocupada em acabar com os judeus...

Nada disto fará sentido. Todavia, um destes dias, a alfarrobeira interpelou-me: o cheiro que ela libertava era tão intenso que, de súbito, me ocorreu que na minha aldeia (terra de figueiras) também terá existido uma alfarrobeira... e ao cheiro associei um sabor adocicado. Só não sei onde é que crescia tal alfarrobeira! Talvez no adro da capela de Nossa Senhora da Luz!  

 

29.10.16

Da Biblioteca Nacional ao Centro Comercial Vasco da Gama

Durante a manhã, entrei na Biblioteca Nacional, em Lisboa. O objetivo era ver a exposição sobre Vergílio Ferreira, nascido em 1916. Situada na "sala de referência", a exposição ocupa uma parede, não toda, porque ainda há espaço para expor o acervo traduzido de Bob Dylan, recente prémio nobel da literatura, que Vergílio bem gostaria de ter recebido... De tudo o que observei, fica-me na retina a letra miudinha do autor, homem certamente tímido e introvertido. E também a máquina fotográfica, ferramenta imprescindível ao "realismo" do escritor...

O espaço silencioso daquela sala convida a que se revisite os catálogos e por entre eles acabei por descobrir o Cancioneiro Geral de Garcia de Resende (1516), com inevitável alusão ao Prólogo, mas o que, desta vez, despertou a minha atenção foi o volumoso in-fólio inquisitorial, onde o Censor dá prova de atenta leitura, ao apontar de forma minuciosa as passagens que teriam de ser cortadas.

Sem querer referir todas as pequenas "celebrações", convém, no entanto, não perder a exposição Da Feliz Lusitânia à Felix Belém.

Em síntese, talvez por ser sábado, fiquei com a sensação de que a BN já terá sido um lugar mais procurado - havia 10 leitores na Sala de Leitura Principal.

 

Durante a tarde, desloquei-me ao Centro Comercial Vasco da Gama. O bulício era tal que cheguei a pensar que o Natal estaria à porta.

 

28.10.16

Na morte

Na morte, aplaudimos.

Selecionamos os lugares, as ações, os acontecimentos em que tudo foi harmonia, entrega, paixão e amor ao próximo.

Na morte, somos filhos do único deus que nos concebeu sem mácula, que proibiu as fraquezas...

Na morte, estamos todos de acordo. Em vida, a inveja cega. O interesse esmaga. A vaidade despreza...

Na morte, batemos palmas. Não se sabe é a quem...

 

27.10.16

O problema de José Sócrates

Mas o que torna uma liderança carismática? Sócrates responde. “As lideranças carismáticas são, muitas vezes, um produto das crises. As pessoas revelam-se nessas alturas de crise. O carisma é sempre algo de excecional, de fora do comum. O maior inimigo do carisma é a rotina”. Em entrevista à TVI

Carisma. S.m. 1. Força divina conferida a uma pessoa, mas em vista da necessidade ou utilidade da comunidade religiosa. 2. Epilepsia (v. carismático*). 3. Atribuição a outrem de qualidades especiais de liderança, derivadas de sanção divina, mágica, diabólica, ou apenas de individualidade excecional. 4. O conjunto dessas qualidades.

José Sócrates tudo faz para vender o novo livro, escrito a quatro, seis mãos... Ataca agora António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa porque lhes falta CARISMA. Ainda bem!

Ele, sim, é um líder carismático porque soube enfrentar a crise. Será que alguém duvida do seu contributo para a solução dos problemas dos portugueses? Ele está convencido de que é nos momentos de crise que se revelam os líderes carismáticos. Eu também, acredito que a liderança pode afirmar-se nessa situação.

Só que dispenso o "carisma", pois se há alguém que se tornou «popular» e "célebre" durante e após a crise foi ele, José Sócrates. E porquê? Porque lhe faltou a necessária educação para destrinçar o que é do interesse público do que é do interesse pessoal... e seus amigos.

O problema de José Sócrates é um problema axiológico. E já é tarde para aprender que nem todos os meios justificam os fins. Dir-se-á que Sócrates nunca leu Maquiavel ou, pior, não sabe lê-lo! 

 

26.10.16

Só vejo deseducação...

«In rem omnem diligentia.» Cíc. Fam.

HiperatividadeDéficit de atenção. Estes conceitos dominam o discurso de pedagogos, psicólogos, pais e docentes. Tempos houve que bastava a noção de desatençãoDispersão.

Avesso a modas, fui observando os comportamentos e dei conta de que a indisciplina se ia instalando - primeiro combateu-se a disciplina do Estado Novo, e, mais tarde, a vontade democrática passou a ordenar...

Entretanto, com a instalação do pântano democrático e o consequente desmoronamento dos valores, a hiperatividade e o déficit de atenção instalaram-se...

Quanto mim, só vejo deseducação. Os Antigos bem sabiam que o sucesso só estava ao alcance de quem se concentrava totalmente no objetivo.

 

25.10.16

A arte e a bestialidade humana

Conhecer o território? Compreender as migrações, forçadas ou não, e o seu contributo para a dignificação, por exemplo, da mulher nas cortes do nordeste peninsular? Perceber que a cortesia (o amor cortês) foi essencial para a elevação da condição feminina na Idade Média pouca interessa...

Afinal, em termos civilizacionais, a arte parece ser pouco mais do que um ato gratuito, fruto da ociosidade de alguns, privilegiados, ou um serviço prestado a um mecenas, ávido de glória terrena e de reconhecimento eterno.

E mesmo que assim fosse, a boçalidade reinante é tão impulsiva que falta o tempo para olhar o passado como lugar e tempo de aprendizagem... Porém, sobra tempo para dar expressão a tudo aquilo que a Arte, desde sempre, procurou combater: a bestialidade humana.

(Este apontamento assinala os hiatos em que a voz se cala para ouvir as verdades babélicas que crescem sem qualquer freio... Se as deixarmos à solta, a Torre acabará por ruir.)

 

 

 

24.10.16

Das palavras, hoje

Umas são caras, outras raras, sem esquecer as feias - as palavras.

Hoje, aprendi que "discípulo" é uma palavra feia.

Ontem, descobri que há palavras inefáveis, de tão raras. Por exemplo, "polissénantica"!

Há dois dias, soube que 'obsceno' é o termo adequado ao nível lexical da "oratória".

Há até palavras que mudam de fatiota de acordo com a essência do locutor: "incenscial", "icensial", "incensial"

- Que tal vai a mixórdia? Numa versão de última hora: - Que tal vai a "michórdia"?

 

23.10.16

No museu de Cerâmica de Sacavém

Por mais que o queiramos ignorar, a verdade é que envelhecemos, o que não quer dizer que o tempo passe e, sobretudo, que tudo possa desculpar, em particular, a mistificação.

No Museu de Cerâmica de Sacavém, duas exposições a não perder: uma sobre os móveis OLAIO, empresa que não conseguiu sobreviver aos ventos democráticos; outra sobre a Fábrica de Loiça de Sacavém, definitivamente perdida, no dia em que as FP25 assassinaram o administrador, Diamantino Bernardo Monteiro Pereira. 

A visita a estas duas exposições é um bom testemunho do que aconteceu em Portugal com o desmantelamento de muitas empresas, apesar do slogan de Abril SACAVÉM EM LIBERDADE É OUTRA LOIÇA!... 

 

22.10.16

Woody Allen, 2016

Novo filme, bem realizado, simpático, com os temas de sempre, embora com um ajuste de contas entre Hollywood e Nova Iorque. Os judeus noviorquinos, para o bem e para o mal, superam a artificialidade hollywoodesca.

Claro que há outras contas por ajustar entre o judaísmo e o cristianismo, entre a identidade e a alteridade...

E, principalmente, na música e nos amores, o que predomina é a autorreferencialidade, mesmo que o realizador já tenha dobrado os 80 anos...

Quanto ao público, na maioria, idoso, continua a rir, como sempre... Por vezes, parece que ri de si próprio.  

 

 

21.10.16

Sibilas ressabiadas

"Vem aí mau tempo. Inundações e cheias nos próximos dias" - diz a notícia... que prevê. Outrora, a notícia informava.

E nós, indiferentes ao oráculo! E nós, desconfiados do oráculo, pois este só anuncia a catástrofe quando pode tirar proveito ou, pelo menos, tomar partido...

No que me concerne, detesto a astrologia, sobretudo, porque ela passou a ditar os acontecimentos que bem podiam ser diferentes se não lhes dessemos tanta atenção.

As notícias são cada vez mais promessas de sibilas ressabiadas. A comunicação social está pejada dessa espécie satânica, e o mal que provoca é incalculável...

 

20.10.16

Viva a Propaganda!

Mário Draghi: «...são necessárias reformas ambiciosas e o governo português sabe disso

Há anos que, por esta altura, surge este estribilho. É o momento em que se apresenta e debate o OGE.

Mudam os Governos e o estribilho regressa. O que me intriga é que ninguém explicita quais são as reformas adequadas ao país... e na verdade, nos últimos anos, não foi feita qualquer reforma, a não ser cortar nas reformas e.… adiar as reformas... 

O resto é propaganda! Finge-se que se repõem vencimentos e reformas, mas não é possível repor o que se perdeu ou o que se não progrediu, até porque, em simultâneo, as taxas e as multas multiplicam-se... O que diminuiu foi o consumo, embora se persista em insistir no contrário. Entretanto, em finais de 2016, seremos menos 0,4%!

PS. Reposto o vencimento de 2011, aplicadas as deduções referentes à ADSE, CGA e IRS, acabo de verificar que em 2011passei a receber menos. Viva a Propaganda!

 

19.10.16

Riem em coro...

Eles não sabem, nem sei se algum dia chegarão a saber, mas deste modo não irão a lado nenhum... O esforço é mínimo, a convicção máxima; já pouco lhes resta por aprender.

Provavelmente, argumentarão que já não há onde ir, e que eu há muito o devia saber - o país já foi; resta uma múmia para turista visitar.

Entretanto, riem em coro, não sabendo porquê, talvez do que 'acham' ver: ninguém pensa, imagina, estima, acredita, crê... apenas 'acha', e 'acham' a todas as horas, em todos os lugares, independentemente da situação, porque estas são todas iguais, as situações...

Alinhados, lembram-me os periquitos de colar, uma espécie exótica que esvoaça ruidosamente sempre que um espectro se move na copa dos plátanos...

O que parece gratuito e absurdo é, afinal, consistente e lógico!

 

18.10.16

E eu nada posso!

Agora que a persiana voltou a subir, a luz dilui-se na fachada, e, por cima do prédio, as nuvens cinzentas imobilizam-se numa promessa ambígua, apesar do braço do Tejo, sequioso, serpentear o verde aluvião resultante do desleixo humano...

A fachada divide-se, agora, em duas, e no topo, a luz torna-se mais solar; por seu turno, o rio escurece à espera de que a nuvem cumpra o seu destino.

Os olhos distraem-se da atenção do dia - ruas cheias de manjedouras, intermináveis filas de carros, leituras cruzadas na sala de aula -, perscrutando quatro parabólicas de antanho, esquecidas ou que, talvez, esperem captar um qualquer sinal extraterrestre...

Entretanto, a luz continua a subir a fachada, deixando as persianas na sombra... as nuvens estão, agora, numa fase de diluimento, alongando a toalha, ambígua, sobre o Tejo, à esquerda...

E eu nada posso! 

 

17.10.16

O gesto absurdo

É quase noite! Ou melhor, a luz solar vai diminuindo... de súbito, quando decidira verificar se a luz artificial se anunciava, a persiana baixou, indiferente ao desejo, absurdo.

Segundos antes, pensara que aos leitores só interessam as primeiras palavras, e não querendo ceder à gulodice, caio na dúvida se o sentido ainda existe, absurdo.

Nesse intervalo, relembro o gesto, absurdo, em plena rotunda do relógio - abro a porta, verifico se o cinto ficara preso, ou talvez a aba do casaco, azul às riscas, vinte anos, vestido pela primeira vez na defesa de uma leitura imagológica, absurda como o tempo se encarregou de provar... afinal, a senhora, a mando do marido, queria saber para que lado ficava o aeroporto.

Do outro lado da rotunda, ainda avistei uma interminável fila de taxistas da semana anterior, absurda - só eu é que a via; o casal não queria saber da luta, só queria as chegadas ou, melhor ainda, as partidas...

Se a alvorada fosse minha, teria partido em vez de ficar a pensar no gesto absurdo, pois o que a senhora queria de mim era que eu baixasse o vidro naquele semáforo que, entretanto, passara a verde, indiferente ao casaco absurdo que um dia fora comprado para celebrar uma iniciação absurda...

Se o leitor chegasse ao absurdo do dia que anoitece, cerraria as pálpebras e, no absurdo, ficaria até que o semáforo se esfumasse.

  

16.10.16

Costureira, me confesso

Se cada ano fosse apenas um dia, estaria, hoje, a iniciar o sexagésimo segundo dia - um trilho cuja duração não parece ter sido definida à partida, isto contrariando o Diderot, para quem tudo estado está escrito "lá-haut, dans le grand rouleau"... Claro que este dia incluiria a noite, a grande mistificadora...

Às voltas com um PC que, a cada passo, interrompe a elaboração de um qualquer teste, porque lhe apetece ou porque entende que eu, hoje, deveria entrar em modo de pausa... concentro-me numa afirmação, para mim, inesperada de Claude Lévi-Strauss e relembro o Sartre e, em particular, o Vergílio Ferreira:

«Quanto à corrente de pensamento que iria expandir-se com o existencialismo, parecia-me que representava o contrário de uma reflexão válida em virtude da complacência que demonstrava relativamente às ilusões da subjetividade. Essa promoção das preocupações pessoais à dignidade de problemas filosóficos implica um risco de desembocar numa espécie de metafísica para costureiras...»

                             Claude Lévi-Strauss, Os Tristes Trópicos.

A verdade é que, não sendo capaz de formular um problema filosófico em que eu não participe, me vejo, ao sexagésimo segundo dia, incapaz de vislumbrar o fim do trilho, caindo, assim, numa abordagem própria de uma exemplar costureira que só dá a obra por terminada quando o fio se quebra...

 

15.10.16

Até amanhã!

Depois da estranheza do prémio nobel de literatura atribuído a Bob Dylan, da morte de José Lello, da apresentação do orçamento recheado de "toma e tira" para que o poder não lhes fuja... exposição de orquídeas na Estufa Fria (só até amanhã!), e assim como quem não quer saber do que se está a passar em Alepo, uma hora e quarenta e seis minutos na Sala Manoel de Oliveira - 17ª Festa do Cinema Francês - também só até amanhã!

"Les Malheurs de Sophie" (ou Les Désastres de Sophie?), uma comédia dramática, por vezes hilariante, mas um pouco violenta para crianças de seis ou sete anos. Bien sûr, a culpa é da madrasta! Eu acabei por sair cansado...

Até amanhã!

 

 

14.10.16

O 'menino de ouro' está mais pobre

José Lello, o socialista amigo

 «Em 1979 fui candidato à Assembleia, mas não quis ser deputado...» Porquê? «Ganhava-se mal. 48 contos ou isso. Eu tinha comprado casa, estava a ganhar dinheiro no privado.»

«Sempre estive nas minorias, mas nem por isso deixei de ter cargos relevantes. Mas é nessa altura, estava o Ferro na liderança, que começamos a fazer a campanha do Sócrates. E ele não queria; era do secretariado do Ferro... Estamos na altura do Durão Barroso, fazíamos uns jantares, começou-se a colocar coisas na imprensa... E ele ficava furioso, achava que era uma coisa indelicada. Mas nós não tínhamos nada a ver com isso, éramos claramente contra o Ferro.» 

«Era um grupo forte e onde estava o Serrasqueiro, o Renato Sampaio. O Costa também vinha aos nossos jantares. O Pina Moura. Foi aí que surgiu o "menino de ouro"... E, de repente, o Santana cai e o Ferro demite-se. (...) E pronto, ele apareceu, nós já tínhamos feito o levantamento das federações todas - é assim que se trata da mercearia partidária. E ele ganhou claramente as eleições.» (Transcrições da entrevista dada por José Lello ao jornal i, 19 de setembro de 2015)

Em 19.09.2015, postei, neste blogue, um pequeno comentário sobre "o socialista amigo". Acabo de saber que faleceu, o que confirma que, em questões de vida e de morte, a mercearia partidária nada pode. Paz à sua alma!

Entretanto, logo, pela manhã, ouvi na rádio que o 'menino de ouro' vai publicar novo livro, baseado na 'sua' dissertação de doutoramento sobre o CARISMA.

Na dúvida, fui consultar o Médio Dicionário Aurélio que transcrevo:

 Carisma. S.m. 1. Força divina conferida a uma pessoa, mas em vista da necessidade ou utilidade da comunidade religiosa. 2. Epilepsia (v. carismático*). 3. Atribuição a outrem de qualidades especiais de liderança, derivadas de sanção divina, mágica, diabólica, ou apenas de individualidade excecional. 4. O conjunto dessas qualidades.

Outrora, se um condenado à morte sofria um ataque epilético, recebia o perdão, por acreditar-se ter sido visitado pela graça divina. 

Em síntese, o "menino de ouro" está mais pobre, porque partiu um dos amigos que mais contribuiu para que o engenheiro acreditasse que era fruto de sanção divina, no caso, redentora... ou que tinha sido escolhido pelo Supremo Arquiteto para tal missão...

13.10.16

Não vou louvar nem deplorar

O Bob Dylan ganha o Prémio Nobel da Literatura! Pois é, não vou louvar nem deplorar. É um pouco tarde para o fazer...Registo. Para mim, é quanto basta!

A Literatura é uma casa muita antiga que, de verdade, abarca quase tudo. E no início, as palavras preenchiam os ritmos e davam voz ao que os corpos não conseguiam expressar e, sobretudo, eram as âncoras da memória...

Sem a palavra da canção, os ritmos iniciais teriam desaparecido com os corpos. A Literatura consagra essa relação.

Quanto ao Prémio Nobel da Literatura, não sei.

 

12.10.16

Divulgação em linha de dados pessoais pelas escolas

A Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) condena numa deliberação recente o que considera ser “uma prática generalizada” de divulgar dados pessoais dos alunos nos sites das escolas, como as pautas com as classificações, imagens dos menores e os horários letivos. E alerta para os riscos que esta publicação traz para essas crianças e jovens, nomeadamente para a sua segurança.

Com base no princípio da confiança, escarrapachamos cada vez mais informação nos sítios das escolas e, particularmente, em bases de dados que, em teoria, visam acelerar a comunicação, como, por exemplo, com 'programas' que gerem a vida académica dos alunos...

Para além de colocarem em linha a fotografia de cada aluno, a respetiva avaliação, a constituição das turmas, as faltas, o calendário de testes e as atividades extracurriculares, estas bases de dados identificam os alunos com necessidades educativas especiais, abrangidos pela Ação Social Escolar... e outros apoios educativos solicitados pelos professores...

Vivendo numa sociedade que prefere a devassa à discrição, o melhor é aplicar as recomendações da Comissão Nacional de Dados... antes que seja tarde!

 

11.10.16

"À la esquerda"

Não há ninguém que explique à senhora Cristas que aquela expressão que ela vai repetindo... "temos uma austeridade à la esquerda" soa bastante mal e não funciona como slogan político.

A senhora é mãe de filhos e como tal não lhes devia servir maus exemplos linguísticos. No colégio, as crianças marcharão "à la esquerda", o que é pouco habitual no ensino privado em Portugal... Discriminados, os petizes acabarão por ter dificuldades de adaptação e um fraco domínio da língua materna, hipotecando o seu futuro e o da mátria, como diria a Natália Correia.

 

 

10.10.16

Estou a sentir-me bloqueado

Acabei de passar na segunda circular, mesmo ao lado da rotunda do relógio. Na primeira, o trânsito fluía; na segunda, tudo atafulhado.

Cheios de "razão", os taxistas bloqueiam os acessos ao aeroporto e asseguram estar preparados para acampar por ali, comendo uma sopinha e um franguinho assado... De álcool, ninguém fala!

Os turistas (e não só!) lá vão arrastando as malas; uns procuram chegar ao avião; outros, procuram a cidade, pensando que os hotéis ficam perto...

A causa parece estar na concorrência, invisível e mais económica! Creio, contudo, que o imobilismo é a principal causa...

Como sempre, sobreviverá quem souber adaptar-se às circunstâncias...

Quanto ao Governo, ouvi dizer que o ministro do ambiente estaria envolvido nas negociações. Não percebo porquê, embora isto já cheire bastante mal...

(Amanhã, lá terei de ligar o GPS mental para não me deixar bloquear.)  

 

9.10.16

Os poetas do Al Andaluz

"Se fossemos realistas, saberíamos que a alegria é um luxo e que a tristeza é o estado natural do homem... "

Não sei se "o meu coração é árabe", nem se tal faz algum sentido, o que sei é que o CANTO ONDO soube escolher e musicar belos poemas para contrariar o meu estado de resignação.

No Museu Calouste Gulbenkian, com vista para o núcleo de arte islâmica, o CANTO ONDO trouxe de volta alguma poesia do Al Andaluz português, de que destaco os seguintes versos:

Acaso te deixarás conduzir

pela tristeza até à morte

Enquanto o alaúde tocar

e o vinho fresco

Estão aí à tua espera?

Que as preocupações

não se tornem senhoras

de ti à viva força

Enquanto a taça for

uma espada cintilante

na tua mão.

AL MUTAMID, REI POETA AL ANDALUZ, BEJA, Séc. XI

 

7.10.16

O leitor, a literatura e a política

Como leitor, deixei de obedecer a um plano de leitura.

Agora, estou a ler "Tristes Trópicos", de Claude Lévi-Strauss, uma obra quase da minha idade. Estarei atrasado, mas de nada serve apressar-me, até porque noutros tempos li imensos livros que já esqueci...

De junho para cá, li dois romances de Stendhal, um autor fascinante - Le Rouge et Le Noir e Lucien Leuwen.

Stendhal retrata de forma impiedosa a França dos finais do séc. XVIII e as primeiras décadas do século XIX, sobretudo, a vida na capital e na província - universos distintos - mas conduzidos por um único valor: o dinheiro. Claro que o amor, nas suas múltiplas máscaras, está sempre presente, sobretudo, em Lucien Leuwen, que não escapa às manobras (nem sempre do protagonista) que conduzem à busca de uma melhor posição social e ao enriquecimento...

Todos querem enriquecer! Banqueiros, Ministros, Deputados, Presidentes de Câmara, Prefeitos... e, como tal, tudo fazem para eliminar quem quer que se lhes atravesse no caminho...

Ler Stendhal é conhecer um pouco melhor os bastidores da atual política portuguesa, inscrita no paradigma resultante do 25 de Abril. Bem sei que a ideia não é simpática, mas realistas e republicanos pós-revolução francesa comungavam do mesmo objetivo.

Numa perspetiva de história literária, vale a pena cotejar Stendhal com Almeida Garrett. Nenhum deles tinha ilusões quanto ao sentido da mudança..., pelo menos, para este leitor.

 

6.10.16

Não temos perdão!

Perdão fiscal?

Será efeito da escolha de António Guterres para Secretário-geral das Nações Unidas? Ou antecipação da inevitável amnistia para assinalar a vinda do Papa a Portugal, em 2017, para celebrar os 100 anos das Aparições de Fátima?

Não temos perdão! Como nem Guterres nem o Papa Francisco conseguirão o milagre de nos libertar da dívida, vamos continuar de mão estendida por tempo indeterminado...

5.10.16

O António Guterres que se cuide!

A rapaziada republicana está eufórica!

O pior é que ela acredita que a escolha do António Guterres para Secretário-geral das Nações Unidas foi obra sua...

Eu, por mim, estou convencido que os dois votos de desencorajamento são daqueles países que não compreendem por que motivo os partidos políticos portugueses devem continuar isentos de pagar o IMI.

O António Guterres que se cuide! O número de amigos está a aumentar a olhos vistos, começando pelos bancos da escola...

 

A rapaziada republicana

Definição: estigmatizar - marcar com ferrete, por pena infamante; acoimar, tachar. (Médio Dicionário Aurélio)

A propósito da cobrança de IMI, o republicano Montenegro disse ao DN: "Nós não compreendemos que se queira agora estigmatizar os partidos."

E parece que o cavalheiro anda em boa companhia. Os republicanos PSD, PS e PCP pensam do mesmo modo.

No dia em que se celebra a implantação da República, a rapaziada republicana quer conservar os velhos hábitos do Antigo Regime - de fora, ficam a Igreja, os Partidos, o Estado, as Fundações... 

Afinal, quem é que merece ser acoimado? Decerto, o povo. Esse, sim, continuará a pagar o IMI e todas as taxas que o Governo e o Parlamento bem quiserem, até porque há quem tenha posto a circular que o ministro das Finanças nos vai cobrar mais de 17 mil milhões até 31 de dezembro de 2016. Só para cumprir promessas!

 

4.10.16

Tal como as línguas, o saber é dinâmico

A investigação nas áreas do conhecimento cresceu de tal forma que o saber pressupõe cada vez menos certezas e, principalmente, exige uma abordagem cada vez mais relativizada, porque, apesar da overdose informativa, há sempre dados que escapam ao sábio...

É até questionável se ainda existem sábios, apesar dos governos, por vezes, apostarem em comités de sábios para, supostamente, se aconselharem aos olhos da opinião pública.

Como tal, não faz sentido a memorização de saberes, a não ser que se queira construir um modelo de sociedade (e de conhecimento) assente em dogmas... Claro que é possível (e vantajoso) adquirir certos automatismos, como, por exemplo, exercitar o cálculo mental e interiorizar os jogos de linguagem.

O saber pressupõe o manejo de ferramentas que vão mudando de época para época, mas não se esgota nelas. Surge frequentemente o argumento "de que os portugueses sabem de mais" e que o nosso futuro está na aposta no ensino profissional. Recentemente, um ministro defendeu 50% de cursos profissionais nas escolas portuguesas... Por detrás, habita a ideia de que nos basta memorizar uns tantos saberes sobre nós e os outros, e que o fundamental é lançar mãos à obra.

Ora, no mundo em que vivemos, as obras, velhas ou novas, exigem cada vez mais investigação que alavanque os saberes. Tal como as línguas, o saber é dinâmico. 

 

3.10.16

Sortes distintas para o prevaricador

Asfixiamos! A pressão, em certas épocas do ano, aumenta exponencialmente. Agora é a discussão do orçamento! Agora é o reinício do ano escolar!

Quer-se que o orçamento satisfaça os interesses das clientelas partidárias e, em simultâneo, seja capaz de agregar cada vez mais neófitos. Pouco interessa se há ou não recursos próprios, porque a expectativa vive do financiamento externo e julga razoável que o crédito possa ser ilimitado... e, sobretudo, que a amortização seja adiada indeterminadamente...

Quer-se que a escola seja um espaço acolhedor, com boa comida e festança, sobretudo, muita harmonia. Para tal, gizam-se atividades sem fim, integradoras e transversais, mesmo se os conteúdos essenciais ficam por assimilar por falta de tempo e de monitorização.

Com a pressão a aumentar, as taxas de juro não param de cantar. Só na escola, se a pressão aumenta, a solução é fácil, pois basta um ou dois processos disciplinares, e manda-se o prevaricador bugiar...

 

1.10.16

À sua maneira!

A maioria dos alunos frequenta o 10º ano pela primeira vez.

Solicitei-lhes, à laia de diagnóstico, que escrevessem sobre o tema "As minhas Escolas".

E fizeram-no de forma responsável. Nem todos se lembravam do nome das escolas; outros, preferiram omiti-lo ou terão pensado que essa informação não era relevante...

Até ao momento, já registei o nome de 45 escolas da Grande Lisboa. De algumas, é possível colher dados rigorosos sobre o espaço físico, mas, na maioria, o que, sobretudo, aflora é a avaliação centrada na relação entre alunos, na existência de espaços favoráveis ao divertimento e, por vezes, no clima de bullying que se abatia sobre rapazes e raparigas, sem omitirem que a violência do meio entrava portas dentro e tornava o ambiente muito pesado.

No geral, estes alunos iniciaram o percurso escolar em espaços acanhados, mas simpáticos, para depois transitarem para espaços mais vastos, nem sempre acolhedores. Cada um fez o seu caminho com maior ou menor dificuldade, gratos a funcionários e a professores, mas nem a todos... indo ao ponto de dar conta de situações abusivas da parte dos adultos... Nem todos revelam ter grande consideração pela "escola", mas acabam por reconhecer que sem ela estiveram a hipotecar o futuro. De qualquer modo, ainda não perderam a esperança de serem felizes no presente e no futuro. À sua maneira!

 

30.9.16

A Banca e o Fisco de mãos dadas?

FISCO: parte da administração pública encarregada da definição e cobrança de taxas e impostos.

Só uma mente tresloucada pode imaginar um país governado pela Banca e pelo Fisco.

Quanto aos banqueiros já sabemos do que são capazes...

E quem é que assegura a idoneidade da parte da administração pública encarregada da cobrança?

Por outro lado, este aperto de mão quer afastar a Justiça, porque, apesar da lentidão, ela incomoda políticos e banqueiros e poderia começar a cercar os zelosos cobradores de impostos.

E alguém fica a perder!

Não sei se os olhos nos pregam partidas, embora acredite que sim. Entre saber e acreditar há, no entanto, um espaço enorme que a muitos não causa qualquer perturbação, de tal modo lhes basta crer...

A situação agrava-se, quando sem ver e só por ouvir, fazemos fé no que ouvimos dizer, de tal modo que nos pomos de acordo ou, pelo contrário, divergimos...

O que ouvimos sobre os outros deveria deixar-nos sempre de pé atrás. Afinal, não estivemos lá para confirmar...

E, raramente, estamos. Por vezes, passamos, mas sempre longe... o que vemos mais não é do que uma incidência que utilizamos demasiadamente como prova do que achamos mais conveniente... E alguém fica a perder!

 

29.9.16

Linear...

Alguém lhe chamou "parque linear ribeirinho" no estuário do Tejo. É atravessado por um trilho que conduz a Fátima ou, para os mais ousados, a Santiago de Compostela.

Às 15 horas, não encontro peregrinos; apenas dois pescadores perscrutam as águas turvas, aparentemente sem sucesso... Num banco de jardim, um homem de meia-idade espreguiça-se ao sol. No bar "guarda-rios", um jovem termina a navegação no smartphone, antes de frustrar o cliente de ocasião - afinal, acabaram-se os gelados! Só café, a 80 cêntimos, e sumo de laranja, a 2 euros!

Entro no trilho, levantam-se as libelinhas, azuis, e as águas inclinam-se para Fátima, embora por lá não passem. E no meio do canal (sapal), linear, o que sobra de outra navegação, ainda azul... turquesa, talvez propriedade de uma antiga princesa. 

Palavra da hora que passa

Incongruenteque contém ou apresenta contradições; que se opõe aos padrões e/ou a regras preestabelecidas; sem lógica; contraditório, desconexo ou incoerente.

Se os dias não existem, poderão as horas contar? Não sei, porém elas alongam-se à medida que a incongruência cresce...

Do que tenho observado, perante comportamentos desregulados, pouco podemos fazer. Nem sequer nos é permitido surfar a crista da onda... é vê-la crescer e esperar que ela desfaleça...

Ao contrário dos dias, as horas de incongruência incham a um ponto que nem a rã da fábula alguma vez experimentou.

 

27.9.16

A mentira

O que interessa é o ouro, o brilho, o corte de cabelo, o brinco, o piercing, a tatuagem, a marca, o bronze, a nudez, o milhão ... e mentiras, muitas!

A mentira está de regresso, não porque se tenha voltado a mentir, mas porque a inverdade já não convence.

Agora, ao acaso, a mentira marca o discurso do político, do comentador, do sociólogo, do juiz, do presidente da agremiação ... já não é a criança que mente até porque ela deixou de recear que a mergulhem na casa das cobras...

A mentira é atualmente a arma dos covardes... a arma dos falsários...a arma dos vendidos... a arma dos néscios.

 

26.9.16

Alberto Gonçalves pensa que é bonecreiro

«Ao longo da sua curiosa carreira, o dr. Louçã contou sempre com uma plateia de bonequinhos amestrados que levam a sério os incontáveis disparates que regularmente profere. Se a criatura se alivia de uma mentira pequenina, os bonequinhos acreditam. Se a mentira é grande, os bonequinhos acreditam também.» Alberto Gonçalves (Sociólogo), Mais depressa se apanha o dr. Louçã do que um coxo, DN, 25 de setembro de 2016

Os sublinhados são meus! E revelam o desprezo que o senhor Alberto Gonçalves sente pela esquerda portuguesa.

Não sabia que o excremento já se tornara matéria da Sociologia, mas pelo que vou ouvindo vende bem.

(Deste comentário não se pode inferir que eu concorde com o Doutor Louça ou com certas ideias do Bloco de Esquerda.)

 

25.9.16

Nahed Hattar assassinado

Enquanto o possidónio José António Saraiva alimenta a crónica mundana nos jornais, nas revistas, nos canais de televisão e nas redes sociais, acolitado pelo Passos Coelho, na Jordânia, em Amã, o escritor NAHED HATTAR é assassinado em frente do tribunal em que estava a ser julgado por delito de opinião contra o ISLÃO.

Infelizmente, há cada vez mais quem não queira esperar pela decisão dos tribunais, o que, na Jordânia - país em que 90% da população é sunita -, abona a favor da justiça jordana.

Por cá é o que se vê: a literatura latrinária consegue elevar um autor sem escrúpulos a notícia nacional.

 

24.9.16

Chamar "cão" ao outro...

«...as bases do PS e da JS estão cheias de cães. Para não dizer mesmo alguma 'canzoada' ao estilo de João Araújo.» Não refiro o autor da afirmação, pois odeio o estereótipo.

Chamar "cão" ao outro é um insulto medieval que era resolvido no campo de batalha. Basta ler os cronicões e as crónicas - sem esquecer OS LUSÍADAS - para dar conta do tratamento a que eram submetidos os mouros, os castelhanos, os judeus e os indígenas africanos e asiáticos.

Em pleno século XXI, há quem insista em recorrer à mesma terminologia, apesar da confessada devoção à doutrina do Papa Francisco.

Felizmente, o Papa atual nada tem a ver com o fanatismo medieval. Pena é que os seus seguidores não consigam acompanhá-lo no ecumenismo e, principalmente, na forma impoluta como trata os que discordam da sua doutrina e condena os que insistem na violência...

 

 

23.9.16

De momento

De momento, nem sol nem lua! Até o momento mais não é do que verbal ilusão... e tudo o que vem é infinita repetição...

De qualquer modo, vou ver se o elevador não falha a sua missão...

 

21.9.16

O muro de Calais

À Calais, Londres finance l’édification d’un mur végétalisé en béton haut de 4 mètres et long de 1 kilomètre pour sécuriser la RN16, la nationale qui mène au port et longe la « jungle », le bidonville où vivent 6 900 réfugiés selon la préfecture (plus de 9 000 selon des associations) désireux, dans leur grande majorité, de se rendre au Royaume-Uni.

Le mur, d’un coût de 2,7 millions d’euros, doit également être équipé de caméras de surveillance. Le Monde.fr avec AFP

Desde cedo, o homem aprendeu a edificar cercas. Primeiro, com o argumento de que precisava de se proteger dos animais. Depois, com o argumento de que precisava de se defender dos homens que lhes queriam assaltar a cerca...

De cerca em cerca, o homem chegou à fronteira. Delimitou tudo o que pôde e chamou-lhe seu, mesmo que isso significasse apoderar-se de tudo o que fazia falta ao outro...

Entretanto, para que a memória do outro - animal, mineral, homem - não se perdesse, elevou-lhe museus, estátuas, ciências e bibliotecas, sem se esquecer de os arrumar, segundo o mérito do conquistador, do filantropo... 

Nas prateleiras da memória, os muros são intermináveis - construídos e demolidos - sem qualquer proveito, pois aqueles que se orgulham de ter defendido a liberdade, a fraternidade e a igualdade, são os mesmos que edificam novos muros de betão coberto de musgo...            

             

20.9.16

Os dias não existem

Estou numa fase em que não consigo perceber o que se passa à minha volta. Uns andam ocupados, embora insatisfeitos; outros, andam ocupados sem nada ganhar; outros, andam simplesmente sem nada fazer - não esquecendo os que fingem que andam ocupados, de tal modo que parecem mais cansados do que os restantes...

O problema deve ser meu que me gasto a tentar compreender o curso dos dias, como se eles seguissem algum rumo.

A verdade é que os dias não existem; só o sol e a lua cumprem a rotina de nos obrigar a procurar uma ocupação, sem a qual mais não somos do que areia por desfiar.

19.9.16

O arguido

O advogado estava a ajudar um cliente a resolver um problema corrente, quando a autoridade entrou portas dentro. O objetivo do Ministério Público era apreender documentação que permitisse fundamentar um dos casos de circulação não autorizada de capitais, envolvendo políticos, empresários, entidades bancárias nacionais e estrangeiras...

Feito arguido, o advogado ficou à espera de que o caso fosse deslindado. Até hoje! Já lá vão cinco anos...

Ser arguido, em Portugal, significa ficar limitado, impedido, por exemplo, de se apresentar num qualquer concurso público, de redefinir a vida profissional.

No caso em causa, já houve quem tivesse sido preso e mais tarde posto em liberdade. Sem acusação até à data!

Lembrei-me do arguido, quando esta manhã, por volta das 7 horas, à saída da Portela, me cruzei com um pelotão de agentes musculadamente armados e que cercavam três barracas de ciganos e dois ou três machos... mulas, cavalos, sei lá! Provavelmente procuravam armas, droga ou algum foragido... Ao atravessar o dispositivo policial, pensei será que não corro o risco de ser feito arguido?

Na minha idade, ser arguido já não põe em causa o meu futuro, mas se tivesse apenas 30 anos, como seria? 

 

18.9.16

O psiquiatra

A psiquiatria é a ciência dos sintomas de perturbações invisíveis da mente... Se assim é, porque é que os psiquiatras se limitam a observar (a ouvir) os supostamente afetados?

Creio que o diagnóstico e o tratamento seriam muito mais seguros se estes profissionais do «mistério» se dessem ao trabalho de ouvir a família, os amigos, os colegas de trabalho... isto é, se conhecessem o meio em que o «doente» evolui...

Aflige-me que haja casos em que o psiquiatra aumenta e diminui a dose de uma certa "substância" só porque o doente lho sugere por telefone.

Não consigo entender como é que um psiquiatra pode avaliar o "estado" de um indivíduo sem sair do gabinete... cobrando em média 100 euros.

Este apontamento é, em parte, resultado da leitura do testemunho do psiquiatra - José Luís Pio de Abreu, autor da obra "Como Tornar-se Doente Mental":

«A Psiquiatria está em crise, mundial. Ainda ninguém sabe o que é a mente. (...) Escreve-se mais do que se lê. Existem instrumentos, o problema é saber se são bem usados. Há muitas ofertas da psicologia e psicoterapia, o problema é a orientação no meio desta selva.» in Público, 18 de set. 2016

17.9.16

Uma corrente intempestiva e de fogo

As imagens que dão conta do fluxo ininterrupto são diluvianas e vulcânicas - uma corrente intempestiva e de fogo que engole e devora todo e qualquer obstáculo...

Ao obstáculo só resta deixar-se submergir e consumir na expetativa de que o fluxo se esgote, ainda que por pouco tempo...

Claro que do lado de lá, há sempre quem se alimente do rio, que mansamente mergulha no oceano, e do sol que insiste em acariciar o terreiro em que repousa...

 

16.9.16

Logomania benigna

No início deste novo ano letivo, não sei como fugir à logomania, isto é, à vontade imperiosa de falar. Sei, no entanto, que o meu jovem público detesta a descrição, a explicação e o comentário, mesmo se construídos de forma breve e coerente...

Em tempos de dispersão, escutar deixou de fazer sentido e acaba quase sempre em indisciplina (violência verbal; alheamento), porque o enunciado, mesmo se reduzido à expressão nominal, é cada vez mais confundido com divagação, digressão... 

E estou a referir-me à logomania benigna, porque da logomania psicótica é melhor não falar... Essa põe à prova a paciência de qualquer santo.

 

15.9.16

Do rigor verbal

Não contacte para... faça-o, por exemplo, através do e-mail 'macagomes@hotmail.com '

O verbo contactar pode ser usado quer como transitivo direto («contactar alguém»), quer como transitivo indireto, selecionando um complemento oblíquo («contactar com alguém»), conforme se pode consultar no Dicionário Sintáctico de Verbos Portugueses, de Winfried Busse (Coimbra, Livraria Almedina, 1994).

Há situações que devem ser acauteladas, sobretudo quando queremos promover um produto, defender uma ideia...

 

14.9.16

Um degrau é que não!

Um degrau! Afinal, a que é que poderemos aspirar nesta vida?

Subimos e descemos e, no intervalo, oferecem-nos uma cadeira ou até um sofá...

Quis ir ver "O rio", mas não havia lugares - depois de esgotadas as reservas, sobraram uns tantos degraus... e como o objetivo era encher a sala...

Não sei se havia algum bombeiro de serviço, mas como não quis dificultar a sua tarefa, retirei-me... Um destes dias, vou ver se compro atempadamente a cadeira para poder descer "O rio". Sim! Para mim, já é difícil subi-lo.

Um degrau é que não!

 

12.9.16

Sem palavras

  1. "Torres novas é tão bonita, não tem mais nada a publicar sobre ela senão mato e árvores?" (comentário no Facebook)
  2. O dia é de intenso calor; a cigarra goza-o enquanto pode. A criança pergunta: - Quem é que canta tão alto? A mãe responde: - o grilo, meu filho!
  3. Na Alameda (Lisboa), três jovens "brasileiros" afinam o conhecimento. Um deles pergunta: - Com quem é que ela estava? Com o namorado baiano? Resposta de outro: - Não, ontem ela estava com o brasileiro. Ela já não quer nada com o baiano! Os baianos têm a mania que são bons e nem sabem falar...

 

11.9.16

Cortada, mas pronta a resistir

Esta oliveira vive no Vale do Oceano. Centenária, por vezes parece que vai definhar. No entanto, se ajudada, acaba por resistir muito para além do lenhador. Vive rodeada de figueiras, mas também não rejeitaria a presença de algumas amendoeiras...

 

10.9.16

É preocupante

Talvez eu esteja a exagerar, mas preocupa-me que alguns médicos desconheçam o nome de certas doenças, mesmo se raras, ou de medicamentos prescritos pelos psiquiatras...

E sobretudo é preocupante que, num quadro de hipotermia grave, o médico não infira que muitas das certezas do paciente possam ser resultantes do seu quadro clínico...

Por outro lado, não me parece razoável que a "história" contada pelo doente acabe frequentemente por substituir o diagnóstico, competência que, creio, deveria ser do médico...

Se, nos hospitais privados, o recurso aos meios auxiliares de diagnóstico pode ajudar a determinar o estado do paciente ou, pelo menos, a atenuar a responsabilidade do clínico, em sentido contrário, tal pode não acontecer nos hospitais públicos - espera-se que o doente caia em sonolência e manda-se para casa...

Na minha longa experiência, como doente ou como acompanhante, há muito que deduzi que o factor económico, em múltiplas situações, se sobrepõe claramente à responsabilidade de "acompanhar o paciente" até que o problema seja esclarecido... os doentes vão sendo empurrados... alguém vai enriquecendo... e o país, orgulhoso do sistema nacional de saúde, tem encargos financeiros insuportáveis...

Talvez esteja a exagerar... e depois há os médicos cuja formação me parece pouco consolidada... 

 

8.9.16

Amnésia seletiva

Há coisas que é melhor esquecer. Ontem foi um desses dias supinamente preenchido, mas que me deixaram de rastos... Como não sei se virei a recuperar, decidi que doravante passarei a sofrer de amnésia seletiva...

Bem sei que este tipo de amnésia é traumático, porém não me importo. Prefiro que o trauma acabe em recalcamento...

Lúcido, aqui, declaro que não suporto curandeiros de qualquer espécie, mesmo que se trate de psicólogos, psiquiatras e psicanalistas...

 

6.9.16

Só o que vejo...

Praia das Adegas

Este lugar está reservado a nudistas, e alguém se lembrou de o designar de "Praia das Adegas"... Não vejo a relação, embora, hoje, seja mais fácil andar nu do que coberto. Será efeito do vinho?

Se há quem prefira os vegetais, por que motivo as plantas não hão de ser carnívoras?

Enfim, hoje estou a seguir a lição de Stendhal:

 « - Ne croyez rien, mon ami, que ce que vous aurez vu, et vous en serez plus sage. »

        Lucien Leuwen

Só o que vejo me conforta... os meus ouvidos já naufragaram...

 

 

 

5.9.16

A onda é de calor

Não fosse o calor, todas as outras penas ficariam esquecidas...

Desde que cheguei à Costa Vicentina que me vejo confrontado com o meu inimigo principal - outrora, atormentava-me na colheita dos figos e das uvas...

Desta vez, o ar esmaga-me a respiração e o nariz rebenta como se onda fosse... e nem sequer conhece o intervalo das marés...

A onda é de calor e liquefaz-se a cada instante, noite e dia.

Parece que tem origem em Marrocos!

 

4.9.16

O domingo do senhor Hulot

Um domingo numa praia portuguesa. Colorido...

 

3.9.16

Na praia

Na praia, os olhos bem podem perder-se nos botões que se espreguiçam gulosamente ao sol, mas é nas escarpas que eles descansam.

As escarpas escondem as aves que as procuram; o sol enlouquece e esmorece...

 

2.9.16

De longe...

Embora perto, tudo o que vemos é de longe. Se nos aproximarmos deixamos de enxergar. Talvez pudéssemos sentir, mas nada nos garante que não fossemos descontinuados.

Hoje, a paisagem não revela a poeira que a inunda nem o calor que a atravessa.

 

1.9.16

Flexibilizar o Programa?

Flexibilizar: "Hacer algo que pueda ser adaptado a las circunstancias..."

Se não se quer ou não se pode mudar o Programa, o que é o docente pode efetivamente fazer? Ou deveria fazer?

A resposta parece simples. Há que adaptá-lo às circunstâncias, desde que, previamente, haja clarificação dos fatores e, sobretudo, haja hierarquização das prioridades.

E quais são essas prioridades?

  1. A progressão cognitiva, emocional e motora do aluno.
  2. A aquisição dos conteúdos adequados a essa progressão.

O resto é música editorial e descaraterização da função do docente...

 

31.8.16

Dilma Rousseff afastada. E pode?

Senado decidiu contra a chefe de Estado brasileira por 61 votos contra 20. Dez de 13 investigados no âmbito da Operação Lava Jato votaram a favor.

Dilma Rousseff afastada da Presidência pelo Senado. E pode? Acusada do quê? De ter deixado avançar a Operação Lava Jato?

Lembra o tempo em que o voto do povo ainda não existia. O tempo romano!

E quanto ao novo Presidente Temer, será que o Brasil entrou no tempo em que a traição rende?

 

30.8.16

A rua da Bombarda

Por razões familiares, nos últimos meses, tive de me deslocar à rua da Bombarda, em Lisboa. Diga-se que antes nunca tinha ouvido falar de tal arruamento... Peculiar, pois é uma daquelas vias em que entrando nela não se pode voltar para trás e onde é quase impossível estacionar.

Quando há obras à entrada ou no interior, corre-se o risco de ficar indefinidamente bloqueado - e por ali impera a lei do embrulho urbanístico. 

Por aquilo que vou observando, o embrulho urbanístico é lucrativo, pois permite desalojar, arrendar a preços de mercado e, sobretudo, subalugar a jovens estrangeiros perdidos nos subúrbios da Graça e do Castelo...

Enfim, nestes meses calcorreei o Bairro das Colónias, cada vez mais multicultural e enlatado e, a tempos, desemboquei na Graça, atualmente sem graça, tantas são as obras e, sobretudo, sem que se veja o traço do arquiteto.

Hoje terá sido o último dia em que fui à rua da Bombarda... e até consegui estacionar em frente do nº 62, logo a seguir a uma oficina de automóveis que nunca vi encerrada. Houve sábados, domingos e feriados em que antecipei que poderia estacionar em frente daquele portão. Mas não!

 

 

29.8.16

O regabofe das obras

A Câmara Municipal de Lisboa aprovou 292 propostas de trabalhos desde o início de 2015, ano em que adjudicaram 74% das obras. E vão continuar até 2020: estradas e passeios, praças e largos.

Ainda estamos em agosto e é cada vez mais difícil circular na cidade. Hoje, precisei de percorrer a avenida Infante D. Henrique e fiquei parvo com a quantidade de entraves criados à circulação rodoviária e pedonal, sem esquecer os velocípedes. 

Recordo que ainda há poucos anos aquela via foi objeto de profunda remodelação que deverá ter custado umas dezenas de milhões de euros... Provavelmente, nem houve tempo de amortizar os empréstimos!

Há nisto tudo algo que me incomoda. Donde é que vem o dinheiro necessário ao pagamento de todas estas empreitadas? Será da Caixa Geral de Depósitos?

E no final, quantos novos-ricos haverá a mais?

 

28.8.16

O emplastro

Perdi-lhe o nome, mas, sempre que ele invade o ecrã, fico sem saber o que fazer - ouvi-lo pela enésima vez; se mudo de canal, temo que o emplastro tenha decidido abdicar do seu papel de "Velho do Restelo", e eu perca o acontecimento.

O problema é de que nada serve mudar de canal, pois o emplastro vive neles como o Velho nas páginas d' Os Lusíadas. E condena-nos à morte, inevitavelmente. 

O emplastro lembra-me o Presidente do Conselho, Oliveira Salazar, que insistia no argumento de que "a razão" estava do seu lado e que o tempo se encarregaria de o mostrar.

O emplastro parece ser um legitimista que nunca percebeu que quem provocou a mudança foi ele próprio.  

 

27.8.16

Entre nós...

"O cão não abandona o caixão do dono.

A notícia vem de Itália, mas poderia vir de qualquer outra parte do mundo.

Entre nós, porém, há quem não se importe com o que acontece ao seu semelhante. Passe de lado, mude de passeio, se esconda...

Em último caso, acena-se com uns milhões de euros que vão direitinhos para o bolso dos "empreendedores"... Há por aí quem deite os foguetes e apanhe as canas! 

 

24.8.16

Em silêncio

Vou ficar em silêncio... A lição é dos avós que poupavam nas palavras e, assim, evito o desconforto alheio, de quem já andava farto de tamanha prosápia...

Sob as horas inúteis, de que serve terçar armas por uma ou outra causa ou até, num tom mais intimista, dar conta da tensão a que obedecemos cegamente...

Em idade juvenil, o silêncio era por vezes cenário de uma imaginação colonizada por anátemas demoníacos - no silêncio, o mafarrico destroçava-me o sossego...

Agora, chegou o tempo de ouvir as penas e guardá-las só para mim. A quem poderiam interessar as minhas penas? 

 

23.8.16

Longe da alegria

Vou esperar um pouco mais, embora a espera nada traga de entusiasmante... A atitude é masoquista, mas resulta de uma paciência inexplicável.

Sensato seria não esperar, porém de pouco serviria. Provavelmente só apressaria o desenlace. E esse é inevitável, mesmo que finjamos ignorá-lo.

E lá voltamos à paciência, isto é, à capacidade de suportar a rotina, o inesperado, a dor e até a ambição de uns tantos que persistem em acreditar na imortalidade...

Dentro de dias, estarei de regresso à alegria, postiça...

 

22.8.16

'Geringonça’, apontamento político-linguístico

Desde que Paulo Portas batizou o governo como 'geringonça' que procuro a origem do termo. Pela sua sonoridade, encontro-lhe um laivo onomatopaico que me faz pensar na sua antiguidade e, sobretudo, na sua expressividade de raiz popular... Afinal, o aristocrata 'Paulinho das feiras', era sensível à quinquilharia e ao palavrão... 

Por outro lado, pondo a questão de forma cerimoniosa, o termo 'geringonça" pode ser uma adulteração do castelhano 'jerigonza' que, certamente, refletirá o modo como os senhores de Castilha olhavam para as nossas proezas... Sem esquecer, o antepassado provençal 'gergon' que serviria para designar a impossibilidade de compreender o linguajar da época avesso a qualquer norma, senhorial ou conventual...

Andava eu nestas cogitações, quando o olhar me caiu sobre a exemplificação de palavras africanas (Caderno de Atividades / Novo Plural 10): lá estava a 'geringonça' no meio de outros termos mais ou menos suspeitos: «búzio, cachimbo, canga, Congo, cubata, dengoso, embalar, fulo, geringonça, lengalenga, macaco, manha, missanga, pipoca, tanga, tango»

Rogando pragas à erudição, estou pronto a aceitar a última explicação. Foi em África, provavelmente no Roque Santeiro, que o Paulinho descobriu a 'geringonça' e decidiu que era do seu interesse (e do PP e do Estado Português) apostar no governo do José Eduardo dos Santos, mesmo que isso o obrigue a afirmar que a geringonça portuguesa está para durar, ao contrário do 'amigo' Passos... 

 

21.8.16

Maria Rueff em entrevista ao Diário de Notícias

"As pessoas não são as políticas dos países." DN, 21 de agosto de 2016

Se puder, compre o DN deste domingo, e leia, pois, irá ver que não se arrepende. Está lá tudo sobre algumas das pessoas mais genuínas deste país dos últimos 50 anos, a começar pela Maria Rueff...

A entrevista, conduzida por Ana Sousa Dias, deveria ser de leitura obrigatória nas escolas deste país, que persiste em valorizar valores efémeros e fátuos.

Este é um daqueles testemunhos que, até hoje, melhor me explicaram que a 'glória política' pouco tem a ver com o sentir e o viver das pessoas, que, de forma espontânea, choram e riem sempre que alguém lhes fala ao coração...

 

20.8.16

O IMI não pode ser um privilégio

O IMI deve ser um imposto universal.

Como tal, sou contra qualquer tipo de isenção a quem quer que seja - Fundações, Igrejas, Associações, Estado, Banca, Municípios, Embaixadas, Emigrantes, Estrangeiros...

A exceção abre sempre a porta ao privilégio...

 

19.8.16

Vão estudar, malandros!

Desta vez, tenho de estar de acordo com o BCE.

Um Governo socialista, apoiado por partidos à sua esquerda, esqueceu-se de colocar 30% de mulheres no topo da CGD. Lembra o atual executivo brasileiro...

Um Governo socialista quer que a CGD seja "governada" por 19 administradores, contrariando a norma europeia. Um Governo socialista promove a acumulação de interesses privados no banco de que o Estado é o único acionista.

Um Governo socialista nomeia para cargos executivos "rapazes" sem formação adequada e ainda se prepara para lhes pagar as propinas numa instituição sediada em Fontainebleau. Por seu turno, os três rapazes (João Tudela Martins, Paulo Rodrigues da Silva e Pedro Leitão) não se queixam por serem obrigados a frequentar, em regime pós-laboral, o curso de Gestão Bancária Estratégica do INSEAD.

Enfim, perante a argumentação de rejeição das decisões do BCE, ainda fico à espera que o senhor Mário Draghi imponha que o secretário de Estado do Tesouro, Ricardo Mourinho Félix, vá frequentar um curso de Administração da Fazenda Pública...

 

18.8.16

Uma história elementar

Caim, o primogénito, era senhor dos campos que a sua vista conseguia enxergar e neles não havia lugar para os rebanhos do seu irmão, Abel. Este, inicialmente, resignou-se e levou o seu gado para além do alcance de Caim.

Só que, certo dia, os montes começaram a secar, e Abel viu-se obrigado a procurar novo pasto no fecundo horto de Caim. Os rebanhos de Abel, famintos, devoravam as primícias que iam encontrando pelo caminho...

Um caminho sem regresso, pois Caim, irado, acabou por degolar o infeliz Abel.

Esta é uma história em que o Senhor não pôs nem dispôs. A causa tem de ser procurada nos pais, Adão e Eva, que não souberam educar os filhos. E assim continuamos. De nada serve pensar que Caim, mais tarde, se terá arrependido, e que isso bastaria para que o mundo se tornasse mais solidário. 

 

17.8.16

O direito à autodeterminação

A colonização é apresentada como "globalmente positiva". Nesse balanço, o destaque é dado às infraestruturas herdadas da colonização, sem esquecer o contributo para a fundação dos novos estados modernos - versão corrigida do que outrora era designado por "missão civilizadora". Por outro lado, a tendência é para desvalorizar a ação repressiva, voltando as costas à ação dos exércitos coloniais e à "selvajaria" dos insurretos.

Na obra Massacres Coloniaux - 1944-1950 : la IVè Republique et la mise au pas des colonies françaises, ed. La Découverte, YVES BENOT explica que, entre 1944-1950, " ces répressions ont lieu dans un temps où s'achève une guerre mondiale dont deux des principaux protagonistes, l'Angleterre et les États-Unis, ont défini les termes de la Charte de l'Atlantique (août 1941) qui proclame notamment le principe du droit des peuples à disposer d'eux-mêmes, autrement dit, l'autodétermination". Principe repris dans la Charte des Nations unies dont la France est cofondatrice en 1945. 

Basta olhar para o historial dos massacres perpetrados pelos franceses para perceber que o princípio consagrado na Carta das Nações Unidas foi totalmente desrespeitado:

  • O massacre de Sétif teve início no dia 8 de maio de 1945, fazendo dezenas de milhares de vítimas argelinas (e apenas 102 vítimas europeias).
  • Os massacres de Rabat-Salé e de Fez, em Marrocos, janeiro-fevereiro de 1944.
  • O massacre de Haiphong, no Vietname, em novembro de 1946.
  • O massacre de Madagascar, em 1947-1948.
  • O massacre de Casablanca, em abril de 1947.
  • O massacre da Costa do Marfim, em janeiro de 1950.

O direito à autodeterminação radica numa linha de pensamento inaugurada por Diderot e pelo abade Rayal, consagrada ainda durante a Segunda Grande Guerra, mas isso não impediu os vencedores de o ignorar. Basta ver como Salazar constrói uma doutrina colonialista que lhe permitiu avançar para a guerra, à margem dos processos de descolonização em curso desde os anos 40...

E hoje, países como a Turquia ou a Rússia continuam a fazer tábua rasa desse princípio, eliminando e anexando...

(Referência inicial: Augusta Conchiglia, Massacres Coloniaux, Nouvel Afrique-Asie, nº 63, Déc. 1994)

 

16.8.16

Teta Lando, taxeiro

Desvario linguístico:

Identificado como simpatizante da FNLA, Teta Lando foi forçado a procurar refúgio na vizinha República do Zaire. " Logo que cheguei fui convidado para cantar com aquele que é, quanto a mim, o maior artista que África já produziu, Franco Luambo Makiadi. Só não o fiz porque o salário que me ofereciam era muito pequeno. E como a única coisa que tinha levado comigo era o carro, tornei-me tacheiro." Motorista de táxi na desvairada cidade de Kinshasa. A sua situação espantava e incomodava os angolanos. "Às vezes apareciam clientes angolanos. Teta Lando? Você por aqui, e ainda por cima taxeiro?!" Público Magazine, 8 de janeiro de 1995.

 

15.8.16

Estórias inverosímeis

Um pouco à deriva, sem compreender por que motivo um país de costas voltadas para a espiritualidade, usufrui de mais um dia santo cuja imagética é, em si, suficientemente fantasista, ataco as páginas de jornais que persistem em assombrar-me, e lá vou encontrando “estórias inverosímeis”, mas perturbadoramente atuais…

Os meninos da rua

«Os meninos de rua, fenómeno recente em Angola, contam-se já aos milhares. Na sua maior parte, ocupam o dia vendendo todo o tipo de utensílios, que por sua vez adquirem a preços ligeiramente inferiores no grande paralelo de Luanda, o Roque Santeiro: vendem cigarros, canivetes, relógios, pentes, máquinas de calcular, espelhos, rádios, secadores de cabelo, e até aparelhos de ar condicionado. Outros lavam carros, transportam volumes, pedem esmola. À noite estendem-se nos passeios ou constroem pequenas barracas nas areias da Ilha, onde outrora os luandenses iam namorar.»

Palavra de honra

«Dirigiram os dois a casa do presumível ladrão. O homem convidou-os a entrar, ofereceu-lhes de beber e finalmente quis saber o motivo da visita. Quando Carlos disse ao que vinham, o ladrão sobressaltou-se: “Palavra de honra que não fui eu”, garantiu, “aliás, se tivesse sido, vendia-lhe já o carro!»

Homem nu

«Pouca gente repara neste homem, que há vários meses se passeia nu em ferente ao parlamento. O fotógrafo do Público repara. Levanta a máquina, e depois volta a baixá-la horrorizado: “Não posso fotografar isto!” O homem tem uma ferida aberta no ventre e os intestinos expostos à luz.»

Dias Kanombo, investigador kimbanguista*

“O Grilo”, sempre vestido de verde, muda de nome consoante o interlocutor, saltando do português para o francês, o inglês ou até o sueco, com a mesma facilidade com que falava umbundu, kikongo ou otchivambo, o luminoso idioma do seu próprio povo – os quanhamas…

(Nascido no Cuvelai, no Cunene, Kanombo é neto por linha materna do régulo local. O pai, alfaiate e pastor, era também catequista numa missão luterana finlandesa. Kanombo chegou a frequentar o seminário, mas rapidamente concluiu que não tinha vocação para padre, vindo a completar o ensino secundário no Liceu do Lubango. Mais tarde, frequentou a Universidade Kopta, no Egito, licenciando-se em Egiptologia…)

Nos anos 80 foi um dos mais ativos elementos da juventude da UNITA em Portugal. Em 1992, reapareceu em Luanda, durante a campanha eleitoral, despertando dúvidas antigas: “Afinal, para quem trabalha este homem?” Kanombo responde com uma gargalhada: “Trabalho para o Ciciba, Centro de Investigação da Civilização Bantu, e estou agora baseado em Durban, na África do Sul, onde estudo a relação entre o antigo idioma egípcio e algumas línguas bantu, em particular o zulu

*Tudo terá começado na pequena aldeia de Nkamba, então Congo Belga, a 8 de março de 1921. Nessa noite, Simão Kimbangu, catequista, antigo aluno de uma missão batista inglesa sonhou que um anjo o visitava. Soube no mesmo instante que era reencarnação do Espírito Santo e que tinha vindo ao mundo cumprir uma missão: “Os povos negros foram os primeiros a cortar relações com Deus”, explica Dias Konambo “em consequência disso são os principais responsáveis pela decadência do mundo”. A missão do Espírito Santo, encarnado no pobre catequista de Nkamba, seria a de recuperar para Deus os negros de África, salvando assim toda a humanidade (…). Hoje (Público, 8 de janeiro de1995) o kimbanguismo é a religião mais popular do Zaire. Na África do Sul, milhões de negros, os sionistas, seguem os seus ensinamentos, enquanto no Egipto encontrou o apoio irrestrito da Igreja Kopta.

NotaO Kimbanguismo é um Cristianismo resultante dos ensinamentos e obras de Papá Simon Kimbangu baseados no Amor, Obediência as leis de Deus e o empenho no trabalho. É uma nova civilização que pretende implementar as bases do humanismo pelo temor de Deus e o respeito do ser humano sem discriminação de raça, tribo e línguas. O kimbanguismo é a filosofia do renascimento do povo de Deus sustentando a visão do respeito dos valores Divinos e humanos. Em suma, o kimbanguismo é uma visão teo-antropocêntrica.

(Mais uma organização tentacular!)

 

14.8.16

Diz o roto sobre o nu

"Diz o roto ao nu", neste caso "sobre o nu", pois a vontade de encontrar cumplicidade é mais forte...

Lá na terra, nem pastor era, ajudava na condução e recolha do rebanho comunitário, quando um forasteiro lhe contou que em Lisboa é que a vida era boa... Sem perder tempo, abalou para a capital.

Ainda se pensou que estivesse destinado a ajudante de pedreiro, mas não, em Lisboa, os ajudantes de pedreiro são todos engenheiros... Sem saber como, um conterrâneo arranjou-lhe trabalho numa pastelaria. 

E o roto, em vez de aviar o freguês, lá vai dizendo que o colega nem o almoço merece...   

 

13.8.16

Organizações tentaculares

Há coisas que eu não compreendo:

  1. " A rede internacional Feithullah Gülen conta com uma cadeia de rádios, televisões, jornais, centros educativos, empresas, associações e fundações em mais de 140 países."
  2. "Vivem na Alemanha perto de 100 mil «güllenistas», além de 150 associações, 25 escolas, 15 «centros de diálogo» e um jornal, o diário «Zaman», com um cordão umbilical ao grupo religioso(...) sem se saber o que realmente são: «uma comunidade de crentes islâmicos conservadores, uma rede profissional de carácter missionário ou um movimento político islamita radical»". Expresso, 13 de agosto de 2016

A verdade é que eu não compreendo que se deixem constituir organizações tentaculares no interior de estados de direito que deviam zelar pelo interesse coletivo.

 

12.8.16

António Gonçalves Ribeiro tem biografia a menos

Ainda a propósito daqueles que têm biografia a mais, hoje, ao reler documentação vária sobre o regresso dos portugueses de África em 1974 e, sobretudo, em 1975, verifico que há quem tenha biografia a menos.  Pelo menos, é o que constato ao pesquisar o nome de António Gonçalves Ribeiro, responsável pelo retorno de uma boa parte dos 700 mil que vieram acrescentar 6% à população metropolitana.

O milagre do regresso e da integração dos portugueses de África muito deve ao voluntarismo e à abnegação desse português que tomou para si a responsabilidade que era do MFA, do Presidente da República, do Governo e das Forças Armadas... que bem se esforçaram por sacudir a água do capote. Lá no fundo, os Governantes da época não eram muito diferentes dos do Estado Novo... Só a ideologia mudara, o que não era pouco, pois isso significou que as colónias (províncias ultramarinas) tivessem ficado nas mãos das potências estrangeiras... e que os laços afetivos fossem definitivamente destruídos... 

O que explica muita coisa! Não fosse essa irresponsabilidade (da cegueira doutrinária de Salazar ao excessos dos primeiros anos da Revolução), não estaríamos hoje tão mal governados e sob a batuta do eurocentrismo.

 

11.8.16

Sempre o passado

Uma travessa! Uma chávena!
Sempre o passado. A herança.
As pessoas só interessam depois de mortas. E nem todas!
Vivem nas porcelanas, nas fotografias, em certas palavras...

Quanto aos vivos, se longe, assombram a cada esquina de distância...
Se perto, falta a paciência, já é tempo de zarpar...

E depois pego no Livro da Vida, falta lá imensa gente. Olho à volta, e é tudo tão inflacionado...

 

10.8.16

Ponte aérea durante o Verão Quente de 1975

«Havia quem defendesse (no Conselho dos 20, um dos órgãos do MFA) que os não devíamos ajudar, porque eram fascistas. Lembro-me do tempo que se perdeu com esta discussão e que a reunião foi inconclusiva a este respeito.» Vieira de Almeida, ministro da Economia nomeado por Portugal para o Governo de transição saído do Acordo de Alvor, assinado a 15 de Janeiro de 1975.

O tenente-coronel Gonçalves Ribeiro acabou por ser o responsável pela ponte aérea. É provável que os mais de 200.000 portugueses saído no âmbito da ponte aérea devam a Gonçalves Ribeiro o facto de lhes terem sido postos à disposição os meios de fuga.

Gonçalves Ribeiro chegara a Angola em 1972 para uma comissão de serviço de dois anos. A mulher e os filhos regressaram a Portugal em agosto de 1974, mas ele optou por prolongar a sua permanência na ainda colónia portuguesa. Integrou o Governo provisório que administrou o território até ao Acordo de Alvor. Em 1975, transitou para o gabinete do Alto-Comissário Silva Cardoso, que substituíra o almirante Rosa Coutinho no cargo…

Em junho de 1975, «Portugal relegou a descolonização para plano subalterno. E, no entanto, faltavam ainda cinco meses para a data da independência de Angola estabelecida em Alvor.»

A 11 de Junho de 1975, o tenente-coronel Gonçalves Ribeiro desloca-se de Luanda a Lisboa, reunindo com a Comissão Nacional de Descolonização, onde defendeu que a TAP «estava muito longe de poder fornecer os meios necessários à saída da população branca. Um problema que não tem merecido o mínimo de atenção por parte do Governo», queixava-se. Naquela reunião, informou que, em Luanda, já havia 50.000 desalojados, vindos de outras áreas de Angola. E os pedidos de reserva de transporte para a metrópole ascendiam a 140.000.

Em maio de 1975, havia três exércitos em Luanda e cada um se considerava dono e senhor da cidade. A segunda batalha de Luanda seria desencadeada no início de julho. O MPLA acaba por dominar a maior parte da capital. Para a comunidade portuguesa, acentuava-se a urgência da partida.

Em Lisboa, acreditava-se que uma nova cimeira poria termo à guerra entre os três movimentos de libertação. MPLA, FNLA e UNITA reuniram-se entre 16 e 21 de junho, em Nakuru, no Quénia, sem que Portugal estivesse representado – o que violava uma das cláusulas do Acordo de Alvor. No texto de Nakuru, não foi feita qualquer referência a Portugal.

Entretanto, o MPLA estava a receber armamento pesado vindo da União Soviética e de outros países do Leste europeu. E a FNLA alimentava os cofres com dólares vindos dos Estados Unidos.  Era a lógica do conflito Leste-Oeste.

Para Gonçalves Ribeiro, havia que “aguentar” com um mínimo de dignidade: «E se queriam partir (os militares) tínhamos de os trazer (os portugueses). Os militares não podiam partir, deixando lá abandonados aqueles que queriam vir embora

 

Donald Trump a brincar com o fogo...

O candidato republicano à Presidência dos Estados Unidos, Donald Trump, está novamente no olho do furacão, depois de ter proferido declarações polémicas. O magnata "sugere" aos seus eleitores o assassinato da sua rival, a democrata Hillary Clinton, que defende mudanças na legislação de compra de armas de fogo.

Hillary quer, essencialmente, abolir a segunda emenda. Se ela conseguir escolher os juízes, não há nada que possam fazer. Talvez os defensores da segunda emenda possam, não sei”, disse o candidato republicano num comício na Carolina do Norte.  Económico

«Talvez os defensores da segunda emenda possam, não sei.» Isto é, Donald Trump convida os defensores da utilização pessoal de armas de fogo, a impedi-la de alterar a segunda emenda. E como?

O tom dubitativo não só não apaga a exortação, como reforça a pressuposição: «Não o posso fazer, mas delego em ti.»

Uma vergonha! Uma avaliação psiquiátrica vinha a calhar...

 

9.8.16

Soa a sirene

São 21h20, soa a sirene...

O apelo de reunião dos bombeiros prolonga-se...

Não sei se o fogo anda por perto ou longe... a verdade é que as televisões passam as horas a dar conta da falta de meios de combate aos incêndios. As imagens não mentem: os meios humanos e os equipamentos são escassos...

E sobretudo as populações não estão educadas para reduzir os riscos, evitando despejar o lixo no mato, limpando caminhos e bosques. As autoridades, por sua vez, fazem vista grossa... E até os pirómanos vivem à solta...

Quanto aos governantes, estão de férias!

PORTUGAL SEM FOGOS DEPENDE DE TODOS!

Entretanto, na Madeira, ouvem-se cada vez mais explosões de botijas de gás.

 

Qual é a notícia?

É a primeira vez que reformados e trabalhadores ativos da Função Pública trocam de posição. O número de beneficiários da Caixa Geral de Aposentações (CGA) ultrapassou o de subscritores – aqueles que fazem descontos para a reforma. Num relatório, o Tribunal de Contas (TdC) nota que “2015 é o ano de viragem, em que o número de subscritores é inferior ao número de aposentados/reformados”.

Os dados constam do Relatório de Acompanhamento da Execução Orçamental da Segurança Social. No documento, divulgado ontem, o TdC revela que, no final do ano passado, o número de aposentados da Função Pública era de 486.269 pessoas. Só por si, esse dado deixava clara a evolução face a 2006: o número de beneficiários cresceu 23,5%, quando comparado com o cenário de dez anos antes. Jornal i

 

Se diminuiu o número de contratados e os novos deixaram de descontar para a Caixa Geral de Aposentações, qual é a surpresa? Qual é a notícia?

Agora, só a canícula é que pode tapar o buraco! 

 

8.8.16

Resposta de Salazar a George Ball

Lisboa, 29.02.1964

  1. ordem nova (americana), ao defender «o movimento nacionalista dos povos do continente africano», visando a independência, «tem de negar o direito preexistente». Esta mudança de posição dos Estados Unidos torna o diálogo impossível.
  2. A Carta das Nações Unidas «prevendo prudentemente várias soluções, desde a integração à independência, entendeu confiar a definição do destino desses territórios à autodeterminação dos povos interessados por intermédio da soberania responsável e, naturalmente, quando pudessem responder por ato tão transcendente de vontade política.»
  3. Três graves queixas de Salazar: a) «os territórios ultramarinos portugueses não são, não eram territórios dependentes, mas politicamente integrados num Estado que nessa forma constitucional foi admitido sem discrepância nas Nações Unidas; b) nas moções votadas referentes a Portugal a autodeterminação não tem sido a escolha de opções diversas, conforme prescreve a Carta, mas a imposição de uma só - a independência; c) no tocante aos territórios portugueses (pelo menos em relação a estes) a independência imediata que se tem exigido recusa a natural evolução dos povos e a existência de uma formação política esclarecida. (...) E podíamos queixar-nos ainda de que a chamada autodeterminação está sendo procurada através de todos os meios de pressão externa, como se a vontade dos povos possa substituir-se à única válida das populações interessadas.» 
  4. Salazar sabe bem que o objetivo da autodeterminação defendido pelas Nações Unidas (e pelos Estados Unidos) é apenas um disfarce da exigência de independência imediata, indo ao ponto de referir a posição do Secretário-Geral da ONU, U Thant, pois as Nações Unidas terão chegado ao ponto de votar não ser precisa qualquer preparação para a independência.
  5. Salazar contrapõe à proposta americana: «V. Exª contrapõe aos resultados desastrosos obtidos naqueles casos em que a independência se operou contra a potência soberana, o êxito alcançado quando a mesma se processou com o auxílio desta. Ora a experiência tem demonstrado (...) que a estabilidade política dos novos Estados ou assenta numa base tribal ou depende do auxílio exterior. No primeiro caso assistimos a um recuo traduzido no renascimento da primitiva organização dos territórios; no segundo estamos perante o que poderia designar-se pseudoindependência ou soberania disfarçada dos mesmos territórios.»
  6. Salazar antevê que no caso de uma independência em que sejam quebrados os laços políticos, a consequência será «a de a posição de Portugal ser tomada por um terceiro país - e não será isso que se pretende?»
  7. Em 1964, Salazar caracteriza o mapa político africano, à exceção da África do Sul, com «um tom exclusivamente neutralista, senão já alinhado em alguns casos contra o Ocidente, o que quer dizer que os novos Estados africanos se recusam a tomar posição no conflito ideológico que contrapõe o Ocidente ao mundo comunista ou tomam-na em favor deste.»
  8. Sobre a estratégia comunista, Salazar defende que o comunismo «pode desistir de formar partidos políticos africanos identificados como comunistas; nem procurará ostensivamente instalar repúblicas populares. Os objetivos comunistas em África contentar-se-ão, ao que nos parece, com captar África para a nacionalização da riqueza formada, meio caminho andado para lhe cortar o progresso económico, e depois em neutralizá-la, ideológica e estrategicamente. (...) Por isso, e na medida em que fomentarmos, o neutralismo africano, creio que estaremos a criar posições que servem, essencialmente, os interesses do inimigo.
  9. Sobre o terrorismo, Salazar não tem dúvidas de «que, se cessasse o auxílio externo aos terroristas, estes não tardariam também a fazer cessar a sua maléfica e inútil atividade...»

 

7.8.16

Salazar pensava que tinha tempo

António Spínola discordava, como vimos, de Salazar porque este pensava que era preciso "saber esperar". Também George Ball, enviado de Kennedy, em carta de 21.10.1963, refuta a tese de Salazar:

«V. Exª acredita que o tempo trabalha a seu favor, nós não. Conforme tive oportunidade de referir, as nossas estimativas indicam que nas melhores circunstância, não será possível dispor de mais de 10 anos para preparar os territórios para o ato político da autodeterminação. Se forem aproveitadas todas as oportunidades durante esse intervalo de tempo, nós estamos seguros de que a presença efetiva de Portugal poderá persistir. Se, ao contrário, essas oportunidades forem desperdiçadas nós concordaremos então com a previsão desoladora de V. Exª de que Portugal será incapaz de "manter a sua influência e os seus interesses atuais nos territórios contra todas as influências ideológicas e económicas impulsionadas do exterior.»

E como sugestão programática, George Ball acrescenta:

« Nós estamos perfeitamente cientes de que este apoio (dos líderes africanos mais moderados) só será possível se Portugal der uma indicação afirmativa, primeiro, de que a autodeterminação é o objetivo em direção ao qual se orienta a sua política e, segundo, que o Governo português está a promover numa base de urgência a realização de uma série de medidas - sociais, económicas, educativas e políticas - para preparar os povos para a autodeterminação dentro de um período de tempo razoável ainda que não necessariamente explícito.

(...) Em menos de uma década V. Exª poderia criar as bases para um programa educativo de grande amplitude. A preparação de africanos que carecem de especialização administrativa e técnica deveria também ser objeto de esforços imediatos, uma vez que nos parece essencial desenvolver e alargar o núcleo indígena de juristas, médicos, professores, engenheiros e operários especializados e semiespecializados capazes de suplementar os brancos que agora ocupam os postos administrativos fundamentais. E finalmente V. Exª poderia no espaço de tempo que lhe resta treinar um quadro de professores para conduzirem um sistema de escolas, a desenvolver tanto nas áreas rurais como urbanas...»

 

6.8.16

O que António de Spínola disse

Entrevistado por José Pedro Castanheira (Expresso, 1994)

1.      O acompanhamento de perto da Guerra Civil de Espanha e da ofensiva Alemã na União Soviética, durante a Segunda Guerra (…) «no plano político, permitiram-me reflectir sobre o papel das grandes potências na condução dos negócios do mundo e sobre o papel reservado aos pequenos países quando queiram manter uma soberania visível.»

2.      Em 1961, foi como voluntário para Angola. «O Ultramar, qualquer que fosse o seu futuro, era um desígnio nacional, reiterado por todas as forças políticas, quer situacionistas quer da oposição.

3. «A minha experiência militar, o meu conhecimento da História e a minha experiência no Ultramar (13 anos) ensinaram-me que não havia solução militar para a guerra. (…) Um Estado federado ou uma federação de Estados eram soluções possíveis.»

4.  Conheceu bem Humberto Delgado, mas em 1958, votou no almirante Américo Tomás.

5.      Em maio de 68, foi convidado por Salazar para Governador da Guiné, tendo na audiência que Salazar lhe concedeu, contrariado a tese de «saber esperar» … «Ante a tese de Salazar de “defesa do Ultramar” e de “defesa da Guiné” face à ameaça soviética, tive ocasião de lhe expor a tese da “revolução social”, com aceleração máxima do desenvolvimento económico, em paralelo com a promoção social e cultural dos africanos. Só assim a defesa militar tinha sentido útil. No final, sem contrariar a minha tese, Salazar só me disse: “É urgente que embarque para a Guiné.”»

6.  A nomeação de Marcelo Caetano para presidente do Conselho foi um momento de esperança, «dando-lhe sempre o meu apoio para soluções de abertura.»

7.  Nos dois primeiros anos da sua estadia na Guiné, compromete-se num esforço militar no sentido de recuperar posições. A partir de 1970, é a componente social e política que ganha relevo… «O PAIGC, em 1970, estava enfraquecido, dividido e mais longe das populações, então ainda muito ligadas à Mãe-Pátria. Era altura negociar… 1972 era o ano ideal para medidas concretas.»

 

8. «O objetivo principal da operação Conacri era justamente libertar Amílcar Cabral das pressões sobre ele exercidas pela União Soviética, de que o PAIGC dependia totalmente do ponto de vista financeiro e de material logístico e militar.»

9. «Mário Soares foi um homem corajoso no seu combate à ditadura, aprendeu muito com os desvios da revolução e soube corrigir o seu posicionamento; governou o país sempre em situações difíceis e veio a ser um grande Presidente da República. (…) A morte de Francisco Sá Carneiro foi uma perde nacional.»

10. Em 1972, «nunca me assumi como candidato à Presidência da República. Naturalmente que não temia um confronto eleitoral com o almirante Américo Thomaz em eleições diretas e livres. (…) A escolha feita por Marcello Caetano foi sem dúvida um passo decisivo para o suicídio político.»

11.  O encontro secreto com Senghor realizou-se a 18 de maio de 1972, tendo o Presidente «expresso uma grande simpatia pelo nosso país e louvado a nossa política social na Guiné. Ofereceu-se para intermediário, como defensor duma “autonomia interna” de tipo federativo com Portugal. Informou-me mesmo de que Amílcar Cabral era recetivo a essa ideia. Ele próprio me sugeriu um encontro com o prof. Marcello Caetano em Bissau. (…) Em Lisboa, tudo foi rejeitado por Silva Cunha e Marcello Caetano com argumentos jurídico-legais.

12.   Estabeleceu vários contactos com Amílcar Cabral, embora Luís Cabral e Aristides Pereira afirmem que nunca tiveram conhecimento de tal. Em Outro de 1972, Amílcar Cabral ter-lhe-á proposto um encontro em «território português», através do inspetor da DGS Fragoso Alas.

13.   Reagiu intempestivamente à morte de Amílcar Cabral, em janeiro de 1973, “Lá me mataram o homem”: «Essa reação está correta. E a insinuação foi, na verdade, para PIDE/DGS de Lisboa, que, a proceder assim, agia às ordens do Governo Central, sem qualquer ligação com o Governo da Guiné. Penso, no entanto, que as dissidências internas do PAIGC, habilmente exploradas por Sékou Touré, é que conduziram à morte de Amílcar Cabral. (…) Não havia no PAIGC substituto com igual inteligência e portuguesismo.»

14.   Na remodelação de novembro de 1973 não aceitou ser ministro do Ultramar, porque isso exigia «o compromisso de eu aderir à política ultramarina oficial.»

15.   O livro “Portugal e o Futuro” foi apresentado pelas «vias hierárquicas competentes. Portugal e o Futuro exprimia ideias que eram do perfeito conhecimento do presidente do Conselho. A proibição do livro, de acordo com a Lei, era da competência do ministro da Defesa. Ninguém pode acreditar que o livro não tivesse sido lido pelo ministro da Defesa e pelo presidente do Conselho.»

16.   Não aceitou a proposta de Marcello Caetano de reclamar, junto do presidente Thomaz, a entrega do poder às Forças Armadas. (Golpe palaciano) Tinha o apoio do ministro Veiga Simão, do almirante Pereira Crespo, do Dr. Rui Martins dos Santos, secretário de Estado do Ultramar…

 

17.   O 16 de março de 1974 «foi uma reação de combatentes do Ultramar à minha destituição e à do general Costa Gomes da chefia das Forças Armadas Portuguesas. O sentimento que os motivou foi de profunda revolta, designadamente no seio dos oficiais que serviram comigo (…) Mas o 16 de março foi uma reação espontânea e construtiva de oficiais que fizeram muita falta ao País no período entre 16 de março e 25 de abril. Resultou de uma reação espontânea do Comando de Operações Especiais de Lamego, que teve o seu núcleo no regimento das Caldas da Rainha.»

18.«O plano operacional do 25 de Abril foi da autoria dos majores Casanova Ferreira, Manuel Monge e Otelo Saraiva de Carvalho, membros duma comissão militar de que faziam também parte outros oficiais como o tenente-coronel Garcia dos Santos e o major Moreira de Azevedo, coadjuvados pelos capitães Luís Macedo e Morais Silva e pelo alferes Geraldo. Com o 16 de março, Casanova Ferreira e Monge foram presos, aparecendo no 25 de abril o major Otelo como o principal estratego do movimento.»

19. «Sou de opinião que a iniciativa decisiva de Salgueiro Maia de se deslocar de Santarém para o Quartel do Carmo o tornou merecedor de ser distinguido pelos altos serviços prestados à democracia e ao País.»

20 «Não é verdade que o brigadeiro Jaime Silvério Marques estivesse envolvido no golpe liderado pelo general Kaúlza de Arriaga.»

21.   Tomou posse como presidente da República a 15 de maio de 1974. E empossou Adelino da Palma Carlos como primeiro-ministro no dia seguinte. Spínola demitiu-se a 30 de setembro de 1974, «face à anarquia que invadia as Forças Armadas», pois não podia aplicar medidas de exceção: terminar «com as atividades políticas do MFA» e impedir «as atividades conspiratórias do PC no seio das Forças Armadas, obrigando-o, igualmente, a abandonar a ditadura do proletariado no seu programa e a não impedir a institucionalização da democracia.»

22. «O meu pensamento num governo militar de breves meses destinava-se a promover eleições democráticas rapidamente e a referendar uma nova política ultramarina. Não me bati por esta solução. O Programa do MFA manteve a Junta de Salvação Nacional, de carácter militar, e um governo provisório civil. Foi o programa que eu li aos portugueses e no qual acreditei. Esta solução acabou por se revelar desastrosa com a nomeação de Vasco Gonçalves para primeiro-ministro e a existência da Comissão Coordenadora do MFA.»

23.   O Partido Comunista não cumpriu as suas promessas, ao persistir no modelo soviético. O PC sempre atuou na sombra…

24.   Apesar de na Junta, Rosa Coutinho concordar quase sempre com as decisões de Spínola, este acaba por reconhecer que ao ser nomeado para presidir à Junta Governativa de Angola, a atuação de Rosa Coutinho sofreu uma evolução completa, apoiando deliberadamente as forças marxistas e tomando decisões contra os portugueses residentes em Angola, que considerava inimigos. Spínola defende que «a sua atuação em Angola, junto das Forças Armadas Portuguesas, fomentando a sua rendição, enquadra-se, sem dúvida, no que eu considero um crime de alta traição à Pátria.»

 

25. «Nunca pensei que o Vasco Gonçalves estivesse ligado ao PC e que tivesse tanta falta de senso (…) Quase louco.»

26.   A traição de Costa Gomes: «o comportamento de Costa Gomes no 28 de setembro tirou-me todas as ilusões (…) Até setembro, acreditei na lealdade de Costa Gomes (…) Mais tarde, ao refletir sobre os factos relacionados com a sua permanente conivência com a Comissão Coordenadora do MFA, sobre a sua identidade com os elementos esquerdistas, sobre a destruição dos apoios militares firmes, não posso deixar de lhe atribuir uma ação preparada e premeditada. (…) O seu desejo era que eu abandonasse Portugal logo após o 28 de setembro, revelando-me, assim, que pretendia atuar sem um peso de consciência a viver no país. (…) Posso apenas dizer que a sua convergência com os comunistas foi total no que concerne ao problema ultramarino.»

27. «O 11 de Março inicial não foi um golpe planeado por amadores, mas antes um movimento patriótico a que tinham aderido inúmeros oficiais. (…) O Partido Comunista infiltrou-se habilmente no seio dos militares e conduziu o 11 de Março (…) Os objetivos do 11 de Março que estava programado – e que teria evitado a loucura coletivista que se seguiu – não foram, infelizmente, atingidos.»

28.   Maior sucesso político da vida: «Ter colaborado abertamente nos objetivos previstos no 25 de Abril que, em última análise, se resumiram à restituição da liberdade e da democracia ao povo português».

29.   Maior sucesso militar: «Ter participado como voluntário na Guerra do Ultramar, onde tive o privilégio de correr riscos ao lado dos nossos extraordinários soldados, lídimos representantes do ancestral patriotismo do povo português.»

 

5.8.16

O que os move...

Em 2005, o JL (6-19 julho) perguntava a Manuel Alegre: - Consideras-te um narciso ou não? Estás ou não no centro da tua obra? Ao que Alegre respondeu: «Eu acho que, de uma maneira ou de outra, todos os artistas estão no centro da sua obra.»

E se lermos um pouco mais da entrevista, ficamos a compreender que o escritor tem ideias claras sobre o assunto: «Toda a gente está sempre no centro. O que há é pessoas que não gostam de si próprias. Eu não desgosto de mim, mas não me considero um narciso. Agora quem passou por certas experiências, esteve isolado numa cela, esteve numa guerra onde se morria, viveu dez anos no exílio, numa grande solidão - é evidente que tem de falar de si próprio.»

Nesta defesa, Manuel Alegre parece querer dizer que não é narcisista, pois tem biografia a mais. Centrando-se no seu caso, cita mesmo Semprun: «Porque hei de estar a inventar personagens, quando eu próprio, com a vida que vivi, sou uma personagem muito mais rica do que qualquer outra que inventasse?»

Gosto do conceito biografia a mais, porque pressupõe que o narcisista é o que tem biografia a menos.

 

De facto, por estes dias (e por outros já passados), andam por aí certos rapazes (e certas raparigas) que, talvez por terem biografia a menos, não resistem ao canto da sereia ou de certos mecenas... E valerá a pena recordar que a figura do mecenato, tão aplaudida socialmente, foi desenhada pelos mesmos rapazes que agora se empanturram e desfilam pelos estádios e outras arenas... 

Talvez Manuel Alegre tenha razão. Eu nunca o considerei um desses rapazes narcisistas, porque, ao entrar na Assembleia da República, já ia carregado de biografia...

 

4.8.16

Na vida

Na vida, uns divertem-se e outros amocham... não é que eu pense ter adquirido o hábito de me dobrar para que outros me saltem para cima, mas a verdade é que, em termos de retrospetiva, verifico que tal já me aconteceu demasiadas vezes... E hoje é um desses dias, com a particularidade de ser o meu primeiro dia de férias...

Aqui estou eu, ansioso, à espera, das 14 às 20 horas, que me venham trazer um utensílio doméstico, quando me comprometera, entre as 18:30 e as 20 horas, a fazer o transporte de um animal doméstico no casco da capital...

As horas não foram por mim determinadas e quem o fez não quer saber de coincidências. Limita-se a estabelecer que «no período selecionado não se deve ausentar do local de entrega. Se houver necessidade de se ausentar deverá comunicar a sua indisponibilidade com 24h de antecedência. Caso não seja feita a referida comunicação, deverá ser paga uma retribuição de 15 euros.» WORTEN

Este é o exemplo do dia de hoje depurado de outros factos que não mencionarei, mas que só o agravam.

De qualquer modo, se conseguir ultrapassar estas dificuldades, talvez amanhã amoche um pouco menos... Só que para que tal aconteça, necessito que o telefone toque rapidamente. Sim, porque os transportadores prometem avisar com 30 minutos de antecedência...
(...)
Às 18h23, recebi uma mensagem da Worten que informava «que a sua entrega / recolha esta prevista ser realizada dentro de 30 minutos.» (sic) O que veio a acontecer... e o resto seguiu a ordem prevista, com a compreensão dos intervenientes...

 

3.8.16

Há quem não perca o "andanças"...

Há quem não perca o "andanças"...  Desta vez, um parque de estacionamento virou braseiro. Felizmente, não há perdas humanas... centenas de carros arderam.

Neste "andanças", volto a estar presente, embora indiretamente, e estou sem saber se o carro* das amigas da Susana terá ardido...

O dia de hoje faz-me lembrar o tempo em que o "andanças" decorria no concelho de S. Pedro do Sul. Sempre que lá me deslocava, temia que uma coisas destas pudesse acontecer...

Bem sei das minhas "andanças" que em viagem, no campo ou na praia, o importante é estacionar e que raramente pensamos na segurança de pessoas e de veículos...

* Não ardeu! Il n'était pas écrit là-haut dans le grand rouleau ! (Diderot)

 

2.8.16

Entre o fio mental e o fio dental

Apesar de haver quem diga "que nunca é tarde", a verdade é que eu já não tenho idade para certas coisas, como, por exemplo, correr a maratona ou escrever versos...

E porquê? Porque, numa certa óptica, teria de carregar com toda a tradição daquela famosa corrida ou do ofício de poetar.

Vem isto a propósito de uma crítica literária de Paula Morão "Ana Luísa Amaral - Manto mais brando do pensar", publicada no JL de 19 de Julho de 2005, em que, a linhas tantas, afirma:

Assim, a literatura «fala» numa des-coincidência entre a tradição e o eu que agora diz, e a quem, por ser outro o tempo, «Não interessa onde / estou», como o poema vai repetindo em eco, enquanto busca o «pequeno dicionário/que soubesse de paisagens/ de dentro», um mapa de palavras que emanasse da tradição para traçar o fio mental com que nova Ariadne, o eu se orienta neste tempo poético conforme ao que foi «inventado/há mais de três mil anos», mas em que «nada é já como soía», como escreveu Sá de Miranda. Resta, pois, ao poeta de hoje o recomeço a partir desse húmus de versos e de vozes ecoando no sopro do «vento», a que Zéfiro de Boticelli dá tão bela expressão desde a capa do volume. (A Génese do Amor)

Só a transcrição me deixa exausto. Agora imaginem que, disciplinado na escola de Mário Moniz Pereira, me atirava a uma destas disciplinas, e, em vez da pista ou do piano, me decidia, qual Orpheu, a recuar três mil anos e a embebedar-me do «húmus de versos e de vozes ecoando no sopro do vento...

Este fio mental que a crítica procura a cada momento restabelecer, e que valoriza como cânone, mata qualquer vontade de iniciar a corrida, mesmo que os louros se afigurem longínquos ou até inúteis...

Por uma questão de exercício, vou interromper este registo e continuar a leitura, pois não quero desistir da caminhada para que fui convidado pela Paula Morão...

 

 

 

 

1.8.16

Mário Moniz Pereira acreditava nas capacidades do indivíduo

Faleceu ontem Mário Moniz Pereira. Tinha 95 anos. Para mim, Moniz Pereira era um daqueles homens cuja existência me encoraja a vencer os obstáculos.

Ele acreditava nas capacidades do indivíduo e sabia que, através do trabalho, era possível rendibilizá-las ao máximo. Por isso, os atletas que orientou e treinou atingiram o topo e retiraram Portugal do anonimato.

Através da persistência e do trabalho, é possível ir muito longe. É esse espírito que falta a muitos de nós, mais velhos ou mais novos. Acomodamo-nos demasiado cedo.

Moniz Pereira soube merecer os 95 anos que viveu. Moniz Pereira sempre foi, para mim, uma fonte de emoções... positivas!

 

31.7.16

Esperteza saloia

Bem sei que estas notas estivais não têm qualquer interesse, ainda por cima construídas com base em recortes de jornais de 1993 - JL de 12 de janeiro de 1993. Sob o título Luís Bernardo Honwana - Moçambique a Literatura em tempo de crise, encontro este registo, assinado por NS:

«Depois veio o tempo da subversão contra a ordem estabelecida. Foi preso entre 1965 e 1967. Posteriormente, exilou-se em Portugal, onde frequentou alguns anos o curso de Direito e participou na vida cultural portuguesa, emparceirando com destacados intelectuais progressistas, enquanto prosseguia a sua atividade política. Na véspera da Revolução dos Cravos deixa este país e junta-se finalmente aos guerrilheiros da Frelimo.» 

Não me surpreende que o autor de Nós Matámos o Cão Tinhoso tenha sido preso na província de Moçambique, em 1965. O que é extraordinário é que Luís Bernardo Honwana se tenha exilado na metrópole, onde a polícia política lhe permitiu prosseguir os estudos e a atividade política.

De momento, não sei se LBH integrou A Casa dos Estudantes do Império*, mas não me espantaria, pois, o Estado Novo com esta instituição visava enquadrar politicamente os jovens africanos, de modo a mostrar ao mundo que o colonialismo português assentava numa matriz bem diferente da dos restantes colonialismos europeus.

Ainda agora, o estado português continua a querer provar que é mais esperto do que os outros... (Falar de Estado é um pouco excessivo...)


Da leitura da entrevista, resulta, no entanto, que LHB terá sabido manter-se à tona, pois trabalhou muitos anos como chefe de gabinete de Samora Machel, chegando a ministro da Cultura. Em 1993, já desempenhava funções que o libertavam do "rigor partidário": Presidente do comité intergovernamental da UNESCO, que coordenava um conjunto de atividades que celebravam "A Década para o Desenvolvimento Cultural".

E também, creio, que valerá a pena registar, a propósito da velha questão do desenho das fronteiras que, à época, LHB acreditava que os conflitos poderiam ser ultrapassados através de uma associação de base regional que possibilitaria a "acomodação das nações subjacentes" aos atuais estados da  herança colonial... Estava LHB convencido que, em África, se poderia seguir o caminho da Europa unida, em que ele avistava: o caminho da «regionalização que vai tender a fazer apagar os Estados e puxar a via das nações, em que as nações nem sempre são coincidentes com os Estados.

A Casa dos Estudantes do Império foi criada por sugestão de um ministro das Colónias de Salazar, Francisco Vieira Machado. Mas foi apelidada por um inspetor da PIDE de «alfobre de elementos anti-situacionistas». O Estado Novo acabou por extingui-la em 1965.

 

30.7.16

A Igreja católica angolana e a guerra

Não sei se o José Eduardo Agualusa já se apercebeu do disparate que proferiu em 1993, entrevista ao JL de 12 de janeiro de 1993: «É o caso da igreja católica, que dispõe de meios quase inesgotáveis, de um sólido apoio internacional e da confiança da maioria dos angolanos. A Igreja está em condições de liderar um amplo levantamento popular contra a guerra. Porque o não faz?»

O argumento era completamente disparatado, porque a Igreja católica nunca teve o apoio da maioria dos angolanos - basta pensar que a resistência ao Estado Novo foi, na maioria das circunstâncias, protagonizada pela igrejas protestantes, em Angola como em Moçambique... E essa situação não se transformou após a independência de Angola...

Por outro lado, esperar que o povo desarmado se pudesse opor a um exército fortemente equipado e experimentado não passa de leviandade intelectual...

Esta triste ideia surge numa entrevista em que José Eduardo Agualusa insiste na «base crioula» da angolanidade que desenvolveu numa trilogia, constituída por: A Conjura, 1989; D. Nicolau Água-Rosada e outras estórias verdadeiras e inverosímeis, 1990; A Feira dos Assombrados,1992...

Neste testemunho, o escritor insiste nalgumas ideias que merecem aprofundamento. Por exemplo, «é no século XIX que mergulham as raízes da nossa angolanidade (...) entre 1880 e 1890 há mais jornais dirigidos por angolanos, em Angola, do que entre 1900 e a época actual."

Por outro lado, apresenta como referências linguísticas, Mário António de Oliveira, Luandino Vieira - na esteira do brasileiro Guimarães Rosa - com uma discreta alusão ao pendor antropológico de Ruy Duarte de Carvalho e uma crítica desapiedada a Sousa Jamba...

Os restantes escritores são epígonos de Luandino ou... inexistências, como, por exemplo, Pepetela...

Finalmente, a ideia de que «Angola é uma ilha" cai muito mal num leitor que se habituou a vê-la como um continente...

Esperemos que, em 2016, José Eduardo Agualusa já tenha revisto as suas teses sobre a "angolanidade", mesmo com o MPLA no poder, que, evidentemente, tem todo o direito de combater. Mas com outra argumentação.

 

29.7.16

Irritações nada literárias

«Terra que caminha enquanto os homens dormem, é metáfora de um país que procura a própria identidade.» Mia Couto

As páginas que vou lendo são do JL de 12 de janeiro de 1993 – ainda Janeiro se escrevia com maiúscula – agora amarelecidas, esperam que eu dê conta de uma tarefa que à época fazia sentido, pois lecionava Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa… O título da página 9 anunciava “Moçambique, país sonâmbulo”, a pretexto da publicação do romance Terra Sonâmbula, por Mia Couto…

A frase inicial do entrevistador diz-nos que este romance é «uma terrível metáfora sobre o presente sofrido dos moçambicanos». Embatuco de imediato, pois não faço ideia do que é uma TERRÍVEL metáfora… À força de pensar que a metáfora resulta de uma analogia capaz de expressar o terror do real, fico a embirrar com o adjetivo e com o sujeito que dele se socorreu…

Suspenso da tragédia vivida pelo povo moçambicano, e convencido de que Mia Couto conheceu aquela realidade, enfrento uma nova afirmação desencorajante: «O meu interlocutor tem um ouvido de raríssima sensibilidade». A superlativação da sensibilidade auditiva serve para pôr em evidência que o Autor vai registando, a cada passo, as deformações linguísticas, aproveitando-as para construir o seu idioleto, como se o seu objetivo fosse criar o seu próprio país… O contexto exige, no entanto, a convergência de todos os sentidos, sem esquecer a razão.

Não sei se o refira, mas também me assombra a pergunta do entrevistador do JL: «A grande tragédia que se vive em Moçambique – e que constitui o pano de fundo desta “Terra Sonâmbula” – é, na tua opinião, o que sustenta a necessidade de um género como o romance?»

Não creio que uma tragédia possa ser pano de fundo ou atirada para os bastidores para satisfazer um qualquer “teórico da literatura” … Mia Couto fez o favor de esclarecer que a tragédia é, no caso, um discurso sobre a guerra, construído já em tempo de paz, com os deuses já amansados… Pobres deuses!

Depois surge a inevitável falta de distância. O que é que isto significa? A necessidade de se acomodar? E também «a segurança pessoal numa sociedade desgovernada na qual o cidadão não tem defesas», que o escritor ultrapassa não personificando a violência do terrorismo, a arrogância do poder.

Isto é, os rostos são substituídos por máscaras…

 

28.7.16

Porque sossego é coisa rara...

Deixada à mão de qualquer pirómano, Caruma é um verdadeiro perigo para o território e para si própria.

Se pudesse, Caruma aproveitava a canícula para se esconder no interior do glaciar mais próximo. Mas como? Mesmo que o vento a levasse, corria o risco de se despenhar no primeiro vulcão...

Face aos perigos que a ameaçam, Caruma decidiu calar-se por uns tempos a ver se o verão a deixa incólume... o mesmo é dizer a ver se os pinheiros sossegam...

Porque sossego é coisa rara...

 

27.7.16

Desconfio dos eurocratas europeus

« Le réflexe naturel de qui ne comprend pas une langue, s'il imagine être dans un milieu hostile et on cherche à l'humilier, c'est de se méfier... » Béatrice Didier

É o meu caso! Eu não compreendo a língua de Bruxelas, e estou certo de que, nos últimos meses, o objetivo dos eurocratas europeus (peço desculpa, se a expressão parecer pleonástica) era humilhar os portugueses.

Por isso desconfio da notícia de que não haverá multas... Hoje já ninguém fala de sanções, talvez porque confundamos os termos. No entanto para os eurocratas, uma multa é diferente de um corte nos fundos, sem esquecer a necessária asfixia orçamental em 2016... Qualquer coisa situada entre os 350 e os 450 milhões de euros. Trocos...

Enfim, hoje até concordo com os argumentos do PCP. Quem diria?

 

26.7.16

Tinhas 19 anos...

Tinhas 19 anos, sentavas-te num banco de jardim, e choravas porque não te compreendiam. Esperavas, talvez, o cavaleiro andante que te libertasse dos algozes e te conduzisse ao palácio encantado da ventura...

Houve tempo em que o ouro pareceu brilhar, mas os algozes nunca te libertaram. Pelo menos é o que continuas a dizer, agora de forma ainda mais anelante - os algozes já não se limitam a cercar o palácio, entraram nele e perseguem-te, deixando-te exausta e inerte, sem perceberes que a única forma de evitar a dor, o silêncio e a escuridão, é chamá-los para perto de ti... e ouvi-los, um a um...

Quanto ao cavaleiro andante, esse nunca existiu. Mais não foi que um sonho teu, em que, no palácio, te fizeste prisioneira de ti própria...

 

25.7.16

Não é preciso fabricar mais armas...

Escrever sobre uma personagem, por exemplo, Julien Sorel, poderia ser uma hipótese. Mas parece-me arriscado. Stendhal criou-a para poder dar conta do modo como a ambição secava tudo à sua volta, mesmo que para tal tivesse de vestir a pele do lobo e do cordeiro. Julien Sorel ora veste uma ora veste outra, e em cada papel "esmaga" os que lhe caem na rede. Só que Julien Sorel não é um indivíduo, é a máscara do ser humano na primeira metade do século XIX francês. Mesmo quando vítima, Julien Sorel é carrasco...

Comecei por dizer que não queria arriscar, mas acabei por tecer um conjunto de considerações só justificadas pela vertigem de escrever...

E essa vertigem quer dar conta de pensamentos incompletos e desconfortáveis. Por exemplo, perante os novos terroristas do século XXI - jovens desadaptados que não suportam viver sem os luxos que a propaganda e o marketing lhes dizem estar ao seu alcance... pequenos delinquentes frustrados, mas conscientes de que só conseguirão a plenitude se forem notícia de sangue...

No turbilhão de ideias, uma se evidencia: a de que cada ser humano é uma arma em potência ou já em movimento. Não é preciso fabricar mais armas, basta espalhar a desigualdade e a injustiça!

 

24.7.16

A enxurrada é inevitável

Saber lidar com a mudança não é o mesmo que adaptar-se à mudança, até porque, muitas vezes, esta significa mudar para pior.

Por exemplo, saber lidar com pessoas que se encontram à beira de um ataque de nervos é bem diferente de lidar com pessoas mergulhadas numa depressão profunda. Há pessoas que se enervam com pouco, por exemplo, com aquelas que se revelam indisponíveis para acolher certas campanhas alegres...

(Elaborar relatórios de todo o tipo é uma mania institucional, cujos efeitos são invisíveis. Muitos são copiados e os restantes encomiásticos, sem esquecer que quase todos são autorreferenciais.)

Diz-se que o mundo está diferente, o que significará que ele mudou, só que mudou para pior e porquê? Porque quando se abre a comporta, a enxurrada é inevitável. Durante décadas, o rio extravasou e agora soam as trancas à porta...

No que me diz respeito, o mais grave é que não sei o que é "a mudança", a não ser em termos tecnológicos, mas o desenvolvimento tecnológico não tem qualquer impacto na melhoria do ser humano... Pelo contrário...

 

23.7.16

Suspensão de 16 fundos estruturais

A Comissão Europeia vai propor ao Parlamento Europeu a suspensão de 16 fundos estruturais em Portugal como sanção pela violação do limite do défice de 3% do PIB em 2015.

Por mim, parece-me uma proposta inteligente, embora eu não perceba porquê... Mea culpa!

Nunca soube quantos eram os fundos estruturais, nem nunca lhes vi o fundo. Também não sei o que é que o adjetivo "estrutural" significa, pois, até ao momento, o que oiço é que "as reformas estruturais" continuam por fazer.

Dizem-me que esses fundos fizeram entrar muito dinheiro em Portugal e que este fez enriquecer muita gente. Não é o meu caso!

Há, também, quem diga que os fundos foram desviados..., mas não se sabe quem o fez e parece não haver maneira de o saber...

Em consequência, a proposta da Comissão Europeia parece-me inteligente. Só peca por tardia!

Infelizmente, a Comissão Europeia acabará encontrar uma solução "inteligente" para que nem todos sofram com a referida suspensão. Entenda-se, para aqueles que se habituaram a desviar os fundos...

 

22.7.16

Um beco hifenizado

Esta tarde, sob uma tabela de cotações, fui escrevendo a lápis "quando deixamos de conseguir acompanhar a mudança"; vejo agora que melhor teria sido ter escrito "lidar com a mudança", pois o que se nos exige não é uma atitude estética, mas, sim, um comportamento útil... e a ideia fazia-me mergulhar num beco-sem-saída - um beco hifenizado para que não haja espaço de fuga. 

Entre parênteses escrevera " E a mudança, a cada dia que passa, é mais frequente e mais exigente". Sim, porque o terrorista já não precisa de atravessar qualquer fronteira, nem de se esconder sob a ideia da autodeterminação coletiva. Já não são necessários tambores de aviso, porque o sinal interior pode deflagrar a qualquer momento. Ao contrário do que se diz, o terrorista não é lobo solitário porque ele não tem fome, ele apenas se quer autodeterminar - autodeterminar-se a si próprio de forma ruidosa; o dia chegará em que o fará de forma silenciosa...

Apercebo-me, agora, que, sob a tabela de cotações, acrescentara: "No entanto, quando esperávamos percorrer resignadamente o caminho em falta, surgiam vozes a bater à porta, desesperadas, convencidas de que poderíamos ser o abrigo derradeiro. Solução pontual, porque só dura o que falta percorrer do caminho. Do lado de lá, pode haver saída, mas só para quem quiser fazer parte da mudança."

O problema é que no beco hifenizado não é possível avançar nem recuar. Talvez o Dédalo ainda nos possa ajudar! 

 

21.7.16

Decreto o estado de emergência em Portugal

Uma serpente venenosa anda à solta em Lisboa. Consta que estará escondida em duas escolas... Na ponte 25 de abril, regressaram as buzinas...

O PSD quer acabar com o pagamento de portagens na Via do Infante...

O Presidente da República considera que é inadmissível querer referendar a continuação de Portugal na União Europeia...

Os amigos de Cavaco Silva promovem um almoço de «amizade e gratidão» no próximo sábado. A nova administradora do Grupo Caixa, Leonor Beleza, é a mandatária do festim...

A Polícia Judiciária continua a apreender material informático aos bancos, deixando de fora o Banco de Portugal...

As obras do Liceu Camões, como as do TGV e muitas outras, já custaram uma fortuna e continuam por realizar...

Em França, Hollande prorrogou o estado de emergência; na Turquia, Erdogan não perdeu a oportunidade e fez o mesmo; na Venezuela, é o que se sabe...

Face à presente situação, creio que alguém deve decretar o estado de emergência. Eu não me importo de o fazer.

 

20.7.16

Aposentação de docentes com 40 anos de descontos

Dois projetos de resolução recomendando ao Governo a possibilidade de docentes com 40 anos de descontos se poderem aposentar sem penalizações foram hoje reprovados no parlamento, motivando apupos e críticas de cidadãos presentes nas galerias.

Os textos, apresentados por PCP e "Os Verdes", tiveram voto favorável destes partidos e do Bloco de Esquerda (BE), merecendo a abstenção do deputado do PAN e o voto contra de PS, PSD e CDS-PP.

Para quem ainda acredita em promessas, a votação de hoje mata as ilusões e esclarece que o Bloco Central continua de saúde. O resto são cantigas!  Nem o PAN!

 

Aproxima-se o estado de emergência na Turquia

O Conselho de Ensino Superior (YÖK) proibiu, até nova ordem, todos os universitários de se deslocarem ao estrangeiro, anunciou esta quarta-feira a agência estatal Anadolu. O YÖK exige que a situação de todos os universitários que se encontram actualmente fora do país seja examinada e que estes regressem à Turquia o mais rapidamente possível, exceto em caso de “necessidade imperiosa”, adianta a Anadolu.

Do que é que o senhor Erdoğan tem medo? De que os estudantes universitários fujam do país e / ou não queiram regressar ao país? Em linguagem diplomática, o que é que significa "necessidade imperiosa"? Espionagem?

Desconfio que se avizinha o momento em que os Turcos vão ter de jurar defender o Ditador, colocando a mão sobre o Corão, caso contrário serão proibidos de exercer qualquer atividade pública e privada e, simultaneamente, impedidos de sair do país.

O que é que os espera? O conformismo e a submissão, em nome de Deus e da Democracia, com a particularidade deste Deus ter rosto - o de Recep Tayyip Erdoğan.

 

19.7.16

O ditador Erdogan e a educação

Após o pedido para reintroduzir a pena de morte no país, o governo turco põe em causa as bases da democracia com uma purga que atinge todos os sectores da sociedade. É agora o caso da educação, onde mais de 15 mil empregados foram suspensos. Paralelamente foram também revogadas as licenças a mais de 21 mil professores de instituições privadas de ensino. O ministério da Educação ordenou também a demissão de 1.500 reitores e diretores de cursos universitários.           (Em nome da democracia e de Deus!)

Como interpretar tais decisões? Qual é o objetivo? Provavelmente, substituir as escolas e as universidades pelas madraças. Ou será que o objetivo é acabar com o ensino?

Parece que o Ocidente se prepara para devolver o leme a Vasco da Gama!

 

É obra! Ou será prémio?

Mas não é só o resultado do referendo que está a preocupar os técnicos do FMI. “O choque do Brexit surge entre situações por resolver no sistema bancário europeu, em particular nos bancos italianos e portugueses", lê-se no relatório do FMI.

11 milhões de portugueses - muitos sem qualquer cêntimo no bolso - podem pôr em causa as finanças de 7000 milhões de habitantes deste triste planeta! É obra!

Nós já temos tendência para o exagero e para a megalomania... só não esperávamos era tamanho destaque vindo de quem frequentemente ignora a nossa existência. 

Entretanto, o Grupo Goldman Sachs viu o lucro trimestral subir 78%, para 1,82 mil milhões de dólares, superando as expectativas dos analistas, com a valorização das obrigações e obrigações subordinadas, avança a Reuters.

Finalmente, não devemos esquecer que o português José Durão Barroso vai iniciar funções como presidente do conselho de administração da Goldman Sachs Internacional. É obra! Ou será prémio?

 

18.7.16

A purga turca do ditador Erdogan

No imediato, a purga turca não fica a dever quase em nada às grandes purgas levadas a cabo durante e depois da Revolução francesa...

A purga turca só não é completa, pois o Parlamento aboliu a pena de morte, a 3 de Agosto de 2002, salvando da execução capital o líder do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), Abdullah Öcalan, condenado à morte e detido numa prisão do Mar de Marmara.

Agora, o ditador Erdogan espera repor a pena de morte, porque esta lhe permitirá purgar os partidos políticos, a magistratura, as forças armadas, as polícias e a função pública e, sobretudo, eliminar as minorias, decapitando os seus líderes, a começar por Abdullah Öcalan... 

E fá-lo em nome da Democracia e de Deus!

Convém, entretanto, não esquecer que a abolição da pena morte era uma velha exigência da União Europeia, sem a qual a adesão da Turquia à Comunidade seria impossível. 

O sonho turco voltou ao início, mas a Turquia dispõe atualmente de uma nova arma de arremesso: 3 milhões de refugiados...

 

17.7.16

Saber tirar vantagem

Estou a (re)ler Le Rouge et le Noir, de Stendhal, e sinto que o leio pela primeira vez. Da primeira leitura, pouco sobrou, a não ser certos vislumbres do que "poderá vir a acontecer".

É um romance sobre as castas sociais, sobre a religião e sobre o amor, sobre a província e a capital, em que o comportamento humano é idêntico. Os protagonistas procuram a todo o transe ganhar vantagem, independentemente da condição social.

Em termos políticos, o liberalismo procura ganhar vantagem à velha e à nova aristocracia. O método é, no entanto, o mesmo, como se se quisesse assegurar que a Revolução fora incapaz de modificar as mentalidades. Ou como se, reunidas as condições, a atitude do pobre e do rico, do nobre e do plebeu, do religioso e do burguês, do cônjuge e do amante, fosse rigorosamente igual: vingativa, manhosa e oportunista...

Da leitura, ficam-me algumas ideias: Stendhal é um escritor que tira vantagem da leitura dos clássicos e dos modernos; que Eça de Queiroz soube ler Stendhal e não apenas Flaubert e Zola; que a condição humana sofre de narcisismo, ambição e mesquinhez; que, hoje, tudo continua na mesma.

O importante é saber tirar vantagem.

 

16.7.16

Uma bênção de Deus

Perante o que ocorreu a noite passada na Turquia, só me vem à cabeça uma ideia: há cada vez mais países governados por homens sem formação intelectual e ética... e, consequentemente, rodeados por sectários da mesma natureza... 

Chegados ao poder pela força ou pelo voto popular, estes governantes nunca são submetidos a análise de carácter nem de competências para o exercício do cargo.

Em comum, têm a capacidade de controlar todos os pilares do poder, e ao fazê-lo tornam-se inamovíveis.

De vez em quando lá se abre uma brecha, logo esmagada, e vista, de imediato, como "uma bênção de Deus".

No fundo, é o que se está a passar na Turquia, na Síria, na Venezuela, no Brasil, no Zimbabwe, em Angola, na Rússia, no Sudão... e um destes dias nos Estados Unidos da América...

Quanto a Deus, deve andar muito desatento...

Entretanto, na Europa democrática, vai-se fazendo vista grossa...

 

15.7.16

Exacerbado o 'espírito crítico'...

Numa sociedade em que desenvolver o espírito crítico se tornou uma prioridade, sem que se defina o que é "o espírito crítico, não espanta que este se confunda com rebeldia, com revolta.

Motivos de revolta não faltam e os motivos de rebeldia sobejam, o que associado ao referido "espírito crítico" é suficiente para que cada um entenda que está no seu direito de mudar o mundo.

A mudança pela força é o melhor argumento daqueles que, exacerbado o espírito crítico, perderam a esperança ou acreditam que a única forma de construir um mundo à sua medida é a violência.

La Promenade des Anglais, em Nice é, apenas, um exemplo. Hoje, estou bastante intolerante, porque, afinal, também eu tenho dado prioridade ao desenvolvimento do espírito crítico... e os ecos que me chegam são dissonantes. Podia explicar porquê, mas não o vou fazer...

 

14.7.16

É tempo de acabar com a chalaça!

O cidadão endivida-se e tem de pagar a dívida. Os governantes endividam-nos e nós é que temos de a pagar.

Há, no entanto, visões distintas: certos governantes consideram que a dívida pública não é para ser paga; outros, fazem finca-pé em que a paguemos, mesmo que isso nos custe a vida..., só que, afastados da governação, limpam as mãos como Pilatos...

Agora, temos uma nova categoria de governantes que entendem que a dívida é um problema que não lhes diz respeito - afinal, não foram eles que a geriram...

Dívida só a que eles deixarem, depois de devidamente escondida...

As dívidas, como todos sabemos, obedecem a um calendário em nada semelhante ao dos ciclos governativos e, como tal, não deve ser tratada com argumentos eleitoralistas, como o atual primeiro-ministro insiste em proferir. É tempo de acabar com a chalaça de peito inchado... e de trabalhar um pouco mais. Com tanta romaria...

 

13.7.16

Os resultados dos exames de Português foram medíocres

Disseram que o exame de Português do 12º ano era "superacessível e superfácil", mas os resultados foram medíocres.

Para esta divergência entre as expectativas e o desempenho há uma explicação. Uma parte significativa dos jovens do ensino secundário não ouve e pensa que sabe tudo. Contesta quase tudo, mas não sabe argumentar, porque não estuda ou, quando o faz, confunde o trabalho intelectual com "achismo" ou, simplesmente, com memorização.

E claro que esta explicação não se esgota em si... é preciso procurá-la um pouco mais fundo: na sociedade, na família, na escola, na sala de aula, em cada um dos intervenientes no processo educativo.

 

12.7.16

Não há "multa zero". Não à "multa zero"!

O comissário europeu para o euro, Valdis Dombrovskis, admite que Portugal poderá ter apenas uma "multa zero", depois de o Conselho de Ministros das Finanças da União Europeia (Ecofin) ter aprovado hoje a abertura de um processo de sanções por défice excessivo no ano passado.

 

Outrora, era possível comprar uma empresa por um escudo, quando o passivo era enorme. O comprador encarregava-se de recuperá-la, assumindo os encargos...

Entre 2012-2015, um Governo garantiu-nos que cumpria tudo o que a União Europeia exigia, fazendo-o porque considerava justo que os portugueses pagassem pelos desmandos dos governos anteriores. Era uma questão de honra!

Sabemos, entretanto, que esse governo, para além de mentir, vendeu, a baixo preço, grande parte do património mais lucrativo.

Hoje, o ECOFIM aprovou um processo de sanções por défice excessivo nos anos anteriores.

Despudoradamente, a ex-ministra das Finanças responsabiliza o atual Governo pela decisão... E ninguém se revolta contra tal descaramento! Eu, que não gosto de manifestações, promovia uma para deixar claro que a política de subserviência foi errada... e também para dizer à coligação que apoia o Governo que não há "multa zero"... O simples facto de se passar uma multa é uma penalização para os portugueses que agravará ainda mais a dívida.

Em suma, o Governo atual deve acabar com o cumprimento de algumas promessas que bem sabe que, mais tarde, pagaremos com língua de pau. E também acabar com o nepotismo cada vez mais visível no sector público...

Finalmente, o Governo, que domina mal a arte da retórica, deve perceber, de uma vez por todas, que, do outro lado, o sorriso esconde sempre o cinismo.    

 

11.7.16

Dimitri Payet, o crime compensa...

Dimitri Payet, carrasco de Cristiano Ronaldo, é o melhor jogador do euro(peu). Como se costuma dizer, o crime compensa...A minha hesitação entre 'euro' e 'europeu', resulta de o melhor jogador do euro ser, na verdade, o Zé barroso; o durão Dimitri Payet Pode ser que o homem não tenha agido intencionalmente, mas o ato não pode ser totalmente desligado da intenção do selecionador francês: «Não acredito que seja possível anulá-lo (CR), mas vamos estar atentos e tentar limitá-lo». E conseguiram, mas o tiro saiu-lhes pela culatra.

Quanto ao Zé barroso, não há quem o trave, com ou sem crime... (Entretanto, para mim, o europeu 2016 já terminou.)

 

11.7.16

A formiga ganhou

Em síntese, a formiga ganhou. A formiga obreira, mesmo se calcada, nunca desistiu.

No essencial, a formiga representa todos aqueles portugueses que contrariam a adversidade, e ousam enfrentar coletivamente todos os obstáculos que lhes surgem ao caminho...

(...)

A cidade-luz, ao perder a cor, não está à altura da tão apregoada igualdade, pois "esqueceu-se" de se solidarizar com o vencedor - o seu símbolo maior não se iluminou com as cores de Portugal...

(...)

Finalmente, desvalorizar a ação do Éder, como continua a ocorrer em certos canais televisivos, faz de alguns comentadores pobres cigarras...  

 

10.7.16

Antes que se faça tarde...

Antes que se faça tarde, desejo que, no França /Portugal, os jogadores se entreguem ao jogo e que ganhe a melhor equipa.

Não me interessa qualquer acerto de contas futebolístico ou outro. Considero detestável o modo como esta final tem vindo a ser apresentada como vingança dos "petits portugais". 

E, sobretudo, não ignoro que, apesar de múltiplas humilhações, o fluxo migratório para França, quase sempre clandestino, nos anos 60, libertou mais de um milhão de portugueses da miséria em que vivia nesta ditosa pátria...

O jogo entre portugueses e franceses deveria ser de união, e apenas isso. A reconstrução da França muito deve aos portugueses que, por sua vez, quase sempre encontraram no Hexágono o lugar de redefinição das suas vidas.

Há muito que penso deste modo, até porque num certo dia de Julho de 1964, o meu pai teve de partir para França porque o granizo lhe destruíra o pouco que lhe restava da esperança...

 

9.7.16

O Zé barroso não é o meu herói!

Não é verdade! O Zé barroso não é o meu herói! E também não é o pícaro anti-herói. De nada serve querer classificar o Zé, embora ele não seja único e, como tal, classificável...

Faço este esclarecimento porque não quero que algum leitor apressado me confunda com gente de tal laia. Nunca quis tal confusão, embora um dia um tio, supostamente bem informado, me tenha acusado de pertencer ao MRPP.

Por experiência antiga, sei que nunca poderia alinhar por essa cartilha. Ainda não esqueci os anos de 1975-77, no Liceu Passos Manuel, quando aquela seita me boicotava as aulas de Português, ao recusarem-se a ler Os Gaibéuso Constantino Guardador de VacasOs EsteirosA Abelha na Chuva, tudo porque os autores seriam seguidores do Barreirinhas Cunhal... O Zé barroso não é o meu herói!

PS. Nesta literatura de Zés, há que não esquecer o Zé, primeiro - o do terramoto - e o Zé, Sócrates - o da bancarrota...

 

 

 

 

8.7.16

O Zé barroso é o meu herói...

O Zé barroso é o meu herói desde os tempos em que, sob o olhar atento do timoneiro, Arnaldo de Matos, lutava contra o capitalismo, a guerra e a CIA, sem esquecer o KGB... Longe vão os tempos, mas, para ele, a luta continua!

Consegue estar sempre no sítio certo, na hora certa. Eu, apesar da hora certa, estou sempre no lugar errado. Talvez, porque não me chamo Zé.

A explicação não é fácil! No entanto, já o Zé, o carpinteiro, soube aproveitar o momento, apesar do que outros Zés, do tipo saramago, insinuam...

Sem esquecer, o Zé, o mourinho, que, também não perde uma oportunidade...

E claro, é melhor não esquecer o Zé, do bordalo e do manguito, que, contrariamente ao que se afirma, sempre se esteve nas tintas para o povinho.

Começo a acreditar que isto de se ser Zé é meio caminho andado. Por exemplo, no próximo domingo, o Cristiano, para mim, passa a chamar-se Zé, o ronaldo. E se tal não for permitido, que o Fernando não se atreva a retirar da equipa, o Zé, fonte...

 

7.7.16

Há muito que deitei fora a chave

Começo a compreender aqueles indivíduos que levam tudo a brincar. Por vezes, parecem irresponsáveis, mas, provavelmente, a atitude deles é a que melhor se adequa à realidade que vamos construindo - uma realidade postiça, parola e artificiosa...

Lá no fundo, a jocosidade é expressão de um embate perdido, mas que insiste em levar a melhor sobre a tradição... Defender a tradição mais não é do que legitimar o poder instituído, seja ele qual for.

A verdade é que eu levo demasiado a sério situações que se apresentam como absolutas, que, no entanto, também elas são formas de preservar um outro tipo de poder, mais profundo e despótico, que não sei nomear, mas que determina o modo como leio, como rio e até como escrevo...

Em suma, falta-me o sentido de humor e nem a ironia me consegue compensar da prisão em que vivo.

Há muito que deitei fora a chave e por isso espero que o barqueiro passe, embora me comece a faltar o óbolo para lhe pagar a viagem.

  

Que Fernando Santos retire o pé do travão...

Primeiro, a cruz, depois, o padrão.
Primeiro, o rei, depois, o cidadão.
Primeiro, a fé, depois, a liberdade.

Agora que Portugal se apurou para a final do campeonato da Europa de futebol, e "as finais são para ganhar", esperemos que o engenheiro retire o pé do travão e liberte os jogadores das vírgulas...

 

de pouco serve a cruz

se já não há rei

nem padrão

 

que o cidadão finte e remate

até que o bloco europeu derreta

 

6.7.16

Um povo que, para ser, precisa de crer!

Primeiro, a cruz, depois, o padrão
Primeiro, o rei, depois, o cidadão
Primeiro, a fé, depois, a liberdade

Um povo que, para ser, precisa de crer!

Só um povo maltratado pode acreditar tanto no jogo
E não importa quem perde, perdemos todos!
E não importa quem ganhe, ganhamos todos!

Um povo que, para ter, precisa que alguém vença por ele...

 

5.7.16

O cabo de esquadra e as novas competências

Não basta ser político para se ser competente, já dizia o cabo de esquadra do Estado Novo. Segundo ele, a competência era apanágio daqueles que se julgavam eleitos por Deus.

Só os eleitos sabiam definir o rumo; aos restantes, decidida a missão, mais não restava do que cumpri-la. Se necessário, com a própria vida...

O cabo de esquadra não sabia o que era o messianismo - na expressão nacionalista, o sebastianismo -, mas sabia identificar o Eleito, e como tal, agia sempre em seu nome, o que significava, para ele, cumprir a vontade do Senhor... 

Agora que os políticos se preparam para rever as competências necessárias a um jovem obrigado a cumprir a escolaridade obrigatória, há uma questão que me atormenta: necessárias para quê?

 

Entretanto, o cabo de esquadra já me começou a soprar ao ouvido que não devo atormentar-me, pois os desígnios do Senhor são insondáveis. Basta que eu dê atenção ao Eleito para orientar tal missão: Guilherme de Oliveira Martins - católico, praticante; socialista, quanto baste; paladino da interculturalidade; educador realista; zeloso defensor das finanças públicas e privadas; servidor abnegado de fundações... e sobretudo, capaz de navegar em todos os contextos políticos. Competência não lhe falta!

 

4.7.16

Sorte, a de Miguel Torga, não teve de comparecer!

O antigo primeiro-ministro José Sócrates está presente na inauguração do Espaço Torga, em São Martinho de Anta, Sabrosa, projecto que impulsionou enquanto chefe de Governo (2005-2011).

Sorte, a de Miguel Torga, não teve de comparecer!

Homem, genuinamente socialista, nunca foi complacente com o poder, nem quando este o perseguia, nem quando as afinidades políticas poderiam explicar alguma conivência. Soube sempre afastar-se dos interesses e, sobretudo, recusou favores, mesmo que tal significasse um progressivo ostracismo.

Profundo conhecedor do povo, defensor de uma identidade portuguesa e ibérica, austera e honrada, Torga, se fosse vivo, dificilmente ficaria em silêncio na presença de tão ilustres governantes. 

 

3.7.16

Do lado de lá do anonimato

Como é que se pode considerar interessante uma história sem enredo, sem definição das circunstâncias?

Não basta partir do pressuposto de que o leitor se interessa pela referência para que a história ganhe consistência.

Por aquilo que vou observando, a história acontece quando se espera agitadamente por um olhar, uma atenção, um autógrafo do ídolo de momento, para que os possamos partilhar numa rede social.

Afinal, a história acontece quando, momentaneamente, passamos a ser vistos do lado de lá do nosso anonimato.

Na verdade, o que custa é não existir aos olhos dos outros. Pelo menos, assim parece! 

 

 

 

2.7.16

O interessante nesta história...

Os peixinhos da Quinta das Conchas estão demasiado inchados. Não creio que estejamos na presença de nenhuma variedade de peixe-balão, o que, de si, também seria preocupante. Portanto, os pobrezinhos devem estar a engolir demasiadas bactérias, não tendo forma de se defender...

Felizmente, o nosso presidente Marcelo ainda dispõe de livre-arbítrio, tendo sabido desfazer-se do Mercedes de 129.000 € que o ex-presidente Cavaco lhe ofertou. Para quem prezava a austeridade, é obra!

O interessante nesta história é que o peixinho foi parar às mãos do primeiro Costa que não encontrou forma de se livrar da bactéria... talvez, porque, a seu tempo, não tenha cuidado devidamente dos lagos da Quinta das Conchas...

(A realidade deve ser muito diferente, mas aqui fica a minha interpretação, esperando que ela esteja errada...)

 

1.7.16

Reações

Pedir para explicar uma reação pode tornar-se um bico-de-obra. Há situações em que a reação não tem explicação possível.

Ainda se alguém pedisse para indicar os sinais dessa reação.... Por exemplo, a ex-ministra das Finanças insiste em reagir à política económica e financeira do atual governo... O melhor seria estar calada, mas não, ela prefere falar sem dizer nada, e fá-lo num tom birrento e infantil de criancinha mimada...

A menina bem poderia aprender com o Cristiano Ronaldo que não reage ao falhanço no Portugal-Polónia, pois, no íntimo, nem ele próprio compreende por que motivo o automatismo falhou...

Um outro mau exemplo é o do João Soares que insiste em reagir, no caso, à condenação do Macário Correia - pretensa vítima das patranhas da Justiça...

 

30.6.16

A inocência do diretor do Museu da Presidência

«O Diretor do Museu da Presidência da República, Diogo Gaspar, é suspeito de levar para a sua residência de férias, no Alentejo, quadros e estátuas da instituição.»

Estou convencido de que o Diretor da Museu da Presidência, Diogo Gaspar, levava as obras de arte para casa para as poder estudar sossegadamente. Os ex-presidentes eram muito espalhafatosos (Sampaio e Cavaco) e estavam sempre a interpelá-lo sobre os temas, a perspetiva, as cores, os materiais, o claro-escuro, a adequação ao lugar...

Se forem chamados a depor, Sampaio e Cavaco darão certamente testemunho dos fins de tarde, em que Diogo Gaspar, depois do apurado estudo provinciano, lhes satisfez minuciosamente a curiosidade.

Só esse zelo e abnegação podem explicar a necessidade sentida pelos ex-presidentes da República de o condecorar...

 

A luz verde do senhor Wolfgang Schäuble

O ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, declarou esta quarta-feira que Portugal precisa e deve pedir um novo programa de ajustamento. Mais, acrescenta o governante alemão, se o fizer terá 'luz verde'.

Este alemão, apesar do recuo, disse o que a Alemanha quer de Portugal. Por mais que os nossos governantes se contorçam nas cadeiras ou inventem soluções para "esconder" a dívida dos bancos, das empresas, do estado e dos particulares, o caminho está à vista de todos... 

Penso que deveríamos levar a sério o conselho de Wolfgang Schäuble, e dizer-lhe que, em Portugal, "luz" e "verde" são termos incompatíveis... 

O senhor Wolfgang Schäuble, para além, de deixar de fingir que se precipitou, o melhor que tem a fazer é dar um pouco mais de atenção à cultura portuguesa, até porque nela encontrará muita da prepotência que o caracteriza.

 

29.6.16

Um exemplo de ironia: a excecionalidade da retenção

O Ministério da Educação defendeu que cabe às escolas decidir se um aluno com muitas negativas passa ou não de ano, no âmbito do carácter de excecionalidade das retenções previsto na lei, interpretado de forma livre pelos estabelecimentos.

Leio a nota do ME, tendo no horizonte a recomendação do FMI de que Portugal necessita de reduzir o número de professores, e eu concordo não com o ME, mas com o FMI...

Há alunos que transitam com 7 classificações negativas e outros não. Transitam para onde? 

Pois, deve ser para o ano seguinte. E o que é que fazem no ano seguinte? Dão cabo da turma em que são inseridos e fazem perder a paciência ao Diretor de Turma, sem esquecer os pobres dos professores, às voltas com as chamadas estratégias de recuperação e / ou de enriquecimento. 

Muito da depressão dos docentes tem origem nesta trapalhada, em que muitos chutam para a frente de qualquer modo, porque é considerado incorreto reter o aluno ou, em alternativa, criar turmas de nível.

O insucesso não é apenas resultado da retenção. Em muitos casos, ele é fruto da transição. Há, por aí, muito sucesso individual que tem contribuído para o atraso estrutural deste país.

Não consigo entender por que motivo não são criadas turmas de nível nas disciplinas estruturantes, como Português, Matemática, Língua Estrangeira, História, Filosofia... com os recursos docentes e pedagógicos mais adequados.

Sim, mas para isso, o ME tem de se instalar nas escolas, averiguar o que lá se passa e disponibilizar os recursos financeiros necessários.

Nota final: a figura da autonomia pedagógica é, neste caso, uma boa desculpa para a (ir)responsabilidade do ME.

 

28.6.16

A ironia não é coisa séria!

Eu raramente leio a revista Visão. Não por falta de visão, mas por falta do vil metal. No entanto, quando o faço, consulto sempre a ficha técnica para verificar se o meu antigo aluno, Filipe Luís, por lá continua. Lembro-me dele, porque integrava uma turma do 9º ano (Escola Secundária de Santa Maria - Sintra) de boa cepa - vários alunos mostravam-se competentes no exercício da escrita, tendo já iniciativa jornalística e radiofónica...

Esta memória, creio que está correta, mas pode ser o resultado de "um desmiolado" capaz de "vender a própria mãe para dispor de acesso livre ao Estado" ou, em alternativa, uma daquelas "pessoas de bem que se servem dos gays para se promoverem". Esta classificação, um pouco contraditória, tem autoria: o sociólogo Alberto Gonçalves.

Quem, de vez em quando, lê os meus desabafos, sabe que eu tenho especial apreço por este sociólogo, que eu costumo encontrar ao domingo no Diário de Notícias. A verdade é que não esperava encontrá-lo na Visão, mas, afinal, ando mal aconselhado - ele deve estar um pouco por toda a parte, a destilar o ódio que nutre pelo PS...

Desta vez, o principal alvo é a sua direita que anda cega, o que me leva a pensar, provavelmente, de forma incongruente, que a ironia é um tropo incompreendido pela direita. A ironia não é coisa séria!

E curiosamente lembro-me que sempre me afligi quando os meus alunos não conseguiam perceber se aquilo que eu lhes dizia "era a sério ou a brincar"... 

(Visão, 8 junho 2016, última página.)

 

27.6.16

Renovação geracional

Num tempo de globalização e de mudança tecnológica constante, esperar-se-ia que aqueles que mais tempo trabalharam cedessem o lugar aos mais jovens. 

Essa substituição seria naturalmente regenerativa, porque traria nova energia, novas ideias e, principalmente, uma superior capacidade de lidar com a mudança...

Por exemplo, na educação, esse processo de substituição traria uma aproximação geracional que, em si, só poderia reforçar o clima relacional e, consequentemente, acelerar o desenvolvimento cognitivo...

Por essa Europa fora, as gerações mais velhas, em nome do statu quo, opõem-se à mudança, sempre que ela significa integração e aceitação do outro... 

Mas não são apenas os mais velhos, são, principalmente, os governantes que não compreendem que só a renovação geracional pode dar sentido à vida daqueles que, apesar de mais habilitados, se arrastam e fenecem pelas vilas e cidades e, ao mesmo tempo, garantir o futuro dos mais idosos.

Caso não consigamos fazer a tempo e de forma honrosa essa renovação, acabaremos, todos, mais pobres, mais revoltados e mais tristes.

 

Ontem

Não sei se o jogo Portugal - Croácia merece tanto frenesim, mas a verdade é que Portugal passou esta etapa. 

Só não compreendo é que com tão bons jogadores, a bola não chega ao Cristiano Ronaldo.

O melhor seria, talvez, pedir a Nossa Senhora de Fátima que o Fernando Santos ponha o Renato Sanches a jogar de início e já, agora, que o autorize a rematar.

Não sei se, ontem, aconteceu alguma coisa mais neste país. Parece-me que o Fernando Pimenta ganhou o campeonato da Europa, mas não o de futebol...


PS. O canoísta Fernando Pimenta conquistou, no campeonato da Europa, duas medalhas de ouro, em Moscovo: K1 5000 e K1 1000.

 

25.6.16

Da miséria humana

Que haja perto de três milhões de refugiados na Turquia ou que a população sénior do Reino Unido, porque não gosta que a paisagem humana se modifique, tenha votado a favor da saída da União Europeia são questões de pouca monta.

No Sul da Europa, o mais importante são as festas, a praia, a comidinha, o futebol e até a religião - as seitas proliferam com os seus escaparates móveis...

Pelo que acabo de observar, na primeira página de um pasquim, vinga a mesquinhez, pois, não podendo humilhar antecipadamente Cristiano Ronaldo, coloca-o numa posição dúbia...

 

24.6.16

Na noite do Brexit...

Na noite do Brexit, Marcelo e Costa participaram no S. João no Porto. Amanhã, não irão perder o jogo de Portugal contra a Croácia.

Só se S. Cristiano Ronaldo não nos fizer ganhar a eliminatória é que despertaremos para o afundanço financeiro e para o retrocesso económico...

Entretanto, o partido alemão já começou a acusar a "geringonça" de nos estar a colocar a jeito para o caos que se avizinha, como se Passos e companhia não tivessem fortemente contribuído para engordar o partido dos eurocéticos. 

Com esta classe política, não vamos lá! 

O melhor seria aproveitar a próxima vinda do Papa a Portugal para, pelo menos, beatificar o Cristiano Ronaldo... e deixarmo-nos definitivamente de políticas...

(Nos bastidores, está a ocorrer uma interessante mudança de diretores nos jornais. Porque será?)

 

23.6.16

Os exames deveriam ser realizados ao princípio da noite

Ana Allen Gomes lembra que existe, inclusivamente, investigação que sustenta a marcação de exames, a partir da adolescência, para o período da tarde, com início às 15h00. E quando assim é "adolescentes e jovens adultos têm mais oportunidades de obter uma duração de sono adequada na véspera do exame".

Eu acredito na ciência meridional, sobretudo, quando ela, para assegurar que os jovens tenham dormido e repousado o suficiente antes das aulas e dos exames, defende que eles devem passar as manhãs - até à hora da sesta? - na caminha... 

As madrugadas já não são o que eram! Imagine-se que os capitães de Abril, na noite de 24, tinham ido para as docas, dormido até tarde, e iniciado a marcha ao entardecer...

 Explicaram-me, em tempos, que "o adolescente" era um produto dos liceus. A criança, em vez de entrar de súbito na vida adulta, passou a viver um intervalo de escolarização que permitiu gerar essa nova fase de maturação, que foi designada por adolescência...

Entretanto, com a extensão da escolaridade obrigatória e a criação de vários graus no ensino superior, os adolescentes passaram a ser considerados jovens adultos. Só não se sabe é quando que esta nova fase termina: aos 30, aos 40 anos?

Caso esta minha reflexão resulte de alguma ciência, a verdade é que trabalho atualmente para um ministro da educação - jovem adulto. A esta hora, já o ministro terá lido a tese da cientista Ana Allen Gomes...

Em conclusão, espero que, no próximo ano letivo, mesmo que os exames não possam ter início ao anoitecer, comecem às 15h00, em ponto...

A shadenfreude do Correio da Manhã TV...

« Il existe un joli mot allemand, Shadenfreude, la jouissance de l'infortune d'autrui. C'est ce sentiment qu'un journal doit respecter et alimenter. » Umberto Eco, Numéro Zéro, page160, Le Livre de Poche.

Cristiano Ronaldo é, apenas, o alvo de maior renome de que o grupo Correio da Manhã se serve para proporcionar prazer à custa da desgraça alheia.

Acidentes, incêndios, rixas domésticas, casos de corrupção, todos servem o mesmo objetivo: lucrar com a boçalidade do espectador e do leitor. E por isso, as " imagens" são repetidas à exaustão; as notícias são recicladas, desenterrando o lado obscuro da vida dos próprios defuntos, como acontece, por exemplo, com as alusões mais ou menos explícitas ao pai do Cristiano Ronaldo...

Perante este jornalismo, de tipo abutre, por mais que critiquem o Cristiano Ronaldo por ter atirado o microfone ao lago, eu compreendo-o perfeitamente - Quem não se sente não é filho de boa gente!

 

22.6.16

Não gosto de empates nem de empatas

Não é por nada, mas não gosto de empates nem de empatas. Na vida, como na bola, o empate não serve ninguém.

Por esta hora, sinto-me feliz. Vou esperar por sábado, ciente que, no jogo, o empate não é solução. Como eu gostaria que esta minha confiança fosse extensiva à vida política portuguesa. 

 

21.6.16

Estaremos a ficar desenvergonhados?

«...ça signifie que nous sommes en train de perdre tout sentimento de honte.» Umberto Eco, Numéro Zéro, page 232, Le Livre de Poche.

(Já não sei se estamos a ficar desenvergonhados ou se nunca aprendemos a ter vergonha.)

Esta minha indecisão é filha de um estado contraditório em que a educação judaico-cristã me fez respeitar certos princípios (valores?), como os do pudor, da responsabilidade e da honra. Sempre que desrespeitasse alguma destas regras, deveria sentir vergonha, confessar o pecado e arrepender-me... Por outro lado, Nietzsche e Freud alertaram-me para o peso excessivo da censura cultural e pessoal, deixando-me a balouçar entre a autocrítica permanente e um certo tipo de libertinagem, bastas vezes, antissocial.

Ouvi ou vi escrito que Armando Vara pede uma comissão de inquérito parlamentar que avalie o seu contributo para a bancarrota em que o país mergulhou. O mesmo exigem o PSD de Passos e o CDS de Cristas, embora por motivos diferentes...

Todos eles se dizem católicos; nenhum será judeu, quero crer. No entanto, comportam-se como suicidas a quem a palavra do Livro nunca terá chegado. 

 

20.6.16

Domani (Amanhã)

Domani é o nome de um jornal, imaginado para, sem chegar a ser publicado, dar conta do modo como o jornalismo perde, por inteiro, a independência e de como os jornalistas são controlados por um diretor ao serviço de um "patrão", cujo único fito é eliminar todos os que lhe podem travar a ambição.

O que acabo de escrever procura interpretar o pensamento de Umberto Eco no romance Número Zero. Apesar de publicado em 1992, só agora o leio, mas vejo nele, mais do que o manual do mau jornalismo da época, uma antevisão do jornalismo da atualidade...

PS. Creio que este livro deveria ser de leitura obrigatória de jornalistas, advogados, magistrados, sem esquecer algumas das vítimas da comunicação, dita, social.

 

19.6.16

O pecado privado e o pecado público

Ontem, pedi aqui perdão, mas não disse do quê.

E também ninguém se preocupou com a falta do complemento direto. Terão, talvez, pensado que me referiria à minha ausência na manifestação em defesa da escola pública. De certo modo, era verdade - o meu espírito gregário é frágil.

No entanto, o que eu quero reafirmar é que nada tenho contra a escola pública nem contra a escola privada. Estudei e ensinei em ambas, e encontrei virtudes e defeitos nas pessoas que as serviam ou que, infelizmente, se serviam delas / nas pessoas que as servem ou que, infelizmente, se servem delas.

Sei que insistir neste tipo de abordagem pode parecer insanidade minha, mas é assim que penso.

O pecado privado em nada se distingue do pecado público. Por exemplo, o padrão comportamental da gestão do CGD é, afinal, o mesmo do BES, do BANIF, do BPN, do BPP.

Arruínam o país. Não têm perdão. No entanto, os responsáveis continuam à solta. Provavelmente, porque, num país católico, só o Juízo Final lhes ditará o destino...

E isso eu não perdoo!

 

 

18.6.16

Espero que me perdoem...

Espero que me perdoem, mas eu nunca fui de autos de fé, touradas e procissões!

Raramente, fui a uma manifestação. E quando fui, não posso dizer que me tenha arrependido, mas senti-me sempre a mais. 

A verdade é que detesto fenómenos de massas, talvez porque considere que os pastores são verdadeiros manipuladores de opinião, acabando mais cedo ou mais tarde por tosquiar o rebanho...

Nada tenho contra a escola pública, nem a consigo imaginar como inimiga da escola privada. Para mim, simplesmente, há homens e mulheres, nos dois lados, que não são dignos de se ocupar da instrução do cidadão.

 

17.6.16

Se eu fosse inglês...

Se eu fosse inglês, votaria a favor da saída da União Europeia. Não é que a ilha se baste a si própria, mas pode sempre aprofundar os laços económicos e financeiros com as suas extensões coloniais, evitando, deste modo, a supremacia germânica...

Portugal, antiga e reiterada extensão colonial inglesa, no essencial pode apresentar os mesmos argumentos que o Reino Unido, pois o centro da Europa insiste em desligar-nos do passado de descoberta e, posteriormente, colonial.

A verdade é que, se a nossa soberania, no passado, sempre foi frágil, hoje, não passa de uma ilusão. Não há matéria em que possamos tomar uma decisão sem a aprovação do suserano.

À Alemanha, a saída da Inglaterra acaba por ser conveniente. A médio prazo, acabará por aceitar a adesão da Turquia e negociar acordos económicos favoráveis com a Rússia...

E Portugal, em vez de ser o rosto da Europa, como defendeu Fernando Pessoa, acabará por ser a porta dos fundos.

 

16.6.16

A violência corrói os nossos dias

Jo Cox, representante de "West Yorkshire" no Parlamento britânico foi assassinada.

Não há hora em que a violência não seja notícia e, sobretudo, repasto para multidões famintas de sangue. 

A causa pouco interessa, embora se saiba que, em muitos casos, a violência pontual procura que a mesma se multiplique. Parece que, por toda a parte, a agressão substitui a palavra, sem esquecer aqueles que usam a palavra para incitar à violência.

Da Rússia aos Estados Unidos, passando pela Turquia, pela França e pela Inglaterra, a vertigem da barbárie tomou conta dos comportamentos mais primários, atirando a educação para o caixote do lixo.

Jo Cox, defensora de causas humanitárias, é a vítima ideal para os fundamentalistas que, a todo o momento, calcam aqueles que procuram preservar a lenta humanização do homem.

O que, ultimamente, se tem visto, é o despertar da irracionalidade que, no passado ainda próximo, fez milhões de vítimas.

 

15.6.16

Dizem que o exame foi "superacessível, superfácil"...

Pouco tenho a dizer! Afinal, a "geringonça" não mudou nada, a não ser, talvez, a ideia de colocar os alunos do 12º ano a opinar sobre o papel da educação «na construção dos ideais, da liberdade e da justiça social.»

Vamos ter muitas opiniões, todas "superfavoráveis", com muitos exemplos e zero argumentos! 

E andou o Eça a testar sistemas educativos, para concluir que, em Portugal, a educação não levava a lado nenhum: desenhou personagens, testou-lhes o carácter, mergulhou-as no meio, ora provinciano, ora citadino, sem esquecer o cosmopolita... e NADA. Tudo na MESMA!

Se o exame era "superacessível", espero que as respostas não sejam "superfrouxas" e "superpopularuchas".

 

14.6.16

Amanhã, há exame de Português

Será que a 'geringonça' se entendeu para substituir José Saramago e Sttau Monteiro por Manuel Alegre? Por dar a palavra a um daqueles poetas vivos que sempre soube escutar os outros poetas?

FIQUE CLARO que eu não sei responder... No entanto, se me pusesse a adivinhar escolheria o poema AS PALAVRAS:

Palavras tantas vezes perseguidas

palavras tantas vezes violadas

que não sabem cantar ajoelhadas

que não se rendem mesmo se feridas.

Palavras tantas vezes proibidas

e no entanto as únicas espadas

que ferem sempre mesmo se quebradas

vencedoras ainda que vencidas.

 

Palavras por quem eu já fui cativo

na língua de Camões vos querem escravas

palavras com que canto e onde estou vivo.

 

Mas se tudo nos levam isto nos resta:

estamos de pé dentro de vós palavras.

Nem outra glória há maior do que esta.

Manuel Alegre, O Canto E As Armas, 1967

(Expliquemos lá então a opção de Manuel Alegre, sem esquecer a circunstância...)

E se quisesse escolher outras "palavras", escolheria as de Eugénio Andrade...

 

13.6.16

Exercícios de ansiedade gramatical

Este post pode parecer descabido. No entanto, vou arriscar colocar aqui o questionário que acabo de elaborar para todos aqueles alunos que têm o hábito de procurar em CARUMA respostas para algumas das suas dúvidas.

Desta vez, o melhor é ter uma Gramática à mão...

Os enunciados foram extraídos do Diário de Notícias de 12 de Junho de 2016.

 

1.       Emigrantes gostam do hiperativo e do hiperotimista.

a.       Classifique, quanto ao processo de formação, as palavras sublinhadas.

2.       Alunos portugueses são dos que têm mais férias no verão.

a.       Substitua dos por um pronome demonstrativo.

b.       Divida a frase em orações e classifique-as.

c.       Na 2ª oração, existe um modificador. Transcreva-o.

d.       Em 1 e 2, o grupo nominal não é antecedido pelo determinante artigo. Explique porquê.

 

 

 

3.       Foram aprovados dois protestos. Os socialistas votaram dos dois lados…

a.       Classifique sintaticamente o constituinte sublinhado.

b.       Substitua por um quantificador a expressão “dos dois lados”.

c.       Classifique esse quantificador. 

d.       Coloque na voz ativa a primeira frase.

4.       Para os Portugueses, o grande problema é o défice público. Neste capítulo, Portugal é incorrigível.

a.       Classifique, quanto à formação, a palavra sublinhada.

b.       Classifique-a, também, quanto à função sintática.

c.       Explicite o antecedente de “Neste capítulo”.

d.       Identifique dois grupos preposicionais e descreva-os.

e.       “Neste capítulo” é um estruturador de informação ou um reformulador explicativo?

5.       Nos EUA, a bossa-nova institucionalizou-se de tal forma que os americanos acham que é deles…

a.       Classifique, quanto à sua formação, a palavra sublinhada.

b.       Divida as orações, e classifique a segunda e a terceira.

c.       Transcreva o antecedente “deles”.

d.       Na primeira oração, o verbo é pronominal ou pronominal reflexo?

e.       Na frase transcrita, destaque os elementos linguísticos que asseguram a cadeia de referência.

6.       Promoção do mês: um corte de cabelo à Ronaldo por 16 euros.

a.       16 corresponde a que tipo de quantificador? (Interrogativo, universal, existencial, relativo, numeral fracionário, numeral cardinal…)

b.       Observe a frase nominal e transforme-a numa frase verbal.

c.       Indique a função dos dois pontos no enunciado.

d.       Especifique a constituição do grupo preposicional “à Ronaldo”.

e.       “Corte” é uma forma de base ou um caso de derivação não afixal?

f.        “de cabelo” é um complemento do nome ou um do modificador restritivo do nome?

g.       Dê um exemplo de modificador apositivo do nome.

7.       É o segundo em meia dúzia de dias. Na semana passada, vi na televisão um amigo, jornalista de carreira longa e escritor de basta obra, falando sem complexos da sua experiência como motorista de tuk-tuk em Lisboa.

(…)

 

- Joel Neto! – ouço, num berro inesperado, entre a exultação e o calduço, algures na rua dos Fanqueiros. – O que é que faz aqui sua excelência, pá?! Veio à capital?!

É outro escritor e jornalista ainda, e com uma obra mais expressiva do que o primeiro – dos jornais à TV, dos livros de viagem à ficção. Pára a motinha, com os turistas assarapantados no banco de trás. Apita, fez três aceleradelas, ri-se. Cumprimentamo-nos calorosamente, perguntamos pelas patroas e depois ele perde-se pela rua do Comércio.

a.       Joel Neto aplica o acordo ortográfico de 1990 ou não? Justifique.

b.       Na frase “É o segundo em meia dúzia de dias”, a palavra sublinhada funciona é uma catáfora porque o referente se apresenta antes ou depois?

    i.      Transcreva o referente.

c.       “segundo” é quantificador numeral ordinal ou cardinal?

d.       Em “jornalista de carreira longa e escritor de basta obra”, os adjetivos têm, ambos, valor restritivo ou não? Explicite.

e.       “Tuk-tuk” é exemplo de empréstimo interno ou externo?

f.        Nas orações “Apita, fez três aceleradelas, ri-se”, a coordenação é sindética ou assindética?

g.       Em “O que é que faz aqui sua excelência, pá?!”, o ato ilocutório é assertivo ou diretivo?

   i.      Classifique o deítico sublinhado.

  ii.      Em termos sintáticos, qual é o valor do termo sublinhado.

 iii.      Comente a expressividade da sequência “sua excelência, pá”.

h.       No texto transcrito, a pergunta “Veio à capital?!” é, ou não, exemplo de um processo de Implicatura conversacional? Justifique.

i.         O texto de Joel Neto corresponde a um protótipo injuntivo-instrucional ou a um protótipo interrogativo.

j.         No último período do texto, identifique dois exemplos de conotação.

k.       Em relação aos meios de transporte “a motinha” é um hipónimo ou um merónimo?

 

 

 

 

12.6.16

A escola pública e o ensino das línguas

"As minhas filhas fizeram o jardim-de-infância e a primária numa escola pública. E agora estão na Escola Alemã, (...) tem a ver com a opção por um currículo internacional. Para mim era importante que elas tivessem uma educação com duas línguas que funcionassem quase como maternas, digamos assim. Se assim não fosse, andariam obviamente numa escola pública." Alexandra Leitão, secretária de Estado da Educação.

A secretária de Estado da Educação, Alexandra Leitão, tem dado provas de coragem ao afrontar os interesses instalados no Ensino Privado, no entanto, na entrevista dada à Visão, faz prova de falta de visão política, pois se o ensino público deve promover a igualdade, em matéria de ensino das línguas estrangeiras, não o faz já há muitos anos, por mais que se aposte no ensino do inglês desde o primeiro ciclo.

Um país periférico da União Europeia, se quiser competir com o centro dessa comunidade, tem de generalizar o ensino das línguas nacionais dos parceiros europeus mais poderosos, e fazê-lo recorrendo a professores devidamente habilitados e a métodos adequados à idade dos jovens alunos. E a senhora secretária de Estado sabe disso, como, em geral, a classe política o pratica com os seus filhos.

Ainda, nos últimos dias, tive oportunidade de compreender a fragilidade da situação portuguesa, ao assistir à projeção internacional dos filmes realizados pelas oficinas de cinema de países como a Bulgária, o Reino Unido, a Alemanha, a Finlândia, a Lituânia, a França, Portugal, a Bélgica, a Espanha, Cuba, o Brasil e o México. As oficinas eram constituídas por jovens, entre os 7 e os 18 anos. Durante 3 dias, os jovens realizadores, produtores e atores apresentaram defenderam o filme produzido por cada equipa e, sobretudo, questionaram de viva-voz o trabalho das restantes oficinas.

Ora nesta situação de exposição pública, não pude deixar de compreender a dificuldade portuguesa em questionar os trabalhos apresentados ou de compreender as questões colocadas na Cinemateca Francesa.

Há um défice imperdoável num dos pilares da formação e da educação em Portugal - o ensino das línguas estrangeiras. A senhora secretária de Estado da Educação sabe-o, porque não ignora que há um "currículo internacional" e que o escolheu para os seus filhos...

Não se trata, aqui, dos jovens portugueses serem mais ou menos ricos ou pobres. Trata-se, sim, de desenhar uma política da língua materna e estrangeira que nos tire da periferia...

 

11.6.16

De Paris, fica-me uma imagem de caos

De Paris, fica-me uma imagem de caos. O lixo amontoa-se a céu aberto. As avenidas abrem-se em estaleiros intermináveis. Ontem, fechadas ao trânsito, eram infindáveis vazadouros humanos conduzidos por pastores de ocasião, pendurados nas grades das grandes obras, e vigiadas por milhares de agentes das forças militarizadas... Os adeptos do futebol davam expressão ao contentamento, de uma forma brutal, ensurdecedora e irracional. É assustador como cantam a marselhesa, à exaustão...

Da racionalidade cartesiana, pouco sobra... De tal modo que a deslocação a Paris, para mim, terminou numa visita demorada ao Père Lachaise...

Pode parecer estranho, mas esta minha ida a Paris pouco teve de turístico. Afinal, o meu papel era o de acompanhar um grupo de nove jovens (dos 16 aos 18 anos) cujo objetivo seria o de apresentar o "filme-ensaio" realizado no âmbito do projeto "À nous le cinéma! Une expérience de cinéma à l'école".   

A verdade é que um grupo de jovens portugueses, nesta faixa etária, em Paris, tem inevitavelmente uma outra prioridade e, quando tal acontece, o papel do acompanhante torna-se muito espinhoso.

Paris ter-lhes-á ficado na memória, apesar dos riscos vividos, regressando todos a precisar de dormir...

 

10.6.16

Em Paris, l'important c'est la musique !

Já é tarde e estou impaciente.

O dia começou cedo. Só que o avião (da Vueling) partiu com duas horas de atraso. Em Orly, pensei que tinha regressado a Sacavém - o condutor do transbordo parecia um principiante; os taxistas (3), nenhum sabia o caminho para a Cinemateca francesa - nem o GPS ajudava...

Entretanto, as horas tinham passado sem almoço; foi-nos dito, que por iniciativa de um colega de outra escola, alguém nos tinha reservado 17 sandes. O problema é que ninguém sabia delas - tinham sido roubadas! 

Reduzidos a dez sandes (de frango /atum) que levaram imenso tempo a ser confecionadas, os meus acompanhantes acabaram por entrar na sessão da tarde, que decorria na sala Henri Langlois, cinco minutos antes daquela ser dada por terminada...

Na atmosfera, apesar de tudo o que nos ia acontecendo, reinava uma certa euforia. A ministra francesa do Ambiente tinha estado presente, vários realizadores compareceram e explicaram os documentários que foram apresentados no período da tarde...

Depois houve pic-nic: brasileiros (ricos e pobres) descobriram em Paris que havia portugueses de Lisboa e da margem sul Tejo...

Já tarde, chegados ao hotel, os jovens prepararam-se com esmero para a noite de Paris... e aí começou a minha impaciência que ainda não terminou... Percorrida a rua Faubourg de Saint-Antoine em direção à Praça da Bastilha, fiquei a perceber que a História pouco importa... L'important c'est la musique!

 

8.6.16

Nos próximos dias

Nos próximos dias, vou tentar perceber como é que a meteorologia influencia o cinema, porém, talvez, acabe por descobrir que a questão é mais de tema do que de influência. Por outro lado, também me interrogo se não seria melhor procurar o modo como o clima influência o cinema.

Só que a minha perceção desta temática parece estar errada, pois o clima e o tempo serão ramos da meteorologia.

O tempo abarca o estado físico das condições atmosféricas num determinado momento e local. Ora o cinema, se não for produzido em estúdio, será sempre determinado pelas estado da atmosfera e do lugar.

 

7.6.16

Uma ideia triste

Pode parecer uma ideia triste e absurda. A verdade, no entanto, é que depois de passar umas horas nos corredores das urgências do Hospital de S. José, dei comigo a pensar que os cemitérios deste país são muito mais hospitaleiros...

Não só o espaço é insuficiente para todos aqueles que se veem para ali atirados, alguns sem qualquer noção do tempo e do lugar, como é evidente a falta de clínicos e de pessoal de enfermagem.

Hoje, por exemplo, nas urgências, para além de todo o tipo de doentes, alguns moribundos, havia presos, guardas prisionais, polícias de trânsito, bombeiros, maqueiros, seguranças privados, voluntários... só não havia médicos, e os que por ali circulavam eram tão novinhos...

É muito triste que os doentes passem o dia inteiro nas urgências, o que os leva, frequentemente, a abandonar o Hospital sem terem sido devidamente atendidos. E, também, é triste que o facto de ser estrangeiro possa permitir passar à frente...

Em conclusão, quando eu for internado num hospital ou num hospício, não me visitem. Peço-vos que deem um passeio pelo cemitério mais próximo, e descansem uma boa hora à sombra hospitaleira de um cipreste...

 

6.6.16

Do rigor avaliativo

Estou indeciso! Não sei se escreva sobre uma certa tendência da escola pública ou sobre uma ideia do romancista Stendhall: Rapporter du revenu est la raison qui décide de tout dans cette ville qui vous semblait si jolie. L'étranger qui arrive, séduit par la beauté des fraîches et profondes vallées qui l'entourent, s'imagine d'abord que ses habitants sont sensibles au beau... » Le Rouge et le Noir, Livre premier.

 

Um pouco como o estrangeiro que chega a Verrières, e perante a beleza do lugar, imagina que os habitantes são sensíveis ao belo, também eu quero acreditar que a escola pública se rege pelo rigor avaliativo. No entanto, verifico, a cada ano que passa, que há um número significativo de alunos que consegue obter vinte valores, na avaliação interna, nas mais diversas disciplinas, sujeitas ou não a exame externo.

O vinte, mais do que premiar a excelência, consagra um tempo de emoção vivida pelo professor que se revê no discípulo, um pouco como o pai se revia outrora nos sucessos do filho...

E o mais interessante é que este tipo de excelência, em muitos casos, não tem qualquer continuidade no prosseguimento de estudos, até porque, na verdade, estamos perante perfis que não trazem qualquer contributo enriquecedor à comunidade... 

Agora que se aproxima o professor-tutor, desconfio que o número de vintes irá crescer ... como se os portugueses apreciassem o rigor.

 

5.6.16

Não é fácil chegar à praia

Não é fácil chegar à praia se quisermos ir pela Marginal. Há quem mande a PSP cortar o trânsito durante uma manhã inteira. 

Não sei quem manda nem se paga o serviço. O que sei é que o cidadão acaba desviado para a autoestradas, sem aviso atempado, tendo de pagar retrocesso e portagens.

Por outro lado, também não sei por que motivo é necessário cortar estradas em lugares onde há tantas pistas para peões e para ciclistas... E bem sabemos como estas soluções são caras para o contribuinte...

Nada contra a pegada ecológica! Mas, nestes casos, desconfio que a iniciativa, para além de pouco limpa, é, sobretudo, política... 

 

4.6.16

A árvore

Uma árvore, de pé!

Há uns tempos, parecia condenada...

Hoje, certas zonas do tronco reflorescem, como se a morte se tivesse distraído... Também nós estamos condenados, mas quem sabe se um dia parte de nós desabrochará noutro lugar ou noutra hora..

Um destes dias, disseram-me que, no ano passado, por esta altura, eu definhava a olhos enxutos. Quem sabe se parte de mim não regressou à vida?

O ano passado, por esta altura, eu observava a felicidade das poupas e não dei conta da morte da árvore. 

Afinal, as poupas ainda não regressaram e a árvore não morreu.

 

3.6.16

Só há dois paradigmas!

(Provavelmente, isto não tem qualquer interesse! Isto é o quê? Qual é o referente?)

- A morte. Ela condiciona tudo! Não tanto ela, mas a conceção que dela temos: determina o modo como vivemos, a interpretação que fazemos da arte...

No essencial, só há dois paradigmas: o trágico e o religioso (dramático).

Perante alguém que confessava que, com a passagem do tempo, lhe parecia que desaprendia de ler, eu quis explicar-lhe que ler é descobrir a morte da vida, isto é, responder à pergunta: Será a morte o fim ou um tempo de passagem?

A arte, até hoje, ainda mais não fez do que posicionar-se: do classicismo greco-romano a todas as suas renovações; do cristianismo a todas as restantes religiões... A arte, por vezes, procura apresentar-se como alternativa, mas acaba por ser, sobretudo, a expressão de uma sucessão de dúvidas, incapaz de afrontar o enigma que resume a condição humana...

O meu interlocutor deixou de ouvir-me, porque acha a questão inútil. Lá no íntimo, prefere não se interrogar sobre a finalidade da sua própria vida... e depois queixa-se do texto.

 

2.6.16

Do que eu ouvi e vi

Ouvi o professor doutor Miguel Metelo Seixas proferir uma significativa conferência sobre a "Heráldica hoje: porquê, por quem e para quê?

Registo com particular cuidado a concisão da definição: A heráldica é um código visual que recorre a imagens - sinais.

A heráldica, hoje, parece retomar uma das funções que preenchia na Idade Média: informar, motivar e persuadir grupos de indivíduos, em geral, analfabetos.

Para todos os efeitos, a heráldica IDENTIFICA e cria, para o bem e para o mal, elos...

Vi uma sala esvaziar-se num ápice. Bastou que terminasse a informação da classificação do terceiro período. As preocupações com o exame nacional esfumaram-se e a debandada foi quase total. Sobraram quatro almas! Espero que os dois sonetos de Camões não lhes tenham feito perder o apetite...

 

Finalmente, ouvi a formadora de uma oficina de cinema dar uma lição sobre a falta de responsabilidade de quem ESCOLHE uma determinada tarefa e depois descura de forma sistemática o seu envolvimento no projeto, sem apresentar razões válidas... Numa oficina, o projeto é de todos os que a ele aderem.... e não, apenas, do mestre.

O espírito do oficina é difícil em contextos de aprendizagem, onde se insiste em premiar a infantilidade... ou a prosápia.

 

1.6.16

Ouvimos ou não ouvimos?

Ouvimos ou não ouvimos? - a dúvida.

-  Sim, ouvimos tudo o que nos disse e fizemos tudo o que nos disse.

- Tudo? - hesitação - 'Tudo' abarca o que foi dito ou apenas aquilo que quisemos ouvir?

Por exemplo, já percebemos que 'tudo' é um quantificador universal, embora não saibamos para que é que serve um quantificador e porque é que é classificado como universal... Não seria melhor chamar-lhe global?

Esta problemática lembra o Eusébio da Silveira - não confundir com o Ferreira! -, que andava a ler a História de Todos os Povos do Universo. Pobrezinho! E ele nunca teve de aprender que 'todos' também era um quantificador universal. O universo do Eusebiozinho era tão tacanho que ele jamais teria compreendido o que significava universal. E a bem dizer ele não lia, só folheava uma velha enciclopédia e deixava que a vista se imobilizasse sobre as ilustrações. Nunca chegámos a saber quais eram as ilustrações que ele mais apreciava, apesar de podermos suspeitar que essas ilustrações seriam espanholas, mas não de Santa Teresa de Ávila...

A Santa Teresa de Ávila do catecismo! O pobrezinho também era muito forte em pontos de doutrina. Sabia-os todos de cor.  Se lhe fosse dada a oportunidade de resolver o grupo da gramática do exame nacional de Português de 2016, em vez de obter um certificado de bacharel, seria, de imediato, premiado com o grau de doutor...

Ainda a propósito do que ouvimos, - o senhor nunca nos falou desse eusébio, nem do ega, nem do maranhão, nem de qualquer perdigão. E também não o ouvimos falar do brasão - só vagamente de um sebastião; e talvez dum bonifácio, que nos disseram que era reverendo...

Só que nós não sabemos o que significa reverendo. Não temos dicionário! Temos smartphone, mas o senhor nunca disse que o poderíamos utilizar para saber o significado das palavras. Até agora só aprendemos a passar a vista pelas ilustrações. Até já lá encontrámos a Santa Teresa de Ávila, de Jean Genet - que nos sonhos era devassa. - O que é que significa devassa?

- E, afinal, se não ouvimos e não sabemos é porque o senhor não presta. 

 

 

31.5.16

Bem podíamos mandar eliminar o luar!

Disseram-me um destes dias que "Felizmente Há Luar! “não era nenhuma obra-prima, como se uma peça de teatro nascesse para ser prima-dona.

Surpreendido, procurei explicar que, em 1961, Luís Sttau Monteiro tinha como objetivo contribuir para uma mudança política que pusesse cobro a um regime caduco, que enviava para as cadeias todos os que lutavam contra a ditadura, contra a guerra colonial, contra a censura, contra o obscurantismo, embora ciente da dificuldade do empreendimento: 

SOUSA FALCÃO: Mas como, Matilde? Como é que se pode lutar contra a noite? 

Em 1961, o próprio dia se transformava em noite para aqueles que eram citados como opositores do regime:

SOUSA FALCÃO: Ao chegar a S. Julião da Barra, meteram-no logo numa masmorra e aí ficou todo o dia, às escuras, até que, ao cair da noite, uns oficiais lhe mandaram uma enxerga e duas mantas por piedade... {Gomes Freire d'Andrade)

Não era preciso ser opositor! Bastava uma denúncia! A ditadura não sobrevive sem inimigo e, como tal, se não houver, inventa-se...

Apetecia-me falar do luar, mas para quê? É óbvio, o luar foi inventado para iluminar a noite. Agora que a iluminação pública não nos falta, bem podíamos mandar eliminar o luar... Afinal, o luar também não é uma obra-prima! 

De qualquer modo, arrisco e vou transcrever duas sequências significativas desta peça de Luís de Sttau Monteiro:

A - D. MIGUEL FORJAZ (com raiva): É verdade que a execução se prolongará pela noite, mas felizmente há luar...

B - MATILDE (Para o Povo): Olhem bem! Limpem os olhos no clarão daquela fogueira e abram as almas ao que ela nos ensina! Até a noite foi feita para que a vísseis até ao fim... (Pausa) Felizmente - Felizmente há luar!

 

30.5.16

A 17 dias do exame nacional de Português

Não é surpresa, mas, nesta altura do ano letivo, há sempre um encarregado de educação que se queixa do professor do educando. 

Passaram três anos desde o início do ciclo, e o professor ainda não anunciou aulas de recuperação e de preparação para o exame nacional. E, sobretudo, o professor terá descurado o Dicionário Terminológico e o Novo Acordo Ortográfico. 

Chegou, assim, o momento de ajustar contas, não com quem sempre perturbou o processo de ensino e de aprendizagem, mas com quem foi excessivamente tolerante com os caprichos juvenis...

A 17 dias do exame nacional, há aqueles alunos que, finalmente, decidiram comprar uma Gramática de Português, embora não saibam qual, apesar do professor, todos os dias, levar uma para sala de aula, indo ao ponto de registar no quadro (e no sumário) o número da página referente ao conteúdo em foco, E claro também há jovens que se queixam dos professores que lhes recomendaram a compra ou, em último caso,  a consulta de uma Gramática, por exemplo, na Biblioteca Escolar...

Como Freud bem explicou, isto não passa do conteúdo manifesto, porque há sempre um outro, ainda mais traumático - o conteúdo latente.

Quando aborrecemos o rigor e o método, quem paga é a competência de leitura. Com o tempo, desaprendemos de ler e, sem leitura, não há escrita que resista.

Mais do que o desconhecimento da Gramática, o exame nacional expõe os efeitos da indisciplina, da instabilidade emocional e do amor-próprio, nos domínios da compreensão, da interpretação e da produção de texto...

 

29.5.16

Um país assoreado

Tejo, em ano pluvioso

Em finais de maio, num dia em que choveu por várias vezes e de forma intensa em Santarém, desloquei-me às Portas do Sol, na expectativa de ver um rio caudaloso e pujante. Infelizmente, a água alagava as margens, e o rio lá ia contornando os bancos de areia. Se há coisa que nunca percebi é a razão por que boa parte do leito do Tejo continua assoreado.

Triste, deixei a cidade e acabei na autoestrada, de regresso a Lisboa. Só que, afinal, os bancos de areia estendiam-se, a toda velocidade, pelas faixas de rodagem, em direção a São Bento. 

Na estação de serviço de Aveiras, compreendi como é difícil ensinar as boas maneiras - amarelos ou não, ninguém respeitava a instrução - FILA ÚNICA; ninguém parecia ter aprendido que não deve passar à frente nas filas...

E eu que passei anos numa escola privada, paga pelas esmolas dos crentes, a aprender os fundamentos da cortesia, esperei pacientemente que o aluvião se desfizesse - tal como me tinham ensinado num outro tempo...

Mas não, na autoestrada, os bancos continuaram amarelos, embora vislumbrasse uns tantos vazios...

E o Tejo continua assoreado! E o país continua assoreado!

 

 

 

28.5.16

O refeitório Jesuíta

A entrada no museu diocesano de Santarém é cara - 4 euros. No entanto, paguei a renda disposto a saber o que é que fora feito do espaço em que vivi durante quase seis anos. Restauradas a fachada e a igreja, fui surpreendido pelo recheio - arte sacra - e, sobretudo, porque pude voltar a entrar no refeitório. 

Está como o conheci, mas sem padres nem seminaristas... No seu lugar, o relicário de São Gil, cercado de painéis e de candeeiros de iluminação... 

Saí de lá com uma emoção inesperada, a relembrar a sopa de abóbora, as travessas de carapaus fritos, os medalhões de carne e, sobretudo, um arroz divino. E claro que na mesa dos padres e dos prefeitos, havia tal aprumo que, por mais burgessos que fôssemos, alguma coisa haveríamos de aprender...

Neste regresso ao passado, acabei por saber que o enfermeiro Domingos, no meu tempo (1965-1970), já foi fazer companhia aos três bispos de outras conversas. Na verdade, deveria referir quatro, pois descobri que o primeiro bispo diocesano se encontra sepultado na igreja do Seminário, embora um pouco distante do meu altar preferido.

Finalmente, fui informado que o meu padrinho de crisma, padre Fernando Campos, ainda faz os seus passeios, apesar de já não celebrar missa... Isto de ter um padrinho que não vejo desde 1970 é estranho, sobretudo porque ele é o principal responsável pelo estado de meditação em que vivo - homem de pouca ou nenhuma fé!

 

27.5.16

Uma leitura ousada de Frei Luís de Sousa

Eis, aqui, ao lado, uma leitura ousada do III ato de Frei Luís de Sousa, de Almeida Garrett. 

Se for a Santarém, não se esqueça de observar esta escultura, mesmo ao lado da Avenida do Brasil, bem perto da Domus Justiae.

E já agora aproveite para (re)ler o drama que melhor dá conta da veia dramática de um dos portugueses que mais se esforçou por tornar Portugal um país civilizado.

(Esta postagem é dedicada a todos aqueles que um dia me asseguraram que leram o drama cujo autor tencionava revolucionar o teatro português.)

 

26.5.16

Em nome do rigor pedagógico

Em nome da transparência das decisões, do rigor orçamental e da qualidade pedagógica, bom seria que todos tivéssemos acesso ao custo de cada escola, pública ou privada.

Estou em crer que a atual polémica em nada serve a melhoria do sistema educativo, pois, se no universo das escolas privadas há quem se sirva delas para acumular riqueza pessoal, no universo das escolas públicas, embora haja muitas geridas com rigor não apenas financeiro mas também pedagógico, outras há que mais não são do que sorvedouro de dinheiros públicos.

É preciso saber o que é feito do dinheiro entregue a cada estabelecimento de ensino, recorrendo a uma observação que contemple o investimento na qualidade do ensino e da aprendizagem. Não basta olhar para os resultados no final de cada ano escolar e continuar a despejar dinheiro em programas de recuperação oportunistas...

 

25.5.16

Feriados e dias santos

Feriado - diz-se do dia em que se suspende o trabalho e as aulas, por prescrição civil ou religiosa.

Em Portugal, os dias santos de religiões, que não a católica, não são feriados. Porquê? Creio que um governo socialista, apoiado pelas forças de esquerda, deveria acabar com esta discriminação.

Se todas as religiões devem ter o direito de celebrar os seus deuses e o seus santos, não se entende que, em pleno século XXI, a matriz do Estado Português continue a ser o Catolicismo.

Pessoalmente, não entendo por que motivo grande parte da população, que vive distante de qualquer religião, é obrigada a usufruir de um dia santo como, por exemplo, o do Corpo de Deus.

Demagogia e oportunismo...

 

24.5.16

Ainda se o professor pudesse aplicar a extrema unção!

Esbaforido, só lhe importa saber quando é que pode realizar os testes em atraso. Não se importa de fazê-lo por atacado.

Outro, nem sequer aparece, mas manda mensagem ao colega para que ele coloque a mesma pergunta. Neste caso, respondo sempre do mesmo modo ao mediador: - Veremos!

Claro que ainda há aqueles que não aparecem nem dão qualquer explicação com ou sem recurso a mediador - colega, diretor de turma. Um destes dias, irão aparecer com o ar mais cândido, justificando que estiveram doentes e que já é tarde para realizar qualquer tipo de tarefa... 

 

Na escola pública, o professor, como o médico ou o confessor, tem de estar sempre disponível. Ainda se o professor pudesse aplicar a extrema unção! Não consta que algum moribundo tenha sido obrigado a prestar uma derradeira prova, a não ser a do temor de que o confessor possa estar farto de água benta... e chegue fora de horas...

Estes incidentes, noutros tempos, eram críticos, agora não passam de contratempos.  Qualquer semelhança com a realidade é pura fantasia de quem se enganou na vocação.

 

23.5.16

O que dói

O que dói é saber.
O que dói
é a pátria que nos divide e mata
antes de se morrer.
Eugénio de Andrade, setembro 72

O que dói
é não querer saber
ou fingir não saber
que as pátrias nos dividem e nos matam
antes de se morrer.

O que dói
é haver quem pense que matar é um ato figurado
e que, a ter ocorrido, foi noutro tempo...
e noutro lugar.

O que dói
é haver quem pense que se morre
apenas quando tiver de ser...

O que dói
não é sofrer o que tem de ser.
O que dói
é saber que há quem nos impeça de viver.

 

22.5.16

Solilóquio? Creio que sim...

O solilóquio é uma fala que alguém dirige a si próprio. De certo modo, esta fala não pode ser considerada réplica, pois esta pressupõe a existência de um diálogo ou, pelo menos, um colóquio. Como alguns querem, ando muito longe da interação.

Eu bem gostava de interagir, mas lá, no fundo, sinto que de mim só querem conformidade. 

E o solilóquio arrasta-me para a ataraxia de Demócrito - a tranquilidade de alma, a ausência de perturbação - bem próxima da apatia dos estoicos...

No entanto, por mais que me esforce, há sempre alguém a desassossegar-me. E os caminhos do desassossego são tantos que, em certos momentos, me apetece acabar com o próprio solilóquio... 

Bem sei que os Poetas sabem como resolver o problema, mas eu não. Nunca fui poeta! Tolo, sim!

 

21.5.16

O binómio de Cesário Verde irrita-me

Binómio é uma noção cujo termo é composto pelo prefixo bi e por um vocábulo grego que se pode traduzir como “parte” ou “porção”. Isto significa que um binómio é formado por duas partes.

Há binómios irritantes! Um deles é o famoso binómio de Cesário Verde. Não há manual - sebenta, aluno ou professor - que não fale do binómio 'cidade-campo' na poesia de Cesário Verde. O único que nunca usou tal termo foi o Poeta.

No essencial, Cesário Verde foi reduzido a esse binómio. Independentemente da pergunta, as respostas começam todas pelo binómio: o poeta, cansado da cidade, refugia-se no campo...

Embora o Poeta tenha introduzido a modernidade, no sentido baudelairiano do termo, na literatura portuguesa, isto é, tenha deslocado o olhar do campo para a cidade, descrevendo-a, à luz do sol e da iluminação pública, nas suas 24 horas, tenha desenhado os tipos sociais que a povoavam e, em particular, as desigualdades, tenha condenado a injustiça e celebrado o trabalho, a verdade é que a imagem que dele se vulgarizou coloca no mesmo patamar o campo. 

E fá-lo sem sequer se dar ao trabalho de assinalar que o campo de Cesário é totalmente diferente daquele que durante centenas de anos suportou a literatura ocidental. O campo de Cesário é um campo produtivo, ao contrário do campo do classicismo e do romantismo, onde nada acontecia a não ser algumas cenas cinegéticas, piscatórias... sem esquecer as amorosas, felizes ou trágicas...

O campo de Cesário não é um espaço de evasão, mas um território que continua o espaço do trabalho citadino, apesar de mais eufórico...

De qualquer modo, a novidade que Cesário nos trouxe foi a CIDADE - a Modernidade com todas as suas contradições.  

 

 

20.5.16

O triângulo virtuoso pode ter nascido defeituoso...

Por uma qualquer razão genética, nunca fui capaz de desenhar o que quer que fosse que merecesse a minha aprovação, o que, sempre que necessário, disfarcei com o recurso a uma régua, um esquadro e, em certos casos, um compasso... embora este último sempre exigisse de mim um rigor que não estava ao meu alcance e, principalmente, de quem sonhasse pertencer à confraria dos pedreiros-livres. 

Portanto, condenado à imperfeição, lá vou recorrendo às figuras geométricas. Mas não sou o único!

Acabo de ler um artigo de Carlos Moedas, "O desafio dos desafios na UE: recuperar o otimismo", publicado no DN de 15 de maio de 2016, em que o Comissário europeu para a investigação, ciência e inovação revela uma nova visão da geometria / geografia europeia:

«Ora, a estratégia da Comissão para promover o crescimento económico baseia-se num triângulo virtuoso: investimento, reformas estruturais e responsabilidade orçamental

Tenho estado a dar voltas ao triângulo, porém não consigo perceber como é que esta estratégia pode ser aplicada em Portugal. Parece-me que este triângulo deve ter nascido com defeito...

 

19.5.16

As vacas portuguesas estão prontas a voar

Ainda a propósito do esmagamento da soberania portuguesa, expus a um grupo de jovens a minha preocupação sobre a indiferença de que davam mostras.
Procurei convencê-los de que o teatro de forma épica visa questionar o leitor /espectador sobre o seu próprio tempo e não sobre o tempo da fábula. Por exemplo, a peça Felizmente Há Luar! estabelece um nítido paralelismo entre 1817 e 1961, no que concerne à ação do antigo regime e à ocupação estrangeira. Expliquei que compreendo que não queiram aprofundar a História desta apagada pátria; no entanto, disse-lhes que não entendo que ignorem que as nossas decisões políticas de pouco servem, pois quem nos governa é a União Europeia e os seus tentáculos no terreno... apesar de, hoje, o primeiro-ministro ter prometido que as vacas portuguesas, proibidas de nos darem mais leite e derivados, estão prontas a voar.

Quem diria?

 

 

 

 

18.5.16

A juventude portuguesa ignora a questão da soberania

«Mesmo que, de repente, sobre o muro

Surja a sanhuda face

Dum guerreiro invasor, e breve deva

Em sangue ali cair

O jogador solene de xadrez,

O momento antes desse

(É ainda dado ao cálculo dum lance

Pra a efeito horas depois)

É ainda entregue ao jogo predilecto

Dos grandes indif'rentes

Fernando Pessoa / Ricardo Reis 

Batem-se pela independência pessoal desde cedo mas, paradoxalmente, não dão qualquer importância à soberania coletiva.

O cânone literário - de Fernão Lopes a Camões, passando por Vieira, Garrett, Eça, Cesário, Pessoa, Sttau Monteiro, Saramago - retoma reiteradamente a questão da soberania nacional.

O resultado prático é uma farsa gigantesca, pois há muito que a competência de leitura se degradou e, sobretudo, o desinteresse pelo futuro coletivo se instalou.

Quando a Comissão Europeia trata Portugal como uma colónia, estou sem compreender qual é causa do comportamento da juventude portuguesa.

Por vezes, chego a pensar que Portugal mais não é do que uma invenção de meia dúzia de iluminados que nunca olharam à sua volta...

 

17.5.16

A triste Penélope e o pobre Orpheu

Uma Poupa na Portela

Não posso afirmar que chegaram as poupas, porque, de facto, até agora só consegui avistar uma. Não sei se ela terá vindo adiante para verificar se o terreno e o clima lhes serão favoráveis no verão e no outono de 2016...

A verdade é que esta poupa, este ano, procurou um terreno mais próximo da igreja, apesar de muito mais poluído, ao contrário do que acontecera com as poupas do ano anterior que se tinham refugiado num jardim afastado do bulício...

Vou ficar à espera para ver se compreendo alguma coisa do que se passa no universo das poupas, pois no meu nada acontece de significativo. Ou será que estou cada vez mais desfasado da realidade?

É que agora vivemos a vertigem de desfazer o que de mal foi feito. Mas tal será possível? Os governos portugueses lembram-me a triste Penélope...

Creio que a continuarmos assim, acabaremos como o pobre Orfheu...

 

16.5.16

Bem ao nosso gosto

«Hoje, com o alastramento planetário do kitsch como género universal do gosto, era inevitável que a grosseria se acentuasse no nosso país arcaico, tão próximo do pós-modernismo.»  José Gil, Portugal, Hoje. O Medo de Existir, 2004, pág. 196.

Segundo os entendidos, ao colocar a vulgaridade na ordem do dia, o Kitsch caracteriza-se por agradar a uns e desagradar a outros.

Em Portugal, os artistas são, por ora, ícones ambivalentes, cujas obras são enterradas com eles e, em muitos casos, são mesmo cremadas.

Entretanto, já me esquecia que hoje é o dia internacional de histórias de vida. E como tal, não posso deixar de interrogar o conceito. Histórias de vida! Porquê? Não nos basta uma história? Provavelmente não. Porque mais importante do que a vida vivida é, afinal, a narrativa da vida... e, aqui, chegados, com maior ou menor grosseria, cada um inventa as histórias de vida mais convenientes...

 

15.5.16

Andam a encornar as línguas

«O Bloco (...) encorna o PS à esquerda (encorna é uma tradução possível de to cornerencostar a um canto) ...» João Taborda da Gama, DN de 15 de maio de 2016.

Ontem, o festival da Eurovisão quase que eliminava as línguas nacionais. Não fosse a Áustria ter decorado um refrão em francês e uma ou outra mistura linguística, pensar-se-ia que as nações europeias teriam sido extintas... Bem, os italianos ainda vão fazendo jus à tradição!

Hoje, J.T. da Gama sai-se com esta de que o Bloco de Esquerda anda a encornar o PS. Eu ainda pensei que o verbo estaria a ser utilizado no seu sentido genuíno, mas não, tinha de meter futebol e ainda por cima inglês... Com ou sem escola pública, há que respeitar as línguas nacionais, a começar pela comunicação social. Bem sei que o J.T. da Gama gosta de trocadilhos, porém... Já basta a quantidade de linguistas e de gramáticos que nos querem convencer que a origem do Português é anglo-saxónica e não latina!    

 

14.5.16

Das coisas e dos animais sensíveis

Das coisas sem respiração não sei o que dizer, porque já não as sei contar.

Houve tempo em que reparava numa pedra e dizia 'ali está uma coisa inerte'. Depois, comecei a pensar que talvez a pedra tivesse uma vida secreta...

Só que a teoria do conhecimento acabou-me com a indecisão no dia em que me convenceu que esta vida se resume à relação do sujeito com o objeto. Nesse momento, descobri-me como Sujeito, senhor de múltiplas coisas - tanto dava que elas respirassem ou não...

Lembro-me até de um certo Bexiguinha convencido de que podia dispor da vida de todas as coisas, embora não soubesse distinguir as coisas vegetais das coisas animais, umas racionais outras inapelavelmente irracionais, porque alguém se esquecera de as ensinar a falar.

Este Bexiguinha acabou por se transformar numa coisa, porque, no sentido recentemente aprovado pelo Parlamento português, terá deixado de ser um animal sensível... É uma decisão acertada que, na minha opinião, deveria começar por ser aplicada na AR - há por lá tantas coisas inertes!

De qualquer modo, vou passar a ter mais cuidado. 

Doravante, vou dar mais atenção ao tronco da árvore, à relva e à ave acabada de chegar. Até o cimento me parece que tem uma vida secreta - uma alma! 

 

13.5.16

Três bispos

O corredor espelha
o bispo vermelho
das baionetas francesas

(querubins
penam sem fim)

um dia o falcão partiria para beja
outro dia outro campos partira
e morrera gaseado
na banheira da nazaré...

no encerado derrama-se ainda a púrpura
da cerejeira estéril...

e deixaram-me assim...

 

12.5.16

Encontro com o escritor Mário de Carvalho

Hoje, 12 de maio de 2016, pelas 10 horas, a convite da professora bibliotecária, Maria Teresa Saborida, três turmas receberam o escritor Mário de Carvalho. 

Feita a apresentação do convidado, a turma de Latim, da professora Rosa Costa, expôs, através de um «power point», o resultado da pesquisa efetuada na obra "Quatrocentos Mil Sestércios" (1991) sobre as referências de origem latina, em termos lexicais (toponímia e onomástica) e culturais (rituais domésticos e espaços familiares e sociais).

Deste estudo fica a ideia de que escrever é uma atividade que exige trabalho porfiado, pois, como Mário de Carvalho confirmou, «o escritor tem obrigações para com o seu leitor». Afinal, só compreendemos o presente se lhe conhecermos as raízes!

Questionado pela moderadora sobre a 'qualidade' do tempo que viveu no Liceu Camões, quando, aqui, frequentou o último ciclo do ensino liceal, Mário de Carvalho revelou que esse período correspondeu a uma experiência complexa, pois encetou relações de amizade com colegas que se distinguiram (e distinguem) em importantes áreas da vida portuguesa, e também descobriu, de forma dolorosa, como é que se asfixiava o anseio democrático...

Quanto à preparação da sua escrita, Mário de Carvalho frisou a importância que dá à observação do quotidiano e a tudo o que vai acontecendo no mundo em que vivemos. Contrariando o senso comum, para o autor, escrever é um trabalho árduo que não admite anacronismos e que deve acrescentar e não repetir - revelando, a propósito, que continua fiel ao labor e ao rigor de Flaubert.

Num apontamento centrado na obra "Quem disser o contrário é porque tem razão" (2014), foi visível a importância que Mário de Carvalho atribui a este "Guia prático de escrita de ficção", numa época em que a escrita parece resumir-se a uma «falange hegemónica de prescrições, conceitos e juízos primários (...) a chavões e estereótipos» arrancados ao 'senso comum' (e não ao 'bom senso') e à 'sabedoria das nações'...

Por fim, sintetizando o modo como o escritor se dirigiu a quem aprecia o oficio da escrita, esta breve nota, do muito que ficou por dizer, termina com um conselho:

«O ponto é que se identifique e conheça o que se está a rejeitar, ou que isso tenha, que mais não seja, razoáveis possibilidades de existir, pelo menos nos seus contornos. Porque, às vezes, o arroubo de protesto também grita as palavras da fantasia ou da irrelevância.» op. cit., pág. 33, Porto editora.

Da fantasia e da irrelevância...

 

 

11.5.16

Nenhum Rodrigues aceitaria o papel de títere

Tem sido difícil escapar à chuva nestes últimos meses e, pelo andar da carruagem, também não vai ser fácil evitar as notícias sobre o 'ministro da educação". 

Cansado do Crato, prometera a mim próprio não me ocupar do Tiago Rodrigues, porque não sei quem é: falta-me o tempo para lhe investigar o pensamento sobre a arquitetura do sistema educativo e os valores que o devem orientar... 

Cada vez que rebenta um caso, sinto-me desorientado, pois não descortino uma estratégia; apenas, um número avulso... 

Dizem-me que o ministro não passa de uma máscara. Não acredito. Nenhum Rodrigues aceitaria o papel de títere. Consta que o velho bonequeiro é quem manda na "educação" em Portugal. Prefiro não acreditar.

Talvez por me ver em silêncio e um pouco amargurado, um colega aposentado, mas apostado na reposição da memória do passado, ofereceu-me um texto de António Carlos Cortez, «Aos alunos portugueses e ao actual ministro da Educação», Público, 11 de maio de 2016, pág. 44.

O artigo, não sei bem como classificar o referido texto, ocupa uma página inteira. (Parece estar na moda oferecer páginas inteiras a certos colaboradores!) E também não sei o que é que o ministro da Educação poderá aproveitar de tal contributo: a ideologia do divertimento; a política da língua; a memória histórico-literária; o acordo ortográfico; o regresso da Literatura; a dignificação da classe docente; a avaliação; a formação; o fastio discente; a náusea docente ...

 

10.5.16

Aborreço-me sempre que medram para mim

Leio, mas aborreço-me sempre que alguém escreve sobre outrem sem lhe conhecer a obra.  O que quero dizer é que conhecer a obra de outrem é muito mais do que ler umas recensões críticas, um artigo de um académico, sem esquecer a "prosa " veiculada pela web...

Aborreço-me sempre que me dizem que leram uma obra, mas dela nada conhecem... 

Aborreço-me sempre que medram para mim para dizer que um qualquer autor é desprezível só porque lhes promete trabalho.... 

O trabalho, por exemplo, de consultar um dicionário... O trabalho, por exemplo, de conhecer o léxico específico de uma profissão. Até a abulia e a ociosidade deveriam merecer mais atenção...

Aborrece-me a displicência e a negligência e, em particular, aborrece-me o ar empinado de certas criaturas que para tudo têm uma opinião definitiva.

  

9.5.16

Sr. Alberto Gonçalves, "ao ponto da obesidade"?

O sociólogo Alberto Gonçalves celebrou o 1º de Maio com um exemplo da sua ciência:

«Fernando Rosas é um homem notável. Em décadas de carreira política, nunca lhe descobri uma opinião favorável à liberdade, à democracia e ao progresso, embora encha sempre a boca com esses vocábulos ao ponto da obesidade (...) O Dr. Rosas não serve para coisa nenhuma, exceto de exemplo a fugir.» DN, 8 de Maio de 2016

Não é que eu seja um seguidor de Fernando Rosas, custa-me, no entanto que ele seja tão maltratado por quem não tem o cuidado de definir o que entende por "liberdade", "democracia" e "progresso"... Apesar de tudo, sabemos que para Fernando Rosas a liberdade é a dos ´´povos, a democracia é ´popular' e o progresso 'social'´... Fernando Rosas é um daqueles indivíduos que está sempre pronto a combater o Antigo Regime onde quer que ele renasça...

Podemos não concordar com ele, mas o Doutor Rosas explica com clareza o que pensa e não atropela a língua portuguesa, como acontece com o Sr. Gonçalves que, se não se cuida, acaba por se empanturrar com os seus próprios dislates linguísticos. 

- Ao ponto da obesidade, Sr. Gonçalves?

 

8.5.16

O oriente do ocidente

 

Hoje fui visitar o Museu do Oriente, em Lisboa... Inaugurado há 8 anos, este museu traz a muitos que nunca foram ao Oriente alguns dos traços culturais que nos distinguem. 

Gostei do que vi (exposições) e do que ouvi (música do norte da Índia), mas não resisto a perguntar: Por onde é que andam os milhares de orientais que hoje residem em Lisboa?

Enquanto não obtiver resposta, vou perscrutar o centro da terra com a curiosidade do felino que procura libertar-se da serenidade oriental...

 

7.5.16

A Microsoft mentiu

O sistema operativo Windows 10 da Microsoft, instalado em cerca de 300 milhões de dispositivos, vai deixar de ser grátis.

Os sistemas anteriores descontinuados, o que é que sobra ao utilizador? PAGAR...

E se desligássemos os computadores e restantes gadgets durante uma semana?

Primeiro acena-se com a cenoura...

 

GTESC apresenta Sete Crianças Judias

No Auditório da Escola Secundária de Camões, o GTESC apresenta Sete Crianças Judias, de Caryl Churchil nos dias 6, 8 e 10 de Maio de 2016, com encenação de Maria Clara Melo da Silva; cenografia de Mário Rita; desenho de luzes, som e luz de João Lacueva e José Alvega; filmes de António Manuel; interpretação de Carolina Falcato, Maria Carrilho, Helena Real, Diogo Guerra, Beatriz Felício, Ana Beatriz Santana, Gonçalo Romão, Maria Portugal, Ana Rodrigues, Marta Rocha e Graça Gomes; Vozes de Helena Real e Ana Rodrigues; Expressão de Beatriz Felício. 

Esta noite, o GTESC apresentou à comunidade o trabalho de aprendizagem realizado ao longo do presente ano letivo. Com a dramatização de Sete Crianças Judias,  o GTESC comenta o que se passa no Mundo, sem se comprometer com nenhuma das fações em conflito, porque os argumentos de uma e de outra parte estão inevitavelmente comprometidos com valores particulares... o que fez do texto de Caryl Churchill pretexto para uma adaptação que visa defender princípios que, por definição, deveriam ser universais...
Sete anos depois de Maria Clara Melo da Silva ter fundado o GTESC, a representação desta noite mobiliza a quase totalidade das linguagens que, de há um século para cá, vêm dominando os palcos, pondo termo à dicotomia que suportava a ideia de que o movimento, a luz, o som, a imagem... mais não seriam do que auxiliares do chamado «texto principal"...

Quem conhece o texto de Caryl Churchill, terá certamente ficado surpreendido com a qualidade do trabalho realizado por todos aqueles que integram o GTESC 2015-2016.
Apesar da oliveira da "madrinha” Maria do Céu Guerra, as Sete Crianças Judias do GTESC não se deixaram confinar à Faixa de Gaza.

 

6.5.16

A guerra não se explica! Nem às crianças!

A propósito do monólogo dedicado a Gaza, Sete Crianças Judias, de Caryl Churchill

A guerra não se explica! Nem às crianças!

Na guerra morre-se! Por vezes, sobrevive-se sem perceber como. Quem sobrevive também não sabe porquê.

Claro que há os que não podem morrer na guerra. Vivem longe ou, então, mandam na guerra. 

Às crianças que vivem a guerra de nada serve explicar o que é a guerra nem a história da guerra. O melhor é mostrar a todas as crianças o mapa dos que vivem longe da guerra, o mapa dos palácios dos senhores da guerra...

O melhor é mostrar-lhes que há senhores da guerra que vivem na sua própria casa, na sua própria rua, na sua própria escola, na sua própria sinagoga, na sua própria mesquita, na sua própria igreja, na árvore mais frondosa do terreiro mais próximo... e talvez seja melhor mostrar-lhes que, entre as próprias crianças, também há senhores da guerra...

Bom seria que não fosse necessário ficar à espera que as crianças crescessem. Para quê colocar sobre os ombros das crianças a responsabilidade que é nossa, os que vivemos longe e os que mandam na guerra?

 

5.5.16

Com pinças

Com pinças... escrever mais do que isto já é atrevimento. 

Aos dezoito anos, a verdade é uma forma de enxovalho.

Traçar um plano e aplicá-lo é desnecessário.

Distinguir uma ideia de uma ação parece insensato.

Ignorar o significado das palavras não aflige ninguém. 

Ler segundo uma instrução é uma forma de tortura.

Há temas pobres e temas ricos. Por ora, a Internet parece ser um tópico desinteressante. Tal como a leitura!

Aos dezoito anos, o ponto de fuga encontra-se na escrita criativa. 

Com pinças... acrescento: - E se fossemos lendo o "Guia Prático de Escrita de Ficção", de Mário de Carvalho... até porque "Quem Disser O Contrário É Porque Tem Razão"...

Quem souber dizer o contrário... 

Com pinças também se pode dizer o contrário.

 

4.5.16

Sem qualquer expectativa

Bem sei que os linguistas e certos filósofos da linguagem estão convencidos que «dizer é agir», eu por enquanto preocupo-me com aqueles que confundem o pensamento com a ação. Em abstrato, isto pode enervar, mas eu sei bem do que estou a falar.

Publiquei esta breve reflexão no Facebook, sem qualquer expectativa, convencido que o pensamento vive de ideias e de certas imagens, nem todas. Há por lá umas tantas que atrofiam!

Consta que há por aí um paradigma que confunde tudo: os leitosos que nada fazem, os achistas instantâneos e, sobretudo, os narcisistas de serviço...

Eu bem tento, mas há dias em que esmoreço... chego a pensar que o melhor seria subir ao palco e despejar tudo para a plateia.

Para quê? Continuaria a falar sem demover. No meu caso, o provérbio «água mole em pedra dura tanto bate até que fura" não se aplica.

3.5.16

A Internet em versão escolar

A Internet permite-nos falar «com o outro lado do mundo, com pessoas do outro lado do mundo».
O outro lado? Quanto a este, estamos esclarecidos! Será assim mesmo?

A Internet será um «tema viral», uma vez que a «aderência» é cada vez maior?
O que é um «tema viral"? O que é feito da adesão? Caiu em desgraça?
A Internet permite mesmo «travar conhecimento com a cultura italiana»? Bom, ao fim da tarde, marcamos encontro... Espero não me atrasar! É que ela há muito que espera por mim...
Será que faz algum sentido que haja quem «se dedique à Internet»? Não sei se antigamente havia quem se dedicasse à máquina de escrever, embora as boas esposas se dedicassem aos maridos e aos filhos, sem esquecer as que procuravam o «outro lado do mundo» ...

Acabo de encontrar um enunciado que me assegura que «a Internet pode ser uma fonte de dispersão para a sociedade”. Pobre sociedade, tão global e tão dispersa! Será que faz algum sentido afirmar que «a minha Internet está muito lenta»? É bem feita! Ora, se sou tão comedido quando me refiro à Luz...

 

2.5.16

O sociólogo Alberto Gonçalves escreveu-me...

Embora não saiba quem eu sou, o sociólogo Alberto Gonçalves escreveu-me nos seguintes termos:

«Aos cépticos, lembro que, pormenores à parte, em Caracas a coisa também começou assim, com o poder tomado por um bando de rústicos, nostálgicos do comunismo ou meros oportunistas de carreira. E também houve bazófia, proclamações de soberania, injúrias a imperialistas imaginários, juras de amor à liberdade, promessas de imparável progresso...» DN, 1 de maio de 2016.

Quem quiser entender a ciência deste sociólogo que leia o artigo "A Venezuela é o futuro". Estão lá os dados todos!

Eu sou um dos céticos que duvida da bondade das instituições europeias, que não crê na solidariedade dos credores, que está convencido que o imperialismo existe... e que o senhor Alberto Gonçalves se está a exceder, escrevendo por encomenda...

Pode ser que eu esteja errado e que, afinal, o sociólogo tenho ponderado devidamente os dados e a sociologia seja uma ciência exata, cujos resultados são fraternamente acolhidos pelo Diário de Notícias... ao domingo, dia de todos os senhores.

 

 

 

1.5.16

No Dia da Mãe, António Barreto escreve sobre os pais

No Dia da Mãe, António Barreto queixa-se de que o Ministério, os sindicatos e os professores não apreciam os pais:

«E muito menos os pais. Metediços, ignorantes e incompetentes são os epítetos que muitos professores e quase todos os sindicatos reservam para os pais dos seus alunos. No que são acompanhados pelo ministério que jamais fez reais esforços para interessar os pais e lhe dar tempo, proporcionar estruturas de participação sincera e atribuir responsabilidades e poderes.» DN, 1 de maio de 2016.

Melhor seria começar por afirmar que, em geral, é a MÃE que é a encarregada de educação, papel que, atualmente, chega a ser desempenhado pela AVÓ. E que a mãe faz na escola o que sempre fez na vida: defende a cria de tudo e de todos, com maior ou menor razão. Sempre foi e, assim, continuará a ser.

Embora não seja meu hábito defender o ME, tenho de reconhecer que, se faltam condições aos encarregados de educação para uma maior participação na escola, a responsabilidade deve ser partilhada por outras áreas da governação e do sector empresarial privado e público. Quanto à irritação dos professores, o melhor seria analisar, com realismo, a situação dos atuais docentes e, em particular, dos diretores de turma.

Quando um investigador docente universitário observa os ensino básico e secundário, fá-lo, em regra, de forma especulativa, de acordo com pressupostos razoáveis, mas cujas conclusões são, na maioria dos casos, inadequadas. E porquê?

Porque raramente é encarregado de educação, sobretudo se pai, porque nunca desempenha a função de diretor de turma, porque não tem tempo para participar no Conselho Geral da escola, e porque tem uma péssima noção do que significa ser docente na escola atual: continua a pensar que a sala de aula é o lugar para dar conta dos resultados da SUA investigação, que na sala de aula ainda há lugar para o primado magistral e, sobretudo, ignora... o que eu, por ora, não me atrevo a reportar...  

 

30.4.16

Paul Verhoeven dos anos 60

Li algures que Paul Verhoeven (Amesterdão, 1938) é um realizador malcomportado ou, pelo menos, que a sua obra desafia a moral instalada.

Talvez seja verdade, no entanto, a "Cinemateca com o IndieLisboa" acaba de mostrar cinco dos seus documentários, realizados entre 1960 e 1965, e fiquei com a ideia de que este realizador não seria assim tão malcomportado.

No documentário HET KORPS MARINIERS, a celebração dos 300 anos do Corpo da Marinha (1665-1965), não vi ponta de sátira, não vi sombra de ironia. O Corpo da Marinha é instruído para um cenário expansionista e de hegemonia territorial.

O tema do mau comportamento preocupa-me por causa da ambiguidade com que o perspetivamos. Nuns casos, tudo fazemos para nos vermos livres dos malcomportados; noutros, incensamo-los pela rebeldia de que são capazes... E em muitas situações, os malcomportados que rejeitámos acabam por ser objeto da nossa veneração secreta...  

 

29.4.16

Há coisas que aborrecem!

Só pode ser força de expressão dizer que 'há coisas que aborrecem'. A própria 'força de expressão' não me agrada, parece-me querer exprimir uma certa atitude mental de quem é preguiçoso, mas não se consegue calar...

Não querendo queixar-me dos do costume, olho hoje para a Avenida Gago Coutinho, pejada de táxis, no sentido do Areeiro e quase vazia no sentido contrário - os poucos automobilistas eram forçados a circular na faixa do bus; as restantes faixas serviam as forças da ordem, encavalitadas em motas alemãs, exibindo o seu potencial de fogo... Fiquei um pouco apatetado, vindo-me à memória "A Inaudita Guerra..." do Mário de Carvalho.

A verdade é que não gostei daquela encenação poluidora e anacrónica. Nem daquela nem da maioria das 'formas de luta' que recorrem ao desperdício...

E a propósito de desperdício, aborrecem-me os restaurantes onde se pode comer à tripa forra por uma dezena de euros. Com tanta miséria, empanturrar-se deveria ser considerado crime! 

Acontece que, por razões familiares, ao início da tarde, vi-me acantonado numa dessas manjedouras. Contrariado, lá escolhi três ou quatro ingredientes, e fui avançando no esvaziamento do prato ao ritmo dos outros comensais e, quando menos esperava, surge um simpático funcionário que me interpela: - Então, o sr. não se serve de mais!?

Francamente, bastava olhar para mim, para perceber que isso me aborrecia...

 

28.4.16

Fernando Cabral Martins na ES de Camões

A memória é um elemento essencial de qualquer poética. Pelo menos é o que infiro das palavras de Fernando Cabral Martins que, hoje, se deslocou à Escola Secundária de Camões para abordar o tema "Algumas Imagens da Poesia de Mário de Sá-Carneiro". Não tanto a memória do tempo vivido pelo jovem Sá-Carneiro, há mais de 100 anos, no Liceu Camões, nem sequer a memória da relação privilegiada com Fernando Pessoa, mas, sim, o papel da memória na génese e na substância do ato poético. 

O que Fernando Cabral Martins procurou vincar foi que o que, hoje, deve interessar é o legado poético e não tanto o Poeta, porque só a poesia dá conta do diálogo que ele foi capaz de estabelecer com o modernismo baudelairiano e com as vanguardas que foram respondendo às várias crises despoletadas pela revolução industrial: a crise da vida social (o anonimato do homem citadino); a crise da comunicação (o impacto dos novos mass media); a crise psíquica (o dilema da identidade).

Neste sentido, o cosmopolitismo de Mário de Sá-Carneiro foi um fator essencial à produção de uma vanguarda - a vanguarda de Orpheu - em que as fronteiras entre as diversas artes se esbateram, gerando sucessivas expressões artísticas (paulismo, futurismo, cubismo, expressionismo, interseccionismo, sensacionismo...) e, sobretudo, agindo de forma visceral naquele que é hoje considerado o expoente máximo da geração do Orpheu: Fernando Pessoa.

 

Eu não sou eu nem sou o outro

Sou qualquer coisa de intermédio:

Pilar da ponte de tédio

Que vai de mim para o outro.

   Lisboa, fevereiro de 1914

Na poesia de Pessoa há extensos vestígios da Eurídice que nunca desapareceu da arca pessoana...

(Outros tópicos merecedores de atenção: a ideia de que a vanguarda não implica rutura; a noção de que os poetas decadentes não o são - combatem a decadência; o paulismo como "disparate" provocador de bom senso; o interseccionismo, expressão literária que fixa o essencial do cubismo; os "performers" modernistas; Mário de Sá-Carneiro, produtor do Orpheu, financiado pelo pai...); a sinestesia, intersecção de duas sensações ou de várias realidades distintas; a centralidade de 1915...)

27.4.16

Porquê eu?

Explicar a técnica narrativa de um autor como Saramago não é fácil, sobretudo explicar o modo como o narrador se posiciona em relação à história e procura coagir o narratário a acompanhá-lo na construção de um ponto de vista demolidor da História oficial e da verosimilhança tradicional. O discurso do narrador, nas suas diversas faces, desconstrói a expectativa do leitor tradicional e dá um abanão nas convicções académicas e populares.

Em abstrato, nada disto é inteligível, o que determina uma estratégia de leitura minuciosa, lenta, capaz de pausas mais ou menos prolongadas para clarificar as múltiplas referências de que o texto se alimenta. Só quem acompanhe este processo didático poderá fazer uma pequena ideia de como a atitude dentro da sala de aula pode conduzir ao sucesso ou ao sucesso interpretativo, e consequentemente à formação do "leitor". Sim, porque o leitor não nasce feito nem deve ser objeto de formatação.

Há muito que acredito que aprender a ler é uma atividade que deve ser cultivada diariamente, embora os meus atuais interlocutores andem muito distantes deste ponto de vista. Não todos, felizmente! Mas há uns tantos que se estão marimbando, e que perturbam permanentemente o processo de aprendizagem...

Por princípio, resisto até um limite que, no meu caso, é o da minha própria dispersão. No entanto, em cada aula, seleciono um "alvo" e pergunto-lhe o "que é que o traz à sala de aula". Em regra, a minha pergunta fica sem resposta ou, melhor, acabo por ser confrontado com uma argumento definitivo: - Porquê eu?

Um bom exemplo de pressuposição, porque, afinal, há tantos outros desatentos, marimbando-se. O implícito fica comigo: Deixe-me em paz, vá chatear outro... Eu sei muito bem ler! Não preciso disto para nada...    

 

26.4.16

A racionalidade conjugal da morgada de Travanca

A presidente do Conselho de Finanças Públicas (CFP), Teodora Cardoso, rejeitou hoje que este órgão consultivo tenha uma postura ideológica, defendendo antes que respeita a racionalidade económica.

A racionalidade económica é um conceito que me provoca azia. Em primeiro lugar, porque a racionalidade só pode ser estabelecida pela razão humana; em segundo lugar, porque a economia é uma categoria que não deve descurar a ideologia que, pela sua origem, pressupõe um governo do homem para o homem.

Para mim, não é admissível que um perito em finanças públicas tenha uma visão da governação estribada nas regras do galinheiro de salazar: os trabalhadores põem os ovos e os safardanas abocanham-nos...

A dona Teodora Cardoso lembra-me outra Teodora, a do Calisto Elói:

Valha-me Deus! - exclamou ela aflitivamente. Tu dizes-me coisas que me fazem endoudecer! Pois tu não vês que eu já não posso dar o meu coração a outro enquanto for casada com um?

- Vejo que me não amaste nunca, Teodora. Dize a verdade... Nunca me tiveste amor?

- Eu sei cá, primo! ... Se me casasse contigo, tinha-te amor... Assim como casei com meu marido, que hei de fazer eu agora?  

 Camilo Castelo Branco, A Queda dum Anjo - diálogo entre os primos Teodora e Lopo, cap. XXIX.

 

25.4.16

Que me desculpem os nostálgicos de abril!

Já me sentei ali. Sob um sol tímido, procurei o sopro do dia. Procurei que a aragem me libertasse da asfixia. Por momentos, a temperatura subiu e eu respirei melhor.

O alívio foi, no entanto, breve. Talvez ainda possa regressar, mas não sei se fará sentido até porque há outros bancos... de jardim que os outros já tiveram melhores dias.

De qualquer modo, hoje, sei que de pouco serve regressar ao passado, por isso interrogo-me se ainda faz sentido "voltar" a 1974, quando uma boa parte da população nasceu depois dessa data... E sobretudo, questiono-me sobre o tempo de vida das revoluções.

A última revolução, se não está moribunda para lá caminha. Que me desculpem os nostálgicos de Abril!

 

24.4.16

"Alguma coisa mudou"... para pior

«Houve uma época em que os professores estavam muito mais próximos dos alunos, em que se esforçavam por lhes dizer: " As tuas condições atuais não têm necessariamente de moldar o futuro." Mas alguma coisa mudou.» Kalaf Angelo Epalanga, DN, 24 abril 2016

O Diário de Notícias presta hoje um bom serviço, ao abordar a questão do "racismo institucional" que tem medrado nas escolas portuguesas, com poucas exceções, como será o caso da Secundária de Azevedo na Damaia.

Kalaf Angelo Epalanga, entrevistado no mesmo diário, dá conta de que, na sua opinião, os professores mudaram de atitude - tornaram-se mais distantes e menos conhecedores do meio onde trabalham...

Eu concordo que alguma coisa mudou para pior. Em primeiro lugar, mudou o modelo de formação de professores que, nos anos 80 e 90, dava particular atenção à individualidade do aluno e ao meio. Depois, a partir de 2005, mudaram o estatuto do professor e do aluno.

O primeiro foi transformado em «mão-de-obra» indiferenciada, sem qualquer reconhecimento de saber e de competência relacional e pedagógica. O segundo, o aluno, passou a ser mais um, subordinado a critérios de ensino que descuram por inteiro as aprendizagens iniciais - não basta definir metas -, é preciso alterar os mecanismos que permitam que todos possam atingi-las...

O responsável pelo "racismo institucional" é o ministério da educação, incapaz de definir uma política educativa que proporcione igualdade de aprendizagem, e não de oportunidades porque elas são poucas, independentemente, da origem social e cultural cada aluno.

 

23.4.16

POR FAVOR, NÃO MEXA NOS ANJOS!

 

Que posso eu acrescentar? 

Estes anjos são tão esbeltos, tão diáfanos, que só posso imaginá-los a fugirem da igreja onde os têm reféns... Quanto ao pedido, não o entendo, pois eu nunca faria mal a um anjo! De qualquer modo, saí da igreja com pena deles, e nem a injunção de Cristo a Lázaro SURGE ET AMBULA me alegrou...

Preferia que o Senhor lhes devolvesse a missão para que os criou, mesmo que alguns lhe tenham desobedecido...

E também não compreendo por que motivo parecem querer seguir caminhos opostos. Melhor seria que dessem as mãos! Que seguissem o exemplo da esquerda portuguesa.

Ou será que estes dois anjos, tão esbeltos e tão diáfanos, representam a direita portuguesa?

Bom, nesse caso, POR FAVOR, NÃO MEXA NOS ANJOS!

 

22.4.16

José Rodrigues dos Santos ajuda a explicar o que é um derivado não afixal

Ainda não eram 20 horas, e já o José Rodrigues dos Santos vociferava UM ARRASO ÀS PREVISÕES DO GOVERNO.

De imediato, pensei naqueles meus alunos que não entendem do que é que se está a falar quando se explica e dá exemplos de derivação não afixal. Aquele ARRASO vem mesmo a calhar - um grupo de peritos em finanças públicas ARRASARA repetidamente o governo. É que eu passei o dia a ouvir a notícia, apesar do JRS a apresentar como a última novidade, capaz de provocar a queda do próprio céu...

Afinal, o que é um derivado não afixal? De acordo com os linguistas lusitanos, trata-se de um nome deverbal gerado por um verbo, (de modo não canónico) - o parênteses é meu! Não canónico pela simples razão de que, em certos épocas, não há tempo para aprender nem vontade para seguir as regras, por exemplo, da derivação por afixação. Há por isso muitos nomes deverbais: abalo, agasalho, busca, janta, espanto, insulto, toque, troca... Ao JRS deve ter faltado o tempo para construir um enunciado menos tonitruante! (A falta de tempo de quem tanto escreve!)

Já agora aproveito para concluir a lição sobre o desrespeito pelo cânone:  Dias houve que, por razões de conveniência financeira, alguém sugeriu que o melhor era converter os judeus, obrigando-os a adotar um nome cristão, novo já se vê pois os velhos tinham todos senhor e senhora. E foi vê-los a trocar de nome: coelhos, cavacos, cristas, sapateiros, ferreiros, ferros, anzóis, martelos, portas, marmelos, relvas, costas, seguros, rebelos, figueiras, saramagos, uvas, zimbros - todos nomes comuns que viraram nomes próprios... 

E os mais extraordinário é que os linguistas acabaram com a velhinha derivação imprópria, batizando-a de conversão, certamente em homenagem à conversão forçada dos judeus em cristãos-novos. Não sei se há por aí alguém que se chame auto da fé!

 

 

 

 

21.4.16

Defraudado

Às 18.05, sentei-me em frente do coreto. Inexplicavelmente, este estava deserto. A miudagem habitual desaparecera. As aulas tinham terminado, e o negócio mudara de lugar... Senti-me defraudado. Na fachada do Liceu, três vultos de outrora pareciam, como eu, frustrados. Creio que o Mário era o que estava mais triste, talvez porque merecesse o lugar central...

Ele que chegou mais cedo, cedeu o lugar a outro Mário que de Dyonisos teria muito pouco ou, talvez, o engano seja meu.

O dia fora longamente preenchido e improdutivo, apesar da agitação circundante... No entanto, ainda vislumbrei aqui e ali uns olhos surpresos, porque, apesar de tudo, não me conformo com o lugar-comum.

 

20.4.16

Uma arca cheia de ismos

Devo andar a exprimir-me mal. Por vezes, chego a imaginar que certos termos já estão classificados como arcaísmos. Talvez o arcaísmo não passe de uma arca cheia de ismos. Definição nada ortodoxa mas que, quem sabe, pode pegar de estaca...

Por exemplo, o Mário Nogueira resolveu imitar o professor Marcelo, e veio a público classificar o novíssimo ministro da educação, tendo lhe atribuído classificação positiva. Só que desconheço os critérios de classificação. Espero que nada tenham a ver com nomeações de familiares, amigos, amigos dos amigos - povo de esquerda em geral...

A própria esquerda já colocou na arca os velhos ismos. Como diria o António Barreto, por estes dias, preferimos os rapazes e as raparigas e, sem ofensa, os neutros - velha reminiscência latina, por ora, bastante maltratada...

O que verdadeiramente interessa são as sacristias, lugar onde, afinal, o destino do contribuinte é cozinhado.

 

19.4.16

Democracia de confessionário

As ideias surgem-me avulsas e inconsequentes, mudas seguem o seu caminho que é não incomodar ninguém. No entanto, uma delas não para de me dar comichão no cocuruto - vivemos numa democracia de confessionário.

Anda por aí um Costa, mais propriamente, o Carlos, que fiel servidor do eurismo, esconde informação vital ao decisor ou a quem pensa que ainda decide... Qual confessor, o Carlos não informa o governo das patranhas congeminadas lá para os lados de Frankfurt, deixa-o enredar-se em soluções de última hora que acabarão por levá-lo ao cadafalso. Diz que são as regras do sigilo, ignorando que, em democracia deveria vingar a transparência...

Afinal, o velhinho segredo de estado continua a fazer o seu caminho... e as suas vítimas, muitas!

 

18.4.16

De viés

Se a sociologia é uma ciência, do que é que estou a falar quando acuso um sociólogo de ser de direita, o qual, por seu turno, já acusou outro de ser de esquerda? Poderá a ciência ser de direita ou de esquerda? Ou, afinal, a sociologia nunca foi uma ciência, resumindo-se à ideologia daqueles que não conseguem despir-se das vestes do poder?

Passa por mim uma criatura que me evita o olhar e que se refugia na vitrine do hotel para me observar de viés, como se não me conhecesse. No instante, interrogo-me sobre o mal que lhe terei feito, e sigo caminho... Mais adiante, outra criatura, em visita institucional, saúda-me majestaticamente, como se lhe faltasse a montra, e eu sigo pensando no perdigão que subiu a uma alta torre...

Apesar da visão refrativa me cansar cada vez mais, procuro esquecer aqueles que me olham de viés, mas é difícil.

O confronto verbal ignora o tema e perde-se em atalhos. A referência vive embrulhada na motivação, diluindo-se na banalidade do cidadão comum que, por sê-lo, voltou a ser súbdito...

 

17.4.16

Alberto Gonçalves, sociólogo de direita

 «Porque é que isto acontece? Ninguém faz ideia. Um governo do partido derrotado nas urnas, chefiado por uma nulidade irresponsável, herdeiro da histórica competência do PS, repleto de adolescentes mentais e iluminado pela ponderação do PCP e do BE tinha tudo para funcionar. É a história do maluco que se lançou várias vezes do 3º andar com consequências aborrecidas - e agora lança-se do 5º para ver se aterra ileso.» Alberto Gonçalves, Sociólogo, DN 17 de abril de 2016.

Primeiro não quis acreditar que fosse possível viver num país governado por uma nulidade irresponsável, depois reli o excerto de «Aos comentadores de "direita"» atento aos sinais de IRONIA. E percebi que os fundadores do PS eram incompetentes, que os quadros atuais pertencem à categoria dos adolescentes pré-adultos, que o PCP e BE não passam de grupos de destrambelhados. Quanto à história do maluco, desconheço o referente.

Embora pensasse que o Sol quando nasce é para todos, hoje sei que não é bem assim. O Sol ilumina os comentadores de "direita", mesmo que estejam adormecidos. De qualquer modo, o sociólogo Alberto Gonçalves já começou a despertá-los.

 

Sem querer ofender o ilustre sociólogo - afinal, a Sociologia também pode ser de direita! Salazar foi uma nulidade irresponsável ao bani-la das Universidades - vou lembrar-me deste dia sempre que entrar ou passar por perto da Quinta Pedagógica dos Olivais.

 

16.4.16

Nunca fui escuteiro

As andorinhas ainda não chegaram, porém os escuteiros estão um pouco por toda a parte.

O dicionário da Porto editora define o ESCUTEIRO como «mancebo pertencente a uma associação organizada, que se exercita em serviços humanitários e se prepara para a defesa da Pátria.»

A definição parece-me um pouco retrógrada: ignora as mancebas; confunde o escutismo com o voluntariado; revela uma matriz militar...

Eu nunca fui escuteiro, embora tenha sido seminarista, voluntário à força, tenha cumprido o serviço militar, campista e caravanista...

Bem vistas as coisas, só me falta ser escuteiro, mas creio que o melhor seria começar por rever a definição do termo...

 

15.4.16

espirro com letra minúscula

espirro com letra minúscula
(nunca atribui grande dignidade ao espirro)
a verdade é que raramente espirro
só que quando espirro a carcaça desfaz-se...
 talvez seja por isso que perco a paciência
(de mim todos esperam que seja paciente
há mesmo quem pense que nasci paciente)
só que ninguém ouve a carcaça a desfazer-se
casco velho cheio de frinchas
depois de me embebedarem os quistos
querem agora dissecar-me os gânglios
só que eu  prefiro o mar de sargaços
ou será de engaços
abstémio
disse-lhes que sim, daqui a seis meses,
sejam pacientes que eu vou ver se não espirro
se um costa incomoda muita gente
dois costas incomodam muito mais
e sobretudo um incomoda o outro

 

14.4.16

Não sei se...

Não sei se o atual ministro das finanças anda a esconder a verdade, mas custa-me aceitar que aqueles que, nos últimos anos, nos mentiram diariamente venham acusar quem quer que seja de mentiroso.

Não sei se o Bloco de Esquerda não tem mais nada para fazer, mas parece. Talvez pudesse aproveitar o tempo para estudar um pouco de Gramática! Consta que o BE quer substituir o masculino pelo neutro para acabar com a discriminação. Haja paciência!

Não sei se o Almada Negreiros discriminava os ciganos, no entanto não deveria tê-los trazido à baila na guerra ao Dantas:

O DANTAS É UM CIGANO!
O DANTAS É MEIO CIGANO!

... e sobretudo não deveria ter discriminado as CIGANAS!

13.4.16

No reino da informalidade

As fronteiras podem ser uma fonte de conflitos, a história o ensina. Um pouco como a formalidade pode matar a espontaneidade e a imaginação.

Há, contudo, um certo tipo de informalidade que, como o aluvião, tende a ignorar as regras que impedem a subversão de valores e de comportamentos.
Dito de outro modo, há cada vez mais comportamentos que esmagam todo e qualquer valor.

Nem já os detentores do poder revelam ser capazes de separar a res púbica da res privata. O primeiro-ministro delega num amigo a responsabilidade de o representar em negócios equívocos.

Os exemplos são múltiplos!

Vivemos no reino da informalidade e quando tal acontece vinga a estupidez.

 

12.4.16

Francisco Nicholson, aluno do antigo Liceu Camões

«O ator, argumentista, escritor e encenador, Francisco Nicholson morreu esta terça-feira de manhã, 12 de abril. Internado no hospital Curry Cabral, o ator encontrava-se doente devido a complicações resultantes de um transplante hepático a que fora submetido há uns anos. 

Francisco Nicholson começou a fazer teatro aos 14 anos, no antigo Liceu Camões, sob direcção do encenador e poeta António Manuel Couto Viana, a convite do qual veio a pertencer ao Grupo da Mocidade, que integrou com, entre outros, Rui Mendes, Morais e Castro, Catarina Avelar e Mário Pereira.»

Será que a Morte prefere os dias sombrios? Há dias em que assim parece. Talvez, porque deixámos de encarar a morte como lugar de passagem ou, em alternativa, de reintegração no cosmos.  

 

11.4.16

Perante a soberba

Pouco posso dizer sobre as grandes questões, pois, do que conheço do passado, estas não passam de querelas de ambiciosos sedentos de poder e de riqueza.

Por outro lado, do que conheço do presente, a maioria vive animadamente o momento, alheia aos problemas do mundo, como se vivesse num universo paralelo. E talvez viva!

Um universo que despreza o ponto de vista de quem quer que seja. Em certos dias, é mesmo necessário pedir desculpa por ainda cumprirmos o dever de explicar que o ponto de vista é o lugar a partir do qual se observa, a partir do qual se pensa... um lugar concreto, diferente sempre que ousamos mudar, aprofundar, questionar, propor outro caminho...

Perante a soberba, não querendo deixar de ser corteses, baixamos a voz, eliminamos as convicções, e resguardamo-nos nas definições.

Um destes dias, mais não faremos do que ler o manual de instruções...

 

10.4.16

Um poeta, ministro da cultura

Do Medo

1

Não pode o poema
circunscrever o medo,
dar-lhe o rosto glorioso
de uma fábula
ou crer intensamente na sua aura.
Nós permanecemos, quando
escurece à nossa volta o frio
do esquecimento
e dura o vento e uma nuvem leve
a separar-se das brumas
nos começa a noite.

Não pode o poema
quase nada. A alguns inspira
uma discreta repugnância.
Outras vezes inclinamo-nos, reverentes, ante os epitáfios
ou demoramo-nos a escutar as grandes chuvas
sobre a terra.
Quem reconhece a poesia, esse frio
intermitente, essa
persistência através da corrupção?
Quase sempre a angústia
instaura a luz por dentro das palavras
e lhes rouba os sentidos.
Quase sempre é o medo
que nos conduz à poesia.

2

Voltando ao medo: as asas
prendem mais do que libertam;
os pássaros percorrem necessariamente
os mesmos caminhos no espaço,
sem possibilidades de variação
que não estejam certas com esse mesmo voo
que sempre descrevem.
Voltando ao medo: o poema
desenha uma elipse em redor da tua voz
e cerca-se de angústia
e ervas bravias — nada mais
pode fazer.

Luis Filipe Castro Mendes, in "A Ilha dos Mortos"

 

A velha Índia

«Pertenço a um género de portugueses / Que depois de estar a Índia descoberta / Ficaram sem trabalho...» Álvaro de Campos, Opiário.

Para lá do verde, o investimento alemão; por detrás, o que resta da velha Índia – a ponte.

Bom seria que os políticos se empenhassem mais em construir pontes do que em destruí-las.

(...)

Na Índia de hoje, a tragédia:

«O incêndio que deflagrou este domingo num templo indiano, provocado por fogo-de-artifício, causou pelo menos 102 mortos e 280 feridos, segundo um novo balanço oficial. Milhares de indianos juntaram-se na madrugada de hoje num templo hindu de Puttingal Deva, na província de Kerala, sul da Índia, para celebrar o festival Vishu, quando o local de lançamento do fogo-de-artifício a ele associado foi alvo de uma explosão.» Correio da Manhã

 

9.4.16

A Voz inútil é um modo de dizer

A Voz inútil é apenas o modo de dizer que naquele serviço o número de enfermeiros é de tal forma reduzido que não sobra ninguém para responder às questões dos familiares dos doentes.

Curiosamente, no serviço de internamento, o familiar e o amigo do doente são esclarecidos de que só o médico pode dar informação e como tal o melhor é ligar para a unidade, só que do outro lado irrompe uma Voz inútil...

Chegados à unidade, por exemplo de Cuidados Intensivos Neurocriticos, não há médico à vista, e apenas se vislumbra um enfermeiro em frente de um terminal de computador, provavelmente a preencher a ficha clínica dos doentes...

De qualquer maneira, não me posso queixar: o António está a recuperar bem da intervenção... e cá fora sempre pude observar o castelo de S. Jorge, apesar de bem distante.

 

A Voz inútil

Estou desde as 18 horas de ontem a ligar para o serviço de neurocirurgia do Hospital de São José. O telefone toca durante meio minuto até que uma Voz 'responde', Lamentamos, de momento não é possível atender. Volte a ligar mais tarde.

Bem gostaria de saber de quem é esta Voz e quanto é que lhe pagam para realizar esta tarefa inútil.

Lá terei de me mexer e cumprir o preceito: Quem quer vai, quem não quer manda!

 

8.4.16

Partiu o ministro caceteiro

«Entretanto, o António Costa deve lembrar a João Soares que não precisamos de um ministro da cultura trauliteiro.» Caruma, 1 de Março de 2016

A nomeação de João Soares para ministro da Cultura só não me surpreendeu por ele ser filho de quem é. A Comunicação Social celebrou o 'homem de cultura', embora eu nunca tenha percebido porquê. Conhecia-lhe a arrogância que o levou a perder a renovação do mandato para presidente da CML, conhecia-lhe o descaramento que o levara a apoiar Savimbi, contribuindo para a manutenção da guerra civil em Angola, conhecia-lhe as relações pouco recomendáveis com investidores chineses interessados na propriedade alentejana e não só...

No essencial, a cultura de João Soares resume-se a um discutível círculo de relações, com enorme dificuldade em aceitar a crítica... e que por isso reage como se ainda vivêssemos no século XIX.

 

7.4.16

Idalécio ou 'aquele que tem o espírito forte'

Passei anos a guardar papéis e eles são tantos e já amarelecidos que já não tenho paciência para os recuperar. Talvez pudesse digitalizá-los ou até copiá-los para o computador, mas falta-me o tempo e, sobretudo, sobra-me a ideia de que estes não iriam interessar a ninguém.

Apetece-me rasgá-los, de vez! De tempos a tempos, inicio a tarefa, mas acabo por suspendê-la. Vá lá saber-se porquê!

Nos últimos dias, tenho vindo a pensar que, definitivamente, perdi a hipótese de enviar os meus papéis para o Panamá.

Triste sina! Chego sempre tarde! Eu que prezo a pontualidade... a culpa é dos meus pais que não quiseram dar-me o nome de Idalécio. 

 

6.4.16

De passagem...

Há tanta gente a necessitar de ajuda! Tanta gente em movimento!

Com maior ou menor diligência, desenvolvem-se estratégias de acolhimento e de integração. No entanto, quando se pensa na aprendizagem da língua portuguesa como forma de integração, há um momento em que todos desaparecem, como se o inglês bastasse para eliminar as fronteiras.

Afinal, o que se desenvolve através do ensino em inglês é uma nova forma de assimilação, em que as escolas em geral e, em particular, as universidades não passam de barrigas de aluguer.

A integração pressupõe o conhecimento da cultura do lugar, da sua especificidade linguística e histórica. Sem esse conhecimento, o imigrante e o refugiado (categorias, por vezes, indistintas) estarão só de passagem, mesmo que a linha que separa a vida da morte possa ser muito ténue... 

 

5.4.16

O mal-estar destes dias

Há sempre um dia em que a intimidade acaba exposta, mesmo se por prevenção ou para despistar sintomas recorrentes.

Há sempre um dia em que um amigo se prepara para regressar às mãos do neurocirurgião, mesmo se para por cobro ao crescimento de um cisto indesejado.

Há sempre um dia em que um filho decide regressar a Ancara, capital de um país, onde a repressão das oposições é cada vez mais frequente e violenta.

Há sempre um dia em que um colega nos parece ter subitamente envelhecido... 

Este é um desses dias!

Para a semana, esperemos que o vento frio se tenha afastado e que o pólen dos plátanos tenha cumprido a sua função.

Para a semana, esperemos que o mal-estar destes dias tenha cessado! 

 

4.4.16

Olho vê, mão pilha

«Mas os ‘Panama Papers’ batem o recorde em volume de dados, sendo a maior fuga de informação sobre offshores de que há registo: envolvem mais de 214 mil companhias. Os ficheiros incluem emails, fotografias, ‘powerpoints’ e partes da base de dados da Mossack Fonseca, a sociedade de advogados panamiana que está na origem da informação aparentemente mais relevante, num período entre a década de 1970 e 2016.» Imprensa, 4 de abril 2016 

Como escreveu Saramago em Memorial do Convento, «mas isto, confessemo-lo sem vergonha, é uma terra de ladrões, olho vê, mão pilha...» Só que Saramago, na circunstância, referia-se à arte de furtar portuguesa. Afinal, o furto é global, e como o polvo, sabe esconder-se nos lugares mais improváveis. No caso, no Panamá.

Paga-se o trabalho miseravelmente, corta-se nas pensões, condenam-se empresas à falência, colocam-se os povos no pelourinho, e para quê? Para que os abutres vivam à grande pelo menos desde os anos 70!

 

3.4.16

Pela integração

«Há duas maneiras de organizar a receção de imigrantes. Uma tem a designação genérica de integração. A outra de multiculturalismo.»  António Barreto, DN, 3 de abril de 2016.

Vale a pena ler o artigo de António Barreto!

No que me diz que respeito, desde meados dos anos 90 que pugno pela interculturalidade, uma das estratégias possíveis de integração. Nunca percebi como é que politicamente se pode defender a divisão do território em ilhas de cultura (religiosa ou outra...)

A maioria dos conflitos dos últimos 100 anos encontrou nessas ilhas terreno propício ao avanço de projetos de alargamento do chamado "espaço vital". Basta lembrar como Hitler anexou a Áustria, a Renânia, a República Checa, sempre em nome das minorias alemãs...
O que, afinal, em nada se distingue, por exemplo, da estratégia de Putin, mais recentemente...

 

2.4.16

Leituras várias

Desde as cinco horas que chuvisca e eu fui um dos tolos, embora não me possa queixar, pois o edredão secou enquanto o sol durou. 

Por entre os afazeres domésticos, o dia foi consumido numa caminhada e, sobretudo, em leituras várias: "O dia em que a jararaca voltou"; "Relations Internationales de 1930 à 1939"; "Les agressions allemandes et la marche à la guerre (1938-1939)"; capítulos primeiro e derradeiro de "Memorial do Convento"...  (Talvez, Santo Aleixo nos possa valer!)

Estas leituras podem parecer incongruentes, no entanto dão-nos a compreender a mecânica humana: por um lado a ambição desmedida; por outro, a inconsequência e a cobardia. 

O cruzamento de leituras de índole jornalística (Brasil atual), histórica (conflito entre ditaduras e democracias no séc. XX) e ficcional, dá ao leitor o distanciamento necessário à compreensão do descalabro civilizacional em que estamos mergulhados.

Infelizmente, esta experiência é cada vez menos partilhada.

 

1.4.16

Para que serve a escola?

Quando não há uma relação direta entre o sucesso na vida e o sucesso escolar, qual é o lugar da escola no mundo atual? 

Tradicionalmente, a pergunta seria "qual é o papel da escola na sociedade atual?"

Na verdade, já não há sociedade e muito menos uma 'sociedade portuguesa' ou até uma 'sociedade europeia'. O que há são corredores que uns tantos percorrem, alheios ao interesse comum, e que, no final, se revelam portas de entrada para a riqueza e para a fama, independentemente dos meios para as atingir...

O sucesso na vida não obedece a qualquer critério ético, apesar de uns tantos continuarem a defender valores verdadeiramente anacrónicos, pois os media e as redes, ditas, sociais veiculam, ao segundo, atitudes e saberes despojados de qualquer criticismo.

A escola mais não é hoje do que um cais para onde são atirados os filhos daqueles que procuram o sucesso na vida a todo o custo nos corredores da desumanização e da alienação...
Nestas condições, para que serve a escola? Para que serve a escolaridade obrigatória de 12 anos?

Do ponto de vista relacional, qualquer observação revela que os laços desenvolvidos são fúteis e, por vezes, antissociais. Do ponto de vista da aprendizagem, não é difícil concluir que a matriz conteudística é desfasada da realidade e, como tal, desinteressante e aborrecida...

 

31.3.16

A Senhora da Furgoneta

The Lady in the Van. Filme, 2015.

Só hoje vi este filme sobre as relações humanas num bairro londrino no período thatcheriano. Relações postiças que, apesar de tudo, se vão tornando corteses. 

Miss Shepherd sabe como ninguém explorar a má consciência da rua em que instala a sua "furgoneta", obrigando os vizinhos a tolerar-lhe o lixo, a sujidade, a pestilência e uma certa sobranceria. Sobretudo, o "vizinho" Alan Bennet acaba por, ao usá-la como tema de escrita, dar-lhe uma assistência inesperada até porque a recusava à própria mãe...

Por outro lado, este filme revela uma crítica explícita, embora pontual, ao catolicismo, porque fora, afinal, um sacerdote católico que censurara o amor da jovem Margareth (Miss Shepherd) pela música, levando-a entrar num convento... Critica, também, a assistência social inglesa que só muito tarde se ocupou da velha Miss Shepherd.

Esta obra mostra que uma personagem excêntrica e foragida esconde muitas vezes uma vida frustrada, porque os padrões de cultura assim o determinam. E Miss Shepherd nunca aceitou por inteiro esse destino...  

Finalmente, embora o tema possa parecer 'negro', há momentos que são hilariantes, e a interpretação dos atores Maggie Smith e Alex Jennings é excelente.

(Na sessão das 15:20, no Cinema City Alvalade, estiveram apenas 7 (sete) espectadores...)

 

Nem os lesados do BES /GES!

Ontem, foi celebrado um acordo entre os do costume para que hoje o Novo Banco possa ser posto novamente à venda sem assustar os potenciais compradores.

A leitura do ato é fácil, mas parece que ninguém deu conta disso. Nem os lesados do BES /GES!

 

30.3.16

Perda de tempo...

Do que ouvi até agora na comissão de inquérito ao Banif, Administração, Banco de Portugal e Governo, colocados sob a pressão de Frankfurt, mais não fizeram do que perder tempo... O mesmo tem vindo a acontecer com o Novo Banco... E provavelmente o mesmo estará a acontecer com o BPI...

Todos dão mostra de grande azáfama na procura de soluções, mas o resultado é a rendição a Frankfurt. Pelo meio, engordam uns tantos à custa do empobrecimento dos restantes.

A perda de tempo deveria ser tratada como 'caso de polícia' e não numa comissão de inquérito, pois esta é, também, uma perda de tempo...

 

29.3.16

Só porque existo...

«Isto é que fim, que princípio, que fim de que viagem, que crónica?» Mário Cláudio, A Memória do Rito.

Só porque existo
há princípio e fim
a dor da viagem acentua-se com a impressão de que o cais irá ficar deserto de mim
o cais existe sem pensar que possa haver princípio e fim
nem a ilha que o acolhe lhe desperta atenção
as flores são de pedra
azuis, as águas e as aves

Só porque existo
o cais as flores as águas as aves ganham cor, e parece que têm princípio e fim.

 

28.3.16

Revolta e Revolução - longe vai o tempo...

«Globalmente, o tribunal deu como provado que os acusados formaram uma associação de malfeitores, pelas reuniões que realizaram em Luanda entre Maio e Junho de 2015 (quando foram detidos). Num "plano" desenvolvido em coautoria, pretendiam - concluiu o tribunal - destituir os órgãos de soberania legitimamente eleitos, através de ações de "Raiva, Revolta e Revolução", colocando no poder elementos da sua "conveniência" e que integravam a lista para um "governo de salvação nacional".» Lusa

Longe vai o tempo em que o MPLA apelava à Revolta e à Revolução! Longe vai o tempo em que os escritores escreviam poesia e narrativa a apelar e a legitimar a Revolta e a Revolução. Longe vai o tempo em que Agostinho Neto (NOITE ESCURA) acreditava na liberdade: 

(...)

Um dia começou uma noite sem estrelas.

Mas na noite escura

os corações se erguem

Ah! é tão alegre a madrugada!

  

Vivemos num tempo em que os tribunais angolanos utilizam o mesmo léxico e decidem do mesmo modo que as autoridades coloniais. 

Ah! é tão triste o despotismo!
Ah! é tão mesquinha a indiferença!

 

27.3.16

No domingo de Páscoa

Deste lado, um pontão e uma ponte. Curiosamente o sufixo /ão/ nada acrescenta, pois a ponte, quase invisível, leva muito mais longe...

Em 'ressurreição', o sufixo /ão/ deveria acrescentar ou, pelo menos, trazer o perdão à iniquidade humana, mas não. Tudo continua como dantes... até os flamingos voltaram, às centenas, ao leito do Tejo... Longe da objetiva, mergulham os longos pescoços sem qualquer preocupação com a redenção.

Alimentam-se sofregamente, porque a viagem pode ser a derradeira. Ninguém os irá acusar de gula, nem ouvi-los em confissão...

Eu é que já não tenho perdão!   

 

26.3.16

Uma ideia oblíqua

Sábado de chuva! Ninguém refere se as barragens estão cheias, nem se o preço da eletricidade deveria baixar...

Só as cerimónias da Semana Santa surgem misturadas com os falhanços do Cristiano Ronaldo e com a celebração do Dia Mundial do Chocolate. Lá por fora, ecos prolongados dos atentados em Bruxelas e do acidente que vitimou doze portugueses, numa furgoneta de sete lugares conduzida por um jovem de 19 anos... 

Entretanto, eu termino a leitura de "Resgatados", de David Dinis e Hugo Filipe Coelho. E concluo com uma ideia oblíqua: quando à nossa frente se levanta uma parede é muito difícil derrubá-la. A teimosia de uns acaba por ser a desgraça de outros...

«Para ele (José Almeida Ribeiro), Sócrates era um líder político nato, com os inconvenientes que os grandes líderes sempre tiveram: quando acertam os resultados são magníficos; quando erram os seus erros são históricos.» op. cit, pág 233. 

 

O que é curioso no meio de tudo isto é que também eu vivo cercado de paredes, e não sei como escapar-lhes... Creio, todavia, que pouco falta para que a chuva de hoje se transforme no fogo de amanhã...

 

25.3.16

Resgatados ou por resgatar?

Resgatados / Os Bastidores da Ajuda Financeira a Portugal, de David Dinis e Hugo Filipe Coelho...

Enquanto leio "Resgatados...", vou pensando no calculismo que medra atualmente nos bastidores da vida política nacional e europeia. 

Este livro é, para mim, surpreendente pela metodologia utilizada pois, ao evitar a verdade das câmaras, acaba por revelar a voragem sequencial dos acontecimentos de ângulos opostos, mas esclarecedores... 

Lá no fundo, os governos portugueses, desde a entrada na união europeia, dançaram todos ao som da orquestra franco-alemã. E quando foi necessário dizer não, já era tarde: a atividade produtiva fora desmantelada e a aposta no investimento público (2008) esbarrou na nova era da austeridade (2010), sempre sob a batuta alemã... Os empréstimos tinham de ser pagos!

Os credores aproveitaram e lançaram-nos o garrote. 

José Sócrates bem se esforçou, mas, infelizmente para nós, parece que o amigo Santos Silva ainda não dispunha de meios para nos salvar. E por outro lado, a oposição, além de viver na ignorância, só sonhava com a manutenção (Cavaco Silva) ou o retorno ao poder (PSD)... 

Espero que o António Costa tenha este livro na mesa de cabeceira e o vá relendo para não cair nas ilusões de Sócrates...

 

24.3.16

Radovan Karadzic...não compreendo!

Radovan Karadzic condenado a 40 anos de prisão por genocídio.

40 anos? E porque não 30, 20, 50?

Este tipo de criminosos não deveria poder ter qualquer expectativa. Já que não é defensável a condenação à morte, esperar-se-ia que a sentença fosse taxativa: preso até ao último dia de vida! 

Há atos terroristas que não merecem qualquer clemência, pois os seus autores foram impiedosos com as suas vítimas e, na maioria dos casos, não manifestam qualquer tipo de arrependimento.

 «O ato terrorista é uma negação da individualidade, é uma negação do ser humano, naquilo que ele tem de único, em nome de uma causa geral.» Aloysio Nunes Ferreira, deputado brasileiro.

 

23.3.16

Ajo em função de um Dever antigo...

Hoje é um daqueles dias em que me vi obrigado a trocar o calor pelo frio, embora o sol se esforçasse por atenuar a friagem da brisa inconsistente. 

Eu estou um pouco como o sol, esforço-me, mas já não sei para quê. Faço-o há tanto tempo que já lhe perdi a origem.

Creio que ajo em função de um Dever antigo cuja consistência se esboroa a cada minuto que passa. 

O problema é que o minuto não passa, simplesmente dura, tornando mais pesados os dias, e escaqueirando o coração. E este apenas acelera, indiferente ao calor e ao frio.

 

Apesar da flor... esmorece...

Nem a chegada da Primavera suspende a chuva. E com ela, a flor esmorece...

Por este andar, os frutos irão faltar... e tudo iremos importar.

No entanto, há flores que resistem anunciando colheitas escassas, mas de qualidade.

Se procurarmos bem, também há homens que não esmorecem, porém esses são mais difíceis de encontrar...

O esmorecimento é uma tentação que, por vezes, seduz pela possibilidade de desistir. 

Se o que vai acontecendo ocorresse no Outono, então...

 

22.3.16

O ato terrorista

«O ato terrorista é uma negação da individualidade, é uma negação do ser humano, naquilo que ele tem de único, em nome de uma causa geral.» Aloysio Nunes Ferreira, deputado brasileiro.

Independentemente das causas, o autor do ato terrorista é um ser formatado que age quase sempre em nome de uma causa geral.

Em termos de combate há que identificar e conhecer plenamente as causas gerais e, principalmente, desmantelar todos os modelos de formação que contribuem para a alienação (formatação) de jovens que, em muitos casos, crescem em espaços multiculturais fechados sobre si próprios.

A prevenção do ato terrorista depende assim da definição de modelos de sociedade e de educação que impeçam a catequização de indivíduos desintegrados e marginalizados em territórios com autonomia própria...

 

21.03.2016

Como se o orçamento os pudesse alimentar a todos

A reivindicação é notícia. Dos empresários aos trabalhadores, todos reivindicam como se o orçamento os pudesse alimentar a todos... O Governo, por seu lado, desdobra-se em compromissos com cedências ao acaso, pois sabe que o seu tempo é curto. Em vez de informar devidamente o país da verdadeira situação financeira, prefere fingir que pode satisfazer todos os interesses, sem perceber que há muitos sectores que procuram derrubá-lo, tanto à direita como à esquerda...

(...)

Infelizmente, os governantes portugueses não têm espinha dorsal, até porque ignoram a História do séc. XX. Bastava-lhes ter estudado as crises com que os países ocidentais se debateram entre as duas guerras mundiais, para compreender que a solução para os problemas da economia dos povos vai muito para além da simples alternância entre governos de direita e de esquerda...

Nem a austeridade nem a distribuição de recursos voláteis resolve os problemas colocados pela progressiva e inevitável eliminação de postos de trabalho e pelo envelhecimento das populações.

Há que desenhar uma estratégia e aplicá-la sem calculismos eleitoralistas.

 

 20.03.2016

A corrupção é inevitável...

A riqueza dos Estados Unidos depende fortemente da desestabilização global e regional. Há 100 anos que é assim!

O que se passa no Brasil é a expressão de que a distribuição da riqueza por muitos ofende claramente os interesses dos conservadores locais e, sobretudo, dos vizinhos do Norte.

A divulgação das conversas entre os dirigentes políticos é feita de forma seletiva para criar o caos. Há muito que os Estados Unidos controlam toda a informação, utilizando-a cirurgicamente. Acontece agora, mas já está em curso há vários anos...

E a corrupção? Esta é inevitável nos políticos filhos da pobreza. Rapidamente, percebem que no aproveitar é que está o ganho e, sobretudo, que, se se mantiverem pobres, não têm qualquer hipótese de ombrear com todos aqueles que controlam o mundo da finança. 

Se não podes com eles, junta-te a eles!

Também, em Portugal, nas últimas décadas, foi esse o caminho. Num país pobre, a gente pobre, quando chega ao poder, acaba por se juntar a eles. E o caminho é a corrupção... 

Quanto aos ricos corruptos, a ambição não tem limites.

 

18.3.16

Com sabor a baunilha

Conheci uma criança que poupava durante três meses para poder comprar um pacote de bolacha baunilha. E quando, finalmente, saboreava a primeira bolacha, sentia a consciência pesada. 

Aquela extravagância perseguia-o para onde quer que fosse, porque, lá no íntimo, percebia que quebrara o princípio de que não se deve desperdiçar dinheiro com coisas inúteis, nomeadamente, que não deveria ter cedido ao pecado da gula...

De facto, aquele pecado não resultava de um impulso momentâneo: a todos os três meses, lá comprava um pacote de baunilha, com uma única exceção anual - em abril, substituía a bolacha por um gelado, de preferência, de baunilha.

Agora avançado na idade, só raramente compra um pacote de bolacha baunilha, e não porque lhe pese na consciência, mas porque quem o poderia censurar partiu para um lugar onde não é preciso poupar durante três meses para poder comprar um pacote de bolacha baunilha ou trocá-lo por um gelado de baunilha...

Descobri, agora, que aquela criança tinha um único sonho. Que, quando os seus amigos se forem despedir dele, alguém tenha comprado alguns pacotes de bolacha baunilha, e que todos possam saborear uma bolachinha... com sabor a baunilha. Ou, se for abril, que a possam trocar por um gelado... de baunilha.

 

17.3.16

Parecia que o sol brilhava

Avolumam-se as nuvens - parecia que o sol brilhava. Mas é uva por amadurecer.

De forma sibilina, Freud separou as pulsões da vida das da morte. Há, contudo, quem procure a vida através da morte.

O caminho é sedutor. Porém, no canavial sopra uma friagem que se desfaz em pranto...

Em tudo, há uma oposição irritante. Chamam-lhe coordenada adversativa; melhor seria chamar-lhe bifurcação. E, em vez de um caminho, são agora dois sem regresso.

 

 

 

 

16.3.16

Avolumam-se as pausas

Avolumam-se as pausas - discutem-se os últimos escândalos, a bola, a família, a falta de educação, os excessos... dos outros, as insuficiências dos outros, os erros dos outros...

Por vezes, as pausas são interrompidas para regressar ao trabalho de mostrar ao chefe que o posto de trabalho não foi desertado...

De qualquer modo o esforço é inglório, porque o chefe não descola do lugar que ele próprio determinou ser o seu. 

Hoje a pausa é em frente de um televisor, de onde é possível avistar um funeral de alguém que por aqui passou, sem que, aparentemente, tenha deixado qualquer indício... 

(Começo a pensar que sou invisível! Eu que não sou chefe, observo e registo sem que isso desperte a mínima atenção. Do outro lado, o televisor vai mostrando imagens que não descortino; a própria voz da repórter é abafada por um discurso múltiplo sobre as insuficiências e os erros dos outros, no caso, das outras, por ora, ausentes...)

 

15.3.16

"Eu fui teu amigo"

Embora sempre ocupado, em algum momento deves ter pensado naqueles amigos que te ignoravam, mas que na tua morte não iriam desperdiçar a oportunidade de saudar a tua jovialidade, a tua fraternidade, o teu talento.

Nesse momento, o teu sorriso seria amargo, mas por pouco tempo, pois faltava-te o tempo para suportar a mediocridade, embora soubesses que a melhor forma de te desforrares seria representar essas vidinhas postiças.

Desta vez partiste, sem qualquer encenação, sem qualquer sorriso, mas nem por isso a mediocridade irá desaproveitar o momento de dizer "eu fui teu amigo"...

No que me diz respeito, a tua morte trouxe-me à memória que falta algures o teu testemunho, e não sei se foi porque, à data, estivesses ocupado ou, simplesmente, porque as tuas palavras poderiam destoar...

(Na morte de Nicolau Breyner.)

 

14.3.16

Sou eu que gosto e mais ninguém!

O gosto será determinado pela vontade? Do tipo 'eu não quero gostar de sopa e portanto não gosto de sopa'. A decisão parece resultar de embirração!
Se os adultos não comem sopa, por que motivo dão sopa à criança... E mesmo que os adultos comam sopa, a vontade de afirmar a diferença, não vá o exemplo coartar-lhe a liberdade, obriga à rejeição sob a forma de choro, grito ou simplesmente de boca cerrada...

Os dias passam e o gosto vai ficando cada vez mais apurado: eu quero, eu não quero; quero, não quero; não... já disse que não! Por outro lado, o gosto não exige aprendizagem, não requer conhecimento do outro, nem do contexto em que ele nasceu, cresceu e morreu...

Sou eu que gosto e mais ninguém!  O gosto foge de qualquer forma de desgosto... e se não for suficientemente convincente, parte para a demolição de todo e qualquer património, porque nada pior para o gosto do que admitir que outro possa ter realizado qualquer coisa digna de admiração... Sou que gosto e mais ninguém!

 

13.3.16

Da paixão, da morte, da vida

Nos anos 70, durante três anos e meio, desci e subi diariamente a Calçada do Combro (Lisboa). À época, as igrejas viviam envergonhadas...

Na sala de aula, por mais de uma vez, procurei explicar o que era a arte do Barroco, dando exemplos livrescos, quando poucos números acima se situava um dos expoentes do Barroco e do Rococó do séc. XVII - a Igreja de Santa Catarina ou a Igreja dos Paulistas. À época, a sede do MRRP tinha mais influência na juventude que frequentava o Passos Manuel ou a Escola D. Maria I.

Hoje, regressei à Igreja de Santa Catarina para ouvir o CRAMOL (Grupo de Canto de Mulheres) interpretar um conjunto de polifonias e melodias tradicionais de mulheres, evocativo do tempo religioso dos mistérios da vida e da morte.

A execução foi primorosa e por isso merecedora de aplauso, até porque nos restitui cânticos do tempo rural, evitando a mistura tão do agrado das gerações urbanas.

A Igreja encheu, sobretudo, de mulheres, mas isso já são contas de outro rosário... e o prior não ficou a perder...


«A Senhora da Saúde
Tem uma rosa no rosto
Que lhe deram os romeiros
No dia 15 de Agosto»

Manhouce /Beira Alta

Pessoalmente, prefiro o título: Da vida, da paixão, da morte. No entanto, aceito que o lugar possa explicar a inversão... O que não quer dizer que compreenda.

 

 

 

 

12.3.16

Dois em um, na Ulmeiro

Passei pela Ulmeiro, no nº 13 da Avenida do Uruguai. Mais do que os livros, quem ali mais desperta a atenção é o gato, de que desconheço o nome, mas lembrou-me o velho Bonifácio d'Os Maias. Deitado ao sol na montra da livraria, parecia desprezar quem por ali se comprazia em apreciar o seu porte soalheiro em vez de se fixar na livralhada mais ou menos de teor religioso que ali dormitava...

Entrei, uma simpática senhora, um pouco mais velha do que eu próprio, prontificou-se a esclarecer alguma questão, embora de imediato remetesse para os identificadores afixados nas estantes...

(Sobre a guerra do Rift nunca ouvira falar e o proprietário (?) que se encontrava na penumbra nada disse, o que me levou a pensar que há certos acontecimentos, sobretudo os trágicos, que não interessam a ninguém - milhares de espanhóis, e não só, foram massacrados e, provavelmente, ficaram para sempre nas areias do deserto. Talvez, no entanto, não seja esta a única versão... se eu viajasse até Marrocos, e investigasse as relações do Magreb com as potências colonizadoras - Espanha e França - talvez encontrasse um outro livreiro capaz de me elucidar sobre o primeiro quartel do século XX...)

Como não gosto de entrar numa livraria e sair de mãos a abanar, virei a minha atenção para a estante que indicava Literaturas Africanas. Apenas 5 livros, e eu já os tinha todos... O mesmo sucedeu na estante Literatura Brasileira!

Acabei por encontrar um livrinho em bom estado do Mário Cláudio, que afinal, é dois em um, porque, de um lado, oferece prosa e do outro, poesia... O resto da livraria, não tive coragem de o percorrer...

Preferi visitar o cemitério do Lumiar, onde os ciprestes continuam perfilados e, hoje, visitados por aves que não consigo identificar - não eram corvos nem gaivotas! Talvez estivessem de passagem, como eu, e me seguissem até à Quinta das Conchas...

Ainda observei os eucaliptos, mas neles só poisavam os pombos e um ou outro melro.

 

11.3.16

Com a idade...

«O movimento não se confunde com o espaço percorrido. O espaço percorrido é passado, o movimento é presente, é o ato de percorrer.» Tese de Bergson

Com a idade, o espaço percorrido cresce, e na cabeça de certas pessoas incha de tal modo que pouco sobra para que o resto do corpo consiga mover-se...

Essas pessoas vivem num espelho que lhes reflete as frustrações e os delírios. Reclamam direitos por serviços prestados e detestam ser contrariadas.

O outro perde em autonomia e ganha em servidão... e à medida que serve vai pensando se não se enganou no caminho.

Desmeditando, está na hora de voltar a servir, que os deuses já se inclinam sobre a nossa insubordinação.

 

10.3.16

Marcelo, oficialmente, esqueceu Fernando Pessoa

Ontem, Marcelo Rebelo de Sousa prestou homenagem a Vasco da Gama e a Luís Vaz de Camões. E, oficialmente, esqueceu Fernando Pessoa.

Esperemos que o "espírito" do Estado Novo não esteja de regresso. Há, no entanto, indicadores que perturbam: "venham a mim os pobres de espírito!"

Como diria José Rodrigues Miguéis, "o pão não cai do céu"... 

 

9.3.16

Sinto-me vilipendiado...

A cortesia impôs que o presidente Cavaco fosse condecorado com o Grande Colar da Ordem da Liberdade. 900 convidados deslocaram-se ao Palácio da Ajuda para assistir ao ato e cumprimentar o homenageado. Na espera, foram petiscando e cavaqueando.

Em rodapé:

Numa só empresa, 500 trabalhadores estão a caminho do desemprego. O Governo está obrigado a reduzir a despesa em 700 milhões ou a cobrar mais 700 milhões em impostos.

Nós pagamos a insígnia, os acepipes, o cavaco, o subsídio de desemprego, os palácios, os veículos de alta cilindrada, os cortes nos vencimentos e nas reformas, na saúde e na educação; nós pagamos as taxas... e 5 presidentes.

Começo a pensar que não foi para isto que há mais de 100 anos a monarquia foi derrubada. A verdade é que me sinto vilipendiado, não com a cortesia de condecorar o Presidente Cavaco, mas com a atribuição do Grande Colar da Ordem da Liberdade. 

 

8.3.16

A desgraça dá lucro

« La guerre a enrichi les États-Unis. » in Le Monde Contemporain, page 120, Bouillon, Sorlin, Rudel, Bordas

Esta é a frase que não me sai da cabeça. A Grande Guerra (1914-1918) enriqueceu os Estados Unidos. A Guerra da Síria está a enriquecer a Turquia e, absurdamente, a Grécia não está a saber rendibilizar os milhares de refugiados que lhe entram portas dentro. A afirmação pode parecer cruel, mas a desgraça alheia acaba por ser sempre lucrativa para alguém.

Maria Luís, ex-ministra das Finanças, sabe bem do que os credores são capazes, e como tal, a necessitar de pagar a mansão hipotecada, não perde tempo a colocar-se ao serviço de quem enriquece à nossa custa. Afinal, o Gaspar tinha seguido o mesmo caminho, e o ruído foi menor...

Aníbal Cavaco Silva deixa-nos amanhã, depois de condecorado pelos serviços prestados ao grande capital, e parte muito mais rico do que chegou. Como? Não sabemos. Arauto da austeridade, soube escolher o lado menos doloroso, ao contrário de muitos portugueses a quem essa opção foi sonegada.. 

A experiência ensina que a desgraça de muitos é a riqueza de poucos. Fundamental é não ter escrúpulos.

 

7.3.16

Todos temos opinião...

Todos temos opinião, embora desconheçamos a história do conceito, embora ignoremos o nome daqueles que lutaram até à morte pelo direito de deixar de ser escravo, de deixar de ser vassalo... O tempo era outro, aquele em que a única voz que se fazia ouvir era a do soberano, ou em nome do soberano...

Hoje, melhor seria que a voz de cada um fosse a expressão de um ponto de vista devidamente ancorado na realidade. Falta-nos a humildade de confessar a nossa miopia, ainda que transitória.

Ao ´ponto de vista´ preferimos a 'opinião', que dizemos ser nossa, como se esta não fosse de um grupo, de uma classe, de um rebanho. Preferimos escondermo-nos no relativismo gratuito...

Infelizmente, as convicções são como as crenças, só com fé e muita liturgia é que as toleramos.... E uma pitada de ironia. 

 

6.3.16

Eu, terrorista, confesso que nunca entrei na Laurentina...

Não tenho tempo para o ler, mas hoje comprei o Diário de Noticias.

Por entre afazeres vários, como classificar e corrigir testes e elaborar um novo teste para os alunos absentistas - cada um com o seu motivo, em que nunca pesa o 'castigo' imposto ao professor, dou uma olhadela ao periódico.

Descubro que o DN oferece toda a última página a um cronista chamado João Taborda Gama, embora desconfie que a oferenda seja da Laurentina Restaurante, o Rei do Bacalhau...

Por associação com o teor dos testes que vou saboreando, ainda cheguei a pensar que se trataria de um velho descendente do Gama de 1498, mas logo relembrei outro ascendente mais recente de águas profundas...

Este Gama, tal como os Gamas retratados n'Os Lusíadas, embora vá escrevinhando, não revela grande educação literária. Parece, no entanto, ter uma conceção muito própria do poder local.

Ao lê-lo, percebi que eu devo ser um daqueles "terroristas" que insiste que Portugal está reduzido à pequenez anterior a 1415 - à exceção das paternas ilhas atlânticas - que Portugal perdeu o Império e está a perder a língua...

Diz o Taborda da Gama:

«A existência de prosperidade (...) só será possível com a criação de regiões administrativas (...), sem o terrorismo do somos um país demasiado pequeno para isso. (...) Mais autonomia significa, por exemplo, cada município poder decidir se quer ou não ter IMT, e até se quer ou não ter imposto que tribute as sucessões e as doações.» (sic)

Eu por mim contentava-me com a eliminação do IMI! Será que o Bernardino Soares também acompanha o Taborda da Gama?

 

5.3.16

De nós, nada acusa

«Inutilmente parecemos grandes.» FP /Ricardo Reis

Ser grande é uma aspiração humana. Ambição, de seu nome. A dado momento, nada parece tolher esse impulso. Pulsão milenar, o ser humano não hesita em dar-lhe expressão, pouco importando as vítimas que vão tombando a seus pés...O discurso contra os excessos da ambição de ser grande já não faz qualquer sentido.

Motivo? Porque este tipo de discurso é sempre contra a ambição do outro. De nós, nada acusa.

4.3.16

A lição de Fernando Rosas 'O Estado Novo e os Fascismos'

Na Escola ( Liceu Camões) que testemunhou a ascensão e a queda do fascismo, e que foi durante muito tempo um dos pilares do Estado Novo, mesmo que no seu seio despontasse e crescesse a oposição ao regime ou que das suas janelas Humberto Delgado tenha ousado desafiar Oliveira Salazar, Fernando Rosas proferiu, esta manhã, uma lição soberba, em termos de explicação dos fatores que, após a primeira Grande Guerra, levaram ao poder, na periferia da Europa, sem esquecer a humilhada Alemanha, o fascismo (e o nazismo) que, em nome da Nação, tudo fez para destruir definitivamente os avanços civilizacionais resultantes da Revolução Francesa...

Fernando Rosas mostrou que o fascismo conseguiu atrair simultaneamente as elites conservadoras e empresariais, e todos aqueles que se viram reduzidos a uma vida precária e sem horizontes pela guerra, pela incompetência dos partidos de inspiração liberal e pelo crash da Bolsa de Nova Iorque, em 24 de outubro de 1929. 

A síntese que Fernando Rosas fez em 90 minutos foi certamente estimulante para quem gosta de conhecer o passado; no entanto, o mais importante da lição residiu no tom pedagógico com que procurou que o auditório entendesse que hoje, na Europa, sobretudo nas suas periferias, estamos a ressuscitar os fanatismos, os extremismos e as soluções do passado...

Uma das razões que justificam a reabilitação do Liceu Camões é precisamente porque, para o bem e para o mal, ele é uma testemunha fundamental de mais de 100 anos, cujo memorial não deverá esquecer os diversos contributos que Fernando Rosas lhe tem dado. 

 

3.3.16

Nos ramos dos plátanos...

Como se não tivesse nada para fazer, pus-me a contar os plátanos. Dez, em cada pátio. Dez troncos, eretos sobre raízes invisíveis, alimentadas por arroios secretos. De cada tronco jorram quatro bifurcações, sobre as quais jazem os ramos, por ora, nus de folhas e de pássaros...

O arquiteto deve ter amado o compasso e a simetria e talvez, um dia, tivesse lido 'Os Lusíadas'. Para cada Canto, um plátano, e como o lugar era escolástico, em vez de um pátio, imaginou dois, sem que saibamos qual deles é a réplica e qual o original.

Por capricho do legislador, o lugar passou a ser de Camões, em vez de ter sido apadrinhado por Herculano, o romântico.

E, por uma vez, o legislador acertou, já que Herculano preferia o azeite às alergias de cada primavera...

Como se não tivesse nada para fazer, pus-me a pensar na esterilidade da simetria, na clausura da harmonia, na fatuidade das luzes... e fico-me por aqui, antes que algum varandim venha abaixo... Entretanto, vou colocar o avental e convocar os espíritos do lugar, na expectativa que saiam das Caves e, por um momento, poisem nos ramos dos plátanos... 

 

2.3.16

Não!

Talvez fechar os olhos
Talvez cerrar os ouvidos
Talvez ser cometa...

Esperar talvez
Olhar mais uma vez
Ser cúmplice
Ou ser cometa...

Não!
Tenho horror à podridão.

(No fundo da sala, os pequenos e as pequenas abrilhantam o cavaco, estrelejam no reino da vulgaridade. Ainda sobram, no entanto, uns tantos rostos ávidos de saber, e avessos à batota...

O palácio de Antero de Quental

O palácio da Quinta do Relógio, em Sintra, está à venda por 7, 5 milhões de euros! (notícia)

Sintra, palácio, quinta, relógio - palavras distantes. Talvez voltar a vivê-las se... Lembro-me, agora, que, à falta do vil metal, bem posso sonhar, ou, então, visitar o Festival Periferias, organizado, por estes dias de março, pelo João de Mello Alvim.

Sonho que sou um cavaleiro andante,

Por desertos, por sóis, por noite escura,

Paladino do amor, busco anelante

O palácio encantado da Ventura!

No entanto, o sonho não é de alegria, quando as portas de ouro se abrem:

Mas dentro encontro só, cheio de dor,

Silêncio e escuridão - e nada mais.

 

1.3.16

A precisar de esclarecimento...

A dívida pública aumentou 3.344 milhões de euros em Janeiro face a Dezembro para 234,4 mil milhões de euros, divulgou hoje o Banco de Portugal.

Estou a precisar de esclarecimento. A dívida pública continua a agravar-se!

Espero que o atual Governo já esteja em condições de dizer qual é o seu papel neste agravamento. E de pouco me serve que queira imputar as culpas ao anterior Governo ou às forças de esquerda que o suportam ou o armadilham a cada passo...

Em nome da verdade, António Costa precisa urgentemente de prestar contas. E esclarecer se a situação é reversível. E como! Se não sabe, o melhor é começar a arrumar as botas.

Nesta matéria, de pouco serve tapar o sol com uma ou várias peneiras...
Entretanto, o António Costa deve lembrar a João Soares que não precisamos de um ministro da cultura trauliteiro.

 

 

 

29.2.16

A Linha do Norte

«Porque todas as recordações são a mesma recordação.» Álvaro de Campos, Acaso.

Uma avó quase cega que vê cada vez melhor. Um avó sorumbático que recorda os guardas alinhados à espera de que o presidente do Conselho chegue ao destino. Um pai que se imagina maquinista da automotora que devora a Linha do Norte. Uma mãe que acredita que aquele filho a pode libertar da Cruz que carrega.

Detalhes! A recordação atravessa-se em mim com ou sem comboio... Querer ser outro conforta! Tristes, os que vivemos sem Norte...

 

28.2.16

Em roda livre...

Preocupa-me que haja cada vez mais indivíduos em roda livre!

Aprendi com Freud e com os Surrealistas que a eliminação da 'censura' era um movimento libertador, capaz de combater o determinismo social e cultural, desmontar os recalcamentos e, sobretudo, gerar novas formas de vida, de arte...

Só que a ausência de 'travões' está a tornar-se praga. Cada um diz, em qualquer circunstância, o que lhe apetece, sem pesar a força ilocutória do que diz e apregoa, sem fundamentar o gracejo ou a convicção.

Não sei se é a este comportamento que outrora se chamava loucura, mas parece que anda tudo louco.

E aos loucos não se pode responder! Só ouvir, respirar fundo e procurar compreender.

 

27.2.16

Mosquitos por cordas...

O governador do BP não se demite "por um pequeno incidente"...

João Soares, ministro da cultura, avisa que vai demitir o presidente do CCB na próxima 2ª feira...

O PCP vai aos ministérios discutir o orçamento...

A CGTP já aprovou a subida do ordenado mínimo para 600 € em 2017...

António Costa discute Novo Banco com UGT...

A Maçonaria quer escolher o secretário-geral do SIRP (Serviços de Informação da República Portuguesa) ...

O BE prefere Jesus a Maomé...

Uma juíza trata a ré por "querida"...

Um ex-procurador despachou um inquérito-crime (2011) em quatro meses, deixando os restantes visados em água de rosas. Leia-se arquivou a queixa contra o angolano Manuel Vicente. Só, agora, Orlando Figueira foi detido!

A DGS garante que o mosquito zika não quer nada connosco até ao fim do verão...

O Novo Banco foi oferecido ao Santander e ao La Caixa...

(Isto ainda acaba mal!)

 

26.2.16

São encantadores, quando nos desafiam!

De nós, pouco querem, embora procurem afirmar-se como chefes de horda.

Há muito que o professor perdeu o estatuto de mestre; mais não é do que o inimigo de ocasião que lhes permite mostrarem-se superiores, pois pressentem que a abelha-mestra foi expulsa da colmeia ou, então, vai definhando na sala de aula até que o coração ou o cérebro estoirem de vez...

E o professor nem é o verdadeiro inimigo, é apenas um ersatz da família em desagregação - aquela em que o desafio seria natural e construtivo.

Destruído o porto de abrigo, as palavras e os gestos tornam-se soezes, a simulação questão de honra, até que, aos poucos, tudo degenera em violência verbal, depois gestual, e, finalmente, física...

 

25.2.16

A brincar, sem imaginação

Já não sei se aprendemos, se passamos o tempo a brincar, sem imaginação.

Se aprendêssemos, se experimentássemos, não nos faltaria a memória essencial à imaginação.

A memória facultar-nos-ia as imagens, as impressões dinâmicas, que poderíamos combinar até que fossemos mais do que réplicas do Ser inicial...

Migalhas de conversas transviadas mais não são do que verbetes de um estéril dicionário - nelas, mora um código cuja chave alguém perdeu num dia aziago: o dia em que passámos a brincar, sem imaginação.

 

 

 

 

24.2.16

Uma narrativa estática ou será pantanosa?

Estou aqui às voltas com um suposto conto, escrito por Fernando Pessoa, A Estrada do Esquecimento ou, para alguns, A Estrada da Escuridão.

Tomando como válida a hipótese de que no conto tem de ocorrer um acontecimento que transforme a ordem em desordem para gerar uma nova ordem, parece pouco provável que, mergulhados na escuridão ou afundados no esquecimento, possamos testemunhar individual ou multiplamente qualquer ocorrência. 

No primeiro caso, desapossados da visão, no segundo desapossados da memória, deixamos de saber como recuar ou avançar e, portanto, espectros, pairamos como os pingos da chuva. 

Estáticos, talvez, ainda possamos percorrer os atalhos da audição ou do tato, mas por pouco tempo. Recobrando, por instantes, a memória, vislumbro centenas de milhares de soldados nas trincheiras da Flandres que esperam que a morte os liberte da escuridão e do gás pimenta...

 

23.2.16

Por um instante

Como aquilo que eu vejo não é o que tu vês, como é que eu te posso ensinar a ver?
Como aquilo que eu oiço não é o que tu ouves, como é que eu te posso ensinar a ouvir?
Como o meu corpo não é o teu corpo, como é que eu te posso prender?

Por um instante, talvez possa ser o teu bordão no caminho que só tu podes percorrer!
O teu poder não está ao alcance do meu ser!

 

22.2.16

O dia está a ficar ilegível

«A noite estava ilegível. (...) Só havia escuridão, sem forma, lugar ou fundo. (...) Apenas por atalhos das sensações podíamos confiar na existência do céu, em cima,  e da terra, em baixo. (...) Como os meus olhos não podiam ver, eu via com os ouvidos.» Fernando Pessoa, in A Estrada do Esquecimento.

Há muito que a noite deixou de ser ilegível nas cidades. 

Só nos campos desertos, a escuridão insiste em persistir, a não ser que a lua se deixe esconder... Eu ainda atravessei essa escuridão que ecoava sob os meus passos apressados e desconcertados... passos que calcavam a terra num desafio ao medo que medrava sob os uivos da canzoada. 

A escuridão que me envolvia tinha um chão, tinha um teto, e eu só ansiava que do fundo eclodisse a luz. 

Nunca fui tão longe na noite, porque ainda assim raiava o dia, mas, hoje, a escuridão começa a adensar-se nos sons noturnos, e o dia está a ficar ilegível. 

 

21.2.16

O Estado não paga...

«Na origem deste último erro detetado pelo Ministério das Finanças esteve o cálculo das contribuições imputadas à Caixa Geral de Aposentações (CGA), sabe o Económico. Os serviços públicos não pagam efetivamente uma contribuição pelos seus trabalhadores à CGA (apenas os funcionários fazem uma contribuição efectiva), mas em contabilidade nacional é-lhes imputado um valor.» 

Pois é, o Estado não paga, no devido tempo, a contribuição devida à CGA. E depois, mais tarde, queixa-se do peso excessivo do valor das aposentações. Ao contrário do patronato, o estado adia a despesa, impedindo que a CGA possa gerir autonomamente as contribuições dos funcionários públicos e do estado.

O que depois se torna ainda mais penoso é perceber que as equipas que preparam o esboço de OGE parecem desconhecer o modo como o estado foge às suas responsabilidades sob o manto da "contabilidade nacional", conceito que, se não está, deveria estar consignado na "arte de furtar"...

 

20.2.16

De Umberto Eco recordo sempre...

De Umberto Eco recordo sempre a fábula do riso que ia envenenando os austeros conservadores da "arte poética" que, na verdade, não tinham qualquer motivo para zelar por uma morte inevitável, sem retorno nem passagem...e também recordo o grande e os pequenos inquisidores que preferiam o dogma à dúvida, atirando à fogueira todos aqueles que não eram suficientemente manhosos para se colocarem sob a proteção do magnífico Tribunal... o que me traz de volta, não os fazedores de teses e nem os devotos da obra aberta, mas, sim, o António José da Silva, o Bernardo Santareno e o José Saramago...

 

19.2.16

Só os abutres vivem da morte do outro

«- Impossível. Você sabe, tanto quanto eu sei, que a morte é sempre nova e sempre pessoal. Se assim não fosse, já a tínhamos tornado científica.

- Aí está, señor. Sempre nova e sempre pessoal, diz bem. Afinal, foi só a mim que eles condenaram a morrer por fuzilamento.

- Por isso mesmo é um ato novo e pessoal. Você vai ter de começar tudo pelo princípio. E, se mais alguém morrer, não terá aprendido nada com o seu exemplo. Eu próprio, como nunca morri, não posso nem sei dizer mais nada.» Excerto de um diálogo entre o filósofo e o condenado, in Sombra de Touro Azul, de João de Melo. 

 

Não aprendemos nada com a morte do outro.

Não aprendemos nada com a notícia da morte do outro.

Não aprendemos nada com a repetição da notícia da morte dos outro.

Não aprendemos nada com o comentário obsceno da morte do outro.

 

Só os abutres vivem da morte do outro. E não se pode dizer deles que sejam hipócritas, pois a morte do outro é o seu próprio sustento.

 

18.2.16

Juíza de Carrilho e Bárbara

Juíza de Carrilho e Bárbara é fascinada pelo nazismo - fonte: CMTV

Ingenuamente, pensava que o juiz deveria ser o fiel da balança.

Parece que não! Esta juíza, de acordo com o CMTV, inclina-se para o lado do carrasco.

A situação noticiada é muito grave: ou o CMTV manipula deliberadamente a informação e deve ser sancionado ou, então, a juíza não deve julgar este ou qualquer outro caso de justiça.

Embora não tenha a certeza, desconfio que o Centro de Estudos Judiciários tem vindo a prestar um mau serviço à causa da justiça. Não basta conhecer a lei, é necessário que o juiz quando a aplica o faça, regido por valores bem definidos, como, por exemplo, o da isenção. 

Espero não estar a incorrer em qualquer juízo de apreciação. Creio, no entanto, que a crise de valores se manifesta cada vez mais na educação e na formação... dos políticos, das polícias, dos magistrados, dos médicos, dos professores, dos bombeiros... E quando tal não acontece não há estado de direito que resista. 

 

17.2.16

Ao contrário das obras de Santa Engrácia

O Liceu Camões vive uma situação sui generis: As obras nunca mais começam! Entretanto, o ME prometeu à comunicação social que os estudos e o projeto vão avançar em 2016, tendo feito saber que o financiamento está assegurado.  Gostava de saber quem financia e qual é a verba disponibilizada.

Nos anos anteriores à chegada da TROIKA, já tinham sido gastos dois milhões de euros no projeto da obra que nunca chegou a arrancar.

Finalmente, custa a acreditar que a informação tenha chegado à comunicação social sem que o Diretor da Escola tenha sido previamente informado.

 

16.2.16

Liceu Camões: Novos estudos? Novo projeto?

«Segundo o ME, a reabilitação da Escola Secundária Camões “foi já identificada como prioritária” pela actual tutela, estando previsto que ainda em 2016 se proceda “à fase de estudos e projectos de arquitetura”. O ministério refere ainda que existe “fonte de financiamento assegurada” para esta fase. Quanto ao início das obras propriamente ditas o ME informa que estará dependente da "tramitação" deste processo e da adjudicação posterior da empreitada.» (sic)

O quê? Mais estudos? Novo projeto? Novo arquiteto? Mais despesa? Quem é que paga todos os «avanços e recuos»? Pensava que o projeto já apresentado publicamente tinha sido suspenso, mas, afinal, parece que no ME reina a ignorância... 
Infelizmente, em matéria de educação, passamos os dias a fazer de conta... E o contribuinte sempre a pagar!

 

15.2.16

Toldado

O Centro Escolar de Lordelo I, no concelho de Paredes, já funciona desde o ano letivo 2013/2014, mas é inaugurada esta segunda-feira, às 18h00. Quem a inaugura? O ex-primeiro-ministro Pedro Passos Coelho. (sic)

Não tenho nenhum dicionário à mão, mas, ao ler a notícia, fiquei confuso, perplexo, toldado. Bem sei que o melhor é deixar de ler, ignorar as estações do ano... deixar que a imaginação me transporte para outro clima, mesmo assim estou convencido que as sinapses dos meus neurónios foram desligadas por falta de irrigação sanguínea.

E a responsabilidade é minha, pois procuro dormir sempre para o mesmo lado para evitar transformar-me no roncador de Vieira.

Não fosse uma jovem aluna ter-me confessado que apreciara «o fio lógico» de uma lição sobre o pessoano Ricardo Reis, eu próprio solicitaria que me internassem na Casa de Saúde Mental da Avenida do Brasil...

Haja decoro!  

 

 

 

14.2.16

Azar!

O meu Anjo não prevê qualquer alinhamento favorável dos astros.
Como tal, não necessitam de me consultar nem de fazer qualquer donativo para as obras piedosas das irmãzinhas do caruncho. (...)Eu já me tinha esquecido que o Céu me atribuíra um Custódio. Por maior respeito que o Céu me inspire, cedo descobri que a minha importância era tão insignificante que o divino Céu nem sequer se lembraria da minha existência...

Por mais tola que esta ideia possa parecer, a minha situação não é muito diferente da de Portugal. Ao ler Le Monde Contemporain, de J. Bouillon, P. Sorlin e J. Rudel, acabo de verificar que, apesar da participação trágica na Primeira Guerra Mundial, só, na página 82, surge a primeira referência a Portugal: 

« Au sortir de la guerre, qui ne lui avait valu que de minces avantages coloniaux, le Portugal traversa une crise agricole et monétaire qui ne purent résoudre les libéraux... », isto no sub capítulo : Les autres régimes autoritaires d'après-guerre,   

 

13.2.16

Falta-nos um ministério da Chuva!

Quando a chuva se prolonga, as notícias de inundações têm, pelo menos, um ponto em comum: a geografia. 

Há anos que por esta época ouvimos as mesmas reclamações das populações e das autoridades locais. Há anos que as autoridades nacionais prometem resolver os problemas decorrentes da acumulação das águas...

Há anos que ouvimos falar de programas de intervenção que ponham termo a esta fatalidade.

No entanto, abre-se o Céu e, afinal, tudo continua na mesma, à exceção do país que fica cada vez mais pobre...

Falta-nos um ministério da Chuva!

 

12.2.16

Não sei se estais tristes...

Eu estou triste. 

Nós estamos tristes.

Não sei se estais tristes...

Os mandarins estão tristes. 

O dia esteve triste.

A noite acabará por ser triste - ganhe o Benfica; ganhe o Porto; se o jogo acabar empatado, o Sporting ficará triste... O Sporting também ficará triste se o Benfica ganhar. Quanto ao jogo em si, pouco importa...

Até o alemão Wolfgang Schäuble confessou que está triste com o destino dos portugueses - os juros da dívida portuguesa estão a aumentar e a responsabilidade é da nova esquerda que ousa questionar a vassalagem a que estaríamos obrigados...

E o mais extraordinário é que o colapso escondido dos bancos alemães é, afinal, culpa dos países periféricos que insistem em defender os direitos mais elementares dos seus cidadãos.

O alemão Wolfgang Schäuble nunca soube o significado da termo 'cidadão'. Para o Senhor Wolfgang Schäuble, os povos periféricos não podem a aspirar a ser mais do que vassalos... 

A ideia é antiga. Já tem bem mais de 100 anos, e, de tempos a tempos, agudiza-se... 

 

11.2.16

O novo real - subjetivo e cruel

Aprender a ver o que nos cerca podia ser um projeto de vida. Podia ser o princípio da revolta e da denúncia. E em tempos assim foi.

Para que a objetividade não nos escape, descrevemos minuciosamente a paisagem, o corpo, o objeto. Insatisfeitos, fotografamos; filmamos não, apenas, o objeto ou o corpo, mas a situação, o curso do acontecimento...

E depois, quando pensávamos na plenitude, na captura da flagrância, retomamos a imagem, a cena, e começamos a montagem, e tudo o que lá estava inicialmente mais não é do que pretexto para a expressão de um novo real - subjetivo e cruel...

Cruel, porque a realidade de pouco serve, pois o nosso anseio está agora nas mãos do programa que tudo permite manipular...

E nós gostamos!

Regressado à plenitude da sala de aula, fiquei neste triste estado - marioneta de um filme por estrear.  

  

10.2.16

Um silogismo manhoso

Não nos é permitido aumentar a despesa pública. Porém, para fomentar a economia, a aposta principal centra-se no aumento do consumo, sem agravar a dívida...

Para atingir o objetivo, o Governo propõe-se reduzir o número de horas de trabalho, sem prejudicar o serviço prestado - em regra, mau. Propõe-se, também, só contratar um funcionário por cada dois que deixem a função pública e, sobretudo, defende que as escolas devem acolher as crianças e os jovens, de manhã e de tarde. E porque não à noite?

Eu, por exemplo, vivi em regime de internato durante cinco anos e meio e quero crer que lá em casa ninguém deu pela minha ausência. Não sei se o Governo da época também apostava na diminuição de funcionários para reduzir a despesa, mas ainda me lembro que havia um número razoável de prefeitos (ou similares) que zelavam pela disciplina. Sim, porque o importante era a disciplina!

Por aquilo que vou ouvindo, a disciplina hoje já não será um problema, desde que a criança e o jovem estejam ocupados a fazer aquilo para que têm natural inclinação que, como se sabe, anda longe da aprendizagem do português, da matemática, das línguas estrangeiras, da filosofia, da programação, da física, da biologia...

Estou, no entanto, sem saber se o Governo pensa reciclar os professores, transformando-os em animadores infantis, culturais, políticos, religiosos... ou se pensa contratar quem se ocupe de vigiar os interiores e as imediações das escolas...

Para contratar sem aumentar a despesa, o melhor é despedir os professores ou aposentá-los com vinte ou 30% do vencimento...

 

9.2.16

Não digo que o Céu esteja zangado

Não digo que o Céu esteja zangado, mas parece. A Igreja Católica inventou o Carnaval de três dias, seguido da Quaresma, para dar cabo das Maias demasiado primaveris e libertinas..., embora atualmente esta não se pronuncie quando os corsos são deslocados para o primeiro domingo da Quaresma.

O Céu nunca gostou que lhe alterassem o projeto genesíaco, mesmo que o tenham feito em seu nome... Já a ideia da existência de quatro estações lhe desagradava - a flores florescem durante todo o ano, cada uma a seu tempo... E nós próprios nascemos e morremos para além das estações.

O Céu apenas reconhece, como princípio estruturante, a semana de trabalho, com direito a um dia de descanso. O mês e o ano são invenções de papas e de imperadores, preocupados com o registo da sua efemeridade que confundiam com a “imortalidade"...

No que me diz respeito, já deixei de andar pelas estações e aborrece-me falar delas, porque há tantos lugares onde o Sol deixou de brilhar e a Chuva de cair ou, então, quando a enxurrada chega, fingimos que a culpa é do Céu.

 

8.2.16

O único vício que me resta...

Alimentar um blogue não é fácil! A maioria das postagens não consegue despertar o interesse do leitor de ocasião, sobretudo quando o escrevente não se limita a um tema e insiste em dar opinião sobre tudo o que mexe...

E o que mexe, sem ser a bola, é a política que finge servir, mas que, afinal, se serve de nós. Os políticos parecem ser (são) perversos por nascimento e têm sempre à mão o argumento de que nós é que somos os responsáveis pela nossa triste situação: somos nós que fumamos; somos nós que consumimos a crédito; somos nós que preferimos o automóvel ao transporte público...

No meu caso, o argumento não me convence: utilizo o automóvel, porque a Carris encurtou a carreira 22 - se ela, pelo menos, chegasse à Praça José Fontana!; não fumo há mais de 30 anos; e bem gostaria de não utilizar o único cartão de crédito que possuo - bastava que não fosse obrigado a suportar as consequências da austeridade, em matéria de desemprego e de remunerações amputadas..

O único vício que me resta é este de preencher um espaço em branco, até que um cometa me liberte...

 

7.2.16

Inverno

A furgoneta estaciona em segunda fila, encobrindo o automóvel cuja porta à força de ranger me convenceu a oleá-la, socorrendo-me de um lubrificante multiusos, no qual deposito mais fé do que na classe política... Diz a embalagem que «lubrifica e penetra, remove ferrugem e limpa metais, repele humidade do sistema elétrico». Por um momento, chego a pensar que talvez pudesse aplicar este produto a mim próprio...

Enquanto cumpro a tarefa, procuro o dono da furgoneta e vejo-o do outro lado do muro a abrir e a fechar contentores de lixo, sem que nada retire do interior - ato mecânico e aparentemente inútil. Entretanto, decido descer a rua, aproveitando para caminhar um pouco mais, apesar do cansaço das pernas e da leveza estomacal... 

A rua e as seguintes, quase vazias, deixam o vento à solta, afastando os mascarados da quadra, sem impedir que a natureza troque as voltas às estações: as aráceas (os jarros) florescem verticais, à sombra das sebes que cercam os prédios de doze andares que predominam na localidade, sem esquecer os cogumelos que se escondem nos troncos e nas redondezas das árvores.

Avanço no labirinto e verifico que, na quinta do Seminário, os trabalhadores «guardam o dia do Senhor», obrigando o bispo a pernoitar noutros aposentos - confesso que nunca por aqui vi o bispo do Senhor; ele é ainda mais raro do que os agentes de autoridade... Descubro, todavia, a furgoneta, desta vez bem estacionada, e no seu interior não um, mas dois respigadores de papel - o que é curioso é que hoje não é dia de recolha de papel... Mas eles sabem-no certamente!

E para terminar, que não a caminhada, vislumbro um placard NÃO DEIXE QUE O SEU CÃO SUJE OS NOSSOS JARDINS! Acabara de ver um a sujar a calçada... Contudo, o que me veio à cabeça foi NÃO DEIXE QUE OS POLÍTICOS SUJEM A SUA CONSCIÊNCIA!

Por exemplo, não deixe que, num tempo de decisões políticas precárias, o convençam a consumir mais, sobretudo, produtos importados, e com recurso ao crédito... 

6.2.16

O dinheiro quanto mais circula

«O dinheiro, quanto mais circula, mais quem não o tem vive de esperanças.» Italo CalvinoMarcovaldo (no Supermercado) ...

Marcovaldo foi publicado, primeiro em 1958 e depois em 1963. É um romance realista fantástico, cujo autor deve ter inspirado muito escritor que anda por aí como inventor do realismo fantástico, mágico, animista...

Muitas das histórias que integram esta obra bem podiam integrar o «corpus» de leituras das nossas escolas, pois ajudariam a educar a sensibilidade.

Em 2016, quem não tem dinheiro não é ninguém. Talvez seja por isso que a maioria dos crimes tem como causa primeira o dinheiro. Os próprios governos, para se legitimarem, passaram a gerir as expectativas da população, prometendo-lhe, a qualquer custo, o vil metal... E aqueles, que deixaram de confiar na governação, recorrem a todos os expedientes para se apropriarem do eldorado, mesmo que por uns tempos possam ser alvo da atenção da justiça e dos cobiçosos. 

 

5.2.16

'Os animais docentes' e o escritor emplumado

No Saldanha Residence, em Lisboa, há uma livraria que coloca à venda livros a preço reduzido. Quase todos os dias por lá passo e observo a oferta, variada e, por vezes, de qualidade... Embora isto da qualidade seja subjetivo, como o prova o José Rodrigues dos Santos que se considera o melhor escritor português da atualidade...

Hoje, decidi comprar por três euros, o livro Entre Pássaro e Anjo, de João de Melo. Trata-se de uma coletânea de 10 contos, de que destaco, desde já "Os animais docentes"... 

Num ápice, li o conto, não só pelo registo autobiográfico, mas porque ele espelha fielmente o universo dos docentes e dos discentes da província portuguesa nos anos 70 e 80 - um mundo fechado, hierarquizado, preconceituoso e distante dos ventos que sopravam da Europa... De certo modo, este conto fez-me lembrar as viagens de camioneta para Mafra, por entre vendedores e aves de capoeira, sem esquecer a guerrilha local entre o PSD e o PCP, isto nos anos 70... Sintra chegou depois, mas já se sentiam os ares da capital, apesar das desconfianças e das suspeições. 

Seja como for, não consigo compreender que ninguém diga, de viva-voz, ao JRS que ele não é o Eça, nem o António Lobo Antunes, nem o Mário Cláudio, nem o Mário de Carvalho, nem o João de Melo, nem a Lídia Jorge, nem o João Tordo e outros tão vivos como ele, mas que não colocam a RTP ao seu serviço...

Um destes dias, o próprio candidata-se ao prémio Nobel da Literatura!

 

 

4.2.16

Noutras circunstâncias...

Às 14 horas, abro a porta da sala 19, e espero....

Vinte minutos mais tarde, chegam as 'assistentes' que depositam sobre as mesas a parafernália de filmagem. 

A formadora chega às 15h30 e, de imediato, manifesta a sua estranheza face às ausências... Ainda pergunta se alguém tem o número de telefone de K, X ou Y...

Os aprendizes (ou será aprendentes?) entram um a um, e só por volta das 15 horas é que se pode considerar que metade do grupo está presente, faltando precisamente os que têm o trabalho mais atrasado.

Entretanto, surge uma candidata que quer fazer parte da oficina, mas que acaba por confessar que às 15h15 tem aula... A formadora dissuade-a, apelando ao sentimento de frustração - afinal, a candidata, apenas estaria presente num período morto... Um pouco a despropósito chegou uma outra jovem que vinha pedir autorização para divulgar a existência desta oficina de cinema, com base na experiência adquirida, durante três anos, na Escola Marquesa de Alorna...

Finalmente, às 15h 30, os presentes saíram para fazer "planos" do Sol em torno da Escamões. Mal aqueles saíram, chegaram mais dois jovens que disseram desejar integrar o 'grupo'... e lá foram a correr atrás dos primeiros...

A falta de pontualidade e de explicação para a ausência têm sido uma constante. De qualquer modo, hoje, quero crer que a publicação no JL da reportagem Aprender (com o) cinema, da autoria de Catarina Letria, terá tido influência nestas vontades serôdias de integrar a Oficina de Cinema...

(Enquanto eles se debatem com a luz, eu vou me debatendo com o relato da ocorrência que, noutras circunstâncias, designaria de 'incidente crítico'. Às 15h55, continuo à espera, embora, de momento, tudo pareça correr normalmente. Resta acrescentar que K, X e Y ainda não deram sinal de vida.)

 

3.2.16

Esboço de país

Embora de forma forçada, podemos 'apagar o quadro' e 'apagar a luz', mas não podemos apagar as contas por pagar. Em princípio, porque há quem esqueça completamente os calotes e nos faça pagar por conta...

Por outro lado, há ' artigos´ publicados e outros por publicar, mas, convém saber que artigos queremos comprar, quando entramos na loja, na mercearia ou no supermercado, caso contrário saímos de lá depenados. A novidade dos últimos anos é que, quando consultamos a Gramática, os ‘artigos' foram secundarizados pelos determinantes...

 

Também há várias maneiras de fazer caldo verde, mas o que conta é o paladar do freguês...

De momento, nada mais tenho a acrescentar a não ser que nas farmácias há quem goste de inquirir o cliente sobre o destino do medicamento e os modos de o tomar, e quem se limite a vender o artigo, não se sentindo minimamente responsável se o doente acabar por se apagar...

Finalmente, sinto-me frustrado porque ainda não sei se o esboço de orçamento já agrada à comissão europeia e aos partidos da coligação, embora creia que já não somos mais do que um esboço de país, pronto a apagar-se ou a ser apagado...

E eu estou em consonância (ou como diria um sabido, em ´conivência') com o estado da nação...

 

2.2.16

Meias de vidro

Ainda não acordara, e já, de forma repetida, tinha a sensação de que o carro fora roubado da garagem. Interdito, nem punha a hipótese de que não o parqueara na garagem. Apenas uma sensação de estranheza: Quem é que se ia dar ao trabalho de arrombar dois portões? 

A obsessão onírica só cessou quando a antena dois irrompeu no quarto com uma daquelas melodias que costumam deliciar quem se arrasta no tempo... 

Não se sabe se Freud teria alguma coisa a dizer sobre o sentido do roubo e do derrube dos portões. Provavelmente, falaria de uma pulsão sexual recalcada, ou, então, de um aviso: - se te roubarem o carro, não te queixes, pois preferes deixá-lo estacionado na rua a guardá-lo na garagem...

As meias de vidro enrolaram-se de tal modo nos suportes do estendal da roupa que ele viu-se obrigado a subir ao parapeito da janela para as salvar. A acção foi demorada e não sem riscos: a janela de vidros duplos não abria completamente, o banco de plástico deu de si, desequilibrando o serviçal, a vassoura perdera a magia dos contos de antanho..

Pelo meio, uma atrapalhada e tímida aluna, proveniente do Brasil, que colocava a hipótese de trocar a Literatura Portuguesa pela Filosofia, na esperança de que esta última fosse mais acessível. Talvez, tenha confundido a parte com o todo, isto é, que a Literatura Portuguesa continue a ser escrita no português medievo, anterior a Pedro Álvares Cabral...

Finalmente, os meteorologistas do ar condicionado insistem em anunciar a chegada da Primavera, porque não necessitaram de salvar umas meias de vidro enfunadas pela nortada que ensandece os estendais...

 

1.2.16

Houve tempo em que comprava livros...

Houve tempo em que comprava livros, jornais e revistas. Fui deixando de os comprar à medida que tive de começar a contar os tostões para pagar as dívidas alheias, sem esquecer a luz, o aquecimento e as comunicações... O que me não me impede de entrar em livrarias e percorrer-lhe os escaparates e as prateleiras, minuciosamente.

Ainda agora venho da Almedina (Atrium, Saldanha), impressionado com a profusão e o volume dos livros, mas revoltado porque não consegui vislumbrar a obra do amigo Silva Carvalho, autor.

Sim, do autor! Porque, para mim, um autor é quem é capaz de compor, de criar de dentro das palavras, e não, apenas, quem reproduz a realidade por demais sabida ou desinteressante...

Nas nossas livrarias, só é exposto quem está na ribalta, quem é flácido ou defunto recente.

E a propósito de autor, ando um pouco abalado com os cogumelos urbanos do Italo Calvino. Parece que, em Itália, os cogumelos germinam na Primavera... Aqui, em Lisboa e arredores, é fácil encontrá-los no Inverno, e não consta que deem origem a qualquer intoxicação alimentar, com direito a lavagem ao estômago... Sempre que os revejo, acastanhados ou esbranquiçados, estão destroçados…

 

31.1.16

António Lobo Antunes, sempre...

I - «Nunca esquecerei o início da minha carreira literária. Foi súbito, instantâneo, fulminante. Vinha eu de elétrico para Benfica, depois de mais uma educativa tarde no Liceu Camões, espécie de campo de concentração aterrorizador e inútil, quando por alturas do Calhariz, uma evidência surpreendente me cegou: vou ser escritor. Eu tinha doze anos...»  António Lobo Antunes, Retrato do artista quando jovem - II, in Segundo Livro de Crónicas, pág. 137, Dom Quixote.

...Estávamos, assim, em 1954, sendo reitor do Liceu, Joaquim Sérvulo Correia (1950-1974) ...

II - «Sempre que alguém afirma ter lido um livro meu fico dececionado com o erro. É que os meus livros não são para ser lidos no sentido em que usualmente se chama ler: a única forma parece-me de abordar os romances que escrevo é apanhá-los do mesmo modo que se apanha uma doença.» António Lobo Antunes, Receita para me lerem, in Segundo Livro de Crónicas, pág. 109, Dom Quixote.

... Será por isso que, para mim, a leitura de António Lobo Antunes é aberta; pelo contrário, a leitura da obra de Saramago é fechada, o que perspetiva ao primeiro uma eternidade mais radiosa do que ao segundo.

III - «A minha estrada de Damasco ocorreu há cerca de dez anos, diante de um aparelho de televisão onde um ornitólogo inglês explicava o canto dos pássaros. Tornava-o não sei quantas vezes mais lento, decompunha-o e provava, comparando com obras de Haendel e Mozart, a sua estrutura sinfónica. No fim do programa eu tinha compreendido o que devia fazer: utilizar as personagens como os diversos instrumentos de uma orquestra e transformar o romance numa partitura.» António Lobo Antunes, De Deus como apreciador de Jazz, in Segundo Livro de Crónicas, pág. 131, Dom Quixote.

Ultimamente, leio os livros sem os anotar e sublinhar, o que, terminada a leitura, se revela uma grande chatice. Se quero fazer um apontamento, vejo-me obrigado a folhear o livro; no entanto, a vista raramente acerta, o que significa reler, tomar nota e voltar ao princípio. Para quem está de fora, isto só pode significar que me falta o método. Mas não, o que me acontece é o mesmo que ao hipocondríaco que foge a sete pés da saúde. Estar de saúde é estar morto! 

 

30.1.16

Talvez não seja picuinhice

«A ironia é o humor dos depressivos. “José Gameiro

Pouco tenho a dizer, a não ser que, enquanto leio António Lobo Antunes, vou escutando a emissão do programa Terra a Terra, dedicado a Vergílio Ferreira (TSF).

Pressinto que as minhas palavras não passam de picuinhices, mas gostaria de recusar a ideia de que Vergílio Ferreira tivesse sido «um mestre sem discípulos».

Num tempo de ortodoxias, Vergílio Ferreira era um professor heterodoxo que respeitava a pessoa do aluno, que o sabia ouvir, mas que recusava ser cúmplice de qualquer tipo de propaganda e detestava a mediocridade.

De qualquer modo, talvez não seja picuinhice ouvir quem o lê e quem o conheceu...

 

29.1.16

Apoquentado

´Apoquentar´ é uma daquelas palavras a que me habituei na infância. A minha mãe explicava o comportamento do meu pai, dizendo que ele andava apoquentado com a vida... Eu entendia que o céu não lhe sorria e por isso não me surpreendi quando um dia o vi partir para França, depois do granizo lhe ter destruído as vinhas.

O salto para França não lhe alterou o feitio, embora eu deixasse de ouvir falar da sua apoquentação. Por essa altura, quem andava apoquentado era eu, pois não compreendia o sentido da minha vida, apesar de me garantirem que o sentido da vida era servir...  

Durante anos, só esporadicamente ouvi conjugar o verbo 'apoquentar', e sempre na boca dos que serviam, sem receberem a devida compensação... 

Dir-se-ia que o termo 'apoquentar' só existia na boca da gente vulgar. Os poderosos desconheciam-no por inteiro, porque eles não se deixavam incomodar por miudezas...

De súbito, oiço o primeiro-ministro dizer que não está 'apoquentado' com as exigências da União Europeia - as divergências mais não são que miudezas!

Eu entendo o poderoso primeiro-ministro a quem o céu não tem faltado. Só que não consigo deixar de estar apoquentado... E parece-me que neste país há mais gente que vive apoquentada.

 

28.1.16

A solidão de Vergílio Ferreira

"A unidade do homem, centrada na consciência, desfaz-se à reflexão de que essa consciência é apenas «uma rede de comunicação entre os homens» e assim um homem solitário pode dispensá-la.! Vergílio Ferreira, Espaço Invisível 2, pág. 124, Bertrand editora, 1991

O homem solitário deste tempo deixou de ver reconhecida a consciência que lhe dava unidade, porque o conceito mudou de substância. Vergílio Ferreira, cada vez menos lido, não pode influenciar nem o estar nem o pensar, porque, afinal, o homem abdicou da consciência individual...

O homem já só existe se alinhado, isto é., se estiver presente nas redes sociais - redes de comunicação - cuja eficácia assenta na imagem fácil e na ideia medíocre.

Deste modo, ao ser molécula da consciência coletiva, o homem desfaz-se da sua possível unidade, deixando de ter valor como pessoa... passa a moeda de mão em mão...

Hoje, o homem que optar pela solidão, morre... Vergílio Ferreira nasceu há 100 anos, escreveu uma obra que quis devolver ao homem a sua unidade (a sua consciência), mas este não a quer mais.

 

27.1.16

Le Havre e o mundo à nossa volta

No âmbito do projeto "Moving Cinema", fui hoje à Cinemateca com três "alunos emprestados" ver o filme "Le Havre", do finlandês Aki Kausrimaki. 

Até ao momento da partida para a Barata Salgueiro, pensava que os dez alunos que integram a Oficina de Cinema da Escola Secundária de Camões, fossem cinéfilos... só que para meu espanto a maioria não deu notícia. Lá saberão porquê!

A proximidade das instituições permitiu que a deslocação se fizesse a pé e de forma célere. Todavia, na Conde Redondo ocorreu um pequeno incidente: um aluno deu uma cabeçada num semáforo, porque eu, atento ao que se passava no outro passeio, chamei a atenção para uma situação caricata. Um jovem, que descia a rua, chocou com uma corda de prumos sinalizadores de obra, deitando-os abaixo, sem revelar qualquer preocupação em os recolocar na posição correta. Entretanto, o mestre de obras, que saía do prédio em renovação, ficou estupefacto ao aperceber-se do que acabara de acontecer, sem, no entanto, perceber quem fora o responsável...

Desenlace: "o aluno emprestado" chocou com o semáforo sem lhe fazer qualquer mossa, facto que causou o gáudio de uns tantos africanos estacionados numa esquina.

A sala Félix Ribeiro estava cheia de petizes de origens diversas, mas alguns pareciam ter alguma dificuldade em compreender que o silêncio é condição necessária ao bom visionamento de um filme. Por outro lado, outros jovens, predominantemente de origem africana, revelavam uma apreensão muito interessante das situações, sem esquecer aqueles que conseguiam recordar o filme do ano anterior. 

Estas últimas reticências são a expressão de um intervalo gasto para entrega de uma caixa de música ao pai de uma criança de quatro anos que gosta de música, mas ainda não ouviu falar do topónimo Havre.

Ora os "alunos emprestados" também não sabiam que "Le Havre" é um porto francês - a pergunta surgiu a meio da Conde Redondo, ainda antes do semáforo... o que me fez lembrar o tempo em que nas aulas de Francês ensinava a geografia, a economia, a cultura de França, sem descurar a História, por exemplo, da ocupação alemã e da resistência...
Talvez por essa razão, o filme "Le Havre" recrie a situação dos emigrantes clandestinos e dos refugiados neste início do século XXI, mas com ecos comportamentais e icónicos do tempo da proliferação dos "campos de concentração" e do modo como as populações davam, ou não, proteção a quem era perseguido ou se via obrigado a fugir...
... Só que o desconhecimento dos lugares e dos tempos acaba por limitar a compreensão de obras cinematográficas, como a de Kaurismaki. Preferimos acreditar que as nossas "leituras" são capazes de dar conta do que, entretanto, vai acontecendo na "Jungle" europeia... 

 

26.1.16

Os calotes da campanha eleitoral

Em matéria de despesas da campanha eleitoral, sete candidatos não têm direito a qualquer subvenção estatal.

O Vitorino revelou-se senhor de muito tino, pois não terá gasto um cêntimo. O Edgar, apesar de não ser "engraçadinho", o Partido paga-lhe as despesas. O Morais, senhor de enorme moralidade, decidiu recorrer ao amigos do "face" para que estes lhe paguem a extravagância. O Neto já não tem idade para se queixar. Do Ferreira, não sei o que diga, mas terá património suficiente... O Jorge pouco mais terá gasto que uma ou duas avenças. E quanto à Maria Roseira, são rosas meu senhor... os seiscentos mil euros que terá gasto... Nem nunca D. Dinis chegou a saber! Porém, desterrou a rainha Isabel para Alenquer. Neste caso, desconfio que a quinta de Sintra acabará por mudar de mãos...

Quanto aos restantes, ratos de cidade, calaram-se bem calados, não vá o trovador tratá-los como, outrora, João Garcia de Guilhade fez a Dom Foam:


Dom Foam disse que partir queria
quanto lhi derom e o que havia.
E dixi-lh'eu, que o bem conhocia:
  "Castanhas eixidas, e velhas per souto".

E disso-m'el, quando falava migo:
- Ajudar quero senhor e amigo.
E dixi-lh'eu: - Ess'é o verv'antigo:
       "Castanhas saídas, e velhas per souto".

E disso-m'el: - Estender quer'eu mão
e quer'andar já custos'e loução.
E dixi-lh'eu: - Esso, ai Dom Foão:

"Castanhas saídas, e velhas per souto".

 

25.1.16

Ao entardecer

Tudo começa a acelerar, o frio alterna com o calor, o suor invisível entranha-se na pele depois de um longo banho catártico. 

Os santos de ontem caem em desgraça, e a salvação passa a estar do outro lado do telefone - qualquer resposta, que diga sim à imediatez, serve...

Ao entardecer, os argumentos perderam qualquer força. Só o silêncio e a obediência...

E quando os dias são de chuva, mesmo que a temperatura suba, tudo acelera ainda mais... e depois há o vento, quente ou frio, um demónio à solta...

Espero que ninguém pense que estou a referir-me ao "entardecer" de Cesário Verde. Há, de qualquer modo, a soturnidade da vida eivada de loucura, por vezes, pouco benigna.

 

24.1.16

Temos um novo Presidente da República

Temos um novo Presidente da República - Marcelo Nuno Duarte Rebelo de Sousa, nascido a 12 de Dezembro de 1948...

Esperemos que Marcelo Rebelo de Sousa saiba ser presidente de todos os portugueses, fazendo esquecer aqueles que, em nome do interesse dito nacional, contribuíram para o empobrecimento do país, hipotecando-lhe a soberania.

Apesar de tudo o que escrevi sobre o comentador, desejo que doravante o presidente saiba interpretar a lei, não como um solitário exegeta, mas como um homem permanentemente atento à realidade, sem transigir com todos aqueles que, em nome de interesses pessoais e corporativos, vão delapidando o património territorial, cultural e humano. 

 

Parece que a austeridade mora noutro lugar

Por onde circulo, os cafés estão cheios de um tempo ocioso.

A maioria dos clientes terá deixado de trabalhar há muito ou, talvez, nunca tenha trabalhado...

Não sei se já votaram ou se o tencionam fazer, mas o seu ar despreocupado preocupa-me...

Quando olho os cafés, e me dizem que vivemos em austeridade, fico sempre um pouco confuso: parece que a pobreza mora noutro lugar ou, então, não passa de uma fantasia... 

Dizem-me, entretanto, que os clientes dos cafés são estrangeiros, porém, quando apuro o ouvido, o argumento morre na chávena do meu café... 

Mais logo se verá!

 

23.1.16

Ao atravessar a Quinta das Conchas

Esta árvore parece ter uma vida difícil, porém não desiste. Ao atravessar a Quinta das Conchas, dei de caras com a sinuosidade torturada dos seus gestos e, primeiramente, pensei que o seu estado seria fácil de explicar: a secura do solo.

No entanto, ao olhar à sua volta, verifiquei que por perto se erguia um majestoso e frondoso eucalipto, o que desmentia de imediato que a água andasse arredia de tal lugar...

Afinal, o que falta a uma árvore sobra a outra. Injustiça, talvez!

A Natureza nem sempre favorece a equidade!

 

Enquanto medito, vou esquecendo

Vou votar? Não vou votar?

Se for votar, voto branco? Anulo o voto? Olho atentamente o boletim, e escolho o candidato mais velho, o mais novo, o mais bonito, o mais gordo, o mais magro?

(Estou na dúvida, pois não sei de quanto tempo disponho na mesa de voto para observar a foto de cada um dos candidatos.)

Esta meditação pode parecer disparatada, mas, na realidade, necessito de um critério de decisão. Ainda não passaram 24 horas e já me não lembro de nada de essencial: esqueci tudo o que eles disseram uns dos outros, ou fingiram não querer dizer; esqueci até qual dos candidatos é o mais beijoqueiro...

Como já esqueci quem são os candidatos, hoje já não penso mais neste tema.

Amanhã, se verá! Pode ser que me lembre de me deslocar à assembleia de voto e acabe por me deixar de fantasias... Na hora, talvez Deus me ilumine! Quem diria!?

 

 

22.1.16

A marca pessoal dos candidatos

Dia 24, há eleições para a presidência da República, e não sei em quem votar... Não por falta de candidatos, mas porque não lhes vislumbro perfil para tal responsabilidade.

Votei em 1976, em 1986, em 1996, em 2006, e sempre soube atempadamente o que fazer. Desta vez, não sei!

O modo como os candidatos se apresentaram ao país, lembra-me um grupo de pavões deslumbrados com as suas próprias plumas, que, a todo o momento, prometem cumprir com zelo a Constituição e servir o respetivo povo... Nenhum deles apresenta qualquer razão para que a Constituição seja revista, como se esta fosse a expressão de uma verdade indiscutível... Texto sagrado que só um ímpio ousaria desafiar! 

Todos estão prontos a jurar e a fazer cumprir a Constituição, deixando uma marca pessoal...

Se algum dos amigos quiser apontar dois ou três argumentos convincentes, ficar-lhes-ei muito agradecido.

 

21.1.16

Carta dos Deveres Humanos

Começa a preocupar-me que não haja uma Carta dos Deveres Humanos. 

Na procela política, há candidatos que clamam que não aceitam que lhes restrinjam os direitos...

Por outro lado, na vida diária, os indivíduos de todas as idades e condições, a todo o momento, reclamam os seus direitos...

Não quer isto dizer que não seja necessário combater permanentemente o desrespeito pelos direitos essenciais do ser humano e não só. Parece-me, no entanto, que, em termos de conduta, também deveria ser estabelecida uma Carta dos Deveres Humanos...

Por toda a parte, se verifica que muitos dos que exigem que os outros lhes reconheçam e zelem pelos direitos, se sentem, por seu turno, desobrigados de cumprir com deveres essenciais. 

E fazem-no, colocando-se ao abrigo da Lei e da Moral.

 

20.1.16

Escrever (Vergílio Ferreira)

«Escrever é ir descobrindo o que se escreve. Escrever é quando muito saber para que lados fica o que se procura. Mas como chegar lá? Como saber mesmo que fica para esses lados o que procuramos. Escrever (ou pintar, fazer música, etc. ou até mesmo discorrer em filosofia) é inventar ou criar e só a própria criação ou invenção nos diz por fim o que se inventou ou criou. Nos diz? Nem isso. Porque o que aí está não o sabemos bem, são os outros que no-lo explicam e enfim a sua significação fica sempre adiada enquanto a obra durar.» Vergílio Ferreira, Conta-corrente, nova série II, pág. 348, Bertrand editora

Pouco me importa registar que Vergílio Ferreira nasceu há cem anos (28.01.2016) e que com ele nasceram ou morreram outros vultos da cultura da nacional ou mesmo da cultura local, entenda-se, do Liceu Camões... 

(Ao contrário de outras eras, a informação está em linha, não sendo mais necessário recorrer a mediadores encartados que venham repetir pela enésima vez o que todos podemos alcançar e, também, é maçador aturar verdades construídas à sombra da ignorância do passado...)

O que vale a pena verificar é se, para além das homenagens, ainda há quem o explique, isto é, se ainda há quem o leia, aprendendo que escrever vai muito para além de qualquer processo de enfeudamento a um programa, seja qual for a respetiva natureza...

Escrever é descobrir que, para além das palas, se pode imaginar outras vidas. E esse é um caminho pessoal!

 

19.1.16

Falar a verdade

"Não acredites num tipo que te diz «falar a verdade». Não porque seja mentiroso, mas porque ele próprio a não sabe." Vergílio Ferreira, Pensar.

Escrevemos, muitas vezes, do que não sabemos, atrevendo-nos a afirmar que as enguias que, um dia, vislumbrámos num poço lá foram postas por algum pescador finório. Essa passa a ser a nossa verdade e com um pouco de sorte a verdade do interlocutor... Até que alguém explica que as enguias dos poços para lá foram empurradas pelos enchentes dos rios que ao inundarem os terrenos lhes mudaram o destino...

Quando nos dizem que «as cheias são as maiores de que há memória», embalados pela verdade da cantiga, deveríamos revisitar os poços para verificar se há por lá enguias...

Não há quem não «fale a verdade»! Em jeito de remate, eu próprio escrevo frequentemente «é verdade que...» 

(Prometo, estar mais atento!)

Nestes últimos dias, dez candidatos à presidência da República têm asseverado «falar a verdade» e, como pensou Vergílio Ferreira, nenhum deles a conhece. Como acreditar neles?

A verdade pressupõe a crença, e como tal nada do que é dito deve ser tomado como verdadeiro. Talvez possível... 

E nova dúvida se levanta sobre «a confiança»! Pedem-nos que tenhamos fé - coletivamente ...

18.1.16

Escreve sem pressa

Se não sabes o que escrever, não te preocupes!

Lê uma página ou duas, ou mais se te apetecer.

Sai de casa, procura um jardim e, mesmo sem estares cansado, senta-te num banco, olha à tua volta, segue o voo dos pássaros, escuta-lhes o chilreado; observa os arbustos e as flores, procura-lhes a cor; com um pouco de sorte, talvez, oiças as crianças e o ranger dos baloiços. 

Ao regressares, não te debruces sobre o parapeito, deixa que o Intercidades se afaste - o comboio fica para o dia em que te encontres no cais... Observa apenas os idosos que regressam das compras, em silêncio e tristes, porque só compraram uma pequena parte do que sonharam...

 Se não sabes o que escrever, não te preocupes!

Amanhã, tu ainda podes ler as páginas que te apetecer, tu ainda podes substituir o jardim pelo cais. Os idosos, esses, vão ficando por casa, tristes... a dormitar. 

 

17.1.16

Se possível, não escrevas...

Se possível, não escrevas, não digas nada.

Fica, apenas, a olhar a criança-ciclista que desce a rua, vinte metros atrás do pai-ciclista... O automobilista segue-os, incrédulo, acabando por ultrapassá-los com cautela numa reta antes de virar à direita...

Se possível, não escrevas, não penses na curva, na briosa criança-ciclista e no pai-ciclista para além da curva, destacado, como se toda a estrada mais não fosse do que uma pista reservada a ciclistas...

 

16.1.16

A chave que a vida nos oferece

                 «A pessoa tem de renunciar à sua própria chave
            aquela que todos temos para abrir a vida, a nossa e a alheia
            e utilizar a chave que o texto lhe oferece.»
                  António Lobo Antunes, Receita para me lerem 
                        Segundo Livro Crónicas, Dom Quixote

Habituados a trazer no bolso ou na mala a chave de casa, do carro... acreditamos que para tudo há uma chave. Uma chave anterior, exterior a nós.

As chaves são nossa propriedade, e quando as perdemos ou no-las roubam caímos no desespero e, devotos de ocasião, rogamos a santo António que no-las traga de volta...

E se o santo nos falta, recorremos às chaves do Areeiro (passe a publicidade) que nos arromba a porta e nos faz pagar uma nova fechadura para que possamos regressar ao sossego do porta-chaves...

No entanto, quando se trata da vida, de a compreender, de a enfrentar, não há chaveiro que nos valha, porque cada vida tem a sua própria chave, difícil de encontrar e, sobretudo, porque falta-nos a disponibilidade para a aceitar... até porque na vida não estamos sozinhos, e cada um tem a sua chave como única. 

 

15.1.16

Deve ser do vento...

Não os conheci pessoalmente. Ou se calhar, conheci-os e perdi-lhes a voz, porque, para mim, sem voz não há conhecimento.

Ter-se-ão zangado por escrito, o que é inevitável para quem lhes lê as obras, conhece as capelas e a filiação.

Dizem-me que sob os plátanos fizeram uns tantos apóstolos, uns mais niilistas, outros crentes na salvação da humanidade oprimida.

Durante muito tempo, tive como seguro de que os discípulos se detestavam uns aos outros, de tal modo que era impossível atribuir o nome de um a um plátano, sem que os apaniguados do outro se enfurecessem, exigindo a exclusividade do dito cujo...

Um era existencialista, forjado num seminário da Contra-Reforma; o outro era marxista, enfeitiçado pelas conquistas soviéticas...

Atormentados pela Morte, colocaram-na num pedestal, servindo-a escrupulosamente. O primeiro, substituiu-a pelo Desespero Absoluto; o segundo, acabou por ver nela o Redentor do rebanho oprimido.

Agora há quem queira juntá-los! Deve ser do vento...       

 

14.1.16

Situação I

(À porta da sala de aula.)

O professor abre a porta.
Os alunos precipitam-se para o interior.

O professor continua do lado de fora.
(...)
Os alunos saem em silêncio...

13.1.16

'Nem Só de Caviar Vive o Homem'

Ler um extenso romance exige tempo e, por vezes, paciência. Nem sempre, a intriga é suficientemente verosímil, sobretudo quando abarca um longo período, marcado pelo terror da guerra - de 1939 a 1958.

O romance Nem Só de Caviar Vive o Homem, de J. M. Simmel, é um bom exemplo de uma obra que, sem ter a guerra como tema central, dá conta dos modos como esta se desenvolve nos bastidores, misturando situações de espionagem e de contraespionagem com negócios mafiosos de toda a sorte, sem esquecer o papel decisivo da gastronomia...

Num mundo desumano, o herói, Thomas Lieven, sobrevive porque há sempre uma solução humana:

«Ao longo de toda a minha vida desconfiei das palavras altissonantes e dos grandes heróis. Também nunca gostei de hinos nacionais, de fardas, e daqueles a quem chamam homens fortes.» op. cit., pág. 506.  

Em conclusão, vale a pena ler este romance porque ajuda a compreender os bastidores da segunda guerra mundial nos países beligerantes e nos países neutros, como a Suíça e Portugal, até porque boa parte da ação decorre em Lisboa, revelando o modo como o Estado Novo se comportou durante aquela época.

A informação sobre Lisboa, Estoril e Cascais, é rigorosa. 

 

12.1.16

Qualquer soldado raso pode chegar a general

Nesta República, qualquer soldado raso pode chegar a general - resposta de Nóvoa ao general Marcelo que entende que a Presidência só pode ser ocupada por generais e almirantes... 

Enquanto um parece socorrer-se de uma metáfora de origem castrense, o outro exprime literalmente a sua convicção de berço...

O problema é que ambos, apesar de se declararem abertamente comprometidos com o futuro, continuam a utilizar a linguagem do passado.

Por outro lado, a História ensina que só em contextos revolucionários e despóticos é que soldados rasos conseguiram alcandorar-se ao generalato.

E nesta guerra de senhores feudais, as donas continuam a ficar em casa.

 

 

 

 

11.1.16

D. Afonso Henriques tinha um cavalo...

«... D. Afonso Henriques tinha um cavalo porque os reis andavam a cavalo só os presidentes é que não sabem montar e nas batalhas o rei D. Afonso Henriques ia todo vestido de rei que é um fato de lata e entrava à espadeirada aos inimigos que fugiam dele não sei porquê...»  Luís de Sttau Monteiro, Redações da Guidinha

Para mim, um candidato a presidente que não saiba montar a cavalo não serve. Já passaram mais de cem anos desde que o último rei foi desmontado do cavalo, cedendo o lugar a presidentes que, na maioria, nunca aprenderam a montar a cavalo, embora tenham aprendido a ceder aos interesses dos poderosos e, até em demasiados casos, tenham aumentado a fortuna de familiares, amigos e sequazes...

Para evitar este descalabro, creio que o melhor seria só aceitar a candidatura a presidente de quem soubesse montar ou, pelo menos estivesse disposto a aprender. E depois o eleito presidente ia por esses campos fora, montado no rocim presidencial, à conquista das ilhas perdidas até reencontrar o Encoberto... o verdadeiro responsável pela queda da Cavalaria...

Texto motivado pela leitura de uma estrofe de D. Dinis:

Joam Bol' anda mal desbaratado

e anda trist' e faz muit' aguisado

ca perdeu quant'havia guaanhado

e o que lhi leixou a madre sua: 

um rapaz que era seu criado

levou-lh' o rocim e leixou-lh'a mua

 

10.1.16

MNAC - Museu do Chiado: 4,5 €

O património é de todos, ajude-nos a conservá-lo."

A entrada no Museu Nacional de Arte Contemporânea custa 4 euros e cinquenta cêntimos. 4 euros e cinquenta cêntimos é quanto pagamos para a ver a programação atual.

Hoje, no Piso 3, visitei quatro das instalações* que se candidataram à 1ª edição do Prémio Sonae Media Art, tecnologicamente interessantes, mas efémeras.

A efemeridade não é, em si, um defeito. No entanto, quando o custo da entrada é tão elevado, estas ou outras instalações tornam-se invisíveis. Deste modo, o MNAC não só não divulga os artistas, como não obtém as verbas necessárias à preservação do património...

 

*Tatiana Macedo. INSTALAÇÃO VÍDEO DE PROJEÇÃO SIMULTÂNEA EM TRÊS ÉCRANS (vencedora) 

Patrícia Portela. PARASOMNIA, 2015

MUSA PARADISÍACA, CANTINA FÁBULA, 2015

RUI PENHA. RESONO, 2015    

 

9.1.16

Marcelo, sobranceiro

Tenho profunda esperança que os portugueses decidirão em janeiro o que não devem deixar para fevereiro”. Marcelo contraria Costa: “a primeira volta vai ser as secundárias da esquerda".

Pode até estar mais bem preparado do que os restantes candidatos, porém Marcelo Rebelo de Sousa revela falta de humildade, como, se predestinado, lhe bastasse a vassalagem de um povo que ansiasse pelo Messias...

Imaginando-se anunciado por algum longínquo oráculo, Marcelo procura conquistar a tribo dos infiéis, abrindo mão, assim, do rebanho que naturalmente o seguiria, como se ele fosse o bom pastor...

Corre, no entanto, o risco de as ovelhinhas não serem tão mansas e cristãs como ele quer crer. Por vezes, as mansas ovelhinhas conseguem reconhecer o lobo, sobretudo quando ele é demasiado espalhafatoso e arrogante...

 

8.1.16

Sempre que um inteligente chega ao Ministério da Educação...

Sempre que um inteligente chega ao Ministério da Educação, é sabido que os modos de avaliar mudam.

Educar, nos últimos 20 anos, passou a significar "avaliar", "classificar"...

Pouco importa se há alguma coisa de consistente para aprender.

Pouco importa a qualidade da formação de quem é suposto ensinar.

De facto, é mais rápido alterar os modos de avaliar do que criar um sistema de formação de alunos e de professores adequado à realidade atual e que ajude a construir o futuro. Entretanto, vamo-nos entretendo com o passado...

Criar um sistema de formação exige tempo, e tempo é o que faz falta ao inteligente que, a toda a hora, chega ao Ministério da Educação.

 

 

7.1.16

A chuva e o vento

Pensar que a chuva cai da direita para a esquerda é possível. Neste momento, as gotas estão quase a chegar ao fim da linha ou, melhor, já mudaram de linha...

Se a chuva fosse chinesa, ela cairia da esquerda para a direita e, provavelmente, vê-la-íamos a saltar de linha...

Sob a forma de bátega, a chuva cai a direito, e as grossas gotas, em vez de correrem, fazem-nos perder a linha...

Há também uma chuva miudinha que não se sabe se cai e que, por vezes, nos entontece e, outras, nos refresca...

A chuva a que me refiro, na verdade, não cai; quase tudo o que lhe acontece é por força do vento.

Talvez devesse agora reiniciar: «Pensar que o vento sopra da esquerda para a direita é possível» e sem ter de ir à China «Pensar que o vento também sopra da direita para a esquerda» ...

                                                             e em pouco estaria no olho do furação...

 

6.1.16

Bomba de hidrogénio: Surpresa ou hipocrisia?

Bombe H : « La Corée du Nord a surpris tout le monde » Le Monde

A Coreia do Norte surpreende o mundo inteiro!

Não acredito que um país que vive fechado sobre si próprio tenha capacidade científica, tecnológica e recursos financeiras para levar a cabo este tipo de testes, sem que outros países lhe forneçam os recursos necessários, inclusive humanos... 

E como tal, o espanto da comunidade internacional não passa de uma manobra de diversão. Quem é que pode crer que a China, a Rússia, os Estados Unidos, a Índia, Israel, o Irão, o Paquistão, o Reino Unido e a França nada saibam do que se passa na Coreia do Norte?

Os loucos, entretanto, continuam à solta: aterrorizam e condenam à miséria as populações que, infelizmente, acabam por os idolatrar...

É importante não esquecer que em Portugal há gente boa que continua a confiar na bondade de regimes, como o da Coreia do Norte.

Esta é uma matéria sobre a qual todos os candidatos a presidente da República deveriam pronunciar-se.

 

 

5.1.16

Da opacidade da evidência

O que eu gostava de saber é por que motivo as evidências são tão opacas. Talvez, o problema seja meu, e eu não saiba o que é uma evidência. Será que há alguma relação entre a evidência e a vidência?

De facto, há muito que o meu pensamento sobre o estado do mundo é contestado pelos videntes que me andam cercando como as ondas de San Simion, só que a amiga era cega e por isso não tinha pejo em pedir aos elementos que lhe dessem novas do amado...

Há quem pense que a melhor forma de vida é esperar que lhe tragam a morte amortalhada no arco-íris, eu porquanto prefiro andar à chuva e ao sol, sabendo que por mais água que deitemos sobre o fogo, este nunca se apaga...

A esta hora, o leitor já estará a pensar a que evidência é que me estou a referir, sem compreender que é aquela que, por estar por cima do nariz, não pode ser objeto de vidência. 

 

4.1.16

Montesquieu e a decadência de Portugal

Da leitura das Cartas Persas (1721), infere-se que a expansão portuguesa, no opinião de Montesquieu, não teve êxito por motivos religiosos e demográficos.

Primeiramente, porque o catolicismo gerou uma visão do mundo retrógrada, inimiga da tolerância religiosa e da razão humana... Em segundo lugar, porque, em termos demográficos, a nação não tinha qualquer possibilidade de gerir as enormes parcelas do império inicial, apesar de não ter optado, como acontecera com a Espanha, pelo extermínio dos íncolas:

«Quanto aos portugueses, optaram por uma via oposta; não usaram da crueldade: por isso, foram rapidamente expulsos de todos os países que tinham descoberto. Os holandeses favoreceram a rebelião destes povos e aproveitaram-se dela.» Carta CXXII

O que Montesquieu não refere é que estes holandeses eram, em muitos casos, judeus expulsos da Península Ibérica, primeiro de Espanha e depois de Portugal.

Faleceu o amigo Manuel Duarte Luís. Relembro-o como o homem bom que, nos anos 80, me convidou para com ele orientar a formação de professores no Colégio Vasco da Gama, em Meleças.

Profissional zeloso, procurou sempre que as escolas em que lecionou e de que foi diretor fossem espaços de educação, de aprendizagem e de socialização...
Para o Manuel Duarte Luís, o Outro era sempre uma PESSOA!
(4.1.2016)

 

 

3.1.16

O Prémio Vasco Graça Moura - Cidadania Cultural

O Prémio Vasco Graça Moura-Cidadania Cultural foi atribuído, por unanimidade, ao ensaísta Eduardo Lourenço, de 92 anos, anunciou hoje a Estoril-Sol, que instituiu o galardão, em parceria com a editora Babel.

Leio frequentemente a obra de Eduardo Lourenço, e reconheço-lhe o talento ensaístico e a capacidade de recuperar temas essenciais da cultura portuguesa na sua relação com a Europa e com os restantes continentes, mas causa-me perplexidade uma certa tendência na atribuição dos prémios: a veneração do mais velho em detrimento do mais novo...

A própria notícia, em vez de evidenciar o esforço do professor e ensaísta em prol da cidadania cultural (o que não deixa de ser pleonástico), prefere enumerar os prémios atribuídos e as condecorações recebidas...

Parece que só a morte do mais velho pode "libertar" o mais novo. Relembre-se, por exemplo, o culto de Manoel de Oliveira. 

De qualquer modo, o Estoril-Sol está no direito de atribuir o prémio a quem bem quer, embora creia que Vasco Graça Moura que, designadamente através da Casa da Moeda - Imprensa Nacional, deu um forte contributo para a divulgação da obra de Eduardo Lourenço, talvez preferisse ver reconhecido o trabalho de "alguém" das gerações mais recentes...

 

2.1.16

Não há honra nem dignidade...

«Não há honra nem dignidade no príncipe que se alia a um tirano. Diz-se que um monarca do Egipto mandou prevenir o rei de Samos da sua crueldade e tirania, intimando-o a corrigir-se: como ele não o fez, mandou dizer-lhe que renunciava à sua amizade e à sua aliança.» Montesquieu, Cartas Persas, Tomo II, pág.229-230, Tinta da China edições, 2015. 

Cartas Persas é uma obra pícara, escrita à maneira de Fernão Mendes Pinto, que põe em primeiro plano a defesa dos direitos humanos, em culturas determinadas por princípios religiosos discriminatórios, apesar de, por vezes, parecerem diametralmente opostas... 

Para quem, algum dia, leu Peregrinação é visível a influência do estilo pícaro de Fernão Mendes Pinto em Montesquieu e, em particular, da capacidade de espelhar os defeitos de uma cultura, contrapondo-a à hipérbole das qualidades de uma outra...

Hoje, por outro lado, o que Montesquieu nos ensina é que muito mal vai o príncipe (a União Europeia) que mantém relações de subserviência com o tirano (o presidente da Turquia) por muito válidas que as razões possam parecer (acolhimento dos refugiados e expansão do estado islâmico) ...

 

 

1.1.16

Ao contrário de José Tolentino de Mendonça

Sou matéria finita. Para lá da materialidade, nada experimento, apesar das religiões... Como tal, não me defino como tempo, nem como espaço - vivo um certo tempo e ocupo um determinado espaço, bastante mais material do que a duração...

Ao contrário de José Tolentino de Mendonça, não vejo como defender que «somos feitos de tempo, lavrados instante a instante pelos seus instrumentos» (E/58, 31 de dezembro de 2015). Que eu entenda, não é possível falar da materialidade do tempo até porque tal definição seria contrária à ideia de redenção que caracteriza todas as religiões monoteístas... 

Admito, sim, que estou no tempo enquanto a matéria de que sou feito não se consome. Depois ou antes, nada posso fazer a não ser ceder involuntariamente o lugar a outros... 

Ao contrário de José Tolentino de Mendonça, para mim estar no tempo não significa qualquer forma de desespero trágico, porque a redenção que tanto o ocupa pressupõe uma culpabilidade herdada e, sobretudo, uma graça divina que me seria imposta por uma força externa à matéria finita.

Quanto à nossa tarefa, basta-me o princípio da equidade...